quinta-feira, 26 de janeiro de 2023

Ainda a questão da posse e da riqueza segundo as Escolas Filosóficas e o Cristianismo antigos - Que pensar sobre o capitalismo...



Foi, esta reflexão, suscitada pela leitura do manual de John Sellars "Lições de estoicismo", bem como pelas reflexões de Massimo Pugliucci, Jorge Cano Cuenca, etc Já me referi as aulas do Dr Gual, magistrais por sinal, sobre o Epicurismo, etc Também assisti aulas e cursos sobre o cinismo, o socratismo, o platonismo, o aristotelismo, o ceticismo, o neo platonismo, etc e todas foram bastante gratificantes para mim contribuindo, como já disse, para ampliar meus pontos de vista sobre determinados temas.


Darei início ao texto fazendo uma abordagem típica do capitalismo, embora de minha parte seja honesta e sincera. Anti capitalista ou adversário do liberalismo econômico CRASSO por questões de ordem religiosa, ética, estética, ecológica, etc sou, sem embargo disso a favor do Mercado. Não da mercadolatria ou de qualquer proposta economicista (Inclusive Comunista!) em torno do falso princípio da ilimitação, mas sim da existência de uma liberdade limitada ou controlada por estâncias externas a si. 

Creio ainda menos na ideologia delirante - E mística alias (cf Grayling) - do progresso tecnológico incessante e infinito. A crítica implícita em Malthus remonta a Aristóteles e toma sua forma a partir do mestre Liberal John Stuart Mill - Meu querido Mill, sempre tão lúcido. 

Claro que a afirmação que acima fiz, presente tanto no Pe Júlio Menvielle, quanto nas Encíclicas dos papas romanos e num grande número de pensadores qualificados como socialistas heterodoxos (Tragtenberg) ou humanistas, ou ainda Cristãos, soa absurda aos olhos de qualquer comunista ou marxista posto que o Comunismo é um tipo de materialismo. 

Por diversas vezes aludimos a crítica radical de Marx em torno da estrutura capitalista que ele aspirar demolir até os alicerces por meio da tão esperada Revolução. Marx de fato não acredita em reformas ou em reformismo porquanto encara a estrutura do capitalismo > Propriedade privada dos meios produtivos, salário, capital, lucro e portanto o Mercado como a essência - Monista! - do Capitalismo. 

Outra a compreensão dos que como Sombart não partem do materialismo mas do idealismo, ou como nós, de um realismo muito próximo do aristotélico (A Análise é do Pe Menvielle.) Estes divisam no Capitalismo dois aspectos: Uma material ou estrutural que corresponde ao acidente, e outro essencial que corresponde a essência mesma do sistema - A esse último aspecto Sombart deu o nome de Espírito do Capitalismo. 

Para todos nós e escolas citadas, apenas esse espírito do Capitalismo i é, a aspiração pelo lucro ilimitado, a cobiça, a avareza, etc é incompatível com a Ética, devendo ser extirpado - Assim qualquer ideia de progresso infinito ou de ilimitação econômica que dê suporte a uma visão de mundo ou ordem economicista das coisas. Lembrando os religiosos deslocados, os espiritualistas incoerentes e os críticos hipócritas do marxismo que economicismo é materialismo. Ora, nós nos opomos consciente e resolutamente ao materialismo e por isso incriminamos o capitalismo, enquanto fonte de todos os materialismos contemporâneos. 

Quanto ao aspecto acidental ou estrutural do capitalismo i é Mercado, salário, lucro, capital, etc, temos que poderia ser conservado desde que eliminado aquele espírito acima descrito ou desvinculado dele e associado a uma Ética humanista i é posto a serviço da humanidade ou do grupo social, o que supõem planejamento, controle e limitação - Nas palavras do insuspeito, mas genial, J M Keynes: Postulamos no mínimo um capitalismo enjaulado ou castrado; um liberalismo econômico não economicista. Mesmo por que os conceitos de humanismo e economicismo são teleologicamente excludentes.

Claro que uma reforma puramente econômica e radical nos termos de Marx, desde que não resultante de uma Revolução inútil, seria possível. - Embora suscitando dificuldades e obstáculos muito mais sérios. 

Por isso apostamos séria e honestamente num Capitalismo enjaulado ou num Mercado controlado por uma Legislação política voltada para o bem comum ou como se diz hoje para a qualidade de vida. Honestamente não creio que seja uma terceira via mas, a velha via do Socialismo > Palavra criada por Leroux que ainda assusta muita gente, principalmente os de cultura e formação protestante. Permitam-me dizer que existem apenas dois modelos: Capitalismo, i é, o paradigma da ilimitação (Nos termos do individualismo.) ou do descontrole social e político posto pelos 'clássicos' ingleses> Smith, Ricardo, etc e os Socialismos, que postulam uma limitação em maior ou menor grau. Se admite qualquer índice de controle ou limitação não pode ser capitalismo na acepção leal ao termo. Por isso temos que encarar o papa, os católicos sociais, os padres da igreja, os filósofos gregos, os reformadores sociais do antigo Oriente, Keynes, Galbraith, Giddens, Chesterton, Belloc, fabianos, etc todos, sem exceção, como socialistas. 

Se o termo ainda escandaliza algumas almas assombradas pela cultura protestante calvinista, podemos empregar quaisquer outros criados pelos padres: Fraternalismo, comunitarismo, solidarismo, cooperativismo, coletivismo, etc dá no mesmo, pois a essência de todas essas correntes ou escolas consiste em submeter o econômico ao político e consequentemente ao social numa perspectiva ética. Os métodos e modelos são diversos porém o fim consiste em inviabilizar a ilimitação e barrar acesso a um economicismo materialista pelo qual o ser humano seja esmagado...

Logo, para mim, o terror da palavra é irrelevante e sinal de infantilismo. Passo...

Faço com o capitalismo o que ele costuma a fazer com diversas religiões e escolas filosóficas - As quais ele aplica uma análise realista dualista, esvaziando-as de seu espírito ou consciência e assumindo-as como técnicas. 

Vou exemplificar: O predador economicista atua a semelhança do cozinheiro ou culinarista que após ter esvaziado a caixinha de leite, reaproveita-a colocando massa de bolo ou de pudim...

Mas por dizer predador ocorrem-me as vespas, as quais após sedarem suas presas nelas inocula seus ovos. Eclodindo os ovos da vespa o inseto hospedeiro se transforma numa casca ocupada por uma chusma de larvas... Parece inseto mas não passa duma casca,

Em que pese a aparência de exagero é exatamente o que a ideologia capitalista tem feito com diversos sistemas na modernidade medíocre. 

Toma os acidentes do sistema e insere-se a si mesmo enquanto essência, ditando princípios e valores a uma técnica ou estrutura.

Dentre os sistemas cooptados ou colonizados por essa ideologia materialista temos o nosso Cristianismo, o Budismo, o Estoicismo, etc

Começarei pelo Budismo. 

Todos conhecem muito bem o 'budismo' Mindfulness, que é um budismo não Budista. Vá a página do Instituto Filipe de Souza e lerá: "Para praticar Mindfulness... não precisamos acreditar em Karma, reencarnação, iluminação do Buda, etc". Pode crer inclusive que Buda seja um perverso ou réprobo...

A apropriação consiste em tomar técnicas próprias do Budismo, desvincula-las do Budismo - assim de suas crenças e princípios, e coloca-las a serviço do Mercado ou da gerência do Mercado. Apossa-se da técnica do Budismo com o propósito de negar ou destruir a essência do próprio Budismo, a qual levaria o profitente a questionar o acúmulo ilimitado de riquezas ou o sucesso financeiro. 

Agora pasme - Há quem praticando tais técnicas se apresente como Budista!!! Budista do mercado!!! Apóstolo do liberalismo econômico ou do capitalismo...

Sim senhores...

Ocorre o mesmo com o Neo Cristianismo Ocidental ou protestante ou americanista, de matriz calvinista. Foi em tal organismo que fermentou essa coisa chamada Teologia da prosperidade que tanto sucesso faz no Brasil. E há 'cristão' que se incomode com a Teologia da Libertação (Devido a seus vícios e desvios!)... Minimizando a Teologia da prosperidade. Teologia que colocou certos meios, supostamente religiosos e cristãos, a serviço do mercado ou da aquisição de riquezas - A ponto de converter seitas em Empresas ou Emprejas, voltadas primeiramente para o acumulo de bens materiais neste mundo! E leem  no Evangelho: Não junteis riquezas nesse mundo... Não podeis servir a Deus e as riquezas...

De fato, temos na T P, o supremo monumento erguido a incoerência ou leviandade dos seres humanos!

Mas esta aí, um novo Evangelho, uma nova Teologia, uma nova Graça submissa a um poder econômico e posta a serviço de uma ideologia materialista. Nem Arístipo de Cirene logrou subverter de tal modo o socratismo como o sectarismo protestante - Com a manobra do livre exame! - logrou submeter e esvaziar o Cristianismo...

Mais assustador ainda: Católicos Ortodoxos, apostólicos romanos e anglicanos, aproximam-se disso... sobretudo movimentos carismáticos como a RCC... Pois estão ligados ou relacionados pelo puritanismo e pelo fetichismo. E vai essa mentalidade penetrando o papismo ou a ortodoxia! A ponto de vermos Cristãos Apostólicos assumindo os postulados anti Cristãos do capitalismo... Em que pese toda literatura patrística ou a nossa Tradição!!!

E temos um Cristianismo esvaziado ou não Cristão> Tão casca quanto o Budismo Mindfulness.

Mais sortudo é o hinduísmo - Do qual os canalhas tomaram apenas a Yoga...

Há ainda o caso da bela doutrina de Zeno, Cleantes e Crísipo - Cuja opinião sobre o acúmulo de riquezas repassaremos na segunda parte deste artigo!... Pois os mesmos patrões, administradores, gerentes e servos do capitalismo, que tomaram preces mágicas ao Cristianismo, meditações ao Budismo, etc tomaram igualmente a ascese FUNCIONAL do estoicismo - Como denuncia Pugliucci - colocando-a a serviço do sucesso financeiro ou da obtenção de grandes fortunas.

E no entanto a visão estoica sobre o acúmulo irrestrito ou ilimitado de riquezas ou sobre priorizar o sucesso financeiro, não difere em nada da Budista, da Cristã Apostólica ou histórica ou ainda da Socrática ou da Cínica. Aqui a visão crítica é comum, e poderíamos incluir ainda Confúcio, Platão, Aristóteles, etc que só mudaria o grau ou nível da crítica. Todos aqui veriam o Capitalismo como um empobrecimento da cultura, como uma corrupção, como uma alienação, como desumanização, despersonalização, degradação...

Claro que o princípio operatório é o mesmo: Nada de vida conforme a natureza, de panenteísmo, de adiaphoras preferidas, etc Pois o conteúdo próprio ou essencial do estoicismo é eliminado até os fundamentos.

O problema aqui é que a semelhanças dos meditabundos, dos feiticeiros 'cristãos' etc também esses se apresentam como estóicos, além de ostentar certas formas de ascetismo muito mal compreendidas ou ontologicamente presumidas...

Portanto a questão que enfim aqui se coloca não é se somos Cristãos, Socráticos, Cínicos, Estóicos ou Budistas mas se somos - E insisto nisso! - se somos bons Cristãos, bons Socráticos, bons Cínicos, bons Estóicos, bons Budistas, etc 

Noutras palavras: Se somos Cristãos autênticos e integrais...

E não meio Cristãos, superficialmente Budistas, aparentemente Estóicos, por estarmos comprometidos com outros princípios e valores ou por nos colocarmos a serviço de uma cultura de morte que não nos pertence.

Penso que dois ou dois mil e quinhentos anos seja bastante tempo - E já é tempo para que as coisas sejam levadas a sério...

Até quando vamos tolerar que nossa herança clássica ou Cristã, que o patrimônio imaterial ou religioso da humanidade seja instrumentalizado por um sistema individualista e materialista... Por um sistema egoísta e cruel que nos tem ensinado a tratar a terra nossa mãe a semelhança de vermes ou abutres que devoram uma carcaça podre...




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