terça-feira, 29 de junho de 2021

Naturismo Luxo ou o alto custo de uma vida natural no contexto do mundo Capitalista ou o preço da ruptura - Será a ruptura naturista uma reação da consciência burguesa?




Por mais que admiremos S Bento ou S Scott Nearing temos de ceder as críticas bem fundamentadas dos críticos, em especial dos marxistas. 

Naturalizar a exemplo de S Bento ou de Nearing é utópico ou impossível no mais alto grau.

Sete, dez, três ou um bilhão de pessoas não poderiam viver separadas em seus sítios, feudos ou fazendinhas cultivando a terra.

Bento, Francisco e Nearing são o que chamamos de figuras hiperbólicas, fundamentais e preciosas por chamarem nossas atenção, mas impossíveis de serem imitadas pela totalidade dos seres humanos, justamente porque tais seres são muitos e a terra 'pequena'.

Não há na terra espaço suficiente para meio bilhão de Franciscos, Bentos ou Nearings.

Para além disto, há, e fixado está, o sacrílego sistema que especula com a terra, inclusive com a terra não usada, encarecendo seu preço. De modo que apenas uns poucos bem remediados seriam capazes de adquirir um pedaço de terra com que viver a maneira de um Nearing, ao menos aqui no Brasil a aquisição desse pedaço da terra, com que viver a parte do sistema sairia bastante caro.

Mesmo após as advertências de Henri George sobre a relação da posse com o trabalho continua a terra a ser sacrilegamente retalhada e roubada pelos poderosos. 

O máximo que muitos de nós poderiam fazer é abdicar do consumismo crasso, diariamente instilado em nossas almas pelos meios de comunicação, com o objetivo de que tomemos por absolutamente necessário aquilo que não é. E lancemos mais lenha a este tremendo incêndio que consome o mundo.
Melhor o excesso de desapego de um Buda que este consumismo insensato que nos devora as entranhar e põem a nu a miséria da alma... Se é que tais vermes, gafanhotos ou cupins tem alma.

O máximo que muitos de nós poderiam e podem fazer é assumir um naturismo limitado dentro do próprio sistema, adquirindo apenas produtos veganos, adotando a 'lei' vegetariana, consumindo preferencialmente produtos orgânicos, etc sucede no entanto que a especulação da terra faz com que tais produtos sejam sempre mais caros e que estejam sempre acima das possibilidades das pessoas comuns ou do povo. Daí os marxistas tecerem uma crítica que deve ser considerada: A maioria dos naturistas são burgueses. Aos marxistas incomoda o fato de que parte considerável dos veganos, vegetarianos, organicistas, etc sejam o que chamam de burgueses e que nós chamamos de classe média.

Claro que a maior parte dos não marxistas pouco se preocupa com tais críticas. Não é o meu caso. Pois nossas práticas, sendo saudáveis e até redentoras deveriam ser assumidas pelo bom povo. Tenho aqui que os não marxistas mais esclarecidos atribuam muito pouco esclarecimento ao povo. Falta instrução e consciência a eles e são, em sua maior parte massas e não povo... Certo, certo, muitos dentre eles pertencem de fato a essa coisa amorfa que chamamos de massas. 

Apesar de tudo a isto folgo perguntar a mim mesmo: Se acaso um desses assalariados tomasse consciência e optasse por viver a nossa moda, poderia ele arcar com os custos?

Acaso estão nossos produtos orgânicos ou veganos, assim os moluscos e crustáceos, no acesso da gente mais humilde?

Mas é claro que não.

Os produtos orgânicos por serem mais custosos que o comum dos vegetais, o que decorre do espaço ou da terra e enfim da especulação.

Os produtos veganos porque suas massas - Doces ou salgadas - de fino sabor são feitas com agar agar, algas, cogumelos, compostos de soja, amêndoas, nozes, etc os quais dentre os vegetais são os produtos mais caros. 

O bom povo a ser vegano teria de viver de papas de batata, polvilho, amido de milho, arroz e trigo; levando uma dieta assaz monótona em termos de paladar.

Caso adotassem uma dieta a que chamo de Ética (Que é a minha) excluindo apenas o consumo de aves, mamíferos e demais seres dotados de auto consciência e sensibilidade, ainda assim seria demasiado onerosa para eles - O que sei eu por experiência. Mesmo no litoral do Brasil não podem os mais pobres e a gente simples viver de crustáceos, moluscos ou pescado, pois é caro.

Lamentavelmente temos de considerar a crítica dos marxistas e saber que querendo nós ou não o mercado dita regras, impondo não apenas o consumismo mas também o consumo de certos alimentos já nutritivos, já saborosos, a maior parte da população pelo simples fato da oferta ser maior e a amplitude da oferta determinar o preço, alias um preço mais baixo e acessível.

Triste sabe-lo mas em parte é o consumo de carne facilitado já pelo mercado já pela própria dinâmica populacional. No momento presente sete bilhões de seres humanos não se poderiam manter consumindo apenas vegetais ou frutos do mar. 

Mas e a Índia?

Como tudo faz supor nem todos os indianos são vegetarianos.

E os hindus?

De fato são eles bilhão e pouco de pessoas, cerca de um bilhão e setenta milhões aproximadamente. Um número impressionante de seres humanos.

Todavia, ao contrário do que comumente se pensa ou imagina nem todos os hindus são vegetarianos. 

Entre a fé ou a teoria e a prática vai larga diferença.

De modo que atualmente o numero de hindus vegetarianos oscila entre 23 e 37% tocando provavelmente a pouco menos de 1/3 de bilhão - Quiçá uns 350 milhões de cidadãos. 

O número ainda é impressionante.

Mais revelador ainda porém é saber que também por lá o vegetarianismo ou o veganismo saem mais caros, de modo que predominam nas castas mais elevadas. Também lá são os mais pobres párias ou harijans e sudras que consomem a carne, inclusive carne bovina, por ser sempre mais barata e acessível. O problema da alimentação é também globalizado ou global, tocando ao planejamento nacional ou internacional, assim as dinâmicas do senhor mercado, face ao qual mesmo os devotos hindus se tem curvado. Se a carne é o produto alimentício mais barato que o mercado nos oferece em oposição aos produtos veganos, aos produtos orgânicos e aos frutos do mar, é óbvio que as pessoas mais humildes serão carnívoras não vegetarianas ou adeptas a uma dieta Ética, a qual será dieta de luxo! 

Os pobre não poderão ser veganos ou vegetarianos ou adeptos de uma dieta ética mesmo que queiram em tais condições, ditadas pelo mercado ou pela economia.

E seria utópico ou desumano já força-los, já condena-los... Exigindo que façam abstenções e sacrifícios. 

Portanto se queremos pugnar por uma alimentação majoritariamente vegeta ou por um cardápio ético teremos de pensar antes de tudo na densidade populacional.

Veja a maravilhosa Índia de agora com seus trezentos bilhões de vegetarianos. Trezentos e cinquenta bilhões de seres humanos, mesmo quando veganos ou vegetarianos, continuam sendo uma praga - Como uma nuvem de gafanhotos - a qual se não mata diretamente, mata e assassina indiretamente. Pois aqui preservar milhões de vacas implica sacrificar todos os tigres, rinocerontes, elefantes, etc pelo simples fato de ser necessário acabar (Literalmente) com as florestas para criar campos de arroz. Se o consumo de carne vermelha promove ativamente a destruição da natureza por demandar pastos um vegetarianismo assumido em alta escala por bilhões e bilhões não mataria menos por demandar campos de cultivo. 

Bilhões e bilhões de seres humanos será potencialmente destrutivo sejam estes bilhões carnívoros ou veganos, por uma questão de espaço. 

Tornamos assim, mais uma vez e sempre, âmago da questão, isto é ao número de seres humanos ou ao crescimento da população humana.

O Veganismo não pode proteger ou salvar a terra da destruição ou assegurar o bem estar dos animais caso ignore a questão do crescimento populacional a menos que passe a advogar um decidido retorno ao que chamamos coleta. Agora imagine o leitor sete bilhões de seres humanos abalando-se para coletar vegetais nas poucas florestas remanescentes. Só os brasileiros todos em menos de semana dariam cabo da floresta amazônica sem que sobresse um único animal ou uma única folha comestível!

Não há como tornar a coleta. Tampouco há como substituir pastos por campos de cultivos obtendo qualquer melhora significativa. O vegetarianismo ou a dieta ética só faz sentido num contexto de controle de natalidade e redução populacional. Por si só, como algo isolado, não nos beneficiará como espécie. 

Também a questão econômica precisa ser considerada, assim as liberdades do mercado, as quais nada significam além de controle. Se desejamos diminuir os preços dos vegetais teremos de considerar o preço da terra e questionar a especulação... como deveremos planejar o cultivo. Tudo isto, tornar os vegetais acessíveis ao grosso de uma população reduzida, implica decisões políticas e econômicas as quais não se pode fugir, e implica no mínimo 'questionar' o modelo liberal economicista que temos como o 'menos ruim' ou melhor. Terá isto de ser revisto, necessariamente.

Caso não cheguemos ao populacional, ao econômico e ao político; com o objetivo de tornar o vegetarianismo ou a dieta ética acessível ao povo, formaremos de fato uma seita burguesa, um grupo ou clubinho e meio a multidão de vermes rastejantes... os quais jamais nos será dado censurar com ares de superioridade.

Belo é o ideal da dieta ética ou mesmo o veganismo. Veganos, vegetarianos e adeptos de uma dieta ética devem compreender no entanto que práticas individuais ou sectárias são sempre irrelevantes em termos sociais, e compreender ainda que o sistema econômico estende seus tentáculos sobre todos os espaços, nichos, iniciativas, práticas, etc tudo contaminando e poluindo, e comprometendo. Veja por exemplo a noção de falaciosa de 'capitalismo sustentável' se é capitalismo jamais poderá ser sustentável mas sempre predatório. Em que uma liberdade absoluta em termos econômicos associada a maximização dos lucros pode estar de acordo com o respeito que se deve a fauna e a flora ou ainda com uma extração moderada, a qual por si só impõem limitação?

Lamento mas a nossa dieta, o nosso veganismo ou o nosso vegetarianismo não darão certo enquanto forem tão caros. E os produtos naturais continuarão sendo o que desgraçadamente são: Um veio de lucros dentro do mercado, mais um setor do mercado e não poucas vezes um outro móvel para o consumismo. 

A reflexão que fica - Será que estamos sendo de fato contestadores ou seremos nós colaboracionistas? 

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