quarta-feira, 15 de novembro de 2017

O Tabu do totem - Uma resposta a S Freud II (O significado de Totem e tabu)

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 a análise de Kroeber (opus cit) é a obra de Freud uma obra piramidal uma vez que após discorrer sobre as premissas durante nove décimos dela, saca as conclusões nas últimas vinte páginas.

E com Kroeber até podemos dizer que há ali premissas muito mais interessantes do que a conclusão, tal e qual a relação ambivalência/tabu analisada no capítulo II e de capital importância para compreendermos a personalidade do homem primitivo e a gênese de sua cultura.

Quanto as exóticas conclusões, demos a palavra ao próprio Freud, o qual, por sinal, expressa-se bastante bem.

"A psicanálise nos mostra que o animal totêmico, é, na realidade, uma representação do pai, fato com que harmoniza-se a contradição de que estando proibida sua morte numa época normal qualquer, se celebre com uma festa seu sacrifício, e que depois de mata-lo se lamente e chore sua morte. A atitude afetiva ambivalente, que ainda hoje caracteriza a relação com o pai em nossos meninos, e perdura, não poucas vezes na vida adulta, se estenderia portanto ao animal totêmico, considerado aqui como um substituto do pai." p 185

"Todo supõem a existência de um pai violento e ciumento, o qual reservaria pata si mesmo todas as fêmeas e expulsa os filhos conforme vão crescendo. Semelhante estado social jamais foi observado em parte alguma. A organização mais primitiva que conhecemos e que ainda subsiste em algumas tribos reporta as associações de homens...  Os irmãos expulsos reuniram-se certo dia, MATARAM O PAI E DEVORARAM SEU CADÁVER, pondo fim a existência da horda paterna. Unidos levaram a cabo o que individualmente lhes teria sido impossível. Pode supor-se que o que inspirou-lhes tal sentimento de superioridade FOI O PROGRESSO DA CIVILIZAÇÃO, COMO O DISPOR DE UMA ARMA NOVA. Tratando-se de selvagens canibais era natural que devorassem seu cadáver. Ademais, o violento e tirânico pai constituía seguramente um modelo odiado e temido por cada um dos membros da associação fraternal, os quais devorando-os passam a identificar-se com ele e a apropriar-se de parte de sua força. O banquete totêmico, talvez quem sabe a primeira festa da humanidade, seria a reprodução comemorativa deste ato criminoso e memorável PONTO DE PARTIDA DE TODAS AS ORGANIZAÇÕES SOCIAIS, DA MORALIDADE E DA RELIGIÃO." 185 sgs


"Assim a proibição do incesto apresenta uma grande importância prática. A necessidade sexual, ao invés de unir os homens, divide-os. Os irmãos unidos com o objetivo de assassinar o pai, haveriam de converter-se em rivais ao tratar-se da posse das fêmeas. Cada um deles haveria de querer todas apenas para si mesmo a exemplo do pai, e a luta geral daí resultante haveria de trazer consigo o naufrágio da nova organização social. Afinal não havia nela individuo algum superior aos demais por seu poder, ao qual tivesse sido possível assumir com êxito o lugar o pai. Portanto, se os irmãos quisessem viver juntos, não havia outra solução senão instituir... a proibição do incesto, por meio da qual renunciavam todos a posse das mulheres cobiçadas, alias móvel do parricídio. Destarte salvavam a organização que os havia feito fortes a qual talvez repousasse sobre sentimentos e práticas homossexuais." 187

"A horda fraterna rebelde abrigava com relação ao pai os mesmos desejos contraditórios que formam o conteúdo ambivalente do COMPLEXO PATERNO EM NOSSOS MENINOS E EM NOSSOS DOENTES NEURÓTICOS. Odiavam aquele pai que tão violentamente se opunha a sua necessidade de poderio bem como a suas exigências sexuais, e ao mesmo tempo amavam-no e admiravam-no. Assim depois de o terem chacinado e consumado seu ódio tinham de sobrepor-se neles sentimentos carinhosos, até então dominados pelos hostis. Como consequência deste processo afetivo surgiu o remorso  e por fim a consciência de culpa com ele confundida, desde então o pai morto adquiriu prestígio ainda maior do que gozava em vida... Aquilo que o pai havia tornado impossível enquanto vivia por seu próprio poder, proibiram-se a si mesmos os filhos em virtude de uma obediência retrospectiva... desautorizaram assim seu ato, proibindo a morte do totem que substituía o pai e renunciaram colher os frutos de seu crime, recusando o contato sexual com as fêmeas do grupo, então acessíveis para eles. Deste modo a culpabilidade do filho... COINCIDE COM OS DESEJOS REPRIMIDOS DO COMPLEXO DE ÉDIPO." 187

"Podemos assim concluir que no COMPLEXO DE ÉDIPO coincidem os começos da religião, da moral, da sociedade e da arte, coincidência que se nos mostra perfeitamente de acordo com as descobertas da psicanalise, quando sabemos alias que este complexo constitui o fundamento de todas as neuroses." 203




Freud acreditava no modelo do gorila e portanto que nossos ancestrais mais remotos viviam em pequenas comunidades familiares de caráter poligâmico - o primeiro grupo hipotético recebeu o nome de horda - organizadas em torno de um macho dominante ou alfa, de duas a quatro fêmeas, e os filhos mais jovens do 'patriarca'.

Na medida em que os jovens do sexo masculino atingiam a puberdade eram expulsos do grupo, muitas vezes a força, de modo a não se tornarem rivais sexuais seus.

No entanto, a provável invenção dos implementos líticos ou das ferramentas/armas de pedra, possibilitou que os filhos expulsos da horda, juntassem forças matassem e devorassem o 'patriarca', afinal o canibalismo estava em moda.

O resultado ou efeito natural da morte do pai teria sido a posse das fêmeas por parte dos filhos/irmãos vencedores, estes no entanto, acabaram renunciando a tal posse por dois motivos:

           a) O remorso ou a consciência culposa quanto a morte do pai, fruto da ambivalência.
           b) A situação de conflito generalizado resultante da disputa das fêmeas pelos irmãos.

Desta renúncia as fêmeas i é as mães e irmãs teria resultado o tabu do incesto.

Ainda segundo Freud os animais com que os clans passaram a identificar-se - segundo um esquema bastante comum a mentalidade infantil - também representavam igualmente a figura do pai assassinado. Daí a consciência culposa levar tais clans a proclamar a vida deste animal um tabu. A exceção de um dia ao 'ano' ficavam os indivíduos proibidos de caçar, matar ou maltratar este animal. Num determinado dia porém, o clã inteiro não dó podia como devia mata-lo e devora-lo. Segundo Freud esta festa ou comemoração periódica perpetuaria a memória do parricídio ancestral ponto de partida de nossa civilização.

Como o fundamento da co fraternidade posterior a extinção da horda primordial seria a proibição do incesto ou do contato sexual com a própria mãe, objeto de um desejo inconsciente universal, temos no complexo de Édipo - nome dado por Freud a esse desejo - ou em sua renúncia o protótipo de todas as renúncias posteriores que deram origem a cultura.

Concluindo: Todas as nossas instituições culturais, morais e religiosas resultariam de um parricídio ancestral. As religiões de modo geral prestaram-se perfeitamente a perpetuar essa dinâmica da substituição do 'deus pai' pelo deus filho, assim na mitologia grega quando Cronos assassina Urano e quando Zeus depõem Cronos; assim no Cristianismo quando o Deus Filho encarnado suplanta a Deus, o Pai. Elas também dariam ressignificação a culpa original explorando de diversas formas a ideia de sacrifício expiatório e alimentando-se dessa consciência mítica de culpa.

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