sábado, 27 de janeiro de 2018

Conceito de revolução em Marx, Lênin, Trotsky, Staline e a doutrina do 'Quanto pior melhor'


"V H - Pensa portanto que o Comunismo perdeu sua oportunidade. Por que e quando precisamente?

Toynbee - Perdeu-se no exato instante em que Stalin esmagou Trotsky... Stalin bonapartizou, ou como se diz, o desvirtuou, e confundiu-o com o nacionalismo russo, matando na fonte o ideal Católico ou universalizante que era a força do comunismo." (O que esta de acordo com a análise de Crane Brinton na 'Anatomia das Revoluções' onde expõem a russificação do Comunismo durante a segunda grande guerra) 'Viagem aos centros da terra' por Ventilia Horia, ensaísta anti comunista. P 225

Claro que uma Revolução dramática, nos termos de Lênin, só poderia dar-se nos termos totais e universalizantes de Trotsky. Stalin matou o revolucionarismo bolchevista, literalmente e em termos de sentido ao associal o comunismo a cultura eslava ou russa. Comunismo e Anarquismo devem impor-se a nível internacional ou global, não nacional ou regional, pelo simples fato do Capitalismo ser internacional. Serão fenômenos globais, ou não serão.

Acompanhemos portanto os desvios porque passou o conceito de Revolução dentro do Comunismo.



Marx quando jovem definiu a organização 'partidária' - se é que assim podemos dizer! - como formadora da consciência proletária ou seja como instância educacional.

Mas eu percebo que cada vez mais inseriu-se na consciência marxista, envenenando-a, a tese soreliana segundo a qual alguns quadros intelectuais  fariam ou comandariam uma revolução. Alias, sem depender do tempo ou das circunstâncias externas a que Marx havia aludido (realismo etapista) e assimilando o conceito de Revolução hecatômbica ou de conflito entre esta elite minoritária e as massas alienadas comandadas pela burguesia. A bem da verdade a noção de quadros ou de uma aristocracia educadora não podia deixar de estar presente num teórico de classe média como Marx, ou ainda em Engels e Kautsky, o qual amiúde refere-se a sem papel em termos bastante próximo do padrão de pensamento positivista.

A ideia de um núcleo dirigente, de quadros ou de um partido ali já estava e não podia deixar de estar, a finalidade no entanto não era pelejar ou fomentar sedições, mas infundir a consciência proletária ou social nas massas.

Vejamos então o que Marx havia ensinado sobre o tal processo Revolucionário -

Marx havia ensinado algo totalmente diverso - caso tomemos por padrão o modelo Sorel/Lênin. Pois acreditava que a própria dinâmica do capitalismo produziria uma imensa massa e horda colossal de proletários a um lado e a outro uma diminuta e insignificante burocracia de capitalistas, a qual seria derrotada por aquela sem drástica efusão de sangue ou abalos cósmicos na medida em que tivesse sua consciência despertada pelo 'partido' ou pelos quadros intelectuais os quais, como já dissemos, na visão de Marx, fariam mais o papel de professores - cujo objetivo é levar consciência as massas convertendo-as em povo agente de sua História -  do que de guerrilheiros.

Para K Marx a realidade econômica era condição 'sine qua nom' os proletários não poderiam agir ou fazer a Revolução. A qual se daria necessariamente por etapas, acompanhando o desenvolvimento da produção. Era portanto absolutamente necessário, que no contexto em que viesse a dar-se a futura Revolução, o Capitalismo não apenas aflorasse sem que houvessem objeções, mas que evoluísse, progredisse, se desenvolve-se e atingi-se, livremente sua forma final. Disto dependia a oportunidade ou a necessidade da Revolução Comunista, a qual não passava sempre de uma resposta aos últimos estádios porque passará o Capitalismo. Compreende-se, segundo esta visão, que a Revolução teria de dar-se, necessariamente, numa Sociedade Capitalista que tivesse feito já todo este percurso, e ao fim do século XIX, apenas Inglaterra e Alemanha, pareciam apresentar tais condições.
Marx
jamais compreenderia uma Revolução na Rússia ou na China de sua época i é em Sociedades que ainda não haviam assimilado em larga escala o modo de produção Capitalista, encontrando-se um estádio agrário, campesino, feudal, primitivo, tradicional, etc que ele, Marx, - filho do iluminismo e coevo do positivismo - não podia compreender e cuja cultura deplorava. Segundo o esquema etapista de Marx seria de todo inútil fomentar a consciência proletária em tais conjunturas. A teoria de Sorel no entanto possibilitou um adiantamento, absolutamente controverso, em termos de História. A consciência proletária foi estimulada nos grande centros urbanos tradicionalmente associados ao poder, até que, aproveitando-se de um nicho aberto pelos liberais, veio a assumi-lo; mas em oposição ao campo e ao campesinato (o qual aspirava apenas pela Reforma agrária i é pela distribuição da terra). Foi uma Revolução tipicamente urbana, que renovou a clássica oposição - Cidade X Campo. Para parte dos campesinos, que tiveram sua mentalidade e padrão cultural depreciados, esta Revolução foi sinônimo de opressão.

Digam o que quiserem do autêntico marxismo, a ordem de pensamento presente no velho Marx parece sensata, coerente e realista; diria sóbria. Afinal nela cooperam tanto elementos externos ao homem quanto elementos humanos conscientes de suas possibilidades. Sucede no entanto que esta ordem de pensamento foi danosamente turbada por correntes exógenas advindas do anarquismo idealista. Claro que a revolução elitista e ingênua proposta por Sorel e abraçada pelos sucessores de Engels só podería dar-se nos termos totais ou globais propostos por Trotsky, jamais em termos nacionais ou regionais. Deveria ser universal ou não ser. Os anarquistas que são péssimos lógicos e pensadores - creem que a lógica formal, a coerência, o raciocínio são sempre sufocantes ou opressores - erraram desde o princípio. E as massas até hoje permanecem sem espírito e manipuláveis. Talvez a hora tenha passado porque as massas não foram devidamente preparadas para a hora nos termos propostos lucidamente por K Marx.Você converte as massas em povo i é desmassifica-as e prepara-as para a cidadania (por meio de uma educação integral) ou as mantém escravizavas e submissas i é sob estrito controle. Não há terceira vias aqui. Ou vamos pelo caminho de uma democracia cada vez mais direta, popular ou cidadã ou vamos pelo caminho do totalitarismo, do despotismo ou da ditadura. Uma, coisa é absolutamente certa - como salientaram Ortega Y Gasset e MacLuhan dentre outros - massas e liberdade é coisa que não combina. É como receita de pólvora. É algo explosivo. Apenas os anarquistas a partir de sua antropologia romântica ou ingênua, construída a partir de J J Rousseau, puderam mesmo conceber a ideia monstruosa de emancipar 'massas' e é claro que as massas emancipadas, dando largas a impulsos, instintos e outras forças irracionais, levariam a cabo o ideal sangrento ou hecatombico de Revolução total... Resta saber o que acionaria o furor das massas levando-as ao paroxismo.

Antes de prosseguir quero dizer que este ideal de massas irracionais inconscientemente movidas ainda povoa o pensamento anarquista - se é que assim podemos chama-lo. Do que tivemos e temos exemplo nos Hippies, Punks e outras tribos formadas por rebeldes sem causa. Há aqui uma revolta cega, que não é necessariamente produzida por situações de injustiça, miséria ou indignidade humanas - como no caso dos socialistas e de parte dos comunistas - e que jamais se define, permanecendo sempre difusa... Essa revolta amorfa a um tempo e multiforme a outro não nos parece saudável. Ela sempre poderá conduzir a civilização a tal guerra de todos contra todos... e converter nosso homem em lobo do outro, dando certa força as reflexões emitidas por Hobbes há tantos séculos. Ao menos quanto a essas massas suas considerações parecem justas. A democracia direta pressupõem homens educados segundo os princípios da racionalidade e da ética; demanda um projeto construtivo de caráter humanista. Democracia, mesmo representativa, e formalismo ou estruturalismo, é outra mistura funesta... Sócrates, Platão e Aristóteles elaboraram suas críticas há mais de dois mil anos e nos parecem válidas. 



Vejamos agora como exasperar e acionar essas massas incultas de modo a que executem o programa da Revolução -
Comecemos pelo velho dilema - Na mesma medida em que o capitalismo, diante dos perigos e ameaças, apara suas arestas ou garras (quando não as tem aparadas) as pessoas mais simples passam a ter esperanças ou até a suportarem-no. Aqui todo e qualquer alívio conduz a certo comodismo e é justamente isto que nos explica porque a Revolução não ocorreu na Inglaterra do século XIX.


Para tanto devemos ter em conta aquela reação Cristã (Católica e anglo Católica) e humanitária cuja melhor expressão é a Sociedade Fabiana, criada pelo casal Webster, matriz das 'Trade unions'. De fato aquelas condições cruéis e desumanas que vigoraram durante o auge do liberalismo econômico inglês (Idade de ouro dos capitalistas e patrões) - 1830 a 1880 - e que foram tão vivamente descritas pela pena de um Charles Dickens (o qual nada tinha de comunista ou bolchevista) foram lentamente alteradas no domínio da institucionalidade pelas assim chamadas reformas trabalhistas, das quais emergiu em meados do século passado um estado de bem estar social e de qualidade de vida que perdurou até a Era Tatcher i é por quase oitenta anos. Foram tais reformas que conjuraram o perigo da Revolução comunista prevista por Marx. Não é que o Capitalismo se tenha reelaborado ou reprogramado, como sugerem alguns. O fato é que passou a sofrer restrições por parte do poder político. Na expressão consagrada de Keynes, a fera foi posta numa jaula.
A conclusão salta a vista - Caso as pessoas tenha acesso a certo nível de qualidade de vida, bem estar ou esperança não estarão dispostas a apoiar uma Revolução cósmica nos termos de Sorel ou Lênin. Afinal de constas sabem muito bem que Revolução não é sinônimo de brincadeira e a imagem das  Revs Inglesa e francesa ainda esta mais ou menos fresca em suas memórias. Ainda há certa consciência quanto ao fato das Revoluções terem sido eventos traumáticos nas vidas das sociedades que as conheceram de perto.

Que preço as pessoas estão disposta a pagar por sua libertação?

Não deverão ser bem escravas, na plena acepção da palavra, para estarem dispostas a pagar um preço demasiado alto?

Que condições concretas as fazem com que as massas aspirarem por revoluções totais e incontroláveis?

Enquanto a situação social for suportável e tiverem esperança não apostarão neste padrão de revolução sanguinolenta. Afinal não temos registros de que os escravos, nesta ou naquela Sociedade, tenha cometido suicídio em massa - E a religiosidade pagã ou greco romana nem condenava a prática nem conhecia penas eternas ou inferno. Neste caso por que os escravos não recorreram sistematicamente ao suicídio?

Simples. Por que elas, as condições em que se dava a escravidão, se tornaram flexíveis a ponto de injetar alguma esperança de liberdade em suas consciências. Nem podemos descartar que tudo isto tenha sido previamente calculado com base na simples experiencialidade da vida... Podemos pensar assim na fuga, na alforria, na simples construção de laços de afeto com os proprietários e consequentemente numa melhoria significativa quanto ao trato, etc

Assim a condição dos operários em certas realidades sociais. Quando o sistema ameaçado abre mão de sua rigidez total e até certa medida possibilita a inserção e ascensão social - o que quando faz faz por cálculo - é absolutamente natural que a maior parte das pessoas se conformem com ele. É a obra Psicológica da esperança, a qual não se pode fugir. Apenas a total falta de esperança e a vigência de uma situação insuportável abrem as portas para a Revolução com que sonham anarquistas e comunistas... A matéria da Revolução é o sofrimento, a angústia e o desespero.

Por isso os neo marxistas sorelianos que levam sua escolástica medonha até o fim são sempre favoráveis a tese, imensamente discutível, do 'quanto pior melhor'.

Quero dizer que são favoráveis a afirmação radical do capitalismo em seus termos clássicos para que se produzam as condições ou circunstâncias apontadas não apenas por Marx mas até por Henry George, assim a proletarização total... circunstância que facilitaria ao máximo a Revolução por parte das massas conscientizadas.

Quero dizer que tais pessoas são as que preferem sempre o DEM, o PSDB, o PSC, o PMDB no controle da política, uma vez que tais partidos, de inspiração liberal , produziriam as condições ideais de miserabilidade e desigualdade social que deflagariam uma Revolução violenta inda que por parte de minorias comandadas por elites ainda menores dispostas a lavar a terra com ferro e fogo. O terror só poder ser produzido por circunstâncias excepcionais.

Mas a angústia humana tanto pode ser objeto de esclarecimento objetivo por parte dos estudiosos da sociedade ou dos trabalhistas como pode ser habilmente manipulada pelos fanáticos contra os interesses dos próprios manipulados elevando o grau de alienação a nivel máximo; assim na Sociedade islâmica, no Belt Bible e no Brasil de hoje. O tiro pode sempre sair pela culatra e o medo, o temor, o receio e a dor virem a cimentar. Marx jamais contou com isto, ele era otimista, evolucionista linear e como os positivistas acreditava que o fundamentalismo religioso, ao menos no Ocidente, estava com seus dias contados. Erro cabal, corrigido por Weber dentre outros.

Eis o motivo porque os marxistas/leninistas, ignorando os últimos trabalhos de Marx e as derradeiras cartas de Engels, condenam inexoravelmente a social democracia ou a inserção no plano da política institucional com o objetivo de obter reformas e conter cada vez mais a ferocidade do sistema. Eles não apreciam este caminho porque sabem que a amenização das condições produziriam a acomodação por parte dos dominados, alivio como já dissemos sempre se traduz em esperança e acomodação. A posição é ingênua porque ao menos a parte menos irracionalista do sistema saberá auto regular-se ou adaptar-se até certos limites caso sinta-se ameaçada por uma insurreição. Mas é assim mesmo e a possibilidade de um relativo e precário equilíbrio dentro da estrutura social existente basta para exasperar os radicais sorelianos ou jacobinos, os quais contam com o desconforto ou o incomodo para levantar as massas.
Não tenho nada contra a ideia de uma imensa maioria de oprimidos e injustiçados i é o povo, tomar um poder que alias já é seu.

O que não posso aprovar, em hipótese alguma, é uma ditadura de quadros elitistas, uma vez que estes jamais equivalem ao partido, quanto mais ao proletariado; proletariado é proletariado e ponto.

O que nos conduz diretamente a um governo democrático popular, exercido diretamente pelo povo e jamais por aristocracias de qualquer talhe. Isto porém é outra questão.

O que não posso aceitar é justamente a tese maquiavélica segundo a qual devemos assistir impassivelmente o desenvolvimento total das forças capitalistas de produção - senão até colaborar com ele e estigmatizar a social democracia - enquanto elas esmigalham e torturam impiedosamente seres humanos.

Essa espécie de quietismo que consiste em largar-se ou em entregar-se ao fluxo das forças históricas de caráter economicista sem sequer cogitar em resistir-lhes ou em amenizar-lhe os efeitos é que me parece anti ético, rudimentar, bárbaro, sórdido e grosseiro. Enfim a doutrina do 'quanto pior melhor', a única que me parece apta a fazer com que a maior parte dos seres humanos aspirem por uma revolução em termos catastróficos parece-me sem sombra de dúvida muito mais questionável do que qualquer tipo de reformismo. Afinal porque não conter a priori o desenvolvimento de forças contra as quais teríamos que lutar e combater a posteriori??? Não vos parece mais sensato combater as causas do que seus efeitos, assim a instalação e desenvolvimento das forças capitalistas de produção numa dada sociedade tradicional do que a ordem capitalista já instalada e consolidada. O fato é que Marx no capital, encara o capitalismo ou a fase capitalista como um benefício ou como uma fase progressista no quadro geral do desenvolvimento. Nada mais duvidoso em toda sua obra.




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