terça-feira, 3 de março de 2020

A manipulação/exposição do corpo, o carnaval e a revolução.

Já há algum tempo estava para escrever algo sobre este tema. Fui protelando já por ser complexo, já por ser polêmico.

Até que a reação dos comunistas, anarquistas e cia ao desfile da mangueira (2020) forneceu-me a devida ocasião.

Creio ser dever meu, como articulista e formador de opinião, adiantar que esta análise, como de praxe, não será nada convencional ou destinada a agradar qualquer rebanho, seja o dos conservadores, puritanos, moralistas, fanáticos... seja o dos pós modernistas, sexistas, radifens, etc Por pensar criticamente não acompanho bandos. Penso por mim mesmo, a partir é claro de minhas fontes, sempre vastas...

Em tempos de maniqueísmo/puritanismo mostrar o corpo ou ainda manipula-lo tinha acentos sociais e políticos. Por isso Freud, Atrino, Ellis, etc, em meados de 1900 foram revolucionários... E meio século depois veio a Revolução que prepararam, já a sessenta anos.

Desde então a maior parte de nós pode assumir uma identidade sexual e paralelamente ter acesso e manipular o próprio corpo. Devemos nós considerar tal acontecimentos como um dos mais significativos da História humana, mesmo quando em diversos cenários passamos ao extremo oposto: A deificação do corpo ou da aparência física e uma sexualização exacerbada... De fato fomos de um extremo a outro, daí esperarmos por uma equilibração - Momento em que a sexualidade será encarada apenas como natural ou como parte significativa da vida (Não como seu centro ou foco).

Sabe o leitor que nossa posição face a sexualidade advém da cultura clássica. Portanto sendo reacionária por definição é igualmente progressista e livre. Somos favoráveis aos relacionamentos abertos e contra o controle ou manipulação da sexualidade pelo assim chamado 'parceiro' (s). Isto não quer dizer que sejamos libertinos ou sexistas a moda do Marquês de Sade. O quanto queremos dizer é que o corpo/sexo tem valor, um valor positivo e que a vida sexual tem significativa para o homem. Nossa mensagem tem sido sempre esta: Que a sexualidade ou o corpo sejam encarados com naturalidade não com hostilidade ou pessimismo a exemplo do passado.

Não partilhamos portanto da opinião daqueles que encaram a sexualidade como o supremo valor da existência humana, os quais costumamos chamar sexistas. Somos humanistas... Nosso feminismo diz respeito apenas a igualdade de direitos entre homem e mulher ou a condenação do machismo. Quanto ao ao valor da pessoa somos humanistas! Nem agostinianos, nem puritanos, nem sexistas... Quando nos alinhamos com os trabalhadores é apenas por questão de justiça - Tal o sentido do recorte trabalhista. Mas para além de feministas ou trabalhistas ou de qualquer rótulo - Mesmo o de Cristão Católico - o que pretendemos ser é humanistas. Nada em Sócrates, Aristóteles, Confúcio, Buda ou Jesus indicam-nos que a sexualidade corresponda ao supremo valor da existência humana, mas, uma fonte de prazer a ser corretamente gerenciada.

Não apreciamos um ou outro extremismos.

A luz do que acima registramos podemos dizer que em determinados contestos expor o corpo pode ser pessoalmente libertador, e para isto há espaços de nudismo ou naturalismo. Para além disto cada qual é livre para trajar-se como quiser, a luz de sua própria personalidade. Outra coisa e bem distinta é imaginar que sua própria nudez ou sexualidade seja social ou politicamente relevante, e este é o foco deste artigo. O problema é uma determinada pessoa ou mesmo um determinado grupo de pessoas pretender que a exposição de seu corpo seja revolucionária sessenta anos após a Revolução sexual e numa situação de reconhecida liberdade.

Reconheço seu direito de trajar-se como bem quiser ou se expor seu corpo publicamente ou ficar completamente nu. O que questiono é que semelhante atitude seja revolucionária ou melhor perigosa para o sistema. Penso ou julgo que aqueles que são ou foram perigosos para o sistema: Lamarca, Mariguella, Herzog, Chico Mendes, Dorothy Stang, Patrícia Acioli, Marielle Franco, etc estão mortos! Isto é ser socialmente relevante ou revolucionário.

A Psicologia indica muito claramente que as pessoas que tem algo a mais a oferecer não costumam cobrir ou desnudar por completo o corpo, mas vestir-se com naturalidade e equilíbrio. De minha parte ouso dizer que desconfio dos homens e mulheres que costumam ostentar os membros do corpo, cultivar doentiamente a forma física ou vangloriar-se da beleza, salvo é claro como fonte de renda. Para mim tais pessoas mostram a única coisa que possuem. O ser humano todavia é bem mais do que um corpo sarado ou escultural. E há a dimensão da ética, da inteligência e até da elegância... Tais elementos fazem um ser humano completo, centro de uma personalidade rica e atraente.

Claro que um corpo bonito pode ser um valor. Desde que em conexão com outros valores já citados. O materialismo crasso apenas concordaria em declarar que é o ser humano apenas um corpo a ser ostentado e nada mais... Pois, lamentavelmente a beleza corporal degrada-se com o passar do tempo, cedendo lugar ao que chamamos de feiura: Flacidez, estrias, linhas, manchas, etc A posse de princípios e valores saudáveis (Como o amor a justiça), de inteligência cultivada, de bom humor, elegância, etc são dons perenes, que jamais passam...

Para mim a exposição do corpo apenas denota um profundo vazio em termos de outros valores humanos, e nada tem de social ou politicamente relevante, menos ainda de revolucionário. Ainda aqui ouso discordar veementemente de um pós modernismo que perdeu o trem da História. É verdade que os europeus - prevalencendo-se de certa presença moralista - adoram balançar suas bundas caídas ou flácidos glúteos... No entanto, salvo a existência de concomitante greve, paralisação, etc as bundas para nada servem. Não intimidam seja o patrão ou o governo. Mobilizações, passeatas, greves, boicotes, etc intimidam os patrões e governos mesmo sem nudez ou bundas caídas. Assim você sempre poderá mostra sua buzanfa... Mas não atribuir-lhe uma conotação político social relevante.

Quer que sua nudez seja revolucionária ou relevante? Ostente-a no Iran ou em qualqer país muçulmano do Oriente Médio. No Brasil exposição do corpo não choca porque é já corriqueira...

No país do Carnaval, grosso modo, as coisas são ainda mais exóticas ou esquisitas...

Pois aqui não apenas se mostra o corpo ou ostenta a nudez, mas canta-se, dança-se... (Também se bebe cerveja aquecendo-se essa indústria ou o mercado). As pessoas exaltam-se e pulam, gritam, chacoalham o corpo, etc O que é de praxe... É o carnaval... E temos de reconhecer que faz parte de uma cultura igualmente descompassada. Posto que não vivemos mais numa sociedade fechada e repressora que dependa de uma válvula de escape... Mas como já o disse - Compreende-se.

O que não compreendo é que se atribua qualquer relevância política ou caráter revolucionário a tal festividade, especialmente quando gerenciada por essas colossais agremiações chamadas escolas de Samba, alias subvencionadas pelo poder estatal i é verba concedida pelas prefeituras ou mesmo por agremiações empresariais... Mesmo o Carnaval popular, realizado pelos blocos de rua, com suas marchas, degenerou em comércio de bebidas! Há alguns anos quando subimos a S Paulo para protestar contra o vampiro golpista Michel Temer, demos com um bloco de rua muito aminado e marchinhas satíricas... Foi muito divertido acompanha-lo. Sabido é no que resultou essa muito animada reunião... Em nada! Cantamos, pulamos, gritamos, dançamos... e o Temer lá continuou no poder. Mesmo algumas escolas de samba do pais satirizaram o vampiro, assim os trens elétricos do Nordeste... Mas a situação ficou na mesma.

O que quero dizer com isto é que é da condição ou da cultura do Brasileiro rir ou tirar sarro de tudo, brincar, pular, dançar, cantar, gritar, ostentar o corpo... Fazer carnaval. E se fica eternamente nisso. E disto não resulta absolutamente nada de concreto! Quando o Carnaval com suas sátiras conquistou algo para o povo??? Não, não se passa disso... E os políticos ou demagogos bem sabem (Daí injetarem dinheiro nas Escolas de Samba). Por mais que a esquerda caricata e pós modernista aclame o desfile da Mangueira como revolucionário os políticos não tem receio ou medo dele, pois sabem que ao chegar a quarta feira de cinza os sambistas estão em suas casas curtindo a ressaca do dia anterior ou se recompondo, não com coquetéis molotovs ou fuzis em mãos!!! E disto não sai ou saíra revolução... Passada a febre do carnaval sobe a maré do conformismo...

Ulisses Guimarães já o dizia: 'Político tem medo do povo nas ruas...' [Com pedras ou paus nas mãos e fazendo greve geral.] - os parentéticos são nossos. Não de massas chacoalhando-se no sambódromo. Lá também estão os políticos nos camarotes, degustando caviar, bebendo champanhe e paquerando as filhas do homem trabalhador...

Tal a realidade e nada do que a mangueira fez ou fizer para ganhar troféu e prêmio vaio mudar isto.

Encarar a mangueira, qualquer escola de samba financiada pelo poder público ou time de futebol, como organizações revolucionárias não é menos ingênuo ou tolo do que encarar a Assembléia de deus ou a CCB como organizações revolucionárias...

Querem curtir o Carnaval, beleza... Só não me venham dizer que os políticos vão se sentir ameaçados ou ter medinho das passistas seminuas ou do passista tinindo sua cuica... Pois é isto o cúmulo da alienação.

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