terça-feira, 3 de agosto de 2021

Terça do pânico - "A crônica do futuro." (Conto de horror) I

Não sei se alguém lerá isto.

Não sei se alguém traduzirá isto.

Não sei se alguém encontrará isto.

Nem sei porque registrei isto...

Tudo quanto sei é que acabo de depositar todas estas memórias, não apenas as minhas, mas as memórias coletivas de Boivrax neste cubo plasmatrônico...

Pois em questão de alguns maviris (dias) talvez Boivraz cesse de existir... E, obviamente, eu com ele.

E tudo quanto posso registrar é que sequer passou um mísero Batoun ou cem Kalinis... 

Pressinto, no entanto, que nossa civilização - Apesar de seus milhões de Batouns - chegou ao fim. 

A própria espécie encontrasse ameaçada pela extinção. Embora fossemos orgulhosos até a arrogância. Sem que se completasse um mísero Batoun.

O que me parece evidente é que nós Boivracianos desprezamos nossa História e fizemos vistas grossas ao passado. Desde que Tnak expôs seu modelo de pensamento ao tempo de Tinéias, o emir; acreditamos ter começado a pensar... 

O que não passou de um triste engano: Desprezar as tradições ancestrais como coisa inútil e vã...

Os antigos já nos haviam advertido sobre o que pudesse estar oculto por trás das portas e sobre os rituais necessários para mante-las seladas. 

No entanto passadas dezenas de Batoun surgiram dois grupos entre os nossos: Os que concordavam com as advertências e que julgavam que as portas jamais deveriam ser abertas, sob quaisquer alegações e os que acreditavam que podiam ser abertas, caso houvesse necessidade e com o uso de emblemas. Nossa família sempre pertencera a esta última corrente...

Ao menos algumas situações justificavam a prática de entrar em contato com os ancestrais ou para evocar os que haviam partido, desde que os emblemas de poder fossem usados. Afinal, juntamente com aqueles poderes benfazejos, haviam outras forças, outros seres, outras entidades; que precisavam ser afastadas, e mantidas distantes deste mundo. 

Portanto o controle exigia que toda e qualquer iniciativa nesse sentido fosse aprovada pelo grande Conselho e, somente após termos ouvido os anciãos era permitido deliberar. 

Em seguida os sacerdotes deviam ser purificados e portas do tempo precisavam seladas e santificadas conforme o ritual. Desde que as coisas assim fossem feito não haveria quaisquer riscos.

Meu pai Anéstor filho de Pinakes ensinou-me a empregar os emblemas, como havia aprendido com seu pai e este com o pai dele, e assim sucessivamente por milhares e milhares de Batouns, desde quando Órion e as Pleíades eram jovens! De modo que tudo se sucederá regularmente.

Como líder do colégio sacerdotal aprendi bastante cedo a usar o Triangulo de Unias, o Círculo, as relíquias, a prece de Krizanias, o justo; e a oficiar as cerimônias. Mesmo sabendo que não havia sido autorizadas desde Ziousudras, o piedoso. 

Foi quando sob a influência do perverso Tnak, ao tempo do fraco Tinéias II, surgiu um novo modo de pensar, em tudo oposto da tradição. Tal a seita dos científicos.

Desde então os jovens passaram a ignorar todas as cerimônias, a desprezar os emblemas e a clamar por investigações livres. Até revindicarem livre acesso ao poço do espelho...

A princípio os sucessores do estúpido Tinéias tentaram conter os jovens por meio da violência, determinando que fossem suspensos no muro. Apesar de meu bisavô, Perakis, e alguns outros terem recomendado meios pacíficos com que, se possível, convence-los. Os reis no entanto se foram tornando cada vez mais violentos, graças ao apoio dos radicais, que condenavam todo e qualquer acesso ao poço do espelho, declarando que deveria ser entulhado.

Desde então, graças a perseguição, um número cada vez maior de cidadãos passou a questionar não apenas as tradições mas a própria Akité, coisas que jamais havia sido vista em Boivrax.

Sentido-se fortes os adeptos de Tnak, já na terceira geração, passaram a revindicar o controle do poço do espelho, até então controlado pelos sacerdotes. E como fosse aquela situação insustentável estourou a guerra entre modernos e os sectários, cabendo a derrota a estes últimos ao cabo de oitenta kalinis. 

Desde então foi instaurado o grande laboratório em torno do poço e os sacerdotes todos despojados de sua dignidade. Pois segundo os Tnakianos esta nova Era pertencia a ciência e a liberdade, não a superstição. 

Segundo pude ler no Cubo plasmatrônico legado por meu avô, os modernos ou científicos, mesmo contra a lei, principiaram a manipular as vidas da terra e submete-las a dor - Embora Tibor - Seja Tibor devotamente louvado! - o tivesse expressamente proibido no Varta! Ao recomendar que o sangue do pequeno povo jamais fosse derramado e que exercitássemos a compaixão para com eles. 

A gente de Tnak no entanto afirmou que Tibor jamais havia existido, que o Varta não passava duma coleção de preconceitos toscos, que a Akité era duvidosa e que eles mesmos eram a lei suprema e tudo podiam fazer, tendo em vista o bem dos boivracianos. 

De fato em poucos anos anunciaram a cura de diversas enfermidades, o acesso a Betelgeize, a fabricação de carne, a criação das cúpulas atmosféricas, o transporte imediato... Passando a contar com a simpatia de quase toda gente. 

No entanto jamais cessaram de verter sangue, de submeter a dor as vidas da terra e é claro de manipular o poço sem a devida precaução...


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Continua na próxima quarta feira.  


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