sábado, 8 de abril de 2017

O problema do materialismo, do formalismo politico e da Cultura

Ao nobre amigo A A.


Não, não é a produção econômica apenas que confere estabilidade a uma Sociedade qualquer e encaminha seus destinos. O bom e velho K Marx que nos perdoe. Longe de nós negar a relevância deste fator na Sociedade Moderna. Todavia bem pode ser que nem sempre tenha sido assim e que o economicismo e o materialismo não tenham imperado desde sempre.

Nem lhe podemos atribuir de modo geral e absoluto, o ligamento da coesão social. Alias a Sociedade capitalista não é nem um pouco coesa mas fragmentária, contraditória e caótica. Vivemos numa Sociedade não em conflito, mas em conflitos e inúmeros conflitos que emergem de todos os setores. Pois não há um centro coordenador, e nem mesmo o todo poderoso Sr Mercado tem conseguido assumir este lugar com habilidade.

Setores há que permaneceram e permanecem irredutíveis e elementos culturais opostos que permanecem flutuando pelo ar ou servindo de pavimento aquilo que flutua...

Perdoem-nos os amigos leninistas e fascistas mas tampouco o elemento politico - Mesmo numa perspectiva policratica (i e da democracia direta) - satisfaz plenamente esta exigência. A autoridade politica pode manter a estrutura civilizacional ou social viva por algum tempo ainda e prolongar-lhe a existência, mas não poderá salva-la caso não recupere sua essência.

Não, meus adorados e queridos amigos materialistas, formalistas, estruturalistas, funcionalistas, etc vocês não estão aptos ou capacitados para salvar nossa civilização decadente pelo simples fato de ignorarem as causas mais remotas do declínio. Prolongam sua agonia, mas não podem reconcilia-la e redimi-la, porque o diagnóstico é superficial e esta errado.

A redenção não virá por meio de sedições, levantes, revoluções, ditaduras, inquisições, censuras, punições, exércitos, guerras, policias, armas, etc O testamento de Spengler é roteiro de morte e não de vida.

Simplesmente não poderão salva-la e quando tiverem de recorrer a tais expedientes externos e coercitivos fiquem sabendo que a civilização já morreu e já se desagrega, e decompõem. Talvez esteja ainda no estádio intermediário da anabiose e possamos faze-la tornar a vida. Oxalá assim seja! Mas temos de agir com perícia e da maneira certa, a exemplo do medico que injeta adrenalina na cavidade do coração e o faz bater novamente ressuscitando o organismo.

O coração não bate...

Tens de colocar espírito ali, tens de injetar ideias, tens de investir na cultura, porque a cultura é o cerne e a alma da civilização. E ela apenas é que pode manter uma sociedade coesa, integra-la e conferir-lhe alguma estabilidade em torno de princípios básicos, elementares e comuns.

O materialismo, o formalismo, o estruturalismo, o funcionalismo não nos salvarão, porque mistificam as verdadeiras causas e jamais tocam as fontes desta crise. Antes são outros tantos sintomas causados pela crise.

Ceticismo, naturalismo radical, teocracia, extremos...

Tudo isto é desagregação de uma sociedade que perdeu o seu ponto de equilíbrio ou harmonia passando a uma tensão extrema.

Vou tomar o vocabulário do Filósofo, do perípato, do estagirita.

Matéria e forma. Sim, matéria e forma.

O politico e o econômico, correspondem a matéria. Tem grande importância, concedo aos marxistas e fascistas facilmente. Mas sozinhos e isoladamente não podem solucionar nossos problemas porque não constituem a fonte da cultura ou a fonte mais dinâmica da cultura.

A forma é que determina a matéria.

A ideologia ou a crença, é que dinamiza a produção da cultura.

As fontes da cultura - morram positivistas - estão antes de tudo na Filosofia e na Religiosidade, na epistemologia, na ontologia, na metafisica, na ética, nas grandes confissões religiosas. Elas é que conferem unidade e consolidam as estruturas sociais. Elas é que coordenam e integram os demais elementos. Elas é que ditam o 'sentido'. Elas e que dão forma as organizações politicas e econômicas. Elas é que inspiram as ações humanas.

Por trás de todas estas estruturas sociais, políticas e econômicas com sua alta complexidade existe algo que lhes confere determinação. É como um corpo animado por um espírito e exercitado ou trabalhado pela mente. Se você cuida apenas do corpo, que será dum corpo saudável e belo preenchido por uma mente tosca? E se o espírito foge a este corpo belo e saudável como haverá de conservar a vida? Sem pensamento, ideia, crença, cultura enfim, esta morto o organismo e posto a desagregação. E nada poderá salva-lo.

É a mentalidade, o pensamento, a ideia, a crença que confere unidade, coesão e sentido a personalidade humana. Enquanto elemento coordenador. É a cultura que confere unidade, coesão e sentido ao ser social.

Bosquejar apenas pelo corpo desta civilização ou sociedade sem compreender-lhe o espírito, sera sempre tempo perdido. É necessário sim estudar as formas políticas, a produção de bens, a estrutura, a organização, etc sem no entanto por de lado a cultura e negar-lhe a prioridade.

Ser culturalista e por o dedo no fundo da ferida.

Porque ao fim da Idade Media lá estava ainda a estrutura, em sua maior parte mantida. E foi preciso um evento ideal para provocar uma ruptura traumática, liberar as forças que até então estavam contidas e produzir um novo modelo de organização social. Foi a partir da Reforma protestante que as estruturas da nossa sociedade começaram a ser reelaboradas num sentido capitalista e democrático formal. Foi aqui a mudança de direção. O ponto nevrálgico da Era.

Interagiram ali a produção econômica e a crença religiosa, solidariamente, pois esta última era ainda muito forte e sua forma conflitava com as forças acumuladas. As forças que ali estavam acumuladas, presas e contidas precisavam criar um novo tipo ou versão do Cristianismo, alterar a fé, a idealidade, a doutrina, a ética... Para empenharem esta nova versão em seu favor, afirmar-se materialmente, iniciar a transformação das estruturas, demolir o antigo e produzir novos princípios e valores. O espírito do capitalismo precisava da Reforma protestante para tomar corpo e a reforma protestante, a seu tempo, contava com a força desse espírito para abalar até os fundamentos a igreja rival... Temos aqui uma simbiose. Mas podemos dizer que o papel da Reforma foi crucial.

Dai a atualidade e premência das pautas socialista e católica, inseparáveis. Urge retomar ao menos alguns valores deixados para trás após o fim da Idade Media, assim o trabalhismo, assim o catolicismo, aos quais adiciono a democracia direta; pois tratam-se de elementos solidários. Ligados por afinidades eletivas. A um lado temos expressões do individualismo e a outro expressões do solidarismo. E um lado mínimo índice de consciência social e a outro um elevado índice...

No entanto o elemento fundamental ou basilar é, acreditem, o Catolicismo, pelo simples fato de ter contido o espirito do Capitalismo, ao menos até a explosão da reforma, quando as coisas saíram totalmente do controle, e tomaram uma nova direção, correspondendo a um novo projeto

O protestantismo foi o grande responsável pela afirmação do capitalismo e ambos, juntos e associados, produziram uma cultura diferente. Novos princípios, valores e ideais em oposição a antiguidade e a Idade Média. A partir de então forjaram-se novas estruturas sociais correspondentes. Na medida em que o novo Cristianismo dócil e conformista, pela fé somente buscava refugiar-se no alto dos céus, foi o liberalismo econômico ocupando seu espaço aqui na terra e esta colaboração nos ajuda a compreender a marcha acelerada desta ocupação.

Como em certas Sociedades a monarquia - e não sou monarquista - a nobreza e o Catolicismo - e quem o diz é Hobsbaw, conseguiram travar sua marcha por certo tempo e influenciar seu ritmo até hoje. E nem sabemos a que ponto teríamos chegado, cogita o mesmo autor, se estes elementos, aquele tempo conservadores, não tivessem buscado conter aquela situação revolucionária. Acabaram falhando e sendo triturados, mas atrasaram a marcha do sistema.

Caso queiramos nos reencontrar temos de principiar revendo tudo isto e ponderando detalhadamente.

Caso não cheguemos a reforma protestante. Caso não lancemos um olhar mais crítico e questionemos os princípios, valores e ideais lançados pelo protestantismo no século XVI, bem como suas fontes ideológicas, estabelecendo uma arqueologia de ideias, nosso trabalho será sempre infecundo e a civilização virá a morrer, infalivelmente, miseravelmente. Imagine o Império romano as vésperas do século V. Os bárbaros estão as portas...

Nossa situação não é diferente - Temos bárbaros no Ocidente e no Oriente, animados por seus livros ou sagas religiosas... Temos milionários brincando com essas forças e dançando a beira do abismo. Temos revolucionários dispersos. Temos ideólogos confusos. Temos diagnósticos a rodo. Mas também sabemos que o Catolicismo hodierno esta tão enfermiço e capenga quanto o velho império romano... Temos de ficar cônscios e plenamente cônscios a respeito dos males que acometem o Catolicismo se acreditamos que ele pode salvar esta civilização. Um catolicismo doente não salvará sequer a si mesmo!

Os antigos romanos haviam chegado ao fim do percurso extenuados e sem meios, e confusos. Mas nós chegamos ao limite das forças ainda com meios e com pleno conhecimento das causas. Temos esperança! De sermos lidos e compreendidos.

Refleti com serenidade:

Só podemos salvar uma casa arruinada fortalecendo seus alicerces.

Se o alicerce estiver fraco, fragmentar-se e ficar abalado, a casa virá abaixo, certo?

Você não pode manter uma construção qualquer após seu fundamento te sido retirado ou abalado! Não há como fazer isto.

Do mesmo modo e maneira só podemos restaurar a civilização e vencer a crise repondo cada coisa em seu devido lugar e na base esta o Catolicismo, continuação do socratismo e do aristotelismo antigos e plasmador de nossa cultura ancestral. Se substituir este elemento espiritual por qualquer outra coisa, a construção toda virá abaixo. Estamos assistindo este desabamento há meio milênio! Mas a construção em seu conjunto ainda não veio abaixo.

Temos de repor ou restabelecer o fundamento, mas sabendo que ele precisa ser reforçado. Tem de ser o original!

O que remete como já dizemos ao problema do Catolicismo, que é crucial.

Retomar o espírito do Catolicismo, eis nosso programa de ação e educação. Programa formativo!

Mas atentemos: Não do neo catolicismo agostinizado e luteranizado (protestantizado) mas do Catolicismo antigo e medieval. Não o da inquisição mas o do direito natural e liberdade de consciência. Não dos misticos e misticismos mas da doutrina social. Ou renovamos os mesmos erros e não avançamos.

É na direção da comunhão estética do beneditismo, da Ética franciscana, da escolástica dominicana, do humanismo jesuíta que temos de ir para restaurar todas as coisas em Cristo e iniciar a reconstrução da cidade de Deus, abandonada desde os calamitosos tempos da reforma protestantes.

Se após a Encarnação do Deus Jesus Cristo você, meu amigo, ainda cogita em construir a cidade do homem e da carne em termos puramente materiais, ou seja, por meio do exército, da inquisição, da guerra, do poder, da autoridade politica, etc lamento mas labora em erro e esta equivocado.

Lamento, leia com atenção a magistral 'História da queda do Imperio romano' de E Gibbons bem como 'A queda do Império romano e suas causas'  de Sismondi e constate que o Catolicismo - não o papismo ou papado que não existiam - com seus princípios e valores humanistas análogos aos do platonismo/socratismo é que abalou o Imperio romano, contribuindo bastante para sua destruição. Se você sonha com um novo Império romano pautado nos mesmos princípios ante Cristãos e anti humanos, ele tornará a ser derrubado pela mesma fé e doutrina. A menos que caia por si mesmo ou seja destroçado pelo islã... E a partir daí escravidão maior e mais abjeta.

Após a Encarnação de Deus em Jesus Cristo, patriarca e mestre do humanismo, a única construção solida, consistente, estável, resistente e eterna é a construção do reino de Deus ou seja de uma civilização inspirada nos princípios e valores do Catolicismo e animada por homens regidos livremente pela lei do Evangelho.

Civilização de que Bizâncio foi o mais pálido reflexo, e cujo programa foi abandonado no decorrer da Idade Media, particularmente após o advento do protestantismo. Momento em que o novo Cristianismo neo platonizado perdeu seu sentido e significado social.

Quem não ajunta com Cristo dispersa. Quem não opera com ele opera contra ele. Quem não soma forças com ele e com ele colabora esta fadado a derrota.

Para tanto o Catolicismo, ao contrário de seu oposto, o protestantismo, precisa revigorar-se, precisa brilhar... Precisa de Liberdade, para concorrer em pé de igualdade com as demais fés e suplanta-las espiritualmente, pelo poder do espírito, da coerência e da verdade. Pelo mérito enfim.

E o Catolicismo por ser divino tem consciência e certeza de sua capacidade e de que pode sair vencedor numa situação de disputa intelectual e doutrinal com as demais religiões. Disputa de que saíra revigorado e fortalecido.

Se você nega esta oportunidade ao Catolicismo, de enfrentar 'sozinho' ou melhor, com sua forças, as outras crenças, é porque de fato encara-o como igual a elas, descrendo de sua superioridade divina ou de sua qualidade intrínseca, então não tens fé e não és católico ou filho da igreja. Existe meio Cristianismo, vai ao protestantismo e o verás! Mas jamais existirá meio Catolicismo ou meio atanasianismo. É da fé nicena chegar sempre as últimas consequências.

O divino e transcendente não precisa de adjutórios humanos. Não se apóia sobre a cana quebrada! Não precisa de bengala ou arrimo!

É bem verdade de Liga francesa mergulhou a França num total estado de anomia. Apenas porque a maior parte dos Católicos - especialmente dos mais broncos e tolos - apoiados pelo Papa e a alta cúria, adotaram o método errado, o método da força e da repressão policial; e não o método preconizado por nossos sábios, da luta ou combate espiritual por meio de disputas, debates, diálogos, etc Do contrário nossa fé teria saído vencedora e triunfante e o protestantismo suplantado. Mas ao invés de estudar o Evangelho a luz da tradição da Igreja e de buscar a luz dos Santos Padres e doutores dos primeiros séculos e da Filosofia, os maus católicos preferiram, a exemplo dos infiéis, recorrer a espadas, chuços e vara paus. Consequências???

A longo prazo o protestantismo triunfou, infectou e destruiu a igreja romana... Obteve a vitória! Porque as armas escolhidas pelos Católicos foram as piores.

Precisamos sim duma organização semelhante a Liga Francesa ou ao Partido leninista, mas como queria Marx, como instituição educativa e formativa destinada a produzir uma cultura católica de resistência e controvérsia. Precisamos alimentar a consciência Católica anti protestante e apologética por meio do estudo não de socos e ponta pés.

A cidade de Deus se constrói não com espadas, lanças, bombas, metralhadoras, etc seus tijolos são as virtudes do amor, da esperança, da verdade, da beleza, da justiça, da fidelidade, etc Com que edificamos seus pavimentos e paredes incorruptíveis. É inspirando um ideal de justiça inegociável que se confere estabilidade a uma Sociedade qualquer (Platão, Confúcio, etc). A qual sem justiça desaba fragosamente, esmagando Imperadores, reis, ditadores, presidentes, cônsules, sufetes, etc Quem introjeta este ideal inabalável é o Catolicismo.

Por fim a que vem ao caso o espírito e as fontes do protestantismo???

Precisamos conhece-los tanto quanto conhecemos o Catolicismo, este para amar, aquele para odiar e sobretudo para distinguir com absoluta precisão uma coisa da outra. E não tomar Catolicismo por protestantismo ou professar um Catolicismo desfigurado, obscurecido e adulterado.

Pois se você assume o ideário da RCC esta laborando assumindo um ideário pentecostal introduzido la igreja pelos protestantes e portanto laborando contra o Catolicismo e alimentando um câncer espiritual. A RCC é de origem recente. Mas há coisa anterior a ela e em certo sentido pior.

Então se você professa involuntariamente princípios de são protestantes, ainda assim alimenta o espírito protestante e sabota nossa fé.

Precisa conhecer tais princípios para honorificar o Catolicismo em sua pureza e afastar-se deles.

Como será possível firmar o Catolicismo se flerta com o paulinismo e o agostianismo que estão na base mesma da rebelião protestante???

Pois o Catolicismo é certamente bem mais joânico e em certo sentido até jacobino, do que paulinista. E certamente semi pelagiano, e não agostianiano.

A reforma sim corresponde ao último triunfo e canonização do agostinianismo. Ideologia que a igreja antiga jamais deveria ter tolerado e por cuja tolerância paga duramente!

Não podemos ser carismáticos, judaizantes, paulinistas e agostinianos e o mesmo tempo Católicos da escol ou paladinos da sã doutrina.

Digo o mesmo a respeito da doutrina maniqueista da corrupção total da natureza humana ou da depravação ainda que leve e especialmente no que toca as habilidades da razão e do livre arbítrio furiosamente negadas por Lutero e Calvino.

Tampouco podemos postular, num sentido místico e individualista, qualquer tipo de acesso individualista e imediato ao Cristo. O qual não passe pela igreja enquanto extensão de Encarnação de Cristo e portanto pelos Sacramentos, pela comunhão dos Santos, pelas boas obras ou a vivência. Afinal o individualismo, a negação da igreja visível e o desprezo pela comunhão dos Santos e pelas obras são outros tantos carácteres do protestantismo em oposição da fé Católica.

O Católico reconhece diversas mediações criadas e materiais assumidas pelo Cristo em decorrência do mistério da Encarnação: A Eucaristia, a Virgem, os Santos, as Imagens, etc e sobretudo a vida ética ou prática. São tais elementos que nos franqueiam acesso ao divino Mestre e a sua comunhão. Se resta alguma mística só pode ser concebida dentro deste quadro geral e em conexão com tais elementos.

Importa saber que a fidelidade estrita a tradição e ao espírito Católico, nesta hora de conflito e crise, exige coerência absoluta. Temos de reconhecer quais sejam os elementos protestantes e nos desvencilhar deles para começar a sanar o Catolicismo e em seguida nossa Civilização, retomando a produção da cultura e imprimindo-lhe um caráter humanista.

O protestantismo, declara Dalle Nogare, é matriz do anti humanismo. Pois abate o homem e desclassifica-o... questionando suas aptidões e habilidades. O Catolicismo não... por ele e nele a graça divina assenta-se sobre a natureza. Natureza por essência boa e apenas levemente afetada, quanto a vontade, pelo exemplo dos ancestrais.

Portanto eu vos exorto carinhosa e amistosamente a questionar todos os elementos e principios do protestantismo.

Congratulações!



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