sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

A história de Sam

Dedico esta história a minha querida amiga Simone Abreu, uma das pessoas mais humanas que conheci no mundo virtual.

Para início de conversa esta história é verídica, não vou dizer como muitos por aí, que é uma história baseada em fatos reais, porque todos os fatos são reais, não existem fatos irreais.
Anteontem fui passear pelos sebos da cidade vizinha e como de costume fiquei horas à fio no sebo e não me dei conta do horário. Fui até o ponto de ônibus e tomei o coletivo, assentei-me num banco da frente e folheava os livros que tinha acabado de comprar. Termina aí a minha curta história e se inicia a história de Sam, o protagonista da história que vou contar.

Atrás de mim estavam duas senhoras conversando, como o tom era mais ou menos alto, pude ouvir e prestei atenção porque o diálogo era deveras interessante. Vou tentar reproduzir a conversa do modo que ouvi, confiando assim em minha memória.
- Como vai o Sam?
- Ele está bem, agora ele toma gadernal para controlar os ataques.
- O que é gadernal?
- É um remédio para controlar os ataques que ele tem.
- Antes ele ficava na rua para brincar, mas agora não pode porque ele além de ter ataques está cego. (até aqui eu pensava que se tratava de uma criança ou de um adolescente).
Foi o veterinário que passou esse remédio e o Sam vai ter que tomar pelo resto de seus dias.
- Coitadinho.
- Quando eu chego em casa ele faz a festa, mesmo cego e doente, ele bate a cabeça na parede devido à cegueira.
- Então você nem pode sair, viajar?
- Não. O Sam para mim é como um filho, cuido dele, levo-o ao veterinário, etc... Antigamente, eu passava os fins de semana na casa de meu filho, e deixava alguém cuidando do Sam. Meu filho não gosta dele, mandou eu sacrificar o Sam, dizendo que esse cachorro é um peso porque está velho e doente. E que se eu mandasse sacrificar, eu teria minha liberdade de volta. Então, eu lhe disse, e se fosse eu que estivesse velha, doente e cega, você mandaria aplicar a eutanásia em mim que sou sua mãe? Não queira se comparar - continuou o meu filho - com esse saco de pulgas! Sabe, isso me entristece.
- Ah, mas seu filho é jovem, depois ele aprende.
- Jovem nada tem 32 anos, é casado e tem uma filha.
- Toda vez que ele vinha a minha casa, ele dizia que a fábrica de sabão agradeceria se eu sacrificasse o Sam. Falei para o meu filho, não fala isso, porque Deus pode lhe castigar. E ademais você não é amigo do Sam, mas o Sam é seu amigo, ele gosta de você, mesmo você não gostando dele. Eu nunca vou abandonar o Sam, não vou sacrificá-lo, vou cuidar dele até o fim, e se um dia eu não puder cuidar dele, vou procurar uma ONG ou alguém que possa cuidar dele para mim. O Sam é meu amigo, nunca me abandonou. Você alega que eu não viajo que não aproveito a vida, saiba que o Sam não é um peso, sou muito feliz por cuidar dele. Quando ele era saudável, quando era filhote você gostava dele, se lembra?
- Ah é, também acho que quem maltrata animais pode ser castigado por Deus.
- Eu tenho tanto medo de sair, deixar o Sam sozinho, porque o médico me disse que ele pode ter um ataque cardíaco a qualquer momento. Mas o veterinário sempre me fala que o Sam é um vitorioso, porque venceu a cinomose, e mesmo tendo esses ataques e a cegueira, ele tem muita vontade de viver.

Aqui fechei o livro pus na sacola plástica junto aos outros, levantei-me e toquei o sinal para descer no próximo ponto. Olhei para a simpática senhorinha, disse-lhe que fiquei comovido com sua história e que partilhava em grande parte de suas opiniões e por fim disse-lhe que o mundo seria bem melhor se todos pensassem como ela acerca desse aspecto. Despedi-me e desci em meu ponto, admirado e feliz por saber que podemos aprender tantas coisas numa breve viagem de ônibus.

A história que contei é verdadeira, o diálogo aconteceu mais ou menos assim, minha memória selecionou apenas aquilo que achou essencial, portanto o relato em sua essência é verdadeiro, embora o diálogo seja verossímil.

4 comentários:

Unknown disse...

Meu amigo, q história linda! Fui quase às lágrimas. Vou divulgar.
Um grande presente de Natal vc me deu. Me reconforta saber q existem outras pessoas tão humanas quanto essa Simone Abreu (rs) q vc citou. Sério, qdo sei de pessoas q se comovem e compadecem dos seres de 4 patos, q externam seu amor incondicional por qlqr forma de vida, tenho certeza q são humanas de verdade.
Obrigada por me presentear com uma história tão tocante!

Ravick disse...

Caríssimo Félix,

devo dizer que, além dos textos agradáveis, inteligentes, e de tamanho certo (nem tediosamente extensos, tampouco prosaicamente curtos), seu blog hoje, me fez retomar a fé na bondade das pessoas. Oxalá todas as pessoas vissem seus cães como essa senhora.

Aliás, sobre seu filho, de 32 anos, não me surpreendo. Não falo pejorativamenmte, mas tenho percebido que, por mais que as mulheres é que tenham fama de impulsivas, impiedosas e de gostarem de coisas mais fúteis (sei que vc não vai gostar de ler isso, posto q é feminista (=P), mas não mintamos que não há esse pensamento geral), costumam ser, a partie de certa idade, muitíssimo mais sábias do que a maioria dos homens, espcialmente em lugares mais pobres, onde os homens têm de sujeitar a rotinas de muito trabalho, muita praticidade, pouco pensar e pouca sensibilidade. É por isso que eu meio que "desculpo" o filho dela (muito embora preferisse sacrificá-lo ao Sam...)


Permita-me, postar isso:

"Na história do mundo há somente uma coisa que o dinheiro não compra que é o abanar do rabo de um cachorro". (JOSH BILLINGS)

Anfilóquio de Fayum disse...

Obrigado Sissi, e creia-me se escrevi esse texto em sua homenagem é porque você merece. =)

Anfilóquio de Fayum disse...

"Na história do mundo há somente uma coisa que o dinheiro não compra que é o abanar do rabo de um cachorro". (JOSH BILLINGS)


Disse tudo!!!!!