domingo, 21 de setembro de 2025

Ortodoxia, agustinianismo, igreja romana (Papado) e protestantismo: Os caminhos da Europa

É a Ortodoxia oriental totalmente míope no sentido de entender o significado da cultura e os caminhos teológicos do Ocidente.

Pois jamais veio a discernir com máxima propriedade o significado do agostinianismo e suas conexões com a nova fé protestante. 

Destarte quando interrogamos nossos irmãos Ortodoxos, inclusive os clérigos sobre a igreja apostólica romana as primeiras coisas que se lhes vem aos miolos são: Filioque, papa e purgatório (!!!) ou o que é ainda pior jejuns, barba e ázimos. O Cristo, nosso Bom Deus nos proteja e salve do mal... Porém a situação que temos é esta, quiçá devido a barreira da lingua: O Latim e o Grego, o inglês e o russo...

Alias quando mencionam Purgatório (O papa copta Shenouda III, por exemplo, cometeu tal erro há alguns anos ao dar uma entrevista - Assim os demais Batraks, Oscufs, Cassis, Rahibs, etc) cometem uma erro primário. Pois na verdade o que foi repudiado no falso concílio de Florença por S Marcos Evgênicos, arcebispo efesino, não foi purgatório e sim a crença num juízo particular definitivo imediatamente após a morte, noutras palavras, que o Cristão tem seu lugar de destino definitivamente estabelecido assim que morre. Quando nossa fé imaculada e pura, estende a esperança da mudança e da conversão para o além túmulo, ao menos até o dia daquele único juízo que é final. E por isso rezamos pelos mortos, não para que os santos obtenham uma melhor ressurreição, mas para que de fato sejam iluminados e atraídos a Cristo no mundo espiritual e invisível - E o contrário disto é para nós heresia.

Portanto, mesmo quando repudiamos a existência de um estado chamado purgatório, não professamos fé em dois estados definitivos logo após a morte - Como os protestantes (Que conseguiram piorar o esquema romano.) - mas mantemos esperança quanto a mudança de estado, quanto aqueles que morreram sem ter dado mostrar de arrependimento, como já foi dito: Ao menos até o dia do juízo final. Quanto ao que sucederá aos maus e impenitentes naquele último dia, não nos informa a fé. Embora os Santos tenham sugerido a aniquilação ou a restauração.

O mesmo Marcos Evgênicos todavia opôs-se também a doutrina maniqueísta do Pecado Original e da Depravação total, concebida por Agostinho e expôs nossa fé no 'Pecado ancestral', tal e qual haviam feito os armênios quando escreveu-lhes o papa romano, creio eu, Bento XII.

E no entanto, apesar de ter assimilado parte das heresias de Agostinho, certo é que a Igreja romana ou o papado também as moderou ou conteve. De fato jamais a IAR chegou a ser plenamente agostiniana e aproximou-se mais do agostinianismo durante a assim chamada 'contra reforma' e o 'Concílio' de Trento, sob o impulso do protestantismo ou aspirando reconquistar os protestantes.

Durante toda Idade média o quanto temos é um estado de ambivalência ou tensão, entre o agostinianismo estrito, o agostinianismo mitigado e o semi pelagianismo antigo. Enfim conflitos.

De modo que o veneno agostiniano demorou praticamente mil anos antes de afirmar-se triunfalmente no Ocidente através da pseudo reforma, particularmente do Calvinismo com sua TULIP. 

Mesmo quando a massa dos apostólicos romanos forceje heroicamente por desvincular seu super padre ou santinho querido, de Lutero, de Calvino e do protestantismo, certo é que o protestantismo primordial outra coisa não foi que uma retomada ou reafirmação - Em máximo gráu. - ou ainda um desenvolvimento do Agostinianismo. E basta ler a obra do erudito Padre Stanislaus Grabowsky para convencer-se quanto a isso.

Quanto a Ortodoxia e a totalidade da Tradição grega ou oriental podemos constatar - Já com L E Du Pin já com Karl Rahner (A graça) que sempre ignorou supinamente tais crenças. Num pecado Original, numa Depravação total, numa predestinação particular restrita, numa graça soberana e numa salvação inamissível ou na impossibilidade da apostasia. Como jamais recebeu o dogma blasfemo da expiação ou o deus mata deus para aplacar deus...

Para nós Ortodoxos, todas essas fabulações do ex maniqueu Agostinho são inaceitáveis, ímpias e sacrílegas e ele jamais se retratou como deveria, haja visto que também rejeitou o dogma da realidade da descida do Senhor ao mundo dos mortos. 

Alias, tendo Jerônimo de Stridon traduzido seus livros sobre a Graça ou o monergismo e divulgado tais livros no Oriente, foi confutado, numa obra ora perdida, escrita por Teodoro de Mopsuéstia. Felizmente uma notícia sobre tal obra - Onde Agostinho é classificado como Maniqueu - na Biblioteca (Mirabiblion) do Patriarca S Fócio, o qual, por sinal, referenda o juízo de Teodoro. 

No próprio Ocidente, Juliano de Eclano, um erudito, conhecedor e tradutor de S João Crisóstomo, pela redução ao absurdo foi conduzindo o obstinado Bispo de Hipona a opiniões cada vez mais radicais, ao menos até as vésperas de sua morte, e sequer podemos imaginar, onde Agostinho, envolvido por essa polêmica, haveria de chegar. Certo é que ao ser informado - Por Juliano - de que S Crisóstomo repudiava a ideia de que as crianças tivessem qualquer culpa, ousou insulta-lo. Enquanto cuidava de atrair a sua órbita (Por meio de cartas.) Cirilo de Alexandria, porquanto este, fazia guerra ao abençoado Crisóstomo. 

Já o poderoso Cirilo, sequer se deu ao trabalho de responder a tais cartas... Por outro lado, quiçá estando informado sobre a objeção do hiponense ao Patriarca rival, sequer considerou denuncia-lo aos Bispos do Oriente, o que a longo prazo mostrou ser uma atitude equivocada - Pois num concílio ou sínodo oriental, tal como Pelágio (Que sendo semi pelagiano era perfeitamente Ortodoxo.) fora justificado em Dióspolis seria ele condenado como maniqueu e posto fora da Igreja. 

A sorte de Agostinho foi ter florescido a um tempo em que o ocidente latino e o oriente grego não mais se comunicavam como nos tempos de Adriano. De fato, naquele tempo eruditos da cepa de um Triboniano de Cyme eram já raros. Quanto ao ocidente, passados uns três ou quatro séculos, estaria extinto o conhecimento do grego, isso ao tempo de Eurígena, Pardalus de Laon e Anastácio; o bibliotecário. Ao tempo de Agostinho já não se reconheciam os dois blocos culturais e o próprio Agostinho sequer conhecia suficientemente o grego elementar. 

Até aqui o posicionamento da Ortodoxia Oriental face aos desatinos do africano filho de Patrício. 

Outro o caso da dita reforma protestante.

Outro o caso da reforma protestante, a qual, seja com Lutero ou Calvino, corresponde ao triunfo do agostinianismo no Ocidente ou ao fim da medida imposta pela igreja papa, a qual foi avaliada pelos reformadores como herética. Para os Reformadores Agostinho era Paulo e Paulo era Jesus...  

É justamente por ter sido dissolvido ou contido, por obra da Igreja papa - Desde seu advento e a cabo de milênio - que não podemos identificar o Agostinianismo nascente como ponto de partida do colapso europeu. Afinal se Roma não chegou a repudia-lo com a firmeza necessária, tampouco deixou de suaviza-lo ou tempera-lo evitando que chegasse a produzir um outro tipo de cultura, ao menos numa escala demasiado larga.

Eis porque sequer o papado do século IX pode ser encarado como adversário da cultura ou da civilização. Superstição ou heresia, como queiram, mas não uma Revolução cultural derivada da apostasia. Pois jamais havia ela abraçado as opiniões do hiponense em sua puridade radical. O crime da igreja Romana, repito, limitou-se a tolerar essa o agostinianismo o qual jamais converteu num Dogma indiscútivel.

Tanto que em algum momento foram condenados, o Padre Lucidius e, por Hincmar de Reims, Gotheschalc. Enquanto Adriano Pighius assumia o semi pelagianismo ao confrontar Calvino pouco antes de Trento, isto para citar apenas um exemplo.

E se os franciscanos penderam para o lado de Agostinho é certo que Tomás e os dominicanos tomaram outra direção.

Agora, com a reforma protestante, é o agostinianismo vindicado pelo monge agostiniano de Wittemberg, mas sobretudo por Calvino e seus sucessores, até Loraine Boettner. 

Por isso optamos por assinalar o protestantismo e não o agostinianismo nascente ou o papado como correspondendo a Revolução primordial ou a uma guinada em termos de espírito.

Mas a que vem isso...

Considere o leitor que quando os monges de Hadrumetum foram informados sobre as opiniões do homem não tardaram a considerar que delas resultaria uma relaxação dos costumes ou uma queda de ideais em termos de virtude heroica. O próprio Pelágio era monde disciplinado e devoto. 

No entanto, como acima registramos, foi o obstinado hiponense colhido pela morte, no auge da polêmica com o piedoso Bispo de Eclano. Não podendo desenvolver - Acolhendo, como acolhia, sem maiores problemas os argumentos de seu douto adversário. - seus princípios nos domínios do pecado e da santidade\virtude. Atreveu-se no entanto (Contra Celestius) a declarar que o homem jamais poderia cessar de pecar durante essa existência, opinião blasfemar a partir da qual Lutero desenvolveu seu conceito de Justo e pecador ou da salvação no pecado. 

De fato, apesar das advertências de Clemente de Alexandria, sobre o abuso do Sacramento da Penitência, por parte daqueles que o recebiam frequentemente sem jamais se emendarem, a disciplina desse mistério se foi alargando mais e mais já no contexto da igreja medieval. O que, ao menos na prática, antecipou a definição Luterana sobre a salvação no pecado.

A partir desse transtorno a própria vida monacal, por impossibilidade de atingir seu fim - Que é a perfeição Ética, se foi corrompendo por todo ocidente. No entanto o grande terremoto ou dilúvio de infidelidade e descrença só se abateu sobre a Europa no momento em que Lutero optou por oficializar semelhante estado de coisas e a proclamar em alto e bom som a salvação vicária ou fácil. E nem fazia qualquer sentido manter a vida monacal, voltada para a perfeição, em semelhante contesto... No momento em que o pecado foi admitido como algo já insuperável, já comum nas vidas dos Cristãos pereceu o ideal Cristão primitivo, ideal que havia formado mártires e monges.

Tal a guinada que até mesmo o celibato passou a ser encarado como anti natural e banido da revelação comunicada por um homem celibatário cuja mãe era Virgem. E tão para baixo foi, o ideal heroico dos primeiros séculos, a consciência e a espiritualidade, que, a partir de Luc Sternenberg, a própria Virgem Maria e o próprio S José cessam de contemplar o mistério sublime da encarnação, para, nascido o menino passarem a cópula. Algo que bem poderia caber no judaísmo anti Cristão, mas que no Cristianismo, deslocado ficará. 

A mensagem do agostinianismo retomado aprofundado e ampliado pelo Luteranismo faz a volta do parafuso: E de tanto insistir no poder da graça, apresenta uma graça fraca, que coexiste com o pecado. E daí resulta, paradoxalmente, um mundo que perde o heroísmo, que abjura dos ideais, e que se vai tornando trivial ou comum, a ponto de ser ultrapassado pelo que havia de melhor no paganismo antigo... Pois essa reforma não fabrica Mucios Scevollas, Cincinatos, Coriolanos, Cléias, Cornélias, etc 

E sem monacato ou santidade heroica desaparece aquela aristocracia da virtude que através da imitação ou da mimesis contagiava a totalidade do corpo de Cristo, exercendo sadia emulação. 

E sem essa mimesis teremos a monotonia, a rotina e a inevitável perda da fé. O que de fato se pode verificar a respeito da sociedade Luterana do século XVI, a começar pelos lamentos do próprio Lutero. Cf J J I Von Dollinger 'A Reforma' 1838 e a História do povo alemão de J Janssens.

Certamente que, a longo prazo, no seio das igrejas Ortodoxa ou romana, poderia ter sucedido uma secularização saudável, mais suave, equilibrada e harmoniosa, e Cristã, que não resultasse em incredulidade, materialismo, ateísmo, místicas naturalistas, etc 

protestantismo no entanto, produziu uma secularização informal e interna permeada pela incredulidade e injetou o materialismo e o ateísmo no seio do Cristianismo, até converte-lo tão externa e aparente como jamais havia sido no seio das velhas igrejas acusadas de ritualismo. 

E quando o luteranismo veio a si, já se havia convertido num valhacouto de pessoas sem fé, a exemplo de D F Strauss ou Bultamann... Isto se deu porque a própria via, aberta por Agostinho (Um homem demasiado crédulo.) e alargada por Lutero, foi via suave, que principiou pela negação do heroísmo até chegar, como já foi dito a monotonia e a rotina da vida natural, sem quaisquer indícios de sacralidade. 

Nenhum comentário: