segunda-feira, 28 de junho de 2010

Apoio Mútuo uma outra forma de como a evolução funciona

Como tenho visto tanto no mundo virtual como no mundo real pessoas defendendo o darwinismo social, decidi que era hora de saber quais eram os mecanismos pelos quais funciona a evolução e também entender os conceitos de Darwin. Decidi ler então a obra de Kropoktin: Ajuda Mútua: Um Fator de Evolução.

Kropotkin tinha as mesmas inquietações que muitas pessoas tem hoje acerca do darwinismo e por isso decidiu elemesmo pesquisar, viajar e colher informações para desmascarar não o darwinismo mas o darwinismo social.


Kropotikin escreveu:

Quando a guerra atual começou, envolvendo praticamente toda a Europa numa terrível batalha e quando – naquelas partes da Bélgica e da França que foram invadidas pelos alemães – essa batalha assumiu uma escala nunca vista de destruição em massa da vida de civis e de pilhagem dos meios de subsistência da população em geral, “a luta pela vida” tornou-se a explicação favorita daqueles que tentaram achar uma desculpa para esses horrores. Um protesto contra tal abuso da terminologia de Darwin apareceu então numa carta publicada pelo Times. Essa carta dizia que tal explicação era “pouco mais que uma aplicação à filosofia e à política de ideias inspiradas em grosseiros mal-entendidos da teoria darwinista (de “luta pela vida” e “vontade de poder”, “sobrevivência dos mais aptos” e “super-homem”, etc.)”; mas que havia uma obra em inglês “que interpreta o progresso biológico e social em termos não do exercício da força bruta e da astúcia, mas de cooperação”.

Por isso, mais tarde, quando as relações entre o darwinismo e a sociologia me chamaram a atenção, não pude concordar com nenhuma das obras e panfletos escritos sobre esse tema tão importante. Todos eles tentavam provar que os seres humanos, devido à superioridade de sua inteligência e de seus conhecimentos, podiam mitigar entre si a dureza da luta pela vida. Mas, ao mesmo tempo, todos eles concordavam que a luta pelos meios de subsistência, a luta de todo animal contra seus semelhantes, e de cada ser humano contra todos os outros, era uma “lei da Natureza”. Eu não podia aceitar esse ponto de vista, porque estava convencido de que admitir uma implacável guerra interna pela vida no seio de cada espécie – e ver nessa guerra uma condição de progresso – era admitir algo que não só não havia ainda sido provado, como também não fora confirmado pela observação direta.

Infelizmente o darwinismo surgiu como desculpa para a eugenia, nazismo e como suporte para o capitalismo. Mesmo sendo hipóteses totalmente desacreditada ainda tem gente que cita o darwinismo social como se fosse um fato mais que provado.

Kropotkin queria desmascarar essa teoria anti-humanista das guerras e do individualismo e creio que o conseguiu de modo brilhante.

Vejamos então o que demonstra o ilustre pensador:

No que se refere aos besouros, temos casos comprovados de ajuda mútua entre os besouros-cavadores (Necrophorus), que necessitam de matéria orgânica em decomposição não muito adiantada para depositar seus ovos, pois é dela que suas larvas se alimentam. Por isso, esses animais enterram os cadáveres de todas as espécies de pequenos animais que encontram em suas perambulações. Em geral, levam uma vida isolada; mas, quando um deles descobre o corpo de um rato ou de um pássaro que não tem condições de enterrar sozinho, a solução é chamar quatro, seis ou dez outros para um esforço conjunto. Quando necessário, transportam o cadáver para um solo macio adequado e o enterram de forma muito “estudada”, sem disputas sobre qual deles terá o privilégio de depositar os ovos nesse cadáver. E, quando Gleditsch amarrou um pássaro morto a uma cruz feita com dois gravetos, ou suspendeu um sapo numa estaca enfiada no chão, os besourinhos combinaram suas inteligências da mesma maneira fraterna para superar esse artifício humano. A mesma combinação de esforços foi notada entre os besouros rola-bosta. Pág 25

Pois é, se não tivessem se associado já teriam perecido há muito tempo. O que será que diriam os darwinistas sociais acerca desse respeito, que os insetos "quebraram a lei da natureza?".

O ilustre pensador anarquista escreve:

Quanto ao grande caranguejo das Molucas (Limulus), impressionou-me (em 1882, no Aquário de Brighton) a extensão da ajuda mútua que esses animais desajeitados são capazes de dar a um semelhante em caso de necessidade. Um deles tinha virado de costas num canto do tanque e sua pesada carapaça em forma de panela o impedia de voltar à sua posição normal, ainda mais porque havia nesse lugar uma barra de ferro que dificultava as coisas. Seus camaradas vieram resgatá-lo e, durante uma hora, observei o empenho que faziam para ajudar o companheiro. Eles vieram imediatamente, empurraram o amigo por baixo e, depois de muito esforço, conseguiram virá-lo para cima; mas a barra de ferro os impedia de realizar o resgate e o caranguejo voltava a cair de costas. Depois de muitas tentativas, um dos ajudantes foi ao fundo do tanque e trouxe dois outros companheiros que, descansados, deram início ao mesmo processo de empurrar e levantar seu camarada impotente.
Desde então, não pude deixar de aceitar a citação que li da observação do dr. Erasmus Darwin, segundo a qual, “durante a época de muda, o caranguejo comum que ainda não passou por ela e continua com sua carapaça monta guarda para impedir que inimigos marinhos ataquem indivíduos que estão desprotegidos no meio do processo”. Págs 25 e 26

Os darwinistas sociais ou são ignorantes ou mal-intencionados; se são ignorantes devemos alertá-los. Caso sejam mal-intencionados devemos desmascará-los e mostrar a todos como são falaciosos seus argumentos.

Exemplos de ajuda mútua entre as térmites, as formigas e as abelhas são tão conhecidos do leitor leigo, principalmente por meio das obras de Romanes, L. Büchner e John Lubbock, que posso limitar meus comentários a umas poucas alusões. Considerando um formigueiro, observamos não só que todo o trabalho realizado – criação da prole, busca de alimento, construção, cuidados com os pulgões, etc. – segue os princípios da ajuda mútua voluntária, como também devemos reconhecer, como Forel, que a característica básica da vida de muitas espécies de formigas é o fato e a obrigação de cada uma delas de compartilhar sua comida, já engolida e parcialmente digerida, com todos os membros da comunidade que a peçam. Duas formigas que pertencem a espécies ou a formigueiros hostis se evitam ao se encontrarem por acaso; mas, se elas pertencem ao mesmo formigueiro ou à mesma colônia, aproximamse, comunicam-se trocando alguns movimentos de antenas e, “se uma delas está com fome ou sede, em particular se a outra estiver bem alimentada [...], imediatamente pede comida”. O indivíduo a quem a solicitação é feita nunca recusa; abre suas mandíbulas, adota uma posição apropriada e regurgita uma gota de fluido transparente, que é lambida pela formiga faminta. O regurgitamento de comida para doação é um aspecto tão marcante na vida das formigas (em liberdade), e ocorre tão frequentemente – tanto para alimentar camaradas famintos quanto as larvas – que, para Forel, seu tubo digestivo consiste em duas partes diferentes, uma das quais, a posterior, é para o uso específico do indivíduo, e a outra, a anterior, é principalmente para o uso da comunidade. Se uma formiga bem alimentada for egoísta a ponto de recusar alimento a um camarada, será tratada como um inimigo, ou ainda pior. Se a recusa for feita durante uma luta com outra espécie, a fúria das companheiras recai sobre a avarenta com maior ímpeto do que contra os próprios inimigos. E, se uma formiga não se recusar a alimentar outra pertencente a uma espécie inimiga, será tratada como amiga pelos parentes desta. Tudo isso é confirmado pela observação mais precisa e por experimentos decisivos.

Parece que no mundo dos insetos não reina "a luta pela sobrevivência" nem tampouco "a sobrevivência dos mais aptos" como nos querem fazer crer os darwinistas sociais que nada entendem nem de biologia, nem de filosofia e tampouco de economia.
Ainda sobre as formigas escreve Kropotkin:

Nessa imensa divisão do reino animal, que engloba mais de mil espécies e é tão numerosa que os brasileiros dizem que o Brasil pertence às formigas, e não aos homens, não existe competição entre os membros do mesmo formigueiro ou da mesma colônia. Por mais terríveis que sejam as guerras entre espécies diferentes, e quaisquer que sejam as atrocidades cometidas nessas circunstâncias, a ajuda mútua dentro da comunidade, a abnegação mútua tornada hábito e, muito frequentemente, o autossacrifício pelo bem comum são a regra. As formigas e as térmites renunciaram à “guerra hobbesiana” e passam muito bem, obrigado. Pág 27

Para não cansar o leitor, vou dividir este artigo, assim tenho a certeza de não ser cansativo e de ser lido pelo amigo leitor.

Um comentário:

Ravick disse...

Muito bom, Félix, estou ansioso pra começar a ler este livro. Mas eu devo fazer uma crítica:

"Parece que no mundo dos insetos não reina "a luta pela sobrevivência" nem tampouco "a sobrevivência dos mais aptos""

Na verdade, reina: As formigas que cooperam entre si são irmãs e, ao não competirem, elas permitem que a sua mãe, a rainha, tenha outras ninhadas, e, dentre elas, também ninhadas de formigas sexuadas (ou seja, outras rainhas e machos).

As formigas são "comunistas" porque elas estão lutando pelos seus genes, que estão na rainha. Elas dedicam a vida pelo bem da colônia porque disso depende a continuidade da espécie.

E formigas são também famosas por viverem guerreando. Na minha infância de guri nerd, uma diversão das férias era sair por locais com matas ou dunas procurando formigas e cupins que estivessem combatendo. Certa vez tive a sorte de ver algo fantástico: Dois exemplares soldados de uma espécie grande formiga que ocorre aqui em SC se encontraram em cima do muro de casa. Eles então começaram a lutar, e o vencedor partiu o perdedor em dois e o atirou muro abaixo. As duas eram da mesma espécie, mas provavelmente de colônias diferentes. Note que elas são agressivas contra competidores, mesmo que da mesma espécie.

Isso, porém, não serve de argumento pró darwinismo social, posto que não há absolutamente porque agirmos da mesma forma que os insetos agem. A bem da verdade, a cultura e a inteligência permitem ao ser humano escapar dos rigores da natureza. Deveríamos, isso sim, é pensar em como melhorar a vida de todos.

Porém, ao contra´rio das formigas, somos de uma espécie onde todos potencialmente têm filhos. E, por isso, temos naturalmente tendências egoístas, pois nossos filhos (genes) devem prevalecer. Creio que é esse instinto irracional que lava a racionalizações capengas como a do darwinismo social.