sábado, 15 de maio de 2010

A história do diabo

No princípio Deus criou os céus e a Terra reza o Gênesis (1,1). O Pentateuco não fala uma única vez em diabo, parece que os autores do Pentateuco sequer sabiam da existência de satan. Mas alguém poderia dizer e a serpente no paraíso, não era o diabo por acaso? Vejamos o que diz o texto vétero-testamentário:


A serpente era o mais astuto de todos os animais dos campos que o Senhor Deus tinha formado. Ela disse a mulher: É verdade que Deus vos proibiu comer do fruto de toda árvore do jardim? (Gn 3,1)

Desde quando o diabo é um animal? O Gênesis não fala de um ser espiritual, de uma entidade incorpórea, mas de um animal e de um animal astuto, e a astúcia era-lhe natural, foi Deus mesmo quem fez a serpente assim.

O leitor ainda pode percorrer todo o Pentateuco de cabo à rabo e não encontrará nenhuma menção ao diabo. E isso só vem a demonstrar que os antigos semitas (judeus e samaritanos) não acreditavam na existência de um adversário de Deus.

A primeira vez que o diabo aparece na Bíblia é no livro de Jó, e neste livro Satanás é como um velho amigo de Deus, que conversa e até faz aposta sobre a integridade do protagonista do livro:


Um dia em que os filhos de Deus se apresentaram diante do Senhor, veio também Satanás entre eles.
O Senhor disse-lhe: De onde vens tu? Andei dando volta pelo mundo, disse Satanás, e passeando por ele.

O Senhor disse-lhe: Notaste o meu servo Jó? Não há ninguém igual a ele na terra: íntegro, reto, temente a Deus, afastado do mal.
Mas Satanás respondeu ao Senhor: É a troco de nada que Jó teme a Deus?
Não cercaste como de uma muralha a sua pessoa, a sua casa e todos os seus bens? Abençoas tudo quanto ele faz e seus rebanhos cobrem toda a região.
Mas estende a tua mão e toca em tudo o que ele possui; juro-te que te amaldiçoará na tua face.
Pois bem!, respondeu o Senhor. Tudo o que ele tem está em teu poder; mas não estendas a tua mão contra a sua pessoa. E Satanás saiu da presença do Senhor.
(1:6-12)

O diabo tal como o conhecemos hoje surgiu na Pérsia, atual Irã, fruto da religião mazdeísta. A religião mazdeísta pregava dois princípios eternos: Aura-Mazda (o deus do bem) e Arimã (deus do mal). Provavelmente os judeus adotaram o diabo por volta do século VI a.C quando foram libertados pelo rei Ciro que era persa.

Na época de Jesus havia judeus que não acreditavam nem em anjos, nem em imortalidade da alma e muito menos em ressurreição, eram os saduceus, os verdadeiros representantes do judaísmo original.

A partir daí o diabo foi evoluindo se tornando cada vez pior, até que se tornou um antideus. Infelizmente dentro do cristianismo surgiram pessoas pessimistas com relação à natureza humana e o diabo foi ganhando destaque, mas o coisa ruim tem o seu destaque mesmo, é no livro do Apocalipse.

Orígenes grande conhecedor do grego, do hebraico e aramaico era universalista e acreditava que no fim dos tempos até o diabo se salvaria. E se disse isso, é porque conhecia as línguas nas quais foram escritos os Evangelhos e podia falar de cátedra. Também, o irmão de Basílio Magno, Gregório de Nissa, pregava que mesmo satã seria restaurado no fim dos tempos (apocatástase).

Infelizmente essa doutrina não vingou por questões políticas e também econômicas e não vingou também por causa do declínio do Império Romano, porque com a chegada da Idade Média, os bispos ocidentais que já não tinham grande cultura, exceção para Ambrósio de Milão e Hilário de Poitiers, perderam o pouco de cultura que tinham.

Com a ignorância dos líderes religiosos da Igreja Latina, superabundou o fanatismo, e era preciso explicar de onde surgiam as doenças, porque havia desgraças, etc... E como não tinham melhor resposta retomaram a figura do diabo, só que um diabo mais cruel do que antes.

E como os padres não sabiam convencer as massas porque eram tão ignorantes quanto as mesmas, sua pregação consistia em três palavras: pecado, diabo e inferno. Somente com o surgimento da escolástica é que a igreja ocidental (hoje conhecida como católica romana) pôde ficar menos fanática. A escolástica foi um avanço, mas mesmo assim, os melhores de seus teólogos não conheciam grego, exemplo disso é Tomás de Aquino.

Já na Idade Moderna surgiu o movimento da Reforma Protestante que veio para piorar a situação, mergulhando o ocidente outra vez no obscurantismo e mais uma vez a figura de maior importância não é Jesus, mas o diabo.

Lutero tinha uma verdadeira obsessão pelo diabo a ponto de dizer que tinha dormido mais vezes com o diabo do que com sua mulher Catarina (Não me perguntem o que Lutero fazia com o diabo).

A Reforma veio para reformar o inferno e o diabo que estavam mais tênue no início da era moderna.

Sempre que o povo perdia a fé não em Deus mas no diabo, surgia uma nova forma de protestantismo assim foi que surgiu o pentecostalismo e o neopentecostalismo que fala em demônio o tempo todo. Os protestantes fundamentalistas (há protestantes liberais que interpretam grande parte da Bíblia como mitos e lendas) mal sabem que o diabo é uma invenção pagã que o judaísmo importou da Pérsia.

2 comentários:

quandoescrevo disse...

Companheiro, muito interessante. Como não fico pensando em coisas do diabo ou mesmo no diabo (rsrs), porque nunca subestimei as capacidades humanas como fizeram, nunca tinha observado suas origens! Tem 'remédio' pra tudo que precisa né!? Tenho é do do Cão... tudo é culpa dele!

Fernando Rodrigues Felix disse...

Que bom que gostou companheira! Fico feliz que meu blog é apreciado por pessoas como você.