quarta-feira, 15 de março de 2023

Psicologia, psicanálise, Freud e a questão da multiplicidade de existências - Reflexões sobre a obra de Hermínio C Miranda 'A memória e o tempo' Edicel 1984 - Parte II

Principiou essa fatídica guerra quando o ateu e materialista S Freud, ousou não apenas aderir mas justificar o modelo dinâmico de mente - Inaugurado por Th Fechner - que constitui sua glória. 

Freud foi tributário de um grande número de cientistas e pensadores. Haja visto que Aristóteles já havia levantado a questão da catarse e por assim dizer do psicodrama em suas obras. Serviu-se igualmente de Nietzsche, Ambroise Auguste Liébault, Hipollyte Bernheim e Breuer evidentemente.

Para os fisiólogos materialistas, desde De Holbach, Helvetius, Cabanis, C Vogth, Moleschott e sobretudo Broussais, a mente inexistia ou era produzida pelo cérebro. Toda vida mental era para eles produzida por interações neuronais, como se uma sinfonia fosse produzida apenas pelos instrumentos. 

Freud não apenas inválida esse esquema grosseiro e absurdo, pautado no dogma da monocausalidade, como demonstra que seu modelo dinâmico exerce clara influência sobre o elemento físico ou o corpo - Estabelecendo cientificamente que a mente é capaz de atuar sobre o corpo físico. 

Foi um rude golpe vibrado sobre tantos quantos, seguindo por fila de mão única asseveravam que toda e qualquer doença mental era resultado de uma lesão cerebral. 

Mesmo quando posteriormente Wagner Jauregg demonstrou o óbvio: Que lesões cerebrais afetam as faculdades mentais provocando 'doenças' a demonstração oposta, de Freud - Alias anterior a ele! - permaneceu de pé, uma vez que demonstrações posteriores são de todo inútil para invalidar as anteriores, desde que devidamente documentadas e, ininterruptas.

Por isso, as posteriores ou mesmo concomitantes demonstrações de que um sensitivo tenha fraudando não basta para invalidar as pesquisas que constataram - Por meio de testes realizados com metodologia séria e meios de controle rigorosos. - em testes anteriores. A generalização é sempre infundada uma vez que do fato de alguém ter fraudado certas vezes jamais se pode concluir e menos ainda demonstrar que fraudou sempre - Marquem isto!!!

Se a parlenga do Maddox ou do Dennett, apresentada entre os nossos por Silva Mello (Muito antes - Pois ele partia de Max Dessoir e Paul Heuzé) tem produzido certo impacto a razão é uma só: O absoluto despreparo filosófico da modernidade e da pós modernidade. No caso dos romanos e protestantes cultores da Filosofia tudo quanto há é fanatismo - Embora o Cardeal Lepicier e alguns outros autores papistas (Honestos e preparados!) tenham advertido os fantoches do positivismo - Como o Padre Heredia (O capelão de Daniel Loxton!), P Heuzé, R Amadou, O Quevedo! - de que ao menos alguma parte dos fenômenos em questão eram reais. Vejam pois como bem andou o genial Padre Huberto Rohden, ao declarar (Tal e qual Houdini) que alguns fenômenos eram infalsificáveis...

Tornemos no entanto a Freud. Desde Freud o que chamamos fenômenos psico somáticos continuam a ser verificados...

Mais do que seu construto - A Psicanalise - e conceituação estrutural posterior, adquiriu Freud sua merecida fama por firmar de modo definitivo o conceito de Inconsciente, definido como um repositório dinâmico situado num nível habitualmente inacessível a consciência ou por baixo dela.

Não se trata naturalmente da memória, embora seja algo intimamente relacionado com ela e que dela dependa.

Que a memória de nossas experiências constitui-se uma espécie de registro indestrutível e colossal era algo mais ou menos sabido já antes de Freud.

Todavia bem poderia tratar-se de um arquivo morto, formal ou inoperante e portanto de pouca importância.

Percebeu Freud que pelo contrário, tal arquivo era vivo ou dotado de vida própria, qual fosse uma personalidade autônoma ou um setor tanto mais profundo de cada pessoa. 

Pode o modelo freudiano ser comparado quer a um manancial hídrico quer a uma simples cebola.

Imagine um rio subterrâneo, o qual em determinados terrenos aflora sob a forma de fonte ou pequeno charco, para em seguida tornar as profundezas e desaparecer. Agora considere que esse rio é nossa humana condição - As fontes e charcos que assomam a superfície equivalem a nossa consciência, a zona imediatamente abaixo - Até onde podemos levar o braço! - é o subconsciente (Ao qual podemos ter acesso com certos esforços e assim lembrar ou recuperar as informações!) tudo quanto permanece habitualmente inacessível a consciência é o Inconsciente propriamente vivo.

Agora os behavioristas - Dando show de antropocentrismo beócio! Como seus primos fenomenologistas! - declaram que não existe inconsciente porque não é manifesto a consciência, porque não o temos continuamente diante dos olhos, etc 

Pífia alegação... Pois aquilo que é habitualmente inacessível a consciência em seu estado normal bem lhe pode ser acessível esporadicamente num estado de anormalidade qual seja uma febre, a sonolência, a ação de certas drogas ou a hipnose. Não se trata portanto de algo eternamente inacessível - Como o Castelo do João do Pé de Feijão ou a terra do nunca! - e sim de algo comumente inacessível porém extraordinariamente acessível.

Por isso não somente sua existência mas sua atuação e influência foram suficientemente demonstradas e inúmeras ocasiões a que damos o nome de experiências.

No entanto os ideólogos positivistas ou behavioristas não podiam sofrer que a mente comportasse um agregado dinâmico de ideias ou entidades imateriais, e tampouco que atuassem poderosamente sobre o corpo físico, controlando os nervos e fluídos em que viam a realidade de toda vida mental. Era pois algo demasiado forte para as mentalidades materialistas, algo que não podiam admitir.

Desde então Freud e o freudismo ou a psicanalise suscitaram ódio mortal nos cientificistas...

Isto a ponto daquele ateu, que foi o homem mais genial de seu tempo - Em que pesem as puerilidades humanas! - jamais ter sido contemplado com mísero Nobel por parte de seus irmãos de ateísmo e incredulidade. 

Freud foi supinamente boicotado, inclusive pelos marxistas, os quais de pronto perceberam o significado de suas ideias para o querido materialismo. Freud foi imediatamente classificado por eles como pária ou infiel.

Afinal um esquema materialista da 'mente' só poderia ser formal, mecânico... jamais dinâmico e muito menos envolver um mundo vivo povoado por ideias...

Errou Freud certamente quando atribuiu a seus complexos uma existência universal ou para além de determinadas estruturas sociais (De modo que seus complexos se tornam metafísicos.) - Como demonstraram M Mead e Malinowksy e como deu a entender a não menos genial Karen Horney. Errou quando concebeu o pan sexualismo - Um erro alias perdoável em tempos de repressão moralista ou puritana. Errou ainda quando pretendeu analisar o mundo onírico através de um roteiro. Errou miseravelmente ao imaginar que a virtuose musical fosse produzida pela contemplação auditiva dos peidos pelo bebê... Errou, e errou.

Porém que é mais humano do que errar...

Por isso convém dizer que Freud também acertou muito, quiçá bem mais do que a média. Falível, porém genial... postulou que as pequeninas crianças possuem uma pronunciada dimensão sexual - O quanto basta para exasperar meus amigos marxistas, não menos que o espiritista Hermínio C Miranda - para não mencionar os papistas e os protestantes... E no entanto assim o é e nem precisaríamos de Freud para sabe-lo.

Agora são as pequeninas crianças sexuadas devido a fatores invencíveis de ordem biológica ou devido a fatores de ordem cultural. Dificilmente poderiam ser tais fatores meramente culturais em tempos nos quais a sexualidade humana era rigorosamente oculta e reprimida... Havendo que admitir um certo elemento biológico que tentavam suprimir - O que nos leva de imediato ao tema da fixação, do completo, do trauma e da neurose... Todos interconectados.

O problema aqui - Entre Psicólogos e Psiquiatras, no que diz respeito a neuroses e neuróticos ou psicóticos e psicoses é até bastante simples: A exceção dos casos precipuamente somáticos devidamente tratados - Por meio de cirurgia ou ingestão de hormônios. - todos os demais enfermos (Cuja etiologia fugia ao corpo i é os psico somáticos!) eram, como são, sistematicamente sedados. 

Explico - Em todos os casos em que os fenômenos eram de origem psíquica ou mental propriamente dita, o tratamento oferecido pelos maravilhosos psiquiatras era por assim dizer sintomático, pois consistia em suprimir os sintomas por meio de sedativos. Noutras palavras em narcotizar o pobre paciente... O qual jamais saia desse estado lastimável.

Ainda hoje, entre as pessoas comuns, que recorrem a certos psiquiatras sem saberem ao certo o que tem, é comum o emprego da palavra dopar. Alias por não querer serem dopadas é que elas fogem dos psiquiatras... Existe inclusive livros bastante elucidativos sobre o tema escritos por psiquiatras de renome, como o Dr Guido Palomba. (A decadência da Psiquiatria ocidental.)

Claro que há bons psiquiatras que fogem a regra geral. 

Muitos no entanto, por não admitirem que certa enfermidade mental foge a seu compete-se, continuam dopando apenas... 

Perceba o leitor que suprimir sintomas não equivale a suprimir determinada enfermidade e assim cura-la.

Ademais toda e qualquer medicação produz efeitos colaterais adversos, torna-se ineficaz com o passar do tempo, etc 

Desde que Freud inaugurou sua metodologia e procedimentos - Aperfeiçoados pelas dissidências! - principiaram os neuróticos ou ao menos alguns deles (Certos pacientes, presas de certas formas de neuroses são curáveis e foram curados!) a obter algum alívio ou mesmo a cura. A Psicologia, a psicanalise ou as diversas psicoterapias tem de fato curado muitos daqueles que a não ser elas seriam dopados e conduzidos a uma existência vegetativa. 

No frigir dos ovos ou considerando aquilo que realmente importa, a vida vivida, o alívio ou a cura dos pacientes a Psicologia tem obtido sucesso através de seu modelo dinâmico e imaterial, evidentemente porque tal modelo está de acordo com a realidade. Já o outro modelo, quanto mais irredutível e contumaz, mais tem falhado e redundado no ato de simplesmente dopar aqueles que qualifica como enfermos incuráveis.

Concedo que antes de qualquer abordagem psicológica o ideal seria que o enfermo passa-se de fato por um Psiquiatra competente que lhe escrutina-se o corpo ou o cérebro por meio de raios X, tomografias, exames de sangue, etc até encontrar alguma carência ou lesão e trata-la. Todavia, caso tal escrutínio não desse em nada e o corpo se apresenta-se como absolutamente saudável ou normal, tenho que seria GRAVE DEVER seu, como médico e pessoa, encaminhar o dito paciente a um verdadeiro Psicólogo, de modo ao examinar-lhe a mente - Onde certamente se encontra a origem do mal. - diagnostica-lo com eficácia e trata-lo. 

Lamentavelmente esse trabalho colaborativo e totalizante é quase sempre frustrado pelos preconceitos do psiquiatra, o qual, assumindo uma postura irredutível, raramente admite que aquela enfermidade foge a seu compete-se e passa a dopar o infeliz do paciente - Tornando a psiquiatria cada vez mais desacreditada.

Perceba portanto que a ideologia ou visão de mundo do médico não é inócua face ao bem estar do enfermo, bem podendo ser nociva.

Acaba ou psiquiatrismo sectário, nutrido pelo positivismo, pelo cientificista ou pelo materialista, ou acaba-se a psiquiatria.

Mesmo porque falsas curas somáticas sempre podem ser explicadas pelo princípio psicológico e mental da auto sugestão. Já as verdadeiras curas provocadas pela terapia psicológica são irredutíveis a quaisquer explicações ou teorias behavioristas ou psiquiátricas, pois prescindem sempre da noção de autonomia da mente. 









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