domingo, 28 de janeiro de 2018

Exigências filosóficas e educacionais em torno de um Catolicismo consciente e de qualidade -

"Penso alias que o Cristianismo do futuro virá a ser constituído por um agrupamento de elites. O HOMEM COMUM SERÁ SEMPRE INCAPAZ DE ASSIMILAR ESTA SUPREMA TOTALIZAÇÃO DO MUNDO." Rahner, Karl in 'Viagem aos centros da terra' Horia, Vintila - Verbo, 1972 p 107
 
 
 
O erro de Nina Rodrigues

           Nina Rodrigues - um afro descendente alias - errou gravemente ao declarar que o Catolicismo consciente - com sua alta teologia - era inacessível a nossos negros em função de serem negros i é da raça ou da etnia.
           Qualquer explicação ou teoria que apele a critérios raciais será sempre pífia, artificial e simplória. O racismo implica falta de imaginação e imensa miséria intelectual. Segundo G Santayana e Arnold J Toynbee os alemães, luteranos, forjaram essa xaropada a partir da crença dos judeus na eleição, transplantada ao Cristianismo pela reforma protestante - devido a sua predileção pelo antigo testamento face ao novo (Aqui Maurois - História da Inglaterra) - e mais tarde secularizada. A simples sugestão de terem, eles alemães, merecido a graça divina da reforma protestante bastou para engrandecer-lhes o ego. Eram o Novo israel ou povo eleito, superior a todo os outros.

Errou pois Nina Rodrigues seu alvo, mas não podemos dizer que errou feio. Talvez tivesse chegado a periferia da Verdade e quiçá acertado o alvo caso tivesse levado em conta a situação sócio cultural dos nossos negros, a qual era uma situação de miséria extrema e, consequentemente de falta de instrução. E podia ter dito o mesmo sobre nossos índios e nossos brancos pobres, que não faria qualquer diferença.

Se há uma coisa que o Catolicismo não é e não pode ser é religião de Massas isto pelo simples fato de que as massas incultas e grosseiras não podem assimilar-lhe a beleza dos mistérios e a profundidade da teologia (quanto ao 'Catolicismo' romano ou ocidental excluo as ridículas doutrinas da graça - graça/gracismo - e das penas eternas, que são absolutamente bárbaras e grosseiras, aqui a Ortodoxia e o alto anglicanismo levam franca vantagem!).

Por isso ao ser professado pelas massas incultas o Catolicismo torna-se logo popular ou folclórico assumindo uma feição totalmente diversa de sua feição original e divina. No passado, entre a gente simples do campo, sucedeu algo nesse sentido. Limitou-se porém a certas formas externas e simbólicas já presentes na cultura ancestral pagã, da qual o Catolicismo apossou-se com o objetivo de transmitir sua mensagem. A bem da verdade a gente do Campo em sua maior parte jamais ultrapassou os rudimentos da fé. Sempre alimentou-se de leite, jamais de alimento sólido ou consistente. E no entanto a dinâmica social do campo, que é lenta, conservadora e tradicional, assegurava a manutenção daquele padrão religioso... E enquanto assim foi os Catolicismos puderam sentir-se seguros.

O povo das cidades é mais irriquieto. Multidões de tontos para lá confluem e formam bolsões de massas... E essas fermentam, dando origem a versões degeneradas da fé, assim o Catolicismo popular.


O Catolicismo popular ou degenerado é um culto grosseiro e fetichista em torno de bonecos pintados... Floresce onde quer que hajam massas incultas, no campo ou na cidade. O do campo porém é por tradição submisso, o citadino pode se tornar mais resistente.

Seja como for, podemos definir o Catolicismo autêntico como uma reflexão em torno do Mistério da Encarnação de Deus e suas decorrências, o qual depende necessariamente de uma farta educação Filosófica, clássica e escolástica, sem a qual fica sempre embotado ou frustrado. Da mesma maneira como a formulação teológica dos elementos da fé, implicou por parte dos antigos padres, a assimilação do conteúdo filosófico oferecido pela antiguidade clássica, a apreciação de tais fórmulas ou de tal reflexão demanda certa afinidade com aquela tradição filosófica.

Para o Cristão Católico estudar a Filosofia perene, os clássicos, o pensamento antigo jamais será ocioso.

Ele passa e deve passar pelo vestíbulo ou pórtico da Filosofia. A um lado a compreensão do Catolicismo exige todo um arcabouço intelectual ou preparo. A outro nossa fé estimula e não pode deixar de estimular uma formação cuidadosa e integral em termos de educação. Formar homens para o Catolicismo é formar homens fartamente instruídos e integramente formados.

E esta necessidade de uma educação vigorosa em termos de Catolicismo, suscita e coloca diante de nós um terceiro problema -

Afinal um tal projeto educativo supõem uma sociedade muito bem estruturada, em que prevaleça qualidade de vida não a miséria.

Falemos em termos de tempo - Um tal projeto educativo formativo demanda tempo... Implica que as pessoas trabalhem menos ou que crianças e jovens não trabalhem de modo algum, aprendendo apenas. Uma educação de qualidade não pode ser feita as carreiras, educação feita as carreiras é esta educação formal, meramente tecnicista e acrítica feita para o Mercado. Este tipo de educação não esta de modo algum de acordo com o ideal Católico. Este homem sumariamente educado pelo Mercado e para o Mercado jamais logrará compreender os mistérios da Fé Católica. Por outro lado uma educação humanista e totalizante não poderá deixar de suscitar diversas críticas ao mercado.

Por isso nosso modelo educativo não passa da superfície. Por isso não desmassifica. Por isso jamais emancipa a pessoa humana. Letramos apenas... fornecemos um conteúdo básico ou sumário as pessoas e é o quanto bastará para encaminha-las, como veremos, ao sectarismo protestante ou ao pentecostalismo, que é um sistema irracionalista - i é imensamente pobre em termos de racionalidade - e voluntarista, pelo aspecto do fetichismo. Massas sumariamente instruídas ou letradas jamais poderão assimilar os mistérios do Catolicismo, mas, tampouco se conformarão em viver uma religiosidade demasiadamente determinada... Julgando-se livres e impulsionada por seus interesses precipitar-se-ão nos braços das seitas da prosperidade.

As condições sociais produzidas pelo liberalismo econômico em termos de miséria, injustiça, angústia, desespero, revolta, frustração, ignorância, etc constituem o meio ideal para a proliferação do pentecostalismo. Afinal trata-se de um sistema religioso do qual o mistério e os elementos da Filosofia foram completamente expurgados, e isto a ponto da razão ou da racionalidade ser formalmente repudiada e do pensamento clássico ser condenado como diabólico por sua conexão com o paganismo antigo. Em tais condições o Catolicismo, a menos que mutile a si mesmo, e se reduza, e assuma novas formas de compromisso sempre perigosas, estará sempre em desvantagem.

O homem dos campos, por tosco que fosse ainda podia sentar-se a porta da choupana ao cair da noite, contemplar o céu azulado, fixar seu olhar nas estrelas distantes e refletir a seu modo sobre Deus e a alma... O homem que vive na cidade moderna, sob a sombra dos arranha céus, tem o firmamento sobre si sempre cinza. Chega semi morto a casa e busca dormir, apenas para despertar e tornar a trabalhar no dia seguinte. Nascer, crescer, casar, procriar, trabalhar, descansar, tornar a trabalhar, descansar, tornar a trabalhar... é tudo quanto sabe fazer. Este homem não tem muito tempo para pensar e refletir. E quando lhe sobra algum tempo é natural que busque anestesiar a si mesmo por meio de alguma distração ou diversão. Natural que se dirija a uma taberna, a um baile, a um circo, etc e não a uma Igreja Católica cujo ritual sóbrio e simbólico não foi concebido para 'alivia-lo'. Então onde irá este homem desencontrado do século XXI??? Irá a pseudo Igrejas que reproduziram a mesma atmosfera irracionalista ou emocionalista da taberna, do bar, do baile, do show - Irá a um culto pentecostal onde pessoas repetem palavras de ordem, gritam saltam e fazem piruetas, saindo de lá aliviado, por ter exteriorizado toda sua revolta! Mas, como disse o culto divino Católico não serve para nada pelo simples fato de ser um culto divino e não uma forma de terapia. Ele não foi feito para que o homem esmagado pelas forças impessoais do Mercado exteriorize sua revolta... Não é o culto feito para este ambiente desumano.

O Catolicismo, ao contrário do que dizem muitos apologistas ineptos, seja dito para sua honra, não foi feito para ambientes desumanos. Para sua glória neste ambiente naturalista, economicista e materialista, que não é o seu, agonizará e morrerá. AQUI O SUPREMO PARADOXO DO CATOLICISMO, OU FIEL AO SENTIDO DAS OBRAS, TRANSFORMARÁ O AMBIENTE EM QUE VIVE OU SERÁ DESTRUÍDO POR ELE.

Conviver e viver num ambiente de ignorância e miséria produzido não pela natureza mas pela maldade humana, alias de pessoas que se dizem Cristãs, não poderá. Enganam-se assim os milhões de 'meio' Católicos ou de pseudo católicos que acreditam poder nossa fé conviver pacificamente com o novo mundo produzido e governado pelo Capital ou pelo Mercado. Este mundo foi produzido com o apoio do protestantismo para deleite e desfrute do protestantismo, o qual corresponde a uma forma muito menos imanente ou encarnada de Cristianismo. A uma forma solifideista, descarnada e neo platônica... Irracionalista... Imediatista... Emocionalista. Todos estes elementos encontram-se na Sociedade do capital e na nova forma de 'cristianismo' produzida na Alemanha.

A ideia segundo a qual o Catolicismo possa ou deva conviver socialmente ao lado da miséria e da ignorância é uma ilusão, uma triste ilusão a mais insidiosa de todas as falácias... Elas degenerarão a fé Católica e corroe-la-ão a semelhança de um câncer. Eis porque as massas se protestantizam/pentecostalizam e como venham talvez a islamizar-se. Perdendo nossa cultura toda sua vitalidade. Não a cultura do capital, mas a autêntica cultura Católica, da totalidade, do espírito, do sentido, da vitalidade... a qual morre não morre, desde o século XVI.

De fato nossas massas alienadas pelo mercado, incultas e barbaras, e exasperadas e revoltadas não estão no acesso do Catolicismo (exceto deste Catolicismo modernista e degenerado que assimilou elementos protestantes e sua 'espiritualidade' irracionalista) e sequer no acesso de formas religiosas mais evoluídas como o espiritismo ou o budismo - As massas são feitas e estão postas antes de tudo para o pentecostalismo com sua imensa pobreza. Querem um show, não uma liturgia. Querem milagres, não uma doutrina social. Querem gritar chavões, não assimilar uma ética. Querem vestir camisas com frases bíblicas, não viver o compromisso da fé. Querem bailar, dançar e cantar, não compreender. Querem fugir, não transformar... Recuam decididamente para o céu ou o além túmulo. Aspiram por catástrofes apocalípticas... Assumem um derrotismo instintivo e esperam que este mundo seja consumido pelas chamas!

Não creem, como Lutero não acreditava, numa graça vitoriosa, capacitante ou triunfal, mas numa graça fraca sob o judo do pecado e num homem sempre curvado e fragilizado. Sua soteriologia é pessimista... sua antropologia é pessimista... sua escatologia é pessimista, pois não creem na recuperação do mundo ou no triunfo final do Evangelho. Elas não acreditam que a encarnação de Cristo esteja em fase de ampliação ou expansão na Igreja. Creem no recuo ou refluir da apostasia. Tal a fé ou a cultura dos protestantes assumida por uma multidão de Católicos incoerentes. Os quais aprenderam a conformar-se com o mundo, ao invés de lutarem heroicamente contra ele e conquista-lo e cristianiza-lo.

Nem mesmo a altura dos cultos africanos - nos quais a presença intelectual é igualmente mínima - estão nossas massas produzidas e alimentadas pelo capital. também os cultos afro não tem grande chance de expansão devido a seu elevado conteúdo ritual e simbólico que este homem vulgar de 2018 já não pode assimilar. O simbólico causa mal estar a este homem, pelo simples fato de não poder compreende-lo (Kenneth Clark)

O homem massificado sequer consegue compreender a linguagem estética da arte numa perspectiva clássica, com desenhos e adornos que ele, filho de um século utilitário, julga ociosos. Eis porque o modernismo assumindo a este utilitarismo imposto pelo mercado ou de origem economicista empobreceu a própria arte. Desde então nossas casas e móveis deixaram de ser arte ou de conter algo de artístico, prevalecendo o critério funcional das linhas... Tudo é linha e apenas linha. Tudo é forma geométrica e nada mais, pois a única coisa que importa é a função do objeto. No entanto como disse Theóphilo Gautier - "Se tem utilidade ou uso não é arte.". Por isso nossas joias são obras de arte, porque não tem utilidade alguma... O nível de barbaria é tanto que para este homem desumanizado a própria existência da arte tornou-se supérflua. Jamais tivemos tantos doentes mentais como nos dias de hoje, apesar de termos superado o maniqueísmo e o puritanismo do século XIX... Neste caso porque continuamos enfermos? Talvez porque trabalhemos em demasia... Talvez porque a insegurança em termos de trabalho e estabilidade econômica nos encha de angústia... Talvez porque negando a existência de Deus tenhamos perdido o sentido... Talvez porque já não contemos com o 'conforto' da contemplação estética do belo através da arte... Certamente graças a cada um desses fatores.

Insisto, sequer o islã xiita esta a altura deste homem desumanizado e despersonalizado, e profanado pelo liberalismo econômico. A miséria dos corpos contaminou e atingiu a alma abandonada a suas próprias forças, este homem que é apenas vontade numa perspectiva fetichista alimentada pelo desespero será pentecostal...

A Igreja não esta apta, e jamais estará, para concorrer com o pentecostalismo em seu ambiente. Mudará o ambiente segundo sua ética, conforme seus princípios e valores, a luz do Evangelho e da tradição dos padres ou ficando frustrada, esvaziar-se-a. Os Católicos sinceros, inda que mal orientados, esperam algo de concreto do Catolicismo, teem a intuição de que ao contrário do protestantismo nossa fé e mais do que uma fé... Intuitivamente ainda identificam o Catolicismo como uma Lei, a lei de Jesus Cristo, e portanto como um elemento que inspira e comanda todos os setores da existência e da atividade humanas. O Catolicismo certamente nos abre as portas do céu, mas desde que mantenhamos nossos pés sobre este mundo, em conexão com o próximo, com o semelhante, com o irmão, buscando servi-lo concretamente e minorar seus sofrimentos. Ser Católico sempre será, em última análise, saber identificar-se e compadecer-se. Não se tratá aqui duma mera teoria, mas como disse, de uma postura vital! Bem se vê que é algo totalmente distinto do protestantismo, com sua união direta com deus na perspectiva individual ou egoísta, e do liberalismo econômico, com seu ensinamento de que o outro é sempre nossos concorrente ou rival na luta insana pela vida.

O que nos preocupa sobremodo não é o recuo dos Catolicismos pois em outras conjunturas culturais recuperar-se-iam. A perspectiva de uma sociedade pluralista, tal como foi descrita por Karl Rahner a Vintila Horia (1972) não nos assusta. Ter de conviver com budistas, hinduístas, judeus, neo pagãos, deístas, agnósticos e ateus, numa perspectiva de respeito e tolerância civil não nos exaspera. Caso nosso Cristianismo recobre sua consciência e dignidade, caso nosso Catolicismo se torne mais profundo e comprometido, até teremos lucrado.

O que nos assusta e preocupa sobremodo é a expansão, a afirmação e o predomínio, entre nós, do pentecostalismo ou das formas protestantes Norte americanas... Não estaríamos nem um pouco preocupados caso o romanismo estivesse a ser substituído pelo espiritismo ou pelo budismo. Afinal toda crença trás em seu bojo elementos culturais... E o bojo cultural dos calvinistas e judaizantes de século a século tem sido o sonho de uma Sociedade teocrática em moldes muito semelhantes ao do islã sunita ou salafita com sua sharia. A sharia aqui, para nossos fanáticos, é a torá. E já conhecemos o fim trágico de tudo isto na Alemanha nazista, no Oeste Norte americano... No apartheid...

Aqui negros, indígenas, brancos e mestiços, igualmente tocados e transtornados pela miséria e pela idiotice haverão de ser presas fáceis de uma religiosidade que prima pela miséria em todo os sentidos... Pois não estão, como disse Nina Rodrigues a mais de cem anos, no acesso de uma religião tão elaborada quanto o Catolicismo, como sua alta teologia, com sua escolástica, com sua doutrina social, com seu sentido estético, com seu ritual simbólico, etc Quando a RCC não passa de uma descatolicização do próprio catolicismo ou de sua degeneração interna... é uma protestantização e portanto uma negação e esvaziamento do próprio Catolicismo cujo espírito, na perspectiva do princípío de contradição, é afirmação face a tudo quanto o protestantismo obstinadamente nega. O conflito, mesmo dentro da igreja continua dando-se em termos de espírito entre o principio Católico, positivo e na dependência da Encarnação, e o princípio protestante, negativo e na dependência do judaísmo e do neo platonismo.

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