quinta-feira, 15 de dezembro de 2016

Pensamentos psicológicos...

A primeira psicologia por assim dizer foi a associacionista ou elementar inaugurada por Wundt. Segundo os pressupostos desta corrente cada fenômeno psicológico constituía uma espécie de setor estanque e da ligação existente entre eles - análoga aquela que existe entre os membros do corpo físico - resultava o que cognominamos personalidade.

A esta fase clássica sucederam duas correntes antagônicas e inconciliáveis: A psicanálise e o Behaviorismo. Aquela criada pelo Dr S Freud cerca de 1900 e esta pelo Dr J B Watson em 1914. Trabalha a psicanálise com o conceito de mente ou de fenômenos mentais de caráter dinâmico, e por isso recorre a introspecção. Já o Behaviorismo ou por negar a existência de qualquer entidade que ultrapasse a esfera material do corpo ou por considerar tal forma de existência inacessível a pesquisa limita-se a analisar o comportamento ou as ações humanas. Daí seu talhe materialista ou positivista.

Para os estudiosos behavioristas não há diferença significativa entre a psicologia animal - daí o emprego sistemático de cobaias i é ratos de laboratório - e a psicologia humana uma vez que os mecanismos materiais ou físicos são praticamente os mesmos girando em torno do condicionamento clássico e da relação estímulo resposta. E jamais nos afastamos demasiadamente de Pavlov. Chegamos assim a B F Skinner com seu condicionamento operante implementado através de reforço e/ou punição. A teoria é certamente recente. Empiricamente no entanto o condicionamento operante vem sendo empregado há milênios e com relativo sucesso tendo em vista o adestramento animal ou treinamento de cães, cavalos, elefantes, etc Neste sentido a perspectiva do behaviorismo é bastante acanhada por compreender o fenômeno educacional como um adestramento de seres humanos.

Claro que sendo animais podemos e devemos levar em conta os princípios do condicionamento operante e a operação de adestrar. Mormente em se tratando dos meninos mais jovens, nos quais a potência intelectual ainda não se transformou em ato. Não somos contra este recurso quando aplicado com sabedoria na E infantil ou nas séries iniciais. No entanto, na medida em que o intelecto vai emergindo e se afirmando fica claro que os recursos dispostos pelo behaviorismo vão se tornando mais e mais ineficientes e que a educação intelectual deva tomar outro curso. Por isso que o behaviorismo precisa ser ultrapassado e completado, pelo simples fato de jamais atingir a personalidade como um todo ou de tocar o universo mental de nossos alunos.

Porque o homem não é um rato, um gato, um cão, um elefante, etc mas uma estrutura mental e pessoal tanto mais organizada e complexa torna-se o behaviorismo, enquanto simples treino, ineficaz.

A psicanálise considera que a mente possuí diversas instâncias e que elas se inter penetram. Do que resulta uma visão mais ou menos caótica em termos de conflito. Entre as diversas instâncias da mente humana labora um estado de tensão insuperável matriz de todos os nossos problemas mentais ( digo de todos aqueles cuja origem não é física). Neste sentido cabe um papel de destaque ao inconsciente, definido como instância a que não temos acesso através da memória. A princípio Freud postulou a existência de uma força mental preponderante, no caso a libido, concebida como prazer ou prazer sexual. Foi a constatação a que chegou após ter examinado um grande número de neuróticos. Deparando quase sempre com algum recalque de natureza sexual.

No entanto, logo após a segunda grande guerra, Adler, um seu discípulo mais atilado, chegou a conclusão - após ter se embebedado nos escritos marxistas por sinal - de que a mais forte de todas as energias mentais não era de natureza sexual mas de natureza auto afirmativa, formulando os conceitos de busca pelo poder e instinto de agressividade. Evidentemente que a iniciativa de Adler não podia ser muito bem vista pelo Dr Freud, do que resultou sua 'excomunhão' ou expulsão da fraternidade psicanalista.

Tal não foi, no entanto, a compreensão de K G Jung, o qual, tendo chegado momentaneamente a conclusão de que tanto Freud quanto Adler estavam corretos, chegou a conclusão de que em algumas pessoas predominava o instinto sexual ou a libido e em outras a busca pelo poder até a agressividade extrema. Donde admitiu dois instintos: o sexual e o agressivo, determinando dois tipos de comportamento diferentes. Posteriormente K G Jung propôs a redefinição de libido em termos de uma energia informe, amorfa ou isenta de qualquer determinação. Segundo essa perspectiva a Educação ou a cultura é que direcionavam a libido para um objeto qualquer fosse ele a sexualidade, a afirmação em termos sócio, político econômicos, a religiosidade, a estética, a pesquisa científica, etc E estamos chegando praticamente a psicologia dos tipos de Spranger.

Ainda segundo este pensador as neuroses seriam resultado da concentração da líbido numa só área com prejuízo ou negação das outras. Sendo assim, o psicólogo Suíço recomendava que a libido fosse equilibradamente cindida entre as diversas áreas que constituiriam uma personalidade completa: sexualidade, afirmação pessoal, política, religião, estética, etc

O interessante aqui é que embora protestasse jamais retocar seus pontos de vista S Freud não tardou a incorporar a doutrina dos dois impulsos formulada por Jung. Desde então - cf Para além do princípio do prazer - admitiu a coexistência do Eros i é da libido sexual ou do prazer e do Tanatos ou instinto ora de agressão ora de morte, no mesmo indivíduo e aumentando ainda mais o estado de tensão (decorrente antes de tudo da oposição existente entre Id e Superego). Por fim Freud teve de mostrar-se aberto a hipótese segundo a qual a libido não passava de uma energia informe. Alias o que mais cativa na personalidade de Freud é justamente esta capacidade para assimilar a crítica alheia, incorporando-a a teoria original e o mais triste é que ele, Freud, jamais foi capaz de admiti-lo, passando inclusive por plagiador.

Rank (Otto) foi outro colaborador que incorreu no desagrado do mestre. Por ter - na obra já clássica "O Trauma do nascimento' - proposto, a par do 'complexo de Édipo' a existência de um outro complexo não menos importante relacionado com o parto do nascituro, especialmente com a assim chamada cesariana. Melanie Klein (classificada como post freudiana) foi por essa linha considerada mais ou menos heterodoxa e enfatizou a importância dos eventos anteriores ao completo de Édipo para a formação da personalidade e evidentemente das neuroses. Nesta perspectiva sua monografia sobre o desmame foi cabal, somando-se a crítica de Rank.

Antes de chegarmos a Gestalt ou psicologia das estruturas mentais gostaria de mencionar ainda que de passagem o papel da pesquisadora Karen Horney responsável por introduzir o conceito de cultura no debate psicanalítico e, consequentemente, por problematizar em torno da metafísica freudiana. Ao que parece foi esta mulher insigne, que levantou a ponta do véu, ao sugerir que a percepção sexualista de Freud correspondia não e um elemento abstrato presente em todas as situações e sim a uma conjuntura cultural determinada em termos de tempo e espaço. Freud captou as situações de neurose produzidas pela sociedade européia de seu tempo. Noutras palavras - alias nossas - ao relacionar a situação de neurose com a repressão sexual Freud captou uma situação produzida pela Sociedade 'cristã' maniqueista ou puritana de seu tempo para a qual a negação do corpo e a condenação da sexualidade equivalia a uma necessidade religiosa ou espiritual.

O mesmo vale para Adler ao menos em certa medida, Pois ainda que reconheçamos com ele - e reconhecemos - a existência de um instinto de auto afirmação segundo o qual cada pessoa busca um espaço através do qual realizar-se plenamente no mundo, a ideia de um 'instinto de agressividade', destruição ou morte se nos apresenta como uma hipertrofia daquele estimulada ou promovida pela cultura capitalista. O homem decerto anseia por afirmar-se como 'alguém' no seio da Sociedade e isto corresponde a um sentido. A educação 'liberal economicista' estimulando ao máximo a rivalidade, a concorrência, a combatividade é que produz por assim dizer o tão disseminado 'instinto de agressividade' ou morte detectado pelo eminente psicólogo.

Resta-nos por fim dizer alguma coisa sobre a Gestalt de Kofka, Koehler e Spranger. Em certo sentido a gestalt retoma o esquema coordenativo da psicologia clássica ou elementar, incorporando em certo sentido as críticas da psicanálise na orientação de um dinamismo. Para a gestalt a mente humana deve ser compreendida em termos de uma estrutura complexa em que diversas áreas, partes ou sessões entram e contato e inter penetram-se. São diversas camadas ou tecituras que associam-se, envolvem-se e dão origem a uma macro estrutura peculiar. O que nos remete aos tecidos do corpo humano ou a trama e a urdidura de um pano.

Para a gestalt a educação enquanto assimilação de elementos culturais e sua ordenação pela mente produz determinados tipos comuns de personalidade, cada qual voltada para uma área ou atividade da existência em termos de vocação. A vocação não significa no entanto a convergência da libido ou energia como um todo para uma direção apenas, mas a busca pela afirmação sem prejuízo do prazer ou da alegria. E sempre resta alguma medida de energia para ser aplicada nas demais áreas da personalidade completa. Segundo Spranger em termos de personalidade teríamos as seguintes determinações gerais: Ciência, arte, política, religião, sociedade... Aqui a fonte das neuroses ou do desconforto mental estaria relacionada com a vocação frustrada ou deslocada pelas exigências artificiais da existência.










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