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sábado, 7 de agosto de 2021

Os 'católicos' (Apostólicos romanos) TridentiProtestantes - Resposta ao Sr Paulo Cogos

Como Católico Ortodoxo sempre fui e sou favorável não a missa tridentina porém a Missa medieval, de S Pedro ou de S Gregório, filho da tradição, fiel, coerente e portanto adversário de qualquer inovação ou mudança no plano da adoração ou do culto.

Distingua-se - Sempre encarei com franca simpatia o ideário tradicionalista ou lefrevista em torno da adoração tradicional. Porém, quanto os tridentinos em si há muito que cessei de simpatizar com eles, chegando as vias da ojeiriza. 

Pois me parecem semelhantes as árvores estéreis e secas, as quais não produzem frutos bons. Paradoxalmente por via do moralismo ou do puritanismo de matriz calvinista tornaram-se eles estéreis quanto as obras legitimamente Cristãs... E a beleza do ritual, sendo malbaratada, não tem produzido frutos neles.

Leitor de Lefrevre, de George de Nantes e outros tradicionalista, inclusive do velho H Delassus, ao qual, ao menos em parte não faltava razão, assumi a tradição 'in totum', condenando o sifilização em sua totalidade e não apenas pragmática ou fingidamente ou seja quanto ao que me agradasse ou desagradasse. Compus apenas com a democracia ou com o liberalismo político (Que tornou-se exacerbado em mim.) após ter lido Leão XII (Refiro-me a sua 'reprimenda' a Albert de Mun.) e acompanhando-o e, em seguida com o liberalismo religioso ou com o direito dos seres humanos exercerem a liberdade religiosa, isto por força da Tradição, graças a meus estudos quanto a literatura patrística.

Quer dizer isto que com Lefevre e fiel ao pensamento lefreviano ou tradicional jamais assimilei este elemento exógeno e estranho do 'liberalismo econômico', alias parte essencial da cultura moderna e protestante. Isto ao contrário da oportunista e leviana TFP, que serviu de modelo a este tradicionalismo incoerente e enfermiço florescente no Brasil. Venenosa foi tal inspiração... 

Triste saber que entre nos Brasileiros foi o ritual antigo adotado por questões de exterioridade ou ritualismo e não de vida espiritual. Uma vez que a autêntica fé e a religiosidade apostólica não faz negociações... Entre nós no entanto os adeptos da seita, distorcendo por completo os ensinamentos de Leão XIII e da tradição da Igreja como um todo, mancomunaram-se com o liberalismo econômico, assumindo seus postulados anti Cristãos e ocupando-se em criticar apenas o comunismo. Digo, não apenas pouparam como apoiaram ativamente este modelo econômico materialista de origem protestante. O que não foi feito sem graves consequências em termos de proximidade com concepções e métodos protestantes ora importados dos EUA, os quais evidentemente fogem por completo a Ética Cristã e a lei do Evangelho.

É como se para dar combate a Marx ou melhor a Lênin tivessem recorrido a Maquiavel... O que equivale a expulsar Belzebu com Belzebu. Pois não precisamos de mentiras, calúnias ou difamações com que reprochar o comunismo ou quaisquer culturas de morte e quanto damos combate ao comunismo e a quaisquer culturas de morte, devemos faze-los como Cristãos Católicos i é com ética ou honestamente. Sintomático que nossos 'tracidionaleiros' do Brasil tenham reproduzido o que há de pior numa propaganda calvinista que se torna luterana. (Quem for capaz entenda o trocadilho.) - Nossos TFPentelhos trocaram a solida crítica dos Pes Chambre e Calvez por toda essa miséria protestante e sectária. E a geração atual segue pelo mesmo caminho tenebroso.

Afinal a questão da TFP e de todas as seitas que dela procedem era conservar a todo custo o monopólio da terra ou a propriedade improdutiva das famílias ricas e não pugnar pela fé de nossos ancestrais e, menos ainda, assumir a vida Cristã em sua totalidade e profundidade - O que tampouco parece ser pauta dos nossos Tridentícolas de missa dominical.

Por mais que como Ortodoxos defendamos o ritual ou o ofício litúrgico e, entre nós a missa tridentina ou a Missa petrino/gregoriana jamais defenderemos um Catolicismo Ortodoxo (Ou um romanismo.) de missa dominical. Uma coisa é ir a missa aos Domingos quando não haja impedimento sério, outra dizer que tal e suficiente para ser Bom Cristão ou resumir a prática religiosa a ida da família a missa, isso seria bom para o Luteranismo, jamais para o Cristianismo antigo, Católico, Ortodoxo ou tradicional... Tampouco seria Ortodoxia ou Catolicismo (ou sequer papismo) assumir uma moralidade pessoal estrita ou puritana advinda do protestantismo, pois o que teríamos a qui e o que temos aqui é Calvinismo e ainda protestantismo. 

Digo isto, marco e pontuo, porque sob auspícios da cultura protestante e individualista (Muito próxima do liberalismo econômico.) já a partir do século XVIII mas principalmente a partir do século XIX, surgiu no seio da igreja apostólica romana ou entre os apostólicos romanos uma ideia nova e essencialmente falsa segundo a qual bastava ao papista (Insinua-se isto hoje no seio do Catolicismo ortodoxo com grande sucesso.) ir a Missa, sozinho ou em companhia da família, aos Domingos ou mesmo diariamente, rezar, comungar e viver uma moralidade individual no seio de sua família, ou isolado face a comunidade, para ser um excelente Cristão. Tal a gênese do que começa a esboçar-se como Ideologia libera economicista 'católica' (A expressão é absurda, ímpia e herética!). 

No entanto - Afirmo-o como Bacharel em História - remonta esse novo modelo ou ethós 'católico', a reforma protestante (Cujo teor foi, desde o princípio individualista.) jamais a Idade Média e menos ainda a Antiguidade, ao padrão apostólico, ao Evangelho ou mesmo a antiga cultura israelita... períodos e modelos sócio culturais nos quais nada encontramos em termos de isolamento ou individualismo. A começar pelo século XVII, caso recuemos cada vez mais no tempo, vamos deparando com um romanismo cada vez mais social, gregário, solidário, fraterno... Ou com o papista integrado em sua comunidade e em comunhão orgânica com sua comunidade. O que é perceptível no mesmo no Anglo Catolicismo até o século XVIII ou ainda até meados de 1830, tendo sido memorável primeiramente a briga do arcebispo Laud contra as ambições da burguesia calvinista no século XVII e ainda a luta das paróquias e do espírito paroquial face a movimentação de pessoas exigida pelas fábricas até 1830. Isto quando a um modelo em parte contaminado pelo individualismo protestante. Que dizer então de um Portugal ou de uma Espanha nos século XVI, XV, XIV - Nada, nada de liberalismo econômico ou mesmo de isolamento social por parte dos Cristãos e sim de profunda conexão.

Foi dissimuladamente ou por meio da literatura protestante que o ideal sacrílego, anti tradicional e anti medieval do isolamento burguês ou das famílias burguesas em seus 'paraísos artificiais' desconectados da realidade social infiltrou-se na igreja romana - Partindo daí inclusive o modelo de guetos, digo, de bairros luxuosos onde passaram a viver os ricos, distante dos pobres, isoladamente, como que para não ve-los. O que entre nós culminou nas favelas onde os demais batizados morriam de fome sem que os bons Cristãos se preocupassem. Esse ideal egoísta e criminoso de isolamento foi assimilado. Não partiu nem podia ter partido da igreja romana. A partir do século XVIII e principalmente do século XIX (Com um modelo vitoriano posterior a 1830) que consolidou-se a ideia perversa de um Cristianismo de missa dominical i é limitado a algumas horas de reza ou de cerimonial separado da vida Cristã. 

Lamentavelmente os papistas (Como nossos Ortodoxos do tempo presente.) não tardaram a concluir - Com Lutero e Calvino, e os protestantes - que não precisavam ser Cristãos enquanto patrões, mas apenas dentro de seus lares ou apenas nos templos durante as missas... A abominável constatação é que não era necessário ser Cristão com o vizinho, com o funcionário público ou com o empregado. E criou-se uma moralzinha cristã apenas para a família ou os parentes. Quanto segundo a doutrina Cristã pelo batismo somos todos parentes ou irmãos, membros da mesma família e obrigados a fraternidade. Toda essa atmosfera cultural protestante, individualista e liberal destruiu o sentido tradicional da vida Cristã, por sinal, quanto a este quesito, muito próximo do judaísmo e do islamismo. 

Sob influxo da cultura protestante foram os Cristãos, antes de tudo os apostólicos romanos, alienando-se paulatinamente uns dos outros e afastando-se dos ideais vigentes na antiguidade ou na Idade média, estes autenticamente Cristãos e patenteados pela Tradição. Até ousarem os apóstatas, a partir de apelações pífias com base nos socialismos naturalistas ou no comunismo, conceberem um capitalismo 'católico' i é apostólico romano, chegando ao cúmulo da monstruosidade. Tanto pior a situação da Igreja romana por ter ela, em seus documentos oficiais, condenado o comunismo; e descuidar de condenar o 'éthos' capitalista, por já estar condenado pela tradição sob o termo avareza ou por tocar - A condenação, apenas a sua intencionalidade e não a sua estrutura. A partir disto, parte dos apostólicos romanos concluiu, que seu éthos ou intencionalidade é aceitáve; o que não está de acordo com o ensinamento dos padres da Igreja. Seja como for essa omissão ou falta de profundidade favoreceu a manipulação que agora testemunhamos - Quanto a alguns papistas como o sr Paulo Cogos quererem batizar ou Crismar uma doutrina herética e uma prática pecaminosa, já por ser a ideologia liberal economicista materialista e individualista. Ora é o materialismo uma erro filosófico ou metafísico equivalente a heresia e o individualismo ou egoísmo um vício pecaminoso.

Seja como for o citado Cogos chegou ao desplante de indigitar S João Crisóstomo - Do qual possuímos diversos Sermões contra os ricos ou avarentos! - como partidário de uma entidade cultural que originou-se a partir da heresia protestante, incorrendo por isso mesmo em anacronismo. E foi tão anacrônico quanto K. Marx ao transplantar o conceito de classes para a Antiguidade ou a I Média...

Remetemos ao sr Cogos a obra 'Porque a igreja condena os ricos' publicada pela Ed Paulinas nos anos oitenta ou a qualquer Patrologia como a Badenhawer, a Tixeront, a Cayré, a Altaner/Stuiber, a Drobner, etc se é que já folheou alguma dela. Afinal quem escreve estas linhas teve já a oportunidade de folhear a L. E. Du Pin, Lipomanno, Possevino, Tricalet, etc sem jamais deparar com misera linha em torno do liberalismo economico.

E quem diz que os antigos padres tinham conhecimento dessa ideologia bem poderia escrever, com a mesma seriedade, que entendiam os padres de programas de computador ou ainda que usassem aplicativos... 

Sr Cogos, nos bancos da academia aprendi que posso discordar de determinado autor ou mesmo antipatizar com ele porem jamais atribuir a si o que jamais ensinou, pois e deslealdade.

Melhor seria o sr assumir com os neo papistas ou com um neo ortodoxo impugnado por mim, que a tradicao da igreja ou melhor que a Divina Revelacao, e por ext., a autoridade de Jesus Cristo, do Evangelho, da Cristandade, nao toca a producao ou as relacoes economicas. Ficando tudo isto num setor afora ou aparte da Religiao, qual, portanto, regularia a si mesmo. Destarte sua face de positivista (E portanto de heretico.) viria a plena luz do dia. Na medida em que o sr estaria assumindo o principio anti Cristao e anti etico do MNI. 

Nao fundamentalista, sr Cogos, admito a vigencia do MNI quanto as ciencias de fato exatas ou nao humanas e mesmo assim no plano da Teoria. Pois as certas experiencias cientificas que tocam a vida humana ou animal embrenham-se pelo caminho da etica, assim pelo caminho da etica revelada. Deveria portanto o sr comecar demonstrando que a economia sob aspecto algum e uma ciencia humana, o que foi ensaiado ja, em que pese a miseria, por um colosso como Pareto. Por que o sr nao gasta seu precioso tempo desenvolvendo as teses de Pareto ao inves de perde-lo invadindo terreno que nao e seu, como o da Patristica e o da Patrologia. Por isso vou responder-lhe - Como se diz `Na lata` - Sapateiro, nao passe dos sapatos... Outra possibilidade fecunda para o sr e alegar que sua igreja ou qualquer outra igreja apostolica (Nao me venha com seitas protestantes e claro.) ou o Catolicismo Ortodoxo como um todo, jamais pretendeu exercer sua autoridade no campo da economia ou regular as atividades economicas executadas por seus filhos. Advirto-o no entanto que entrando o sr por essa outra via, como Historiador ecelesiastico que sou, vou remete-lo ao Bulario de Jaffe... Compreende???

Liberalismo economico. Que piada sr Cagos, perdao, digo Cogos... Das duas uma> Como pessimo aluno de Socrates ou do Estagirita o sr nao sabe conceituar o que seja liberalismo economico ou jamais leu palha dos Padres da Igreja ou das Enciclicas de seus lideres, os papas... o que seria leviandade de sua parte. Caso essa atividade humana que e a economia nao tocasse a etica e assim a divina revelacao `Rerum novarum` nao passaria de inutilidade... Da mesma forma Pio XI teria gasto toneladas de tinta e resmas de papel em vao. Percebe como o sr apresenta os membros mais ilustres de sua religiao como beocios, por discorrerem amplamente sobre algo que foge a compentencia deles??? 

Por que seus papas nao se contentaram em recomendar aos fieis a leitura de um Ricardo ou de um Bastiat... Por que nao rechearam suas Enclicas com luminosas citacoes de Molinari ou Mises??? Tens a resposta da Igreja nas entrelinhas sr Cagos, digo Cogos... Igreja apostolica alguma, Igreja tradicional alguma, Igreja historica algum pode deixar de revindicar autoridade no plano da Economia ou da etica, por avalia-la como uma atividade humana conectada as outras e nao sob o falso prisma positivista do isolamento. Pelos simples fato que a ciencia e o conhecimento de modo geral nao e produzido de forma compartimentada como imaginam os filhos de Litree.

Torno no entanto ao inicio de minha critica - Sua afirmacao e monstruosamente anacronica. Nem o sr poderia apontar-nos seriamente qualquer modelo social individualista anterior ao protestantismo no entorno do Mediterraneo ou na Asia. O desafio esta lancado e o sr deve ser um excelente historiador, do contrario consiga um bem bom para debater publicamente comigo, pois ja lhe digo que nao sou comunista ou anarquista (O que alias e publico e obvio - Pois sou bem reconhecido como culturalista!).

Desde ja no entanto ensaiarei uma aula gratis - Tendo se manifestado o Verbo Encarnado Jesus Cristo para criticar ou censurar os israelitas e suas crencas ou para demolir o judaismo antigo, ao menos quanto a um ponto esteve nosso Jesus de pleno acordo com eles, i e, com os antigos judeus e precisamente quanto a organizacao social deles que era gregaria, fraternalista ou solidaria. Conhecida e a preocupacao do hebreu para com outro hebreu, o sentido de conexao ou de identidade, enfim a dimensao social da vida... Notorio que esse ideario tenha sido assumido pelo Cristandade e transmitido de geracao em geracao a todas as epocas e idades futuras ate o advento do protestantismo no Norte da Europa, o qual rompe com a autentica tradicao Crista, inventa ou cria um novo modo de ser e produz um outro padrao cultural cada vez mais assumido pela igreja papa e enfim pela ortodoxia, o que alias podemos descrever com uma simples palavra> Apostasia. 

Sr Cagos ou melhor Cogos, a infiltracao do principio espurio do egoismo ou do individualismo na Cidade de Deus ou na Republica Crista a partir da reforma protestante corresponde a Historia de uma apostasia, nem mais nem menos. Pois toda distorcao do ideal Cristao, qualquer abreviacao em torno do sentido Cristao ou ainda qualquer tentiva reducionista em termos de consciencia Crista devera ser definido em termos de apostasia essencial, e o protestantismo e seu comeco ou ponto de partida.

Foi do protestantismo que partiram absolutismo, jansenismo, capitalismo, kantismo (Subjetivismo e relativismo), moralismo puritanismo, etc enfim todas essas poluicoes. Dai o ecumenismo pratico e perverso dos tridenticolas em termos de cultura - Hipocrita, fingido e ainda mais grave que o ecumenismo teorico da TL. Ecumenismo de esquerda e de direita, tudo farinha do mesmo saco e anti papista ou anti Catolico. Ortodoxo ou papista jamais assume idearios, principios, valores, elementos ou projetos protestantes, como bem sabia o Duque de Guise ou Garcia Moreno. O Cristao apostolico jamais apoia uma politica inspirada no americanismo ou um presidemente associado a um bando de pastores parasitas e venais. Aqui nao ha aproximacao, negociacao ou acordo possivel.

Concedo aos romanos e quica a alguns ortodoxos o privilegio da neutralidade, do afastamento, da alienacao. Enfim o direito de nao se intrometer ou de nao opinar. Como ex protestante jamais cessarei, por um instante, de denunciar como falsos os romanos ou os ortodoxos que assumem pautas ou elementos da cultura protestante, uma vez que nos Cristaos temos nossa propria orientacao, nossa pauta e nosso ideario. Ou ja viram os srs misturar a agua com o oleo???




domingo, 4 de julho de 2021

Cristãos incoerentes, afinidades eletivas e noética.

Vivemos em tempos difíceis de viver ou passamos por tempos difíceis. Nós quais a verdade objetiva, a experiência, a razão e a própria Revelação são eclipsadas por um turbilhão de ideologias e culturas de morte, a maior parte delas notável pelo conteúdo irracionalista ou melhor por aquele absurdo já apontado com seriedade por Camus. Vivemos na Era ou na Idade do absurdo e é isto deprimente. Importa ter esperança - Para Freud era veneno, para os pupilos do Evangelho é virtude.

Esperamos estar passando por tempos difíceis ou por tempos nublados, aguardando pelos raios do Sol... Cremos e esperamos que as nuvens, sombras e trevas sejam espancadas pelo Sol da razão e pela luz da experiência, enfim pelo brilho da verdade divina, para qual são os homens encaminhados pelo que chamamos Filosofia. Não qualquer Filosofia, mas a Filosofia perene de um Sócrates, de um Aristóteles e mesmo, com prevenções, de Platão.

Todavia, enquanto aguardamos este novo 'Renascimento' ou glorioso porvir, temos de ir tateando em meio a este cipoal e tentar cortar-lhes os galhos ou tentáculos.

Tudo está muito confuso e as coisas fora do lugar.

Como disse Brecht, e eu considero patético, são tempos de ensinar o óbvio.

Sim, tempos em que se deve insistir sobre as obviedades ou sobre o que é axiomático, ou seja, evidente por si mesmo. Em tempos de idiotice generalizada já o evidente por si mesmo não parece tão evidente, o que é desesperador.

Bem, quando escrevo Cristãos - Bom advertir o amigo leitor! - certamente jamais me refiro aos protestantes, por mais boa vontade que tenham eles, mas apenas e tão somente a meus confrades os Cristãos Católicos Ortodoxos, ou mesmo aos apostólicos romanos e episcopais (Pertencentes a igreja alta ou ao anglo Catolicismo.) cujas agremiações conservam certos elementos do Catolicismo ou da tradição apostólica. Por questões de ordem cultural apenas alguns deles me poderão compreender.

Os protestantes, digo alguns protestantes, podem ser honestos e acalentar os melhores e mais nobres sentimentos, o que não torna o protestantismo Cristão, na plena acepção da palavra. Devo insistir nisto. Claro que as seitas protestantes são formalmente Cristãs e assim classificadas por todos os manuais de História das religiões. O protestantismo é formalmente Cristão, ponto pacífico. Outra coisa é ser autenticamente Cristão pelo 'espírito' de Cristo... Mesmo a igreja romana, apesar de seus diversos erros e do veneno agostiniano o é, ou ao menos setores e partes suas. Há ainda algo de Cristão em alguns apostólicos romanos - Não nos integristas ou nos carismáticos, e quiçá nem mesmo nos tradicionalistas (Com seu moralismo puritano que os conecta com o que há de pior no Protestantismo i é ao Calvinismo!) mas supreendentemente nos apostólicos romanos moderados - Alguns deles remanescentes da Era Tridentina e outros adeptos da TL (A qual nem por isso deixa de ser um sistema teológico defeituoso!) - apesar da missa moderna, que é como sabemos de origem protestante. Está a Igreja romana, dos pés a cabeça, doente de protestantismo: Do tridentinos aos carismáticos ninguém é incólume naquela comunhão (Isto por dupla via: O agostinianismo e o puritanismo, duas vias de acesso do ecumenismo e da apostasia.), no entanto alguns ainda amam honestamente a Tradição. É a estas pessoas que nos dirigimos, aos que amam o sentido ou a consciência Histórica do Cristianismo, amor há muito perdido pelas seitas protestantes.

Não nos iludamos, já por via do biblismo, que é filho legítimo da invenção da imprensa, é o protestantismo um sistema totalmente novo, uma revisão do Cristianismo histórico ou antigo ou ainda uma adaptação as novas circunstâncias sociais, políticas e econômicas. Só por isso é ele questionável ou mesmo detestável, pois não pode a instituição divina curvar-se face aquilo que é humano ou ceder em qualquer coisa. A instituição do Cristianismo cabe - E com muito mais razão - a diretriz exarada por um dos líderes Jesuítas a respeito de sua Companhia: Ou continuaremos sendo o que somos ou cessaremos de ser. Melhor seria ao Cristianismo desaparecer por completo da face da terra sem deixar vestígios, do que abjurar de seus princípios e doutrinas fundamentais fazendo concessões ou negociatas. O Cristianismo não pode ou deve mudar, e no entanto o protestantismo foi e é mudança.

Mudança por seu individualismo inusitado, mudança por seu transcendentalismo avesso a imanência, por sua antropologia - Agostiniana - viciada, por sua epistemologia capenga, etc 

O protestantismo trouxe sérios problemas a Cristandade. Novidade alguma até aqui.

Aberrante que a igreja apostólica romana ou mesmo que o Catolicismo Ortodoxo tenham assumido o filho bastardo que não lhes pertence. Refiro-me ao fundamentalismo bíblico ou a judaização - Noutras palavras, a todo esse universo formado pelo criacionismo, pelo terraplanismo, pelo geocentrismo, enfim pelo negacionismo científico. 

Nada mais triste do que testemunhar um Rose ou um Corção envidando esforços contra a Evolução Biológica - Um tentando infirma-la a partir de citações do antigo testamento como qualquer protestante, e outro forjando ensaios escolásticos ou metafísicos com o objetivo de refuta-la > Jesus, quanta treva! - o que é somar esforços com os setores mais radicais e obscuros do protestantismo, e daí caminharam (Ortodoxos e romanistas), para o terraplanismo, o geocentrismo, a negação da Lei da gravidade, etc como não poderia deixar de ser, se bem conhecemos o caráter do antigo testamento! De fato este movimento não se deterá no criacionismo! 

Assumido pelos Cristãos apostólicos o postulado protestante e falso dogma de que o antigo testamento em sua totalidade é pura palavra de Deus, chegaremos aos confins do islã, nada restando em termos de Filosofia e Ciência neste mundo. Afinal as raízes da Filosofia e da Ciência encontram-se na Grécia pagã, não no judaísmo ou no antigo testamento, cujo caráter (A par do divino ou do profético voltado para o anúncio do Verbo Jesus!) é mitológico, fetichista, mágico e intragável.

Nada mais comum nestes tristes tempos do que abordar o negacionismo científico. Coloquemos o dedo no fundo da ferida e busquemos suas causas - Como ex protestante direi e alto e bom som: É o negacionismo científico (Com suas propagandas anti vacina, terraplanista, geocentrista, etc ) fruto do fundasmentalismo bíblico protestante - Exportado para as comunidades Ortodoxa e apostólica romana inclusive! - seja ele pentecostal ou calvinista. Tais suas autênticas fontes, em termos técnicos: A doutrina supersticiosa da inspiração plenária, linear e verbal. Para parte dos protestantes (Aqui no Brasil imensa maioria) é a bíblia, ou melhor, o antigo testamento, autoridade absoluta e infalível em termos de conhecimento da natureza criada, ficando a Ciência totalmente desacreditada, quando não atribuída ao Diabo, nos mesmos termos que a 'idolatria' romana.

O aspecto mais triste porém é que parte dos nossos Ortodoxos ou dos apostólicos romanos - Os quais deveriam terçar armas em torno do Novo Testamento ou pugnar pelo Evangelho, que é a pura palavra de Cristo e Lei dos Cristãos - assumem tais postulados e endossam a manobra. Nada mais triste do que ver um Cristão apostólico fazer causa comum com o sistema dentre todos mais avesso a sua fé, que é o protestantismo. Afinal para os pentecostais os apostólicos não passam de idólatras amaldiçoados por Deus enquanto que para os calvinistas não passam de predestinados a condenação eterna. Apesar disso uns e outros não cessam de beber em fontes protestantes, de assumir seus postulados e de estender-lhes as mãos fortalecendo seu poder.

E nossos ortodoxos e neo romanos sempre me fazem lembrar os ratinhos conduzidos pelo flautista de Hamelin...

Eles ignoram as ilações doutrinais ou as afinidades eletivas e por isso não cessa o Cristianismo de diluir-se no protestantismo e de servir a interesses protestantes. Sendo nossos Ortodoxos e Romanos fundamentalistas usados como marionetes ou espantalhos.

Mas e os Apóstolos (Paulo) e os Padres?

Os apóstolos e padres procederam com honestidade e pureza de consciência pelo simples fato de terem florescido antes do advento da ciência, a partir do século XVI. 

Outro o caso dos reformadores protestantes, os quais tendo já vivido nos albores da ciência, foram e são modelos de negacionismo científico. Afinal, tendo em vista a doutrina do Corão Cristão ou do biblismo, esbateram-se ferozmente contra a ciência emergente, Lutero, condenando decididamente o Diácono Romano Nicolau Copérnico e com ele o geocentrismo... Calvino opondo-se a Acquapendente (Assumido por Servet pouco antes de W. Harvey) e a circulação do sangue... Tudo porque o heliocentrismo e a doutrina da circulação do sangue 'Não se achavam na bíblia' ou melhor dizendo, no antigo testamento, sendo supinamente ignoradas pelos antigos israelitas. 

A bem da verdade essa Cruzada bíblica, calvinista, judaizante, sectária, etc jamais cessou. Pois no século XVII os amenos Luteranos da Suécia abriram processo contra Nils Celsius (1679) - Apud Bivort de la Saude, 1959 p 112 - por ter ousado professar o Heliocentrismo. Pela mesma época, aproximadamente, tendo o insigne Nicolaus Stenius verificado o quanto seus confrades luteranos eram apegados a letra do antigo testamento e ao criacionismo chão, passou a igreja romana - Onde obteve o título de Cardeal - e tornou-se um dos próceres da Paleontologia. Já no século seguinte foi Joseph Priestley que teve seu laboratório incendiado pelos bíblicos. Também Moleschoot teve de fugir da Holanda para poder cultivar seus estudos em Roma (...) Darwin enfim exitou bastante em publicar suas conclusões pelo simples fato de viver numa Inglaterra ainda parcialmente calvinista e sectária...

Apesar disso a ciência fez sua caminhada e seus progressos. Sem que pudesse o protestantismo trava-la. Pois o máximo que os fanáticos bíblicos puderam fazer quando o benemérito Jener inventou a vacina foi dizer que os vacinados criariam chifres e se transformariam em vacas. Como dizem hoje aos nossos índios que, caso sejam vacinados, virarão homossexuais ou terão marcas na cabeça (Uai serão os chifres do século XVIII???) - Tal o serviço que prestam os pastores a humanidade em nome de sua bíblia!

Mas tornando ao 'Outro o caso', a negação da ciência pelos reformadores ou por qualquer um de nós em tempos modernos ou pós científicos planteiam uns sérios problemas que jamais ocorreram a Paulo, aos demais apóstolos ou aos antigos padres, os quais honestamente criam nos mitos judaicos tomados a Suméria e ao Egito. 

Pois negar a ciência, e suas conclusões, frutos da experiência sensível, implica criar um problema epistemológico e um problema antropológico. Claro que tal raramente se colocará para um Valdomiro Santiago ou para qualquer ovelha semi analfabeta do Malafaia ou do Feliciano... permanecerão eles bem ajeitados no berço esplendido da ignorância, e nada de mais sucederá. Tal o nível deles...

Outro o caso dos apostólicos romanos ou Ortodoxos que abraçam tal modelo teológico, posto que mais livres e medianamente instruídos. 

Destarte pelo menos alguns deles plantearão a questão da 'veracidade' bíblica do AT, da inspiração plenária ou linear, da falsidade da ciência, deste falso conflito e da credibilidade do conhecimento humano assim da condição humana e aqui teremos o drama, digo o estrago, produzido pela mentalidade protestante, bíblica e fundamentalista.

Os Ortodoxos explorando certos aspectos teológicos muito discutíveis do hesicasmo e tributários do neoplatonismo, irão dar na tal da noética... Há muito assumida pelas seitas protestantes luteranas, pentecostais e mesmo calvinistas. Os romanos irão dar na mesma solução por via do Agostinianismo ortodoxo e mais além irão seguindo na direção de uma antropologia nefasta até o jansenismo, o luteranismo ou calvinismo. 

Ocidente e Oriente por via da noética, que é princípio subjetivo e indemonstrável que se ajusta a qualquer crença ou heresia, desarmarão a Mãe Igreja face as seitas e falsas religiões no exato momento em que carece fortalecer sua apologética com o objetivo de confrontar as ditas seitas, as culturas de morte e o islã - Vejam então como tudo isto é trágico e como os fundamentalistas de modo geral prestam péssimo serviço a Igreja. 

Após terem judaizado, assumido os mitos ineptos dos antigos israelitas e menosprezado os autênticos mistérios de nossa fé, e fragilizado as 'razões' da Igreja - Apresentadas pela Filosofia clássica - os fundamentalistas devem necessariamente flertar com o integralismo. Afinal desprovida de seus fundamentos ontológicos ou apologéticos - I é da demonstração racional e experimental da verdade!  não pode a mãe Igreja caminhar sobre seus pés, devendo ser, como uma palhoça capenga, sustentada pelo poder autocrático e arbitrário do Estado. 

Fundamentada na mística, na noética, na iluminação ou na relevação particular e subjetiva perde a fé seus mais sólidos fundamentos - Sejamos honestos: Qualquer apresentação da Ortodoxia neste sentido só deliciará os Ortodoxos, qualquer apresentação do papismo por esta via só deliciará os papistas, e assim por diante. É a tal noética de todo inapta para convencer os contrários, refutar seus erros e firmar um são proselitismo! E falhará ela cabalmente face as seitas protestantes, ao islã, ao ateísmo e as culturas de morte. Atrairá apenas os elementos semi analfabetos ou analfabetos pertencentes as massas, fortalecendo as seitas. Pessoas mediatamente instruídas, críticas ou geniais não conquistará e agregará a Igreja de Cristo. Do contrário, fosse boa a tal noética para nossas igrejas apostólicas, não teria ela sido assumida com unhas e dentes pelos heréticos... Por isso nada quero com ela... Porque desarma a Igreja e não se presta aos misteres que temos em vista!o, que como grego tem veleidades não apenas hesicastas mas noéticas, que me contento em assumir a fé Ortodoxa, mas não essa Teologia ou Theologumena, ficando com a velha Escolástica ou melhor com a propedêutica da Filosofia clássica assumida por Clemente, Irineu, Orígenes, Atanásio, Eusébio, Gregório de Nissa, Damasceno, etc Vereda sólida e segunda para a apresentação objetiva da fé e sua justificação. 

O que nos leva a afastar-se ao máximo da posição agostianiana com sua epistemologia já suspeita e sua antropologia maniqueísta que redundou necessariamente em calvinismo, como do calvinismo resultaram o fundamentalismo, o puritanismo, a teocracia e mesmo a afirmação do liberalismo econômico ou do capitalismo, pelo que não podem os Cristãos apostólicos assumir tais elementos culturais, os quais nem lhes pertencem ou são seus.

Tal a importância das relações entre os elementos culturais ou das afinidades eletivas, a qual nos permitem ir além da fé e da teologia, e examinar o panorama da cultura com toda sua abrangência. Ora quem diz panorama da cultura, diz projeto social, político e econômico em termos de civilização. E mais uma vez aqui, as Igrejas apostólicas e o protestantismo separam-se. Veja bem e anote isto: São dois projetos culturais não apenas distintos mas apostos; o que vale já para a Igreja romana e muito mais para o Catolicismo Ortodoxo.

Daí apontarmos a leviandade com que papistas e Ortodoxos, assumindo pautas protestantes, como o fundamentalismo, a depravação total, a noética, o integralismo, o puritanismo, o liberalismo econômico, etc protestantizam-se em certa medida. São Ortodoxos que chocam-se contra a cultura e o projeto social da Ortodoxia e romanos que ignoram ou confrontam o projeto sócio cultural de sua confissão, traindo uma mentalidade protestante. Ora um Ortodoxo ou um papista não pode ter uma mentalidade protestante, de modo que jamais será ou poderá ser capitalista ou individualista, fundamentalista (E assim criacionista, terraplanista, geocentrista ou negacionista em qualquer grau.), integralista, carismático, puritano, etc pois cada um desses elementos chocam-se com a norma e regra da tradição e com a mentalidade vigente no padrão apostólico.

É uma questão de coerência. 

Verdade é que a igreja romana tem abdicado cada vez mais - Século após século - de seu próprio projeto, tão caro a consciência medieval. É um fato demasiado triste, pois implicou ceder espaço a esse projeto sujo e porco que ai temos, o qual é de origem protestante e redundou em tais culturas de morte contra as quais nos esbatemos: Capitalismo, Comunismo, Anarquismo, Fascismo, Nazismo, etc Observe que o projeto protestante original, se é que existia (Em termos de teocracia bíblica), abortou miseravelmente. Desde então o Cristianismo foi perdendo cada vez mais o seu ascendente sobre as Sociedades ocidentais... Havendo um esvaziamento Ético em termos de princípios e valores. 

Sob pressão do Islã sucedeu o mesmo no Oriente quicá numa proporção ainda maior. E embora nossos Ortodoxos conheçam algo sobre o império Bizantino, o quanto sabem é sobre sua forma política em parte ultrapassada. Sobre sua estrutura e ações sociais quase nada sabem, sendo a ignorância quase total. Importa dizer que esse projeto jamais completado nada tem em comum com o projeto protestante ou calvinista até certo ponto materializado nos EUA. 

Repito, como houvesse um projeto protestante original: Bíblico, fundamentalista e teocrático; foi definitivamente repudiado pelo Ocidente, pois partindo de seus princípios deletérios o protestantismo produz tensões insuperáveis. Foi e é um projeto de que resultam extremos perigosos: A total descristianização da sociedade e o abandono do mundo a um lado e o ideal de república bíblica pautado no Israel do século VI a C. Até certo ponto parece que essa dicotomia horrenda renasce no Brasil de hoje. Pois se o protestantismo brasileiro teima obstinadamente em enjaular a mente humana ou de enfiar a sociedade na bíblia, o Cristianismo, a partir deste padrão tosco, passa a ser cada vez mais odiado pela outra parte da Sociedade.

Está situação exige por parte dos Ortodoxos, papistas e anglicanos um posicionamento - Especialmente face a infecção ecumênica - e tomada de consciência e eu aconselharia a cada um deles o caminho da coerência: Tornem a luz. Afastem-se de todos os princípios assumidos pelo sectarismo bíblico: Individualismo, biblismo, subjetivismo crasso, negacionismo científico, fetichismo, integralismo, liberalismo econômico, etc Rompam decididamente com esse padrão sócio cultural e retornem a suas raízes. Tornem a Ética da solidariedade, ao Evangelho, a Tradição comum, ao objetivismo, a Filosofia clássica, a ciência, a vida democrática, a justiça, a tolerância, ao amor, enfim a tudo quanto seja humano, nobre, justo e excelente. 

Não tentem usar remendo velho em roupa nova ou colocar vinho novo em odre velhos... Não dará certo. O Evangelho, a lei Cristã, a Cristandade antiga, tem uma visão total e projeto próprio. E não é o que temos... Não é comunismo e não é capitalismo, pronto. Não é objetivismo sem subjetividade e tampouco subjetivismo crasso. Não é cientificismo e tampouco negacionismo... É algo sóbrio, equilibrado, harmonioso e complexo, que foge aos extremismos e ao sectarismo bizarro. Tornemos e retornemos a este projeto humanista, pois dele depende a cura do homem e o Renascimento da civilização, ou sua preservação.

Não temos muito tempo, portanto apressem-nos.

Desculpem a prolixidade e a extensão deste artigo mas foi necessário, pois o repetir é que nos faz claros. Claridade é tudo ou ao menos muita coisa. 

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2020

O marxismo, a verdade e o relativismo. Ensaio epistemológico.

Habitualmente ouvimos ser o marxismo ou sua epistemologia, serem apresentados como relativistas e, os marxistas rebaterem, dizendo que não é bem assim. Daí a necessidade de pontuarmos o assunto e verificar que é o marxismo face a verdade ou qual seja sua perspectiva epistemológica.

Grosso modo podemos dizer que é o marxismo um relativismo, porém de modo algum um relativismo crasso ou individualista, análogo ao relativismo pós moderno, que é dentre todos o mais virulento.

No relativismo individualista nada há que transcenda as unidades individuais e isoladas, pelo que a fragmentação é total ou absoluta. Aqui a única referência que temos é o indivíduo separado de todos os outros - Tal é o critério de todas as coisas!

"O homem é a medida de todas as coisas." Que homem? A espécie enquanto receptáculo de uma capacidade racional ou o indivíduo pautado em sua vontade??? O relativismo pós moderno responde dizendo que cada homem constrói sua verdade, válida apenas para si e que não existe qualquer verdade comum, transcendente ou absoluta. O marxismo não chega a tais confins... quero dizer ao 'vir a ser'... a instabilidade plena... a fragmentação total... ao Caos, conservando alguma unidade, ainda que não seja transcendente.

Privado de fundamentos metafísicos, abstratos, espirituais; assim essenciais e perpétuos, a exemplo da 'Filosofia perene' ou das teorias das formas elaboradas por Platão ou Aristóteles, nem por isto o marxismo dissolve-se por completo num relativismo individualista, atomizando-se.

Assumindo-se como uma espécie de meio termo entre o 'vir a ser' e a 'essência' apresentando-se como um relativismo, mas, como relativismo social, fruto de uma conjuntura histórica muito mais estável do que as impressões individuais. O marxismo admite impressões estáveis e comuns, inda que mutáveis a longo prazo.

De fato julgam os marxistas - A partir de seu materialismo dialético - que a realidade cultural e assim a própria compreensão humana do que seja verdadeiro ou real (superestrutura) esteja assentada sobre uma infra estrutura definida em termos de relações econômicas de produção. Tais relações possuem formas estáveis e comuns em determinadas fases da História humana, as quais perduram por considerável espaço de tempo (Muito mais amplo do que o tempo fruído por algumas gerações humanas.) i é até que as relações de produção sofram alguma alteração significativa.

Delas resulta uma compreensão perdurável em termos de mundo a qual, mesmo sem tornar-se metafísica ou perene nem por isso chega a diluir-se por completo num aos de impressões, emoções, gostos ou opiniões. Destarte a noção de verdade proposta pelos marxistas, sem tornar-se imutável e perpétua como a Socrática, a Aristotélica ou a Católica, nem por isso deixa de possuir certa consistência e durabilidade. Estamos portanto diante duma perspectiva totalmente diversa e não do mesmo e exato relativismo.

sexta-feira, 7 de fevereiro de 2020

Positivismo e pós modernismo, uma conjuração contra o homem.

Aparentemente é o pós modernismo uma reação ou protesto face ao credo positivista. Uma erupção subjetivista ou psicologista face ao objetivismo chão arvorado pelo positivismo. A negação do sistema concebido por A Comte.

E no entanto há um traço comum entre eles: O repúdio a razão, a reflexão ou enfim ao que definem como racionalismo e comparam a religião, e a sua atividade metafísica. É o empirismo crasso anti metafísico. Assim o ceticismo, o relativismo e o subjetivismo crasso ou psicologismo.

O empirismo crasso por negar a idealidade.

O psicologismo contemporâneo por negar a objetividade seja da percepção ou do raciocínio.

O 'Loci commune' aqui é o repúdio a metafísica enquanto capacidade ou possibilidade.

Honesto, o cientificista ou empirista do século XIX, acompanhando Littré - Comte era demasiadamente influenciado pelo 'Catolicismo' - repudiou a Ética por confundi-la com a moralidade ou com a fé religiosa.

Desde então foi o homem convidado a contentar-se com o que é e a repudiar o que deve ser i é a idealidade, equiparada a imaginação ou a fantasia, e lançada a esfera das coisas individuais ou relativas.

Hoje no entanto adoramos falar em Ética, ainda que levianamente, devido ao preconceito anti metafísico canonizado por Kant e Litree. Mas é como discursar sobre uma casa sem paredes... A Ética além de ser ela mesma um esforço metafísico, carece em última análise de um reforço gnoseologico ou metafísico. Afinal de que serviria ao homem uma Ética que não fosse verdadeira ou que fosse relativa se estamos a falar na convivência?

Fique claro que por isso não produzimos ou temos uma Ética consistente, apenas um discurso vazio, logomaquia ou verborragia... A critica católica ou humanista já havia abalado o discurso anti Ético do positivismo no final do século passado. O delírio não durará mais do que vinte ou trinta anos. Mas foi o quanto bastou para que mil Trasímacos sem consciência pensassem conflitos mundiais. Os quais eclodiram vinte anos depois.

Por falta de espírito crítico, idealidade ou Ética o cientificismo positivista colaborou imensamente para que o novo espírito materialista, economicista ou capitalista invadisse e se assenhorasse das sociedades católicas. E seu conformismo ou solidariedade disfarçada foi ainda mais danoso do que a inação Cristã.

Após terem estourado duas grandes guerras, com o saldo de milhões e milhões de mortos, a solução positivista teve de ser revista. Afinal, caso a ciência produzisse Ética seus representantes não apelaram ao pragmatismo ou ao utilitarismo com o objetivo de advogar o uso de animais em experiências, o que nada significa além de colocar se acima do bem e do mal, e, com a mesma arrogância das seitas religiosas, o que vem a expor o caráter místico do cientificismo. Tal foi e é o caso das armas de destruição maciça ou da Bomba atômica...

Estreitamente empírica, por necessidade, a ciência não pode dar Ética que por definição critique a realidade dada e proponha um padrão ideal. Pelo critério do que é não se chega ao que deverá ser... Diante disto só restará ao cientificista ou positivista do pós guerra servir-se do pragmatismo ou do utilitarismo os dois únicos sistemas de Ética ensaiados pelo ateísmo e pelo materialismo.

O problema aqui é justamente que a partir do que é dado ou do que é não nos parece convincente ou terminante que este utilitarismo deva ser social, como queria J S Mill e não individualista. E empiricamente não percebo, nem creio ser demonstrável que Ayn Rand esteja equivocada... É até me parece que ela é seus pares tenham alguma razão quando alegam que Mill tomou remendos sociais ou gregários ao Cristianismo ou a cultura...

Os cientificistas e positivistas há tempos que prometem uma Ética própria e favorável ao homem, mas... Não tem podido cumprir a palavra. É por que? Simples, porque a Ética é um exercício essencialmente racional ou metafísico destinado a romper com a realidade dada, a nega-la, a ultrapassa-la, etc tendo em vista um padrão ideal. Além disto as pretensões da Ética são atemporais, universais e absolutas i é em torno de alguns princípios e valores comuns a todos os seres humanos ou unificadores. Não John Gray não está enganado ao por o pensamento seminal dos antigos gregos em tais termos. É nossa herança!

Não é menos verdade que foi já o positivismo demolido pelo pós modernismo e por ele substituído enquanto moda ou fetiche do momento. Sem que no entanto houvesse qualquer mudança significativa em termos de Ética. Já porque o pós modernismo costuma ser ainda mais feroz que seu predecessor em sua crítica à objetividade de qualquer valor ou princípio universal. O ideal aqui, quando existe, é sempre fragmentado ou individual e nada transcende a esfera do individual.

O primeiro retirou-nos a razão é o segundo a experiência ou percepção. Até que nada restasse ao homem ocidental em termos de 'comum' e ele se converte-se numa ilha ou universo incomunicável, onde a identidade e a comunhão tornaram-se impossíveis. Perdemos a verdade Ética e em seguida a Verdade ontológica. Que nós restou? NADA... apenas o vazio, sinônimo de miséria cultural e civilizacional. Andamos para trás e podemos afirmar, sem sombra de dúvida, que o pós modernismo não corrigiu mas ampliou e aprofundou o erro essencial do positivismo. De um extremo a outro da gnoseologia contemporânea nada lucramos.

segunda-feira, 23 de julho de 2018

Ravachol, Sante Casério... e a propaganda pelo fato.

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Qual o preço a ser pago por ser justo?

Não sei...

Vai de um 'deslike' no mundo contemporâneo ou a um xingamento a cicuta que o grande ateniense teve de tragar.

É que hoje já não nos podem fazer tragar cicuta ou ameaçar com a corda fazendo correr a Calcis ou ao país mais próximo.

De alguns dizem que foram queimados vivos, como Pitágoras ou Moídos vivos num pilão gigantesco como Zeno.

Quanto aquele que disse 'Ai de vós que juntais casa a casa e somais campo a campo' dizem ter sido serrado ao meio por ordem do ímpio Manassés.

Carneades teve a sorte de apenas ter sido expulso da cidade eterna por Catão. Epicteto teve a perna quebrada, antes de ser exilado por decreto imperial. Petrônio o 'árbitro da elegância' teve de suportar os 'grunhidos' de Nero e Sêneca de abrir as veias. Helvídio Prisco foi mandado matar por Vespasiano.

S João Crisóstomo teve de morrer no exílio, S Máximo teve a lingua e o braço cortados, S Atanásio, S Hilário e muitos outros amargaram o exílio em terra estrangeira.

Conecto foi lançado as chamas. Edeline e De Lure foram encarcerados. Vieira processado pela Inquisição.

St Just, Robespierre e o próprio Babeuf supliciados.

Uma multidão de Católicos sociais, os filhos mais esmerados da Igreja, insultados e descritos como comunistas pelos traidores. D Lefevre e o abbe Georger de Nantes perseguidos incansavelmente pelos pedreiros livres. Emmanuel Mounier e Jacques Maritain caluniados pela ralé.

Também Kropotkin e Tolstoi, Ghandi e Thoureau, Blum e Nearing, dentre muitos outros, tiveram de conhecer as privações do cárcere, assim Hérzen, assim Lavrov... Chaplin teve de abandonar o EUA, que dizem ser a terra da liberdade!!!

Vargas foi assassinado da mesma maneira como Gabriel Garcia Moreno.

E sucessivamente os justos tem sofrido nas mãos do paganismo, do judaísmo, do papismo, do protestantismo, do capitalismo, do absolutismo régio, do comunismo, do nazismo, do fascismo e de todas estas culturas de morte abomináveis. Socráticos, Católicos, Policratas, Anarco socialistas e outros tantos amigos do homem tem sido sucessivamente oprimidos e suprimidos por terem ousado alça a voz em defesa da verdade.

Aqueles que se postam intransigentemente, ao lado da justiça e sem consideração de ideologias tornam-se odiosos!

Aqueles que afrontam os preconceitos sancionados pelo senso comum tornam-se detestáveis.

Aqueles que levantam-se contra a mediocridade dominante atraem numerosos desafetos.

Diante disto que fazer?

Calar-se e compactuar face quanto esteja errado ou afrontar?

Seguidores daquele que morreu suspenso no alto do calvário temos por imperiosa e imperativa a segunda opção!

No entanto por uma questão de prudência e para não dar ocasião de escândalo aos mais débeis queremos deixar bem claro qual seja nosso pensamento sobre a 'propaganda pelo ato' ou pela 'propaganda pelo fato' levada a cabo pelos bakuninistas radicais no último quarto do século XIX.

Sabemos muito bem quem foi o patife Nechyaev e quais foram suas relações com Bakunin, intelectualmente falando o menos afortunado ou mesmo pigmeu dos anarquistas. Face a Proudhon e Kropotkin Bakunin é para lá de medíocre...

Para nós a 'propaganda pelo fato' corresponde a algo de monstruoso, abominável, grosseiro e inadmissível sob qualquer pretexto ou alegação. Coisa de gente bárbara, cruel, vil e desumana; quando sã.

Afinal nós não pertencemos ao grupo daqueles que colocam a verdade ou a ideologia, seja ela qual for, acima da vida humana. Nós situamos a vida humana acima da verdade. E por isso não acreditamos que matar seja uma forma ou uma maneira de lutar pela verdade. Admitimos que a violência e a morte sejam justificadas face a opressão, a dominação, a miséria, a injustiça... Acreditamos que os homens possam reagir face a situações sociais de injustiça. Acreditamos na violência defensiva ou na guerra justa, mas de modo algum que se deva matar pela verdade ou em nome da verdade. A verdade é algo que se decide por meio da persuasão ou seja através de evidência e argumentação e não através de bombas, fuzis ou baionetas.

A menos que alguém, capaz de defender-se, opte por morrer por seus ideais ou que se auto sacrifique, é a verdade manchada. Honorifica-a o verdadeiro martírio, dos fortes. Polui-a o assassinato, o derramamento de sangue, a carniçaria, a matança... Matar será sempre matar, jamais defender a verdade. Assassinar será sempre assassinar, jamais promover o conhecimento. Educar jamais será sinônimo de ensanguentar.

Por isso condenamos a propaganda pelo fato da mesma forma que condenamos o terrorismo promovido pelos adeptos do califado; e antes de condena-los despresa-mo-los como o substrato mais baixo da ralé. Como bárbaros, rudes, grosseiros e inimigos da civilização. Não compactuamos com nada disto, e quem ousar declarar-nos partidários de tais recursos seja tido em conta de vil caluniador e mentiroso.

No entanto uma coisa é condenarmos o método empregado por Ravachol e seus companheiros, assim Vaillant e Sante Casério e outra condenarmos a eles como se não passassem de vis criminosos, sádicos, cruéis, etc sem quaisquer conexão com a sociedade em que viviam. De fato adotaram meios inadequados, no entanto nem por isso deixam de ser produtos do tempo ou da sociedade em que viveram ou melhor homens que sentiram todo peso dessa sociedade e não foram capazes de suporta-lo.

Não adianta dizer que havia algo de errado com Emilé Henry ou com Meunier. É da-los como seres a parte da Sociedade, da Sociedade que eles arrenegavam. Então o que temos de analisar, caso queiramos ser justos é se, em que pesem os meios de ação inaceitáveis a que recorreram, tinham lá alguma razão no sentido de repudiar aquele tipo ou padrão de sociedade. Não se trata de absolver a eles, mas de condena-los e absolver aquela sociedade; isto é que nos parece problemático. Alias a ideia que se passa é que eram homens maus ou cruéis em luta contra uma sociedade paradisíaca ou no mínimo aceitável aos olhos da criatura racional.

E já começamos dizendo que aqueles homens, condenados por terem agido equivocadamente, eram filhos de uma Sociedade condenável, cujos métodos ou recursos condenáveis reproduziam. Apenas não eram hipócritas e dissimulados como aqueles que matavam em nome do poder, do dinheiro ou do que chamam de ordem e eram condecorados quando não homenageados com uma herma em alguma praça...

Ravachol e Vaillant, franceses, viveram nas décadas de 60, 70 e 80 do décimo nono século e eram ambos de famílias paupérrimas ou miseráveis. Na França, do século XIX, nem havia algo semelhante a 'poor law' inglesa, nem havia mais um S Vicente de Paulo. De fato a Revolução francesa foi mais imprevidente do que a Coroa Inglesa ao cabo do décimo sexto século. Pois se esta abandonou os pobre por meio século, a contar da extinção dos mosteiros em 1838 a aprovação da primeira 'poor law' em 1898, aquela deixou-os completamente abandonados até a criação das primeiras leis trabalhistas, criadas de 1892 a 1900 e consolidadas em 1938. Portanto o estado francês, marcadamente liberal,, após ter usurpado parte dos bens eclesiásticos - a exemplo da reforma protestante - e secularizado as abadias e mosteiros, abandonou os pobres por mais de século e eles ficaram completamente, totalmente desamparados... A igreja, a seu tempo, envenenada pelo incredulidade e assolada pelo terror, tornou-se absolutamente dócil, na França do décimo nono século. Apenas os Católicos sociais, como Ozanam, lutavam arduamente no sentido de mudar tal situação. Eram no entanto poucos... E as condições políticas inadequadas.

Desde a Revolução, em que pese o Catolicismo social, podemos falar de um significativo vácuo, quanto ao socorro aos pobres, a promoção humana e a proteção do trabalho. Não menos que na vizinha Inglaterra, vigorava um liberalismo sufocante. Mas os ingleses, ao menos durante algum tempo, contaram com a ação social metodista, responsável inclusive, segundo alguns teóricos, por ter espantado o espectro da Revolução... A França, cética e em parte secularizada não contava com algo semelhante. Sua situação era dramática, digo a situação dos pobres, dos trabalhadores, dos camponeses e das classes superiores, os quais levavam uma existência miserável.

Tanto Ravachol quanto Vaillant referem-se amiúde não apenas as situações de fome porque passaram, mas o que é ainda mais dramático, as situações de fome porque passaram seus pais ou irmãos mais jovens sem que tivessem uma mísera códea de pão duro com que forrar o estomago. Mas há quem ache tudo isto comum, aceitável ou até mesmo belo; enquanto a mesma época um único banquete oficial com que as autoridades constituídas recebiam uma autoridade estrangeira consumia uma soma capaz de manter dezenas de milhares de famílias pobres por anos a fio... Tais banquetes, aquele tempo constituíam a prioridade orçamentaria, juntamente com as armas e munições destinadas a reprimir e massacrar os possíveis insurretos, que não se conformassem com tão indigna situação. Eram umas reuniões idílicas e aprazíveis em que algumas centenas de fidalgos degustavam canapês de caviar, trufas, salmão, foie gras, faisão, vinho do porto, etc enquanto milhões passavam dias inteiros com as barrigas vazias, inclusive crianças! Um estado policial, cujo único fim era manter a força semelhante condição, a que chamavam ordem...

Ordem na França do século XIX significava que, segundo o nascimento, uns tinham de conformar-se com pão amanhecido - quando havia - enquanto outros podiam consumir toda sorte de iguarias finas e delicadas, cujo valor bastaria para matar a fome daqueles... E quando morriam eram os nababos sepultados com suas joias de ouro e pedrarias. Carcaças putrefatas eram enterradas com joias cujo valor seria capaz de matar a fome de um vilarejo inteiro por anos a fio. Um só daqueles anéis bastariam para levar pão as bicas de centenas de crianças famintas. Mas... preferiam encerra-lo com uma cadáver num caixão apenas para mostrar 'status'... Então avalie o que era semelhante sociedade! Banquete para uns e agonia para outros, segundo o nascimento, não segundo a inteligência ou o mérito, os quais pouco contavam, exceto quando ornavam uns bajuladores sem caráter.

Segundo Max Nordau - nas 'Mentiras convencionais' - (De man alude a isto) a grande diferença entre os banquetes oferecidos pela França republicana e os não menos faustosos banquetes oferecidos por um Calígula, um Nero ou um Domiciano - capazes de consumir as rendas anuais de uma única Província imperial! - era que estes não apareciam nas primeiras páginas de revistas ou jornais. De fato aquele tempo as comunicações eram bastante precárias, de modo que tais excessos apenas por ouvir dizer chegavam aos ouvidos das massas, jamais aos olhos e com viva cor. A partir de um determinado momento a imprensa pos-se a ostentar ou a por debaixo dos olhos desta plebe ignara o faustoso banquete degustado por nossas elites, tornando-os assaz conhecidos do grande público. E semelhante ostentação da fortuna ao lado da miśeria ou da fome tinha mesmo de despertar a indignação e a repulsa de muitos.

Não era apenas questão de gula ou fome, de excesso ou privação, de riqueza ou miséria, mas acima de tudo de ostentação. A sem cerimônia com que esses ricos esbanjavam o que facilmente ganhavam foi logo interpretada como um tapa na cara. Nós não apenas exploramos o pobre e o fazemos passar fome, não é suficiente - Humilha-mo-lo e tiramos sarro dele. Foi esse tipo de humor negro, já presente na fábula dos 'brioches' de M Antonieta, que exasperou os mais inteligentes e sensíveis dentre os pobres tornando sua miséria ainda mais dolorosa ou internalizando-a.

Além do mais, as pesquisas nos fazem saber que a fome enlouquece. Eu mesmo testemunhei como um de nossos assistidos - pessoa demasiado tímida para revindicar qualquer coisa - quase surtou durante o período em que ficamos doentes e não pudemos socorre-lo. Veja o senhor o que é a fome! Imagine então ter de dormir sabendo que sua mãe passa fome por ter dividido a única fatia de pão com os pequenos, que os pequemos talvez não tenham leite no dia seguinte ou que a sua irmã menos tenha de vender o que chamavam 'pureza' em troca de alguns pobres para ajudar nas despesas da casa... Tais as situações porque passaram Vaillant, Ravachol, bem como o italiano Casério.

Dickens nada inventou do quanto escreveu. Descreveu com fidelidade a crônica de seu tempo, a 'idade de ouro' do liberalismo econômico...

Mas perguntará nossa 'cinderela' ou nossa 'branca de neve': Por que tais homens não trabalhavam ou deixavam-se imolar, como outros tantos, pelo deus mercado??? Havia aquele tempo, mais do que hoje, um colossal exército de reserva composto por desempregados. De modo que conseguir emprego não era tão simples ou fácil quanto se pensa. Tanto pior nas Vilas espalhadas pelos campos em que o trabalho era sazonal. Havia com que viver durante o tempo da semeadura e da colheita, no entanto, durante o resto do ano... Sim, sempre se podia executar alguma coisa ou algum servicinho mas a remuneração era irrisória, ínfima... e o preço dos gêneros, elevadíssimo.

Parece inacreditável ao homem de hoje mas cenas como as que atualmente só se sucedem nos confins da Etiópia ou que ocorreram na Ucrânia do Holodomor, repetiam-se anualmente nos cantões da França caso a colheita sofresse alguma alteração imprevista e o valor dos alimentos subisse. Dezenas de pessoas morriam de inanição... Sem que o Estado fizesse qualquer coisa. O governo policial nada fazia além de recorrer as baionetas e reprimir os insurretos. Por que vocês acham que o anarquismo mais virulento fez sua primeira aparição na França, identificando o estado como o mal absoluto ou metafísico??? Por que durante quase um século, o estado francês inspirado por uma ideologia econômica liberal, omitiu-se por completo face ao problema da inanição, disto resultando a morte de muitos... Para não mencionarmos a fome, a miséria, o trabalho; que eram outros tantos problemas.

De fato viver naquela França 'doce' apenas para uns poucos privilegiados era literalmente enlouquecedor. De modo que Ravachol, Vaillant e outros tantos acabaram surtando e colocando em prática a solução inconsequente formulada por Nechyaev. Exasperados puzeram-se a estourar bombas aqui e ali julgando que exerciam vingança contra aquele estado imoral, insensível e cruel. E se bem que, via de regra, explodissem apenas espaços frequentados pela alta burguesia debochada, sabiam que corriam os risco de ferir ou matar os inocentes que por necessidade ali trabalhavam. Tampouco pararam para considerar a condição peculiar das crianças, dos alienados mentais ou dos idosos, para eles todos os que pertenciam ao 'meio burguês' eram igualmente culpados e como disse Emilé Henry não havia inocentes no seio da burguesia. O marxismo, visando ser mais humano, deu a entender que também o burguês ou ao menos alguns deles, podiam ser vítimas da alienação... Estes jovens aterrorizados no entanto, compreenderam que todos os burgueses eram insensíveis, sádicos, cruéis e culpados face ao calvário percorrido pela gente simples.

Seja como for fica difícil entender de que modo explodir um bebê burguês torna-se revolucionário. Me parece mais um ato irrefletido, face da revolta e da insanidade produzidas pela fome. Trata-se antes de tudo de um ato de sadismo, mas de um sadismo produzido no seio de uma sociedade sádica, por uma sociedade em que todos, inclusive os que protestam contra ela, acham-se anestesiados. Tal o sadismo dos que sepultam seus queridos com tesouros, bem como daqueles que devoram diariamente salmão, pernil, caviar... sabendo que seus irmãos não tem o que comer! De fato o sadismo assume diversas formas... Como cobrir-se com um vestido de seda, tafetá, chamalote, rendas, laços, fitas e pedrarias... com que se poderia saciar a fome de milhares de bocas. Não, não se trata numa insensibilidade ou duma frieza presentes apenas nos anarquistas ou terroristas, mas de uma insensibilidade difusa, socialmente partilhada e que num determinado momento voltou-se contra a própria sociedade.

Antes de julgar tais homens ou tais criminosos - que tenho em conta de mentalmente instáveis ou afetados e aos quais certamente absolveria - acho que devemos procurar conhecer melhor a Sociedade em que viveram e julga-la. Nem preciso dizer que tais homens eram vítimas da Sociedade. Que uma sociedade individualista e egoísta faça vítimas é uma obviedade...  Contento-me por dizer que faziam parte daquela sociedade e que eram expressão dela, não algo a parte... Eu tive honestidade suficiente para ler os depoimentos deixados por estes homens e sacar algumas conclusões. Diferentemente de Paul Adam não direi que tais homens fossem mártires ou santos - embora Ravachol tenha jurado jamais tornar a roubar galinhas de uns pobre camponeses magricelas para dar de comer a irmã menor - mas tampouco direi que eram uns alienígenas ou mesmo uns celerados sem coração. Tudo quando direi é que eram homens de seu tempo e de seu lugar, e que aquele tempo e aquele lugar certamente não eram muito bons.

Pronto falei ou melhor escrevi e aguardo já pelas pedradas, afinal o -

"Diga a verdade e saia correndo." ainda parece ser a regra vigente...

Enfim estamos diante de homens descristianizados, membro de uma sociedade descristianizada ou o que é ainda mais chocante, de uma Cristandade aparente. Pois como pode o Cristão, o Cristão Católico, permanecer acomodado e indiferente face ao irmão que passa por privação e fome??? Como pode o Católico encarar a fome, num ambiente em que a produção de alimentos é suficiente para saciar a todos, como algo aceitável ou comum??? Admitido isto, só posso dizer que há algo de muito estranho ou de muito errado com este Catolicismo e que não se parece nem um pouco com o Catolicismo dos Apóstolos, de Justino, Clemente, Ambrósio, Astério, Basílio, Crisóstomo, etc 

terça-feira, 17 de julho de 2018

A dupla tradição do comunismo - Sua gênese e desenvolvimento

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Conforme dissemos num artigo anterior, o Comunismo se nos apresenta, face ao anarquismo - particularmente face ao anarquismo proudhoniano, mas também face ao bakuninismo (Kropotkin foi quem pela primeira vez tento sistematiza-lo racionalmente polindo as 'arestas') - como um sistema bem mais simples, orgânico e coeso. Conhecendo certa coerência mesmo quando pelo cisma divide-se em correntes rivais. Cada uma delas parte de um princípio oposto presente na gênese da ideologia e desenvolvido até o fim. No anarquismo percebemos inúmeras ideias opostas e contraditórias sobrepostas como que flutuando. Além de esta cindido em duas tradições básicas: Ocidental e Oriental ou russa, o anarquismo encontra-se cindido em torno de inúmeras questões, inclusive práticas e suas correntes assemelham-se as seitas protestantes.

O marxismo, grosso modo, conhecerá apenas duas variedades: A um lado a Social democracia, seja a crítica ou prudente, de Engels, Bebel e Rosa; a moderada de Kautsky, Adler, Bauer, Gramsci, etc ou a radical de Bernstein e por ext dos fabianistas ingleses... O nível a que tais críticos aderem ao insercionismo pode variar quanto o grau, mas não quando a essência do conceito. A outro teremos apenas o jacobinismo radical, demolidor e iconoclástico de Lênin, Trotsky e turma. Os mencheviques de Martov e Axelrod inclusive, tendiam a solução social democrata...

Ainda hoje o marxismo achasse cindido entre comunistas ou leninista a um lado e sociais democratas, 'revisionistas', gradualistas, 'heterodoxos' ou reformistas a outro. E aqueles que arrogantemente revindicam para si o título de 'Ortodoxos' ou fiéis, apegando-se a um aspecto do pensamento de Marx como pronto, acabado e imutável - quando jamais deixou de ser repensado ou revisto pelo próprio Marx - não tem deixado de fazer suas mãos pesarem sobre aqueles que encaram como heréticos, mesmo quando hipocritamente criticam a Igreja Católica.

Importa saber que esta situação característica do marxismo é insuperável ou insolúvel.

Mas por que?

Porque uma e outra corrente partem de dois princípios antitéticos presentes na gênese do pensamento marxista. Quiçá o jovem Marx até tenha pensado em concilia-los, mas só podia falhar, como de fato falhou.

Agora que elementos ou princípios contraditórios Marx buscou unir e qual a gênese de cada um deles?

A um lado temos um ideal de Revolução jacobinista expresso pelo conceito de conjuração levado a cabo por uma elite minoritária. Este ideal foi tomado por Blanqui ao babovismo e transmitido ao jovem Marx, que incorporou-o ao primitivo conceito de Revolução, anterior a 1848. É a ele que se refere Engels no prefácio de 1895 e Bernstein em seu estudo a respeito das fontes ideológicas do marxismo.

Este ideal de Revolução implica admitir que um grupo de heróis ou de homens superiores; um 'quadro' enfim, pode mudar por si só o curso da História, o que nos faz lembrar a noção de herói em Carlyle ou mesmo em Sorel. Implica saber que nem Carlyle, nem Sorel e finalmente nem mesmo Babeuf eram ateus ou mesmo materialistas. Daí terem enfatizado ou salientado o potencial da ação humana, mesmo na esfera individual. Eles certamente acreditavam que a História podia ser adiantada e ignoravam a noção de processo histórico e condicionamento material. Blanqui, que a ser ateu e materialista assimilou o pensamento insurrecionista de Babeuf, era, tal e qual Bakunin, um homem simples ou intelectualmente vulgar. Não podia perceber a contradição entre o método recomendado por Babeuf e as decorrências de seu próprio modelo de pensamento; tampouco o jovem Marx foi capaz de percebe-lo porquanto guiado pelo entusiasmo.

Marx no entanto fora bem mais atilado que Blanqui, no sentido de deixar-se conquistar por um materialismo consciente, que chegou a ser chamado materialismo dialético, por conformar-se com a dinâmica estrutural do pensamento hegeliano. Esse materialismo levou-o a formular o conceito de infraestrutura e de superestrutura e a consagrar o pensamento economicista.

Curiosamente os etapistas, gradualistas e sociais democratas todos apegaram-se a este conceito de materialismo economicista, ulteriormente desenvolvido pelo próprio Marx. Segundo este modelo de pensamento ou esquema o capitalismo carregaria em si o germe das contradições que plenamente desenvolvidas - em sua maturidade - levariam-no inevitavelmente ao colapso. O pensamento clássico de K Marx só poderia ser, como foi, radicalmente determinista. O Capitalismo transporta em seu seio germes de morte... Quando chegar a seu ápice declinará e entrará numa crise da qual jamais poderá sair. O partido deve treinar o proletariado para que seja capaz de detectar o momento em que este processo atingir seu 'clímax' - Só então o proletariado poderá exercer ou cumprir seu papel que é aproveitar-se da oportunidade oferecida pelo processo histórico e assumir a liderança do corpo social. Implica isto caminhar com a História e esperar pela oportunidade dada, que depende do curso do capitalismo... Este desenvolvimento do capitalismo só pode ser apressado pela dinâmica interno do próprio capitalismo, no sentido de atingir sua maturidade e tornar-se vulnerável. TODA E QUALQUER AÇÃO HUMANA QUE PRECEDA ESTA EVOLUÇÃO ECONÔMICA OU MATERIAL É INCONCEBÍVEL OU ABSURDA.

Neste caso como se dará a Revolução babovista ou blanquista?

O velho Marx julgou sabe-lo e poder dize-lo.

Acreditava que no correr da carruagem a proletarização do trabalho eliminaria já os elementos da antiga ordem, já o mundo rural, já as classes médias ou intermediárias. Ao fim do processo todo este universo intermediário cessaria de existir, sendo absorvido, é claro pelo mundo do trabalho. Ao fim do processo, uma capitalismo maduro poderia ser socialmente descrito como uma multidão colossal de proletários face a um diminuto grupo de burgueses monopolistas, estes, naturalmente, a testa da sociedade. Claro que sempre poderia restar um grupo mais ou menos largo que sempre poderia vender-se a burguesia e combater por ela - tal o lupem proletariado. Seja como for Marx chegou a acreditar que apesar dessa possível traição por parte da massa amorfa, alienada e manipulada, o poder cairia como uma maçã madura nas mãos dos trabalhadores. Ele jamais pensou nos termos apocalípticos, catastróficos ou sangrentos da velha Revolução francesa e chegou a crer numa transição/revolução que a não ser pacífica tampouco corresponderia ao 'terror' robespierriano... Tão execrado pela nova elite dominante francesa ou mesmo pela elite dominante inglesa.

Claro que esta visão, por diversos títulos, não se encaixa com a visão anteriormente descrita, em termos de blaquismo/babovismo, legado pela Revolução francesa. Aqui, a ação humana ou individual embrenha-se pelos caminhos do idealismo, podendo por si só mudar os caminhos da História sem contar com agentes condicionantes ou limitantes, ou mesmo exigir uma visão acurada dos tempos, na qual uma elite intelectual busca por sinais. Grosso modo a sanha dos guerreiros e revolucionários não conhece tais elementos condicionantes - como o processo histórico ou a dinâmica interna do capitalismo - presentes no pensamento de Marx e é exatamente esta ignorância a respeito das limitações externas ou dos límites que a torna combativa e invencível no dizer de Sorel.

Assim a corrente marxista mais sofisticada ou determinista, torna-se hermética ou astrológica no dizer de Sorel, na medida em que depende de cálculos externos sobre a realidade feito por um corpo de especialistas. Especialistas que por exigências de caráter racional seriam levados do jacobinismo a social democracia. Por chegarem a crer que ao contrário da conjuração babovista/blanquista esta revolução deveria ser previamente calculada ou preparada nos mínimos detalhes, o que certamente demandaria algum tempo. Por outro lado tempo é que não lhes faltaria, sendo oferecido pela evolução interna do capitalismo, a qual deveriam acompanhar. No entanto o resultado daquela evolução era absolutamente previsível: O colapso do sistema e a oportunidade revolucionária. No campo externo a sociedade capitalista nada poderia ser feito no sentido de 'abreviar os tempos', destarte urgia esperar e enquanto se esperava a política institucional ou melhor a social democracia bem podia fazer as vezes de tática, tendo em vista a futura revolução. Temos aqui um pensamento muito próximo ao de Engels e a respeito do qual nos referimos já em diversas ocasiões. Ainda conta com a Revolução e é crítico, mas por exigência do materialismo - que já se transforma em realismo - faz a revolução recuar ou posterga-a...

Antecipar a Revolução, dirá Engels, é como por o carro a frente dos bois, fazer o jogo da burguesia, ser esmagado e expor-se a ver  a causa do socialismo aniquilada. A revolução ou a ação humana, só poderá ser bem sucedida em seu tempo, quando as condições materiais, oferecidas pelo sistema, mostrarem-se propícias. É a maturação do capitalismo quem nos oferecerá a grande chance - Marx o disse!!!

Diante disto Bebel, Adler e outros, com as bençãos de Engels e antes, com as do velho Marx, podem lançar-se sem temor ao seio da disputa eleitoral e levar os ideais comunistas ao parlamento, beneficiando-se da máquina chamada propaganda. Afinal elemento algum, fosse de ordem política ou não, seria capaz de atalhar a dinâmica do capitalismo e, consequentemente de impedir o estouro da Revolução. A revolução estava determinada pelo processo histórico - em termos de produção econômica - e nada seria capaz de alterar esta realidade. De modo que a ação parlamentar era muito bem vinda.

Perceba amigo leitor que o rígido materialismo mecanicista de Marx conduziu seus seguidores a via eleitoral ou a inserção.

Por outro lado, quando Bernstein, no final do século XIX, avançou até praticamente negar o colapso deduzido ao materialismo crasso e a necessidade de uma revolução, afirmando a ação parlamentar como algo definitivo e quando até mesmo os centristas chegaram a identificar a 'tomada' do parlamento pelos socialistas com a ditadura do proletariado, a ala jacobina - que sempre se mantivera calada por respeito a Marx e a Engels - não pode deixar de retomar o ideal revolucionário, inda que não pudesse repudiar ao materialismo gradualista ou denunciar Engels como revisionista. Diante disto levantaram as mãos contra Kautsky, o testamenteiro de Engels, e contra diversos outros pioneiros, fazendo alarde em torno das mutilações de Liebknecht, agora apresentadas como falsificações e ignorando ou fingindo ignorar a existência de muitas outras fontes e documentos quais sejam as cartas de Engels e de Eleanor Marx. De modo geral o conjunto de tais documentos revelam-nos um Engels que apesar de seus precauções e criticidade abraçou não apenas a via parlamentar mas a violência defensiva, repudiando o golpismo peculiar as correntes blanquista e bakuninista. Claro que os comunistas jacobinos não podiam admitir nada disto, pelo simples fato de não acreditar na via institucional ou parlamentar. Assim, desviando os olhos de Engels e de seus últimos escritos, eles passaram a classificar todos os sociais democratas como renegados e a arvorar o revolucionismo como única solução não apenas viável mas possível. Ao menos da Rússia a coisa tomou este caminho, tomando o jacobinismo o nome de leninismo e hipostasiando-se ao comunismo soviético ou marxismo ortodoxo.

Claro que e Lênin sempre pôde apelas ao jovem Marx blanquista/babovista com o objetivo de santificar seus ideais. O que ele não poderia ter feito é ignorar o conjunto do pensamento marxista e seu desenvolvimento ulterior. O que sobretudo não poderia ter feito é ignorar os ulteriores pronunciamentos de Engels, atribuindo a Kaustky uma ruptura que jamais havia acontecido. Ao apresentar os sociais democratas como inovadores e apóstatas Lênin mostrou-se absolutamente desonesto. O único renegado ou traidor aqui foi Lênin, embora a bem da verdade, devamos admitir que ele apegou-se a um princípio individualista, idealista e rival, que num determinado momento Marx e Engels tiveram de sacrificar ou ignorar - A possibilidade de indivíduos ou grupos, por meio de golpes ou conjurações, antecipassem as condições dadas pela História - Fazendo com que esta avançasse. Para tanto teve Lênin de fazer certos empréstimos ao teórico anarquista G Sorel - outro implacável adversário do determinismo economicista - pensador que mais tarde veio a descrever, hipocritamente, como embaralhado ou confuso.

Paradoxalmente Engels não desejou destruir por completo a esperança na futura Revolução, mas apenas posterga-la. Grosso modo podemos dizer que ele assumiu uma posição social democrática 'crítica', ficando como que no meio do caminho, entre Lênin e Bernstein. Por isso Bernstein como Kautsky, pode revindicar para si o título de sucessor, caso admitamos que Marx e Engels possam ser superados ou revistos; como se supõem de seres humanos e falíveis, inda que geniais e bem intencionados. Na medida em que o pensamento de Marx conheceu uma evolução e do Engels mais ainda, por que supor que este padrão de pensamento não pudesse continuar a evoluir após a morte deles convertendo-se numa Bíblia ou num Corão?

Importa saber que para mater viva a esperança de uma revolução final, Engels teve de reler, reinterpretar ou revisar o materialismo mecanicista e economicista de Marx, renunciando ao que chamamos determinismo, e postulando o que chamamos de condicionamento ou possibilismo. Vale a pena reproduzir suas belas palavras:

"Devemos provar a nossos adversários o princípio essencial - o lado econômico - que eles repudiavam; e então nem sempre tinhamos tempo, facilidade ou ocasião PARA POR EM RELEVO OS OUTROS FATORES QUE EXERCEM AÇÃO RECIPROCA... A evolução política, jurídica, filosófica, religiosa, literária, artística... dependem certamente da evolução econômica. NO ENTANTO TODAS SE INFLUEM MUTUAMENTE E ATUAM, A SEU TEMPO, SOBRE A BASE ECONÔMICA." Carta de 1890 publicada no Sozialisticher akademiker em Outubro de 1895Admitido o simples condicionamento material, Engels, tornava mais aceitável e reforçava ainda mais a doutrina revolucionária da interação, partir da qual os futuros comunistas puderam deduzir que caso a oportunidade oferecida pelo processo histórico não fosse 'trabalhada' ou aproveitada pelo elemento humano, a chance de implementar com sucesso a Revolução ficaria abortada - Daí a insistência cada vez maior no sentido do partido ou da propaganda preparar uma elite de homens no sentido de aproveitarem a oportnunidade histórica.


Daí Rosa Luxemburgo, cogitar que a oportunidade revolucionária não aproveitada poderia descambar em algo totalmente distinto do capitalismo ou do comunismo, o que ela define como barbarismo. Prenúncio do Nazismo??? Quem sabe... Foi o quanto bastou para Lênin e seus sequazes assinalarem-na como heterodoxa, tal e qual Kautsky, Bernstein, Plekhanov, Axelrod, Martov, Gramsci, etc, etc, etc Curiosamente, o citado G Sorel, que nutria séria dúvidas quando ao materialismo mecanicista, também nutria certo temor face a um futuro sombrio e barbaresco...


Importa saber, e esta é nossa conclusão, que o marxismo nascente comportava dois princípios antitéticos, contraditórios ou opostos - Um consciente e outro não. E que no decorrer do tempo Marx e Engels foram apegando-se cada vez mais ao princípio consciente, que conduziria fatalmente a social democracia, até que este foi ligeiramente corrigido por Engels, tendo em vista a elaboração de uma ideologia mais equilibrada, do que resultou uma espécie de social democracia crítica, em que o ideal da Revolução foi protelado para um futuro incerto, como após a revolução russa o fim da ditadura do proletariado seria sucessivamente protelado para um futuro incerto, até atingir setenta anos, e por a luz do dia a farsa ou o equívoco da transição. Claro que, em tais condições, exceto em caso de golpe de estado (Situação em que seria exercida a violência defensiva - Otto Bauer, 1926) os socialistas poderiam conformar-se indefinidamente com a política parlamentar.


Lênin teve de reassumir o ideal do jacobinismo - sem todavia identifica-lo com o idealismo - e de negar toda evolução ulterior, rompendo com ela, e negando, ao menos o pensamento mais elaborado e desenvolvido de Engels. Claro que tudo isto supõem uma traição, inda de inconsciente. Os princípios opostos no entanto, já ali estavam, envenenando o pensamento de Marx. Tudo quando podemos dizer aqui é que Marx era jovem e que o pensamento de cada personagem intelectual deve ser analisado numa perspectiva cronológica e evolutiva.





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segunda-feira, 16 de julho de 2018

Comunistas, anarquistas e humanistas e a Revolução ou Revolução, Ética e Liberdade.

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Um dos problemas postos por Jonh Gray em torno da Ética, que não crê ser universal, mas relativa é a suposta incompatibilidade existente entre as exigências da paz e as exigência da justiça. A argumentação do autor, aparentemente ao menos, justifica-se tendo em vista duas opções extremistas e excludentes - A do pacifismo crasso, assumida por certo número de Cristãos de boa vontade, e a do revolucionarismo atrabiliário, professado por diversas correntes sociais de vanguarda.

Assim se os primeiros sempre sacrificam as exigências da justiça em troca duma paz não gloriosa e tampouco digna os demais fazem muito pouco caso da paz e da vida. O que segundo Gray, aponta-nos soluções éticas antitéticas, excludentes e inconciliáveis... A situação - ao menos para ele - é esta, e não há solução.

Diante disto a questão proposta por nós assume a seguinte forma - Será possível, do ponto de vista ético, conciliar os interesses da paz com os interesses da justiça? Até quando será possível manter a paz? Quando será necessário sacrificar a paz em nome da justiça ou melhor quando uma virtude deverá ceder espaço a outra? Como pugnar por uma luta ou por uma revolução ética? Será isto possível? Adotada a solução policrática, como conciliar a estrutura de uma organização revolucionária com as exigências da liberdade humana?

Num primeiro momento devemos ter consciência, e mesmo o homem pacífico e bem aventurado, de que a paz é um bem desejável, mas relativo. Na hierarquia de valores há valores superiores a ela e um deles é a justiça. E não é possível aconselhar a alguém que suporte a injustiça em nome da paz. A paz só assume a conotação de um valor absoluto quando identificada com a 'não agressão'. Da mesma forma o pacifismo consistente deve significar sempre 'não agressão', é filho da paz aquele que podendo atacar opta livremente por não faze-lo, como é filho da paz aquele que se defende ou que recorre a violência defensiva. É tão inimigo da paz aquele que ataca quanto aquele que comete qualquer injustiça.

Por isso Ihering define a injustiça como uma profanação da dignidade humana. Todo injustiçado é de alguma forma profanado...

Diante disto como exigir deste homem violado no mais íntimo de seu ser que se conforme???

Apesar disto milhões de Cristãos, mal orientados, declaram que a injustiça é coisa que se deva suportar. Uma vez que o Mestre de todos disse: "Aquele que te bate numa face dá a outra face."

Querendo dizer que jamais é lícito defender-se ou exercer a violência defensiva; e que nos devemos deixar esmurrar em quaisquer circunstância.

Antes de tudo devemos compreender que aquele que é agredido ou esbofeteado repentinamente perde o controle e que ao perder o controle foge-lhe a razão. Ele voa sobre o outro, o outro voa sobre ele, começa ai uma briga e não poucas vezes destas brigas resulta uma morte ou dano mais grave. Já aquele que ao ser subitamente agredido ou atacado logra controlar-se adquire um bem relativamente valioso - O auto controle ou controle de si mesmo, o qual lhe permitirá avaliar a situação com serenidade, e tomar a melhor decisão possível.

É significativo que esse texto seja precedido pela fórmula de talião - Olho por olho, dente por dente. O que nos levaria a concluir que o vício condenado por Jesus é a vingança e não a defesa. Ademais está Jesus referindo-se a conflitos pessoais que sucediam amiúde nos ermos da Judeia, degenerando em brigas... com as consequências que acabamos de descrever acima. Neste caso por que colocar a própria vida ou a vida de outro em risco devido a posse de uma túnica? Se a vida de qualquer homem vale mais do que uma túnica???

Diversa é a situação em que o agredido que logrou controlar-se, deduziu ter sido injustiçado e chamou a polícia ou recorreu a lei - assim em Roma, na Grécia ou nas atuais nações civilizadas. Vinganças, brigas, linchamentos, explosões irracionais de violência, etc parece ser tudo quanto Jesus quisera condenar. Não a busca da justiça por meio das leis numa sociedade civilizada ou o recurso a violência defensiva em casos premeditados.

Claro que a solução dada por Jesus refere-se a conflitos pessoais ocorridos em sociedades demasiado arcaicas ou primitivas. Não a conflitos sociais ou impessoais sucedidos em sociedades civilizadas, e que correspondem a uma demanda pela justiça. Claro que tais situações fogem a 'cena' descrita pelo Mestre e assumem outra conotação.

Aqui importa uma única coisa - O sentido mais profundo da paz enquanto não agressão. Antes de ser aquele que em tese suporta qualquer tipo de agressão como um cordeiro, é o Cristão cordeiro que jamais agride. Assim caso existam Cristãos que agridam a outros Cristãos ou mesmo aos não Cristãos É DEVER DA IGREJA REPRIMI-LOS DURAMENTE, ATÉ A EXCOMUNHÃO. Não é ao agredido ou ao que sofre violência que a igreja deve dirigir sua voz para apaziguar, mas ao agressor, para condenar! E não se trata de reprimir apenas o mais comum dos tipos de agressão, a agressão física, mas de reprimi-la sob todas as formas, inclusive a econômica. A igreja não pode tolerar agressores em seu seio.

Por outro lado a sociedade pluralista não é guiada pela lei ética dos Cristãos. Tolerará ao menos a agressividade sútil, que atingirá cristãos e não cristãos, colocando-os num mesmo plano. Deve aqui a igreja condenar os Cristãos que juntamente com os não Cristãos pugnam pela justiça? Certamente que não, como não pode condenar a guerra justa. Assim, o máximo que a igreja pode e deve fazer é gerenciar essa luta ou essa guerra fornecendo uma diretriz ética que exclua a vingança e a tortura; é o quanto bastará por merecer os aplausos da humanidade. Uma vez que os guerreiros após terem pelejado como leões no campo de batalha, devem tratar os vencidos e prisioneiros com cordialidade e doçura.

Importa que numa crise social todos os recursos possíveis sejam empenhados no sentido de manter a paz sem sacrificar a justiça. Todavia esgotados os recursos, a guerra torna-se justa e enquanto justa boa, e enquanto boa desejável. O Cristão não deve avaliar a violência, a guerra ou a revolução enquanto tais ou fins em si mesmas - a violência pela violência será sempre inaceitável já dizia Sorel - mas como meios ou instrumentais para superar uma situação insuportável de injustiça. A injustiça é que fará delas algo absolutamente necessário. Devemos compreender que os conflitos bélicos e as revoluções acontecerão e fornecer uma critério ou padrão ético porque o Cristão possa julga-las. Este padrão é a justiça.

Em certos casos abster-se é colocar-se ao lado dos iníquos e fortalece-los. O Cristãos sempre combaterá ao lado dos atacados, dos agredidos, dos injustiçados, dos oprimidos, dos explorados, etc Sem se preocupar com as facções ou bandeiras ideológicas. Caso a sociedade em que vive agredir ou atacar alguma outra, então poderá não apenas abster-se de lutar em favor dela mas combater tal guerra por meio da pena e da palavra, exercendo oposição ideológica. Nenhuma guerra de conquista deverá contar com o apoio dos Católicos.

Quanto a própria comunidade o critério mais seguro face a uma Revolução - daí o termo violência defensiva - é a quebra da ordem democrática por meio de um golpe, como acabou de acontecer no Brasil, em 2016, com a deposição da presidente legitimamente eleita. O que equivale a uma situação de agressão e injustiça, justificando a resistência ou a sedição. Quanto a tais situações, chamadas golpe de estado, julgo que haja suficiente clareza, uma vez que se trata de eventos de ordem política. Outras situações não são tão claras, na medida em que envolvem a conjuntura econômica ou negação de direitos por meio de massacres e tortura.

Claro que mesmo uma situação de guerra justa ou revolução, inda que desejável, não basta para despertar o que chamam de entusiasmo. Se as crises correspondem a situações anômalas - como as enfermidades ou doenças na vida de um ser humano normal - as revoluções e guerras só podem corresponde a remédios amargos, cauterizações ou cirurgias... Situações relativamente necessárias, não idílicas. Por isso estamos tão longe do contra revolucionarismo tosco quanto da mística revolucionária. Quando esgotadas todas as outras possibilidades aceitamos as situações de Revolução sem nos deixar iludir ou entusiasmar e sem esperar demais... Não cremos que da Revolução ou de qualquer guerra surgirá uma nova sociedade totalmente diversa da anterior ou um paraíso sobre a terra. Não nutrimos sonhos futuristas ou milenaristas em torno das Revoluções, tudo quando esperamos é uma ordem menos iníqua ou suportável.

Por fim enquanto policratas e simpatizantes com aqueles poucos anarquistas bem informados que sabem ser o anarquismo uma luta pela democracia direta  -  acima de tudo a nível de micro estado ou municipalismo - e pela esfera intangível da liberdade pessoal (mencionada por Rousseau nas primeiras páginas do 'Contrato') temos de nos perguntar a respeito de como será a guerra justa ou a revolução. A pergunta se faz necessária porquanto os nazistas, fascistas e comunistas e todos os demais liberticidas acham-se em seu terreno e os amigos da liberdade política não, quando falamos em militarismo ou em algo do tipo militar, como supõem uma revolução ou uma guerra bem sucedida.

Observemos antes de tudo os conflitos gerenciados pelos anarquistas. Primeiramente aquele tipo individualista chamado propaganda pelo fato. De que resultou uma tempestade repressora por parte do estado burguês. Colocando em risco a causa socialista como um todo e alienando não apenas as massas mas o bom povo quanto a tão justa causa. Caso passemos as conjurações, que os anarquistas tomaram ao jacobinista e totalitário Blanqui através de Proudhon, temos o exemplo malfadado da comuna de Paris. Enfim quanto a Revolução espanhola temos um federação de guerrilhas ou conjurações muito mal coordenadas, cada uma atuando a seu modo... Claro que nenhum desses tipos de 'revolução' poderia dar certo.

As guerras e as revoluções que acontecem no cenário de um macro estado unificado exigem um nível mínimo de coordenação, de um comando centralizado e o que é pior de obediência mecânica ou de submissão, sem os quais não podem sair vitoriosas. No entanto esta obediência mecânica, num nível maior, choca-se tanto com os princípios anarquistas quanto com os princípios cristãos ou humanistas de larga tradição filosófica. As relações militares durante uma guerra são em certo sentido arbitrárias, intuitivas e irracionais... As massas incultas conformam-se com elas sem questionar. O Filósofo dificilmente. Não foi por acaso que Carnéades e seus companheiros foram corridos da Roma militarista pelo grande Catão... De modo geral os belicosos romanos, senhores do mundo, encaravam os gregos, com seu apego a arte e a filosofia, como um 'povo' degenerado.

Amigo algum da liberdade, Cristão, anarquista ou humanista, consciente de sua dignidade pessoal, pode deixar de sentir este dilema como a um espinho na carne. Pois dificilmente estará disposto a curvar-se face ao que julgar não passar de caprichos de seu superior... E no entanto a tática da guerra parece depender disto, deste deixar-se controlar por um superior que conhece melhor o conjunto. O sucesso da Revolução ou da guerra parece depender do mando e da submissão e de um cérebro que esteja acima de todos coordenando tudo... Face as este cérebro os mais deveriam estar paralisados, passando a agir como braços e pernas. É exatamente aqui que surgirão conflitos de consciência e tumultos no caso dos Cristãos... Caso se lhe peça que torturem ou massacrem já prisioneiros, já civis inocentes, coisa que ele não poderá fazer em hipótese alguma. Julgo que alguns anarquistas de boa vontade e humanistas concordarão com eles. Formarão objetores de consciência... Isto terá de ser discutido previamente. De modo a obter-se algum tipo de acordo. Não sendo assim a Revolução ficará comprometida.

Mesmo em alguns outros casos surgirão problemas entre os amigos da liberdade. Pois certamente haverá quem se recusará a massacrar animais. Como quem se recusará a comer carne... O anarquista, o católico, o humanista, dificilmente se deixará padronizar. Já as operações de guerra bem sucedidas parecem depender das massas ou dos homens padronizados e sem vontade própria. Levantemos a hipótese segundo a qual tais homens se deixem controlar caprichosamente apenas durante o período em que durar a Revolução - a qual pode prolongar-se por alguns anos ou mesmo décadas. Quem garante que esta situação não servirá como um treino destinado a amestrar homens livres tendo em vista a instauração de uma ordem despótica ou totalitária. Neste caso não estaríamos a nos adaptar antecipadamente, sacrificando nossos ideias, princípios e valores???

Não quero dizer que as Revoluções devam ser contidas.

Estruturas econômicas, religiosas, políticas, etc entrarão em colapso e criarão situações potencialmente revolucionárias para as quais devemos estar preparados. Daí a necessidade de levantar a discussão, inclusive em torno de uma ética revolucionária. E de indagar sobre como seria o futuro post revolucionário e a distribuição dos poderes... Temos de saber antes de tudo que uma Revolução bem sucedida não ocorre as vésperas, exige tempo, planejamento, armamento, técnica, disciplina pessoal, treino, etc, etc, etc Supõem um corpo de guerrilha preparado... Quase todo discurso revolucionário feito pelos místicos de hoje tem sido leviano e espontaneísta. Nada muito sério. O que nos faz nutrir séria reservas quanto a viabilidade de tais revoluções mais parecidas com as grotescas conspirações blanquistas criticadas por Engels em 1895. Não se faz revolução com drinques, pizza, cigarro, maconha, etc Não se faz mesmo... Os profetas da revolução atual bem fariam ler a vida de Marighela.

As revoluções acontecerão. Mas também poderão abortar ou ser sufocadas por falta de seriedade e comprometimento.

Como poderão dar vezo a surtos de psicopatia e crueldade; assim como resultar em totalitarismo e barbárie...

Comportam riscos.

Por isso dissemos - Elas só serão viáveis em situações de injustiça extrema após esgotados todos os outros meios: Ação parlamentar, greves, protestos, marchas, desobediência civil... Só serão aceitáveis como respostas a um golpe ou a um massacre. Será respostas a determinadas situações ou conjunturas históricas, jamais receitas de bolo ou bulas de remédio.

Certamente a mística revolucionária que anima o Comunista, o nazista ou o fascista não deverá contagiar o Cristão ou o humanista; mesmo o anarquista, na esteira de um Kropotkin ou de um Tolstoi acalentará maior ou menos nivel de reserva face a ela.

Ps.: Reservamos outro artigo para dialogar com G Sorel.

domingo, 15 de julho de 2018

Semiologia ou Semiótica do anarquismo...

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Entre o anarquismo e o comunismo há uma diferença significativa - alias há várias rsrsrsrs - no sentido de que este sempre se mostrou mais sistemático, orgânico e compreensível, desenvolvendo-se numa linha mais ou menos coerente. Marx e Engels, e especialmente este último, foram pensadores do mais alto quilate, ao menos no plano da economia (E sintetizadores no mínimo interessantes quanto no plano da Sociologia). Julgo que a nível de anarquismo apenas Kropotkin aproxime-se deles, apresentando um padrão de coerência e clareza que não encontramos num Proudhon ou num Bakunin.

Ademais, é notória e perceptível a influência venenosa da metafísica anti estatista francófona e do individualismo alemão mesmo sobre um teórico eslavo como Bakunin. Mesmo porque, segundo lemos em diversas publicações, as constatações de Bakunin não parecem ter partido de qualquer fonte russa ou eslava, mas de Proudhon e mesmo de Max Stirner, e os atuais anarquistas ou anarcóides, mesmo quando afetam socialismo, parecem não fugir a esta regra. Max Stirner parece estar nas bocas de muitos deles, o que nos conduziria a Bastiat, Rand, Rothbart e ao que chama de libertarianismo Norte Americano, e aqui já demos a volta ao parafuso, pois nos encontramos face ao adversário número um do socialismo ou da sociedade política.

Seja como for temos que Bakunin foi capaz de corrigir-se numa perspectiva cada vez mais social e de chegar ao velho conceito de democracia direta quiçá por influência da tradição Nairodinik ou populista da Rússia - forte pelos idos de 1860 - quiçá por ter tido contado com qualquer tradição Suíça relativa a democracia direta ou ao 'landsgemeine', conservada em alguns cantões Católicos. O fato é que Bakunin caso não tenha endossado, criou o que mais tarde veio a ser chamado anarquismo eslavo, de que Kropotkin foi o maior teórico. E devemos compreender que este anarquismo esta em oposição ao anarquismo de matriz francesa - derivado de mais de Voltaire do que de Rousseau - que desenvolvendo-se nos EUA e incorporando elementos de origem protestante ou alemã - via Max Stirner - deu origem ao já citado libertarianismo dos Ancap.

De um modo ou de outro os anarquistas jamais souberam manter um saudável equilíbrio em suas afirmações no sentido de apresentar - o mínimo que se esperaria deles - o capital tão opressor quanto o estado, e fazer guerra a ambos. Já em Bakunin, detectamos este discurso segundo o qual a opressão exercida pelo que chamam Estado é mais forte ou tirânica do que a exercida pelo capital ou pelo reino do dinheiro. Aqui a tese contrário, sustentada pelos marxistas, parece ser muito mais consistente e apoiada pelos fatos tomados a História.

Fato é que nossos anarquistas jamais romperam com este padrão de discurso, mais anti estatal do que anti capitalista e que ele só podia desembocar na tragédia Ancap - na qual o Estado continua sendo o vilão e o capital assume o papel de herói...

Queremos salientar antes de tudo qual o fim de tais discursos numa linha de coerência...

O anarquismo ocidental ou franco estado unidense, digamos assim, jamais negou Max Stirner, embora este - não Bakunin e menos Kropotkin - tenha negado, por primeira vez no curso da História, a Sociedade, a qual opõem a estranha noção de indivíduo isolado, quiçá tomada a J J Rousseau - que mais tarde afirmará a noção de contrato, em sua dimensão social - e que o Bakunin mais velho ou refletido, dirá ser tão falsa e inconsistente quanto a ideia de Deus (Bakunin era ateu virulento - a ponto de assustar Marx e Engels).

O anarquismo oriental, russo ou eslavo, quiçá devido, as mesmas fontes culturais que inspiraram a Nairodnaya, teve como ponto de inflexão, sua marcada consciência social, e a elaboração, como já mencionamos, pelo próprio Bakunin, de uma teoria de democracia direta bastante próxima da velha democracia grega - que girando em torno da cidade estado é municipalista - se bem que mais ampla por incluir mulheres e operários, e isto num tempo em que o sufrágio direto não passava de novidade. Isto é o que constatamos apesar das deficiências presentes no vocabulário anarquista, o qual pelas razões acima expostas, não é uniforme ou sistemático, mas sujeito a variações e o que é pior, a interpretações discordantes.

O que nos leva ao problema do significado.

Relativo ao que Bakunin e os militantes de seu tempo teriam querido dizer.

Teriam querido dizer o mesmo que Proudhon ou Stirner? Há quem sustente esta tese...

A pergunta é vital para nossos dias. Dias em que o anarquismo volta a carga ou melhor a propaganda e nos quais assume diversos discursos. Claro que nos Socialistas, que somos igualmente amigos da liberdade, queremos saber até que ponto um Stirner, um Bastiat ou uma Rand estão presentes nesse discurso, uma vez que estamos e queremos continuar distantes de um Mises, de um Fridman ou de um Hayek, com os quais parte considerável deles acaba conciliando-se nos termos finais, devido a ideia segundo a qual o capital é menos insidioso do que o estado e a dominação econômica mais leve do que a estatal.

No terreno de uma social democracia ou de uma inserção parlamentar, temos sempre de ter diante de nós as advertências de Engels, que na verdade remontam a F Lassalle e a 1860 no sentido de que nenhuma aliança ou pacto seja feito com os elementos da burguesia, ou de que levemos a cabo uma política honesta, noutras palavras éticas, sem que nossos princípios sejam sacrificados ou ideais negociados sob quaisquer alegações. Temos de adotar um padrão estrito de coerência ou, caso contrário, como Bakunin, chegaremos aos pés de Maquiavel, o ídolo da política burguesa, e isto será tido em conta de sinceridade, e até mesmo aplaudido...

A política deverá ser suja, e nós nos deveremos sujar ou poluir...

Importa que nós, socialistas honestos, não nos podemos aproximar dos que sustentam um estado mínimo. E de modo algum trabalhar junto com os que pretendem derrubar este estado 'burguês' para estabelecer uma ordem ainda mais burguesa sem a presença do estado. Os socialistas não obteriam vantagem alguma em destruir o estado político e manter a estrutura de produção capitalista, do que resultaria, creem eles uma tipo de opressão ainda mais duro.

Alias não há sequer acordo a respeito do que os anarquistas definem como Estado pelo simples fato de seu modo de se expressar ser confusionista ou inexato, favorecendo um discurso capcioso.

Tomemos o exemplo dos anarquistas brasileiros, daqueles que atuam entre nós no momento presente, i é, em 2018.

Antes de tudo constatamos, apavorados, quão poucos dentre eles estão familiarizados com os escritos de Bakunin e Kropotkin, os quais amiúde, são citados de segunda mão. Muito do que vemos nos círculos anarquistas brasileiros provém da tradição ocidental, franco estado unidense, o que confere um acento demasiado individualista as seus discursos, favorecendo não poucas vezes uma aproximação com minimalistas e Ancaps, aos quais eles, anarquistas, acreditam estar ligados pela mesma causa comum - O fim do estado ou da autoridade. Para qualquer socialista, que demanda antes de tudo por uma relativa igualdade econômica em torno de oportunidades, esta aproximação é inaceitável.

Basta dizer que em tais círculos a presença de Max Stirner não é incomum e a opinião subjacente entre eles - aqui o nó do problema - é que Bakunin e Kropotkin concordam com ele. Ora quem teve a oportunidade de ler um e outro, seja ou não anarquista, sabe que não há acordo e que os russos demandavam por algo muito mais amplo e profundo do que a mera destruição do que chamavam Estado. Afinal tanto Bakunin quanto Kropotkin, ao contrário do individualista alemão, não identificavam o ESTADO com a SOCIEDADE.

"La Sociedade es anterior al individuo y le sobrevive, como la naturaleza. La Sociedade es eterna, como la naturaleza, mas bien, nacida sobre la tierra durará tanto quanto dure nuestra tierra." M Bakunin

Diz ainda mais:

"Al margen de la sociedad, el hombre hubiera sido eternamente un animal salvaje."


O problema dos nossos anarquistas tupiniquins é justamente este: Tendo tomado M Stirner por guia identificam o Estado com a Sociedade, de modo que aniquilando o Estado nada resta além do indivíduo ou de indivíduos isolados, e portanto do caos, daquele caos previsto por Hobbes, em que homens convertem-se em lobos sanguissedentos, pelo simples fato de nada haver além deles...

Concluindo: Eles não leram uma linha de Bakunin ou de Kropotkin e não estão familiarizados com a terminologia conceitual empregada por eles, do contrário saberiam que não há acordo entre ambos e o alemão Max Stirner. Caso esta consciência sempre estivesse viva e presente entre eles jamais teriam se aproximado de alguém como Ayn Rand ou Mises.

Portanto forcejemos para compreender o que Bakunin e Kropotkin, estavam querendo dizer.

Segundo Georges Lefranc 1960 p 164 'Bakunin se pronuncia en favor de la sociedad en contra del estado.' Tornemos a Bakunin:

"Espero que la organizacion de la Sociedad y de la propriedad colectiva o social, se produzca DE ABAJO ARRIBA, por la via de LA LIVRE ASSOCIACION, Y NO DE ARRIBA ABAJO, POR MEDIO DE LA AUTORIDAD, SEA CUAL SEA."Perceba o leitor que Bakunin estabelece algumas relações que não são muito difíceis de entender. Relaciona o movimento de Baixo para Cima e portanto do povo para o 'comando' com a livre associação, a comuna, o município, uma pequena organização social. E da mesma forma relaciona o movimento de Cima para Baixo, i é um comando exercido por UM ou ALGUNS apenas, com a odiada autoridade.


Temos assim que para Bakunin o Estado corresponde ao sistema da autoridade ou do autoritarismo (ele não gaz diferença entre os dois tipos de conceito) ou de um comando exercido por um ou alguns sobre os demais. Claro que tem em mira antes de tudo a monarquia e também das diversas formas de aristocracia e certamente as democracias artificiais... tudo quanto duponha dominação.


Para ele, o inverso de Estado - com seu esquema de autoridade vertical - é a Sociedade. Na comunidade social não há comandantes e comandados ou governantes e governados porque todos os cidadãos são chamados a participar das decisões políticas que digam respeito a vida comum. Aqui o comando é de todos, e portanto horizontal. Importa saber se no esquema de Bakunin o indivíduo pode colocar-se acimada comunidade social ou das decisões comuns? O próprio Bakunin responde, sem qualquer artifício, que não. Que após a discussão e a deliberação comum, aquilo que foi decidido pela maioria converte-se em lei, demandando submissão por parte de todos os membros do grupo ou dos dissidentes, pelo simples fato de que tiveram a oportunidade de argumentar sobre seus pontos de vista e de convencer os demais. A ideia que anima este ponto de vista é bastante clara; e pode ser assim definida: Duas cabeças pensam melhor do que uma... Claro que isto pressupõem todo um trabalho educativo/formativo, Bakunin não o ignora, supõem-no. Ele crê que ao menos quanto as coisas comuns, a deliberação da maioria é sempre mais segura do que a opinião individual. Exceto, é claro quando temos massas incultas, situação que levaria o grupo a oclocracia.


Que temos de novo aqui no esquema de Bakunin - apresentando sob as vestes de Proudhon como anarquia??? Nada além da velha democracia direta ou da policracia - apenas ampliada - posta em prática nas cidades estados da Grécia antiga...


E embora Bakunin repudie o nome, continuamos tendo autoridade, a autoridade comum do grupo, em oposição ao autoritarismo, arbitrário e caprichoso, exercido por monarcas, déspotas, tiranos, senadores, falsos representantes, etc Aqui temos uma autoridade justa porque compartilhada. O que excluí como já dissemos a oposição individual dos dissidentes, o que admitido levaria o grupo a destruição. Os dissidentes, caso se mantenham, inflexíveis - é Bakunin quem o diz - são colocados fora do pacto ou da proteção oferecida pela comunidade, sendo-lhes franqueado o direito de abandona-la, exilando-se a si mesmos e formando uma comunidade a parte, conforme seus pontos de vista. Uma coisa é certa, permanecer na cidade, causado distúrbios não podem. Bakunin sabe qual seria o fim da oposição individual 'assentida' após cada deliberação e por isso desaprova-a. Sua comunidade não pode ser e não é a comunidade de indivíduos isolados porque uma tal comunidade é inexequível. A comunidade se mantém por laços comuns, o que demanda submissão a decisões comuns, as quais são legítimas quando tomadas pelo conjunto dos cidadãos.

Toda argumentação de Bakunin gira em torno disto e então - posta de lado a questão dos meios ou da social democracia - sou tão anarquista quanto ele, por subscrever 'in totum' seu ideal policrático de sociedade.

Kropotkin, como é sabido de todos, levou ainda mais adiante o princípio da legítima autoridade exercida comunitariamente por uma determinada sociedade e nada sabia a respeito da 'autonomia' de indivíduos isolados vivendo no seio da comunidade. Neste sentido político e social Bakunin e Kropotkin são verdadeiros socialistas, mormente quando no ideário de ambos a produção econômica é planejada e controlada pelo grupo social tendo em vista suas necessidades concretas e não a ambição e o lucro. Eles não situam o econômico fora do político ou do social i é como algo independente e não conferem ao mercado uma existência separada da comunidade.

Claro que aqui, os alemães de modo geral, em especial os que haviam estudado Hegel não partilhavam nem podiam partilhar das prevenções franco estado unidenses, a respeito do estado existente. E se os comunistas mostraram alguma hesitação, o Manifesto de 1848, com surpreendente lucidez, refere a busca pelo sufrágio universal como parte da luta comunista. E Engels, retomando este viés em 1895, admite que Lassalle, tomou aquele ideal e levou-o adiante, até chegar-mos a eleição de Bebel e ao programa de Gotha em 1875. E embora Marx tenha demonstrado alguma resistência na 'Crítica...' especialmente quanto ao caráter nacional do partido socialista alemão, do qual desconfiava. Seja como for, segundo sua filha Eleanor, pouco antes de morrer aderiu aquela solução, e mais ainda Engels, até morrer...

Em determinado momento os alemães, ao contrário dos anarquistas, concluíram pela estrutura neutra do estado recém cooptado pela burguesia e pela possibilidade de, através do sufrágio universal, inserir-se no parlamento e tomar posse dela, desmontando-a por dentro e transformando-a, a longo prazo, na própria 'ditadura do proletariado'. Claro que o mesmo tipo de raciocínio impõem-se no sentido de transforma-la numa policracia ampliando-a ou aprofundando-a por dentro, ao invés de buscar destrui-la por meio de golpes ou sedições. Claro que aqui já tocamos ao problema da instrumentalidade ou dos meios.

Os anarquistas mantiveram sua metafísica maniqueísta até mesmo quanto as palavras.

Esta percepção tanto mais realista já não diz respeito ao Estado enquanto forma de organização essencialmente opressora, mas a diferentes formas de organização social. Uma autoritária ou dualista na qual Estado e Sociedade/Comunidade são compreendidos como entidades distintas e sobrepostas - o que supõem um indivíduo, um grupo ou um setor comandando os demais. Nós, com Bakunin e Kropotkin avaliamos este tipo de governo como indesejável e ilegítimo. Mas há uma outra concepção segundo a qual o Estado corresponde a própria Sociedade por meio da participação direta de todos os cidadãos nas decisões comuns ou da policracia. Claro que é uma questão de termos ou nomes e que para Bakunin isto é impossível, pelo simples fato dele identificar arbitrariamente o Estado com o autoritarismo ou o comando arbitrário.

A questão aqui não é o estado mas sua relação com a sociedade.

E um repúdio a metafísica francesa anti estatal bem como a terminologia bakuninista, francamente confusão, colocaria a questão em termos de democracia direta ou policracia ou da identificação do estado com a sociedade. Neste sentido a solução elaborada pelos marxistas alemães no curso de sua História, até o fim do século XIX, parece imensamente mais rico do que a insistência furiosa de parte dos anarquistas a respeito das conjurações sucessivamente fracassadas. Claro que tudo isto conduz fatalmente a solução social democrática e que a social democracia, já advertia Engels, pode poluir a si mesma por meio de falsos acordos, pactos, negociatas, etc tornando-se vulnerável e perigosa. É coisa que se deve analisar com prudência noutro artigo.