quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

Apologia de Galileu


________________ Retrato de Tomás de Campanella


Acabei de ler o livro Apologia de Galileu de Tomás de Campanella, escritor e filósofo que nasceu na Itália em 1568 e morreu em 1639. Mas antes de falarmos do livro falemos um pouco de seu autor.


Tomás Campanella, cujo nome verdadeiro era Giovani Domenico Campanella, com a idade de 15 anos entrou para um mosteiro dominicano. Foi acusado de heresia e passou 27 anos no cárcere. Sua obra prinipal é A Cidade do Sol, onde Campanella expõe em forma de diálogo sua concepção de governo. É uma sociedade teocrática, uma república de filósofos e também comunista.


Dadas as breves informações conversemos o (a) leitor(a) e eu sobre a Apologia de Galileu. Nesse livro, ele segue o método escolástico, um método que para quem nunca leu pode ser maçante. Mas é um método interessante, porque dialético. Primeiro contrapõe as teses de Galileu contra as Sagradas Escrituras (Bíblia) e os Santos Padres (Padres da Igreja, teólogos e escritores eclesiásticos que desenvolveram a teologia cristã e nem sempre eram padres e bispos - o período que abrange sua época é do século I até o século VII). Depois defende Galileu com a mesma Bíblia e os mesmos santos padres.

Ele mostra que o problema de Galileu foi desmentir Ptolomeu e Aristóteles, principalmente o último que era a base de toda a vida eclesiástica até então. Tomás de Camapanella demonstra que Aristóteles quando falou do céu e da astronomia, falou daquilo que ouviu e não daquilo que observou ao passo que Galileu fala daquilo que observou e não daquilo que ouviu. Campanella ainda diz que Aristóteles deixa a questão em aberto para quem souber mais acerca dessas questões, as celestes, é claro. O autor ainda afirma que mesmo um santo pode errar em matéria de ciências e demonstra o erro dos santos padres em questões geográficas e astronômicas.
Nesse livro, Campanella parece não demonstrar muito respeito pelo estagirita. Mas na verdade o que o autor pretende é que os homens sejam livres para examinar o mundo observável independente da Igreja e dos filósofos antigos. Ele demonstra que o homem é ser curioso e investigativo e que nossos conhecimentos não são nem perfeitos nem completos. E investigar o mundo -segundo Campanella - e o universo não é heresia uma vez que não atinge os dogmas da Igreja. E mesmo que daí surgisse um erro referente às ciências em nada afetaria os ensinamentos da Igreja. Ao ler este livro, Campanella me lembrou Os MNI - Magistérios Não Interferentes - ou seja a ciência tem o seu campo e a igreja o seu, mas ambos os setores devem dialogar. O Autor da Apologia de Galileu era um homem muito avançado para sua época.
Fico imaginando que bela defesa da Teoria da Evolução não faria Campanella se vivesse na época de Darwin!
Deixo uns breves textos interessantes do livro Apologia de Galileu referente à ciência e ao papel da Igreja. Estou certo de que o (a) amigo (a) leitor (a) vai gostar.
Ei-los:
"Portanto afirmamos corretamente que sem ciência nem mesmo um santo pode julgar corretamente".
"Contra aqueles que combatem as ordens religiosas cap 11
Se alguém - afirma Sto. Tomás - ignorando a matemática, escrevesse contra os matemáticos, ou não sendo um perito em filosofia, contra os filósofos, quem não zombaria disso mesmo que, ao zombar, pudesse incorrer ele na zombaria?".
"Ó deuses imortais - diz Terêncio - nada mais injusto que um ignorante, que não reconhece nada de correto senão aquilo que lhe agrada".
"Nem o santo Moisés, nem o Senhor Jesus nos revelaram a física e a astronomia, mas Deus entregou o mundo à indagação dos homens a fim de que seu intelecto contemplasse , através das coisas criadas, os mistérios de Deus. Eles, ao invés, ensinaram a viver bem e as doutrinas sobrenaturais, para as quais não era suficiente a nossa natureza".
"Os modernos - diz Platão - não são inferiores aos antigos, a não ser pela inveja e pela veneração dos mortos".
De fato, jamais se lê no Evangelho que Cristo discutisse assuntos de física e de astronomia, mas assuntos morais e promessas de vida eterna, cujo caminho nos abriu através do exemplo, da doutrina e do sacrifício supremo. De resto isso teria sido supérfluo. Se, de fato, desde o princípio, Deus entregou o mundo às discussões dos homens a fim de que, por meio das coisas criadas, se esforçasse e o conhecessem e, a fim de que pudéssemos fazê-lo, infundiu-nos uma mente racional e abriu-lhe, como se fossem janelas, cinco sentidos como vias para a indagação, como ensina o apóstolo Pedro de acordo com São Clemente, pelas quais contemplasse o mundo, imagem de Deus, e admirasse aquilo que este encerra e buscasse o seu artífice, Deus. O que também o próprio Crisóstomo explica no comentário ao salmo 147 e em outros lugares, visto que não fomos privados do que é natural por causa do pecado original, como todos os teólogos confirmam, portanto seria supérfluo se aquele que veio para nos redimir dos nossos pecados nos ensinasse também o que devemos e podemos aprender por nós mesmos. por isso nem ordenou aos apóstolos ensinar essas coisas mas batizar e ensinar o que ele mesmo havia feito e ensinado e de comprová-lo com os milagres e martírio. Portanto Bernardo, no sermão sobre Pedro e Paulo, diz: os apóstolos não me ensinaram a arte da pesca ou a de fabricar tendas ou coisas do gênero; não me ensinaram a ler Platão nem a desfazer as artimanhas de Aristóteles, etc., mas me ensinaram a viver. Igualmente, São Clemente, no livro I dos Reconhecimentos introduz Barnabé, que interrogado por um filósofo romano sobre porque o pernilongo foi dotado pela natureza de seis pernas, enquanto o elefante tão grande apenas de quatro respondeu que tinha recebido nos mandamentos de Cristo o ensinamento sobre o reino dos céus e não sobre as coisas da natureza, que podem ser investigadas naturalmente. Os apóstolos nem mesmo rejeitaram a filosofia, dado que Cristo antes elogia os fariseus que prediziam pela observação do céu a chuva e a estiagem, embora os condene por não terem, do mesmo modo, conhecido a partir das Sagradas Escrituras o tempo do advento do Messias, como lamenta também Jeremias".
"Toda seita ou religião que proíbe aos seus seguidores a investigação das coisas naturais deve ser julgada suspeita de falsidade, visto que a verdade não contradiz a verdade... nem o livro da sabedoria de Deus Criador [a natureza] contradiz o livro da sabedoria de Deus revelador; quem teme ser contradito pelos dados da natureza está consciente da própria falsidade".


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