quarta-feira, 28 de outubro de 2015

O tema da violência e o tema do pacifismo.

Encaro a paz como uma vantagem, um benefício, um valor, uma virtude.

Nem por isso sou pacifista crasso como uma Gandhi ou um Tolstoi.

Creio-me pacifista. Mas crítico.

Por mais que seja difícil considero que para pessoa humana seja conveniente abster-se da vingança e proceder sempre com docilidade.

Não se trata de perdoar sem condições ou de ser amigo de todos como preceituam alguns religiosos românticos.

O Evangelho ao decretar que amemos a todos os seres humanos não nos obriga a ser amigos de todos. Isto pelo simples fato de que nem todos estão dispostos a amar, retribuir, respeitar, etc Importa jamais desesperar de tais pessoas, se possível e sempre que possível ajuda-las e jamais agredi-las ou fazer-lhes mal. Importa estar disposto a perdoar caso elas mostrem evidências de que mudaram...

Ninguém é ou pode ser constrangido a viver intimamente com uma pessoa de má índole e sempre será lícito distanciar-se dela.

Agora odiar, buscar vingança ou recusar-se a perdoar aqueles que dão mostrar de serenidade, isto o bom Católico não pode fazer. Amamos os bons e virtuosos vivendo em doce comunhão com eles, amamos os maus pela esperança de que venham a abraçar a virtude, exortando-os a piedade, abstendo-se de agredi-los, tendo paciência com eles e se possível socorrendo-os caso passem por dificuldades, etc São maneiras diferentes de expressar o mesmo amor.

No plano das relações sociais legislou o divino Mestre e não podemos revidar o mal que nos fazem.

Grande desafio temos pela frente.

Porém se tivermos boa vontade, a comunhão ou unidade com o sagrado nos fortalecerá.

Importa saber que Jesus Cristo jamais pretendeu legislar em termos de politica e sociedade.

De fato os preceitos, normas e regras que estatuiu não foram estatuídos tendo em vista a ordem politica ou o estado mas as relações pessoais e ali se esgotam.

Erra cabalmente aquele que a partir da Lei evangélica tenta deduzir princípios políticos destinados ao governo das nações.

Assim tudo quanto o Senhor refere sobre a paz não pode ser usado aleatoriamente tendo em vista a condenação absoluta das guerras.

Pacífico segundo o Evangelho é sobretudo aquele que jamais agride.

Assim a paz do Evangelho, a paz que tende a regular de modo absoluto todas as esferas da existência humana deve ser compreendida não como proibição de exercer defesa, as sempre e antes de tudo como não agressão.

Ao Cristão sempre será vedado agredir ou atacar e tampouco pode se sancionar o ataque ou a agressão em termos de política Cristã.

Por isso que o único tipo de guerra ou rebelião permitido aos fiéis que seguem a Jesus Cristo é a guerra justa por meio da qual os agredidos exercem defesa.

Assim as Cruzadas por meio das quais os Cristãos atacados resistiram a jihad proclamada pelos muçulmanos no século VII e levada a cabo por cerca de quinhentos anos.

Agora aos cristãos jamais sería lícito atacar comunidades judaicas ou muçulmanas com o intuito de converte-las a força. O Cristianismo para sua glória não conhece jihad!

Nem me digam que certas parcelas do Catolicismo como as igrejas romana e anglicana conheceram Inquisições. Afinal sabemos perfeitamente que tais inquisições foram criadas quando o Cristianismo Católico contava com mais de mil anos e que jamais deixaram de ser criticadas pelos melhores membros das igrejas.

Direi ainda que se o desenvolvimento da inquisição estivesse relacionado com qualquer princípio interno inerente ao Catolicismo o Catolicismo Oriental ou Ortodoxo teria também ele conhecido um aparelho inquisitorial. No entanto a civilização bizantina jamais conheceu algo semelhante a inquisição. Donde se infere necessariamente que a existência da inquisição deve-se mais a elementos de natureza externa e exógena do que a elementos próprios do Catolicismo.

Foram tais elementos identificados?

Existem diversas hipóteses relativas a gênese das inquisições Católicas (jamais podemos nos esquecer de que existiram também as inquisições protestantes), tais como: a influência do islamismo e da sharia na península Ibérica, o convívio com os judeus e as fontes cada vez mais valorizadas do antigo testamento, etc

Por outro quando é que o islã deixou de ter jihad, djzia ou murtad???

Tornando agora ao tema da paz.

No entanto se a lei de Jesus Cristo repugna sancionar ou abençoar a agressão tampouco coloca a paz a serviço da injustiça como os pacifistas absolutos. Paz aqui não pode ser encarado por passividade face a situações de injustiça. Esgotados todos os meios pacíficos as situações de injustiça social sancionam o emprego da força, da guerra, da rebelião.

Eis porque Kafka assim expressou-se face a atitude dos operários oprimidos da Áustria: "Esses homens vem até nos para representar quando na verdade deveriam tudo tomar e destruir!"  
Afinal tudo conhece limite...

Assim quando a situação se torna insuportável para a comunidade é perfeitamente lítico tomar e destruir...

Compreende-se quando uma categoria de pessoas ou classe se deixa oprimir por saber-se demasiado fraca para revindicar seus direitos.

Agora quando um grupo ou classe se deixa explorar ao máximo mesmo sendo forte e capaz de reagir ou exercer defesa, já não é questão de pacifismo mas de indignidade.

Socialmente falando o Cristianismo não sanciona a indignidade.

Pois os discursos de Jesus Cristo estão voltados para o homem em suas relações pessoais e não ao governo das sociedades.

O homem forte e capaz que abstem de defender-se ou melhor que abstem de MATAR por suas IDEIAS este apenas é mártir PORQUE não acredita que as ideias possam triunfar por meio da força, mas que suas ideias haverão de triunfar por si mesmas apesar da força e contra a força. Foi este sentido que impediu Sócrates de fugir e que levou Jesus a ser crucificado!

Ambos podiam resistir, podiam fugir, podiam escapar... mas não o quiseram. E pereceram por causa de uma ideia ou opinião.

Claro que não estamos diante de uma situação social em termos de política, daquelas que opõem classes ou nações por consideração de justiça.

Aqui a situação é totalmente diferente e se Jesus Cristo não quis orientar-nos a respeito é porque certamente acreditava em nossa capacidade racional.

Ora, nada mais racional do que a teoria da guerra justa ou da resistência social em caso de agressão.

Mormente quando as crianças, idosos e mulheres inseridos em tais sociedades ficariam a merce de agressores muitas vezes demasiado cruéis. Neste caso proteger os membros mais vulneráveis da sociedade corresponde a um dever Cristão. Assim tendo em vista evitar defender tal gênero de pessoas e impedir que sejam exterminados, torturados ou escravizados pode ser encarado como uma tarefa religiosa.

Nem é necessário que a sociedade seja real, majoritária ou nominalmente cristã para que o Católico esteja obrigado a engajar-se e assumir sua defesa. Basta que seja uma Sociedade liberal ou democrática e laica face a qualquer ameaça fundamentalista ou teocrática a exemplo do pentecostalismo ou do islã. Não pode o Cristão Católico deixar de encarar a afirmação da liberdade no plano da natureza como a afirmação de um valor precipuamente Cristão...

Diga-se o mesmo duma Sociedade liberal ou formalmente democrática em que a maior parte dos cidadãos pertença a uma classe oprimida a qual se nega fazer justiça e que em decorrência disto opte por rebelar-se. Aqui o Cristão, certificado de que tal rebelião corresponde ao sentir da maioria dos cidadãos e que tem boas chances de ser bem sucedida, fica obrigado a engajar-se e a apoia-la ativamente. Não é do Católico omitir-se ou permanecer neutro face a situações de injustiça!

Agora perceba-se que o Cristianismo, mesmo sem ser passivo, lida com a violência como quem lida com um veneno ou seja com extremo cuidado.

E que portanto permanece equidistante da tese 'revolucionária' segundo a qual a violência deve ser encarada como uma espécie de panaceia ou teriaga destinada a solucionar todos os problemas sociais. Tese a que costumo classificar como mística da violência.

Desta mística grosseria, vulgar e ilusória que encara a rebelião ou o golpismo patrocinado por alguns indivíduos como uma espécie de receita de bolo aplicável a qualquer tido de situação, afasta-mo-nos decididamente.

Pois ignora:

O caráter incontrolável das rebeliões.

Os instintos destrutivos das massas e indivíduos em situações de anomia.

O valor da vida humana.

A esperança que os próprios oprimidos tem de virem a ser livres por outros meios.

A condição dos animais e do patrimônio cultural durante tais situações...

É todo um oceano de gente, de animais, de obras de arte e de documentos históricos que costumam ser aniquilados a cada guerra e revolução.

Um preço bem alto a ser pago por elas.

E eu creio que só deva ser pago em situações de injustiça ou agressão, após madura ponderação exercida por todo corpo social.

E não segundo a opinião precipitada de um líder ou de alguns indivíduos.

Nada deveria ser mais democrática ou amplamente discutido do que situações de conflito.

Importa que em tais situações o Católico esteja atento ao sentir da maior parte dos cidadãos, numa perspectiva democrática.

Neste terreno mais do que qualquer outro julgo que a verdade esteja no meio e que os extremos do pacifismo crasso e do odinismo correspondam a anti humanismos que se tocam.

Pois nem podemos sacrificar a justiça a paz e nem podemos ser fiéis a paz cometendo agressões.

Legitima é a guerra determinada por um ideal de justiça. Maldita a guerra promovida pela vontade de oprimir.

Nem tanto ao mar nem tanto a terra é nosso parecer.

Aqui como em todas as situações humanas seja a dignidade do homem nossa medida.

Paz quando houver justiça! Legítima defesa e resistência quando houver agressão!











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