quinta-feira, 27 de fevereiro de 2020

Notulas sobre o pensamento medieval

- Após as invasões germano/árabes, as simples escolas e instituições educativas clássicas desapareceram. Que dizer então de uma Filosofia agonizante? Doravante a reflexão Filosófica será posta a serviço da Teologia Católica ou Ortodoxa, enquanto tentativa de se compreender racionalmente os elementos da fé Cristã. Enquanto atividade autônoma, iniciada mil anos antes pelos gregos a Filosofia chega ao fim.

- Julgo jamais ter existido uma Filosofia escolástica. No entanto diversos problemas de ordem filosófica foram postos e examinados no contesto da Teologia escolástica, sem que a profundidade da reflexão ficasse comprometida.

- O primeiro teólogo Cristão a servir se largamente da Filosofia clássica foi S Clemente de Alexandria, a quem devemos a transcrição de cerca de trezentos fragmentos clássicos, doutro modo perdidos. Seu exemplo foi seguido por Orígenes, famoso escolarca alexandrino, por Eusébio de Cesárea e outros, até S João Damasceno, primeiro expositor a fazer uso de Aristóteles e guia, por assim dizer de Tomás de Aquino.

- Parte dos cristãos ocidentais ou latinos, mais afeitos a gramática ou a arte retórica bem como as instituições do direito romano, chegou a nutrir sérios preconceitos contra o manejo da Filosofia pelos crentes, do que temis exemplo no 'anti teológico' Tertuliano.

- A principio Agostinho assimilou o pensamento Oriental, chegando a compor uma obra contra os académicos, há muito comprometidos com o ceticismo. Posteriormente no entanto, toda sua concepção de mundo é sua teologia foram afetadas pela queda do Império Romano ou pela Invasão de Roma por Alarico. Desde então assumiu ele uma posição maniqueísta, deturpando o conceito de pecado ancestral, negando o livre arbítrio, afirmando a predestinação e construindo um sistema próprio chamado agostinianismo ou grafismo o qual serviu de base ao luteranismo e ao protestantismo de modo geral. Tal sistema é pessimista da antropologia a epistemologia, havendo alguma evidência disto ja nas Confissões. Com efeito está a Agostinho nas bases de - Al Achari, Al Gasali, Ockhan, Lutero, Montaigne, Jansenio, Pascal, dos 'tradicionalistas', de grande parte dos neo conservadores e de outros tantos irracionalistas.

- Devemos ao Cristianismo histórico, Católico, Ortodoxo, tradicional ou episcopal, em termos de literatura a conservação de parte significativa da produção clássica compilada pelos monges da Assíria a Irlanda. Em termos de Ética a retomada ou conservação do ideário humanista/reformista proposto por Sócrates e Platão, o que foi constatado tanto por um Nietzsche quanto por um Werner Jaeger. Em termos de gnoseologia realista um certo apego  velha tradição aristotélica bem como a metafísica grega tradicional. É o quanto nos liga ao mundo antigo, enquanto elemento de continuidade. Neste sentido a Igreja histórica ou antiga é como que um cordão umbilical que ainda nos liga a Cultura clássica.

- O falacioso conceito agostiniano de pecado original, com toda sua carga de pessimismo, remete nos a queda ou a morte do Homem grego romano enquanto ideal/padrão posto pela cultura, assim ao trauma ou impacto produzido por esta queda. A falência dos projetos Socrático e Aristotélica, ao cabo de quase mil anos, não podiam deixar de repercutir no ideário dos Cristãos iletrados do Ocidente produzindo um paradigma negativo.

- Não poderia nem pode o islã produzir qualquer contribuição ao pensamento Filosófico. No entanto, a princípio - Tal e qual os judeus a partir de Aristóbulo e Filon - Continuados no decorrer da Idade Média por Avicebrom e Maimonida - e os já citados padres Cristãos - não podiam os muçulmanos, instalados na orla do Mediterrâneo ou nos domínios do Império Persa, permanecer impermeáveis ao patrimônio cultural clássico. Ali instalados quase que de pronto foi o pensamento Filosófico introduzido por convertidos Cristãos (Ou mesmo por clérigos Assírios, Siríacos, Coptas e Bizantinos) ou Zoroastrianos resultando em duas vertentes rivais: A Mutakallim ou Alh al Kalãm e a Mutazila. A primeira, representada por Al Isfaraini 'Ostad' fazia uso da Filosofia com o objetivo de compreender ou justificar o sentido tradicional dos elementos da fé. A segunda, representada por Ibn Ubayd e pelo próprio Averróis (Ibn Rodh), adotou um posicionamento mais crítico, buscando soluções de compromisso bastante ousadas.

Ao cabo de três séculos foi a Mutazila condenada pelos líderes religiosos e teólogos ortodoxos do islã como uma contaminação ou poluição grega e classificada como heresia. Por fim no século XI, Al Achari e Gazali, usando de material grego fornecido pelo ceticismo ou pelo agostinianismo - E antecipando Ockhan, Lutero e Kant - atacaram já a percepção, já a razão em benefício da fé cega, assim dos livros e profetas. O que se seguiu após eles foi uma inquisição feroz... O remanescente dos Mutazilas refugiou-se em Al Andaluz junto aos últimos Umayas, onde em pouco tempo veio a extinguir-se cedendo espaço a estreita ortodoxia sunita. E como diz Reilly o pensamento racional e livre jamais tornou a renascer no seio do Islã, prova de que era de fato um elemento exógeno, em oposição a cultura árabe ou semita. Possivelmente Averróis foi o único Filósofo situado no contesto islâmico.

- A Teologia escolástica de modo geral não sufocou o exercício Filosófico, antes estimulou o mesmo quando o fazia convergir para outro fim e o subordinada à outra área do saber. Penso na Escolástica como um período de gestação ou ventre, em que foi gestada a Filofosia moderna, novamente senhora de si.  O próprio Descartes não foi capaz de romper por completo com esta tradição, embora como Filósofo da Natureza ou epistemologo científico buscasse já por um.novo critério ou padrão.

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