quinta-feira, 27 de fevereiro de 2020

Nótulas sobre a Filosofia antiga ou clássica.

 - Diversos autores teem classificado os jônicos (Pré socráticos), até Anaxágoras, como monistas materialistas, pelo simples fato de terem buscado saber qual fosse o elemento primordial (Arkhé). Talvez fossem dualistas e para eles a existência de um elemento diretor Imaterial/intelectual não passasse duma obviedade.

- Uma coisa é certa. Pitágoras foi o primeiro a enfocar um elemento estrutural abstrato. Quiçá sua teoria não tenha sido bem compreendida a seu tempo. Seja como for ele parece ter antecipado Descartes, Newton e Einstein no sentido de afirmar que nosso universo possui uma estrutura matematicamente inteligível.

- Podem chorar os pós modernistas e todo rebanho de céticos, relativistas e subjetivistas, o princípio de 'Não contradição' expresso por Parmênides de Elea continua sendo para a Filosofia o que a alavanca era para a Física de Arquimedes. Por isso Aristóteles declarou que os maiores vultos do pensamento anterior a Sócrates haviam sido Parmênides e Anaxágoras, concordo.

- Anaxágoras não excluiu nem poderia ter excluído o elemento material, alias eterno. Realista por definição considerou que aquele elemento era inerte ou passivo por carecer de inteligência e por isso enfatizou a ação do elemento intelectual/Imaterial ou Espiritual sobre o elemento material ou caótico, o qual ciclicamente reorganizava, conforme já havia sido descrito pelo não menos genial Anaximandro. Quiçá o Apeiron e o Nous sejam termos similares.

- Heráclito foi quem forneceu base a Protágoras de Abdera, o qual repudiava a apreensão da verdade por parte do intelecto por julgar que o fluxo da natureza fosse demasiado fugaz. Quando o homem cuidava ter apreendido determinada impressão, já esta se havia convertido em qualquer outra coisa.

- Demócrito não foi pré socrático mas contemporâneo tanto se Sócrates quanto de Platão. Provavelmente foi ele o primeiro materialista, bem como o primeiro a analisar a moralidade humana, antecipando o trabalho de Sócrates.

- Sócrates foi um dos primeiros, senão o único (Mas recordo Carneádes e Epicteto), filósofo de origem humilde. Até seus dias era a Filosofia exercício das elites, executado entre as paredes de alguma Escola e sob a direção de escolarcas bem remunerados. Havia assim uma espécie de monopólio ou segredo. Sócrates foi quem pela primeira vez levou a Filosofia a praça ou as ruas de Atenas, colocando-a no acesso do grande público ou de todos. Sua atitude crítica face aos tabus e preconceitos vigentes foi encarada como perigosa pelos proprietários, sacerdotes, militares e pelos conservadores de modo geral. Anito, Melito, Licon e Diopeites moveram-lhe processo e fizeram-lhe entornar a cicuta sob a acusação de ter corrompido a juventude, pelo simples fato que que a fizeram pensar... Tudo muito atual.

- Platão tentou superar a tensão - Universal/particular ou Repouso/movimento, tradicionalmente posta pelo pensamento grego e disto resultou sua Teoria das formas representada pelo 'Mito da caverna'. É citado como idealista no sentido de imaterialista ou espiritualista, todavia ao que parece o seu 'mundo das ideias' não era isento de materialidade física.

- Como Newton, Aristóteles teve seus pés postos sobre os ombros largos de um Aristócles (Platão) e por isso elaborou uma teoria das formas bem mais realista e consistente além de ter especulado sobre todas as áreas da Filosofia e mesmo do que viria a ser chamado 'Ciência'.

- Pirro, o primeiro cético, tomou sua doutrina ou melhor postura, ao Budismo quando com Alexandre, o grande, vagava pelos confins da Índia. A epokhé ou anulação da vontade, conduz ao Nirvana que é a Ataraxia ou Apatheia. A princípio - Apud V Brochard - tentou Pirro dar aplicação prática a sua doutrina, disto resultando diversos acidentes. Diante disto converteu-se ela em simples negação de qualquer ideal metafísico e os céticos em conservadores por definição. O ceticismo com efeito afirmou-se no mesmo exato momento em que o ideal político dos antigos gregos entrou em colapso após a morte de Alexandre, durante as guerras empreendidas pelos diádocos e epígonos.

- Quiçá epicurismo e estoicismo, se bem compreendidos e despidos dos possíveis extremismos não sejam inconciliáveis pelo simples fato do sofrimento físico ou corporal ser quase sempre compensado por um outro tipo de prazer, interior ou da consciência, sempre que cumprimos com nossos deveres e exercitamos a virtude. A virtude é quase sempre deleitosa ao ser racional, mesmo quando o corpo físico seja esmagado pela dor.

- Nos últimos séculos antes desta Era o aristotelismo havia dado origem a doxografia e aos estudos gramático literários em Alexandria e Pérgamo, bem como a pesquisa científica a partir de Teofrasto de Éreso e Straton de Salônica ou Dikaiarkos de Messina. Foi trágico que por volta do século I a C esta corrente se esgotasse e cedesse passo, primeiramente ao platonismo. O platonismo a seu tempo de releitura a releitura chegou ao neo platonismo e através deste a simples teurgia i é a magia. Isto no exato instante em que outros tantos cultos de mistério, como o mitracismo, o orfismo, o serapismo, etc invadiam o mundo greco romano. Toda uma cultura de massas, de comboio na miséria e instabilidade social, precipitou as multidões nos abismos do misticismo... Nem mesmo os pensadores ficaram indiferentes a este movimento de convergência, disto resultando um continuo e sucessivo declínio em termos de pensamento filosófico. Sendo inútil evocar causas externas ou lançar a culpa no dorso do Cristianismo emergente. Tudo estava decidido e decidiu-se ao cabo do conflito platonismo/aristotelismo e a derrota deste último enquanto padrão de pensamento realista favorável já a ciência já a um raciocínio vigoroso. Vencido o aristotelismo/realismo ficou selado o destino da Filosofia clássica já porque não podia o platonismo deixar de receber outros significados e enquanto neo platonismo de resistir a tempestade mística em formação.

- Resta declarar que nos primeiros séculos desta Era o predomínio do neo platonismo em todas as Escolas nos obriga a dar o exercício filosófico como agonizante e esta magistral criação do espírito humano as portas da morte. Pois em lugar de Parmenides, Anaxágoras, Anaximandro, Pitágoras, Aristóteles ou Dikaiarkos o que temos é a triste figura de um Jâmblico praticando puro e simples wiccanismo e dedicando-se a pressagiar o futuro...

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