sexta-feira, 25 de setembro de 2015

Cultura européia, cultura norte americana e cultura islâmica II

A gestação da cultura de morte: protestantismo, capitalismo e cultura Norte Americana

Helenismo e Cristianismo ou se preferirem Socratismo e Catolicismo antigo, lançaram na Europa os fundamentos de uma cultura humanista. Todavia o desenvolvimento desta cultura foi bruscamente atalhado pelas invasões germânicas e pelo advento do islamismo. Apenas no contesto da civilização Bizantina houve relativo desenvolvimento.
A partir do ano 1200 houveram diversas tentativas de restauração, umas mais outras menos felizes. Por este tempo no entanto o Catolicismo já havia perdido dua puridade. Melhor dizendo a igreja romana afastara-se um tanto do Catolicismo, transformando-se numa monarquia com ambições teocráticas. Como já fizemos questão de assinalar noutro artigo, a luta entre o semi pelagianismo ortodoxo e o agostinianismo ascendente dispersava as forças da igreja. A fixação do dogma das penas eternas corresponde a um instante dramático e decisivo. 

No entanto, apesar de suas quedas e desvios, a igreja romana retinha ainda - como ainda retém (se bem que menos) - uma parcela do espírito Católico, alimentava um cultura humanista e sustinha um ideal de virtude.

Haviam problemas sérios no âmbito da fé. A cultura no entanto matinha-se, ao menos em parte, fiel aos padrões greco cristãos. 

Foi quando a partir do século XVI sucederam-se dois grandes abalos, aos quais seguiu-se a ruptura e a produção de uma cultura totalmente nova.

O primeiro grande abalo, a nível da consciência Cristã, foi o triunfo do agostinianismo por meio da reforma protestante. Até então estivera o organismo do Cristianismo enfermo. O triunfo do agostinianismo significa a morte do humanismo cristão e de modo geral uma perda de consciência.

No entanto ainda após a reforma, o surgimento das novas unidades eclesiais e o Concílio de Trento. Este novo padrão de fé e de cultura que se afirma não consegue arrancar, da noite para o dia, os elementos católicos presentes na cultura. Assim se as ordens religiosas são extintas, a Inglaterra mantem-se fiel aos Bispos e muitos destes fiéis a tradição. Permanecendo de pé as torres, calvários e cruzes, e viva a memória das terras comunais! Já na França para onde quer em olhem os reformados deparam-se com os símbolos e instituições da antiga e odiada fé.

Aspiravam os sectários pela produção de uma nova cultura. Todavia o velho mundo esta impregnado de simbologia católica.

A solução foi buscar solo virgem com o intuito de criar a tão sonhada república bíblica, sem sinos, cruzes ou bispos. Tal o ideal sonhado pelos puritanos que embarcaram-se no Mayflower.

Como os santos muçulmanos de hoje eles não estavam dispostos a viver ao lado dos odiados anglicanos e papistas. Os anglicanos e papistas a seu tempo não estavam nem um pouco dispostos a curvar-se perante as exigências da Torá.

Melhor expulsar os índios de suas terras. Seria bem mais fácil uma vez que anglicanos e papistas possuiam asmas de fogo e os índios não!

Assim, deste ideal mosaísta, puritano, huguenote, sectário ou fundamentalista, surgiu a grande república do Norte, a que chamamos Estados Unidos.

A proposta era fazer desta província ou pais uma nação protestante, ou como dizem, bíblica.

Ignoravam no entanto que todo reino dividido trás em si uns germes da morte.

Multiplicaram-se as facções, seitas, partidos... pois após os calvinistas chegaram os congregacionalistas, anabatistas, quackeres, metodistas, luteranos, unitários, etc os quais puseram-se logo a combater uns aos outros... produzindo espaços ou nichos de incredulidade.

De modo que em 1776 os indiferentes, que não eram poucos, tendo em vista seus próprios interesses - alias os mais saudáveis - e a condição pluralista da sociedade norte Americana, vibraram rude golpe ao fundamentalismo, separando a religião do Estado ou as fés da política.

Por este tempo o deísmo já circulava na Inglaterra a mais de século, a fé minguava nos corações, os Bispos perdiam sua autoridade e a Igreja Anglicana - ao cabo de cento e cinquenta anos de luta - conhecia sua segunda grande derrota. A Revolução Industrial havia sido concretizada e já um novo ideal, materialista, economicista ou capitalista; norteava as ações humanas produzindo uma nova cultura.

Reviveria no entanto o humanismo na Inglaterra, ja por meio do papismo que mais uma vez alastrava-se pelo pais, do alto anglicanismo revigorado e da mais ampla gama de socialismos secularizados, das utopias de Owen ao Comunismo. Destarte, apos seu zênite ou idade de ouro, o liberalismo econômico inglês conheceu significativo declínio. Ficando a fera enjaulada até ser libertada mais uma vez pela 'Dama de ferro'.

Os EUA no entanto eram terra Virgem. Jamais fecundada pela cultura greco romana. Sem uma História medieval. Sem qualquer tipo de tradição humanista. Sem raízes deitadas no solo do Catolicismo ou Cristianismo antigo. Sem consciência, sem memória, sem passado em termos de promoção humana ou justiça social.

De modo que eliminado o éthos religioso ou a inspiração credal. Mais do que na Inglaterra o éthos materialista economicista foi capaz de criar raízes, fomentar caráteres, produzir cultura e criar estruturas sociais. Em recando algum do mundo moderno o capitalismo conseguiu encarnar-se em termos de estruturas sociais e impor-se como nível de consciência senão dos EUA.

Na Europa também conseguiu em maior ou maior medida criar estruturas. Estas no entanto - exceto na idade de ouro do liberalismo inglês - jamais lograram desenvolver-se por completo ou esgotar suas potencialidades e absorver os demais setores da sociedade subordinando-os a seus interesses. Havia sempre algum limite ou medida imposto pelas monarquias, pelos catolicismos, pelas tradições ou pelos socialismos seculares. Barreiras políticas, religiosas, sociais ou ideológicas que o economicismo jamais conseguiu destruir por completo. Permanecendo assim sempre incompleto!

Pode ter surgido na Europa enquanto ideologia. No entanto esta ideologia européia encontrou sua máxima expressão apenas na grande República do Norte.

Pelo que a cultura norte americana e a cultura européia não são uma e a mesma coisa.

Na cultura européia sobrevivem, numa massa heteróclita, elementos religiosos ou seculares que precedem em séculos ou milênios o advento do capitalismo e que se lhe opõem.

Assim o ideal de liberdade e democracia direta tão caro aos antigos gregos, igualmente presente nos cantões suíços desde a Idade Média e em diversas partes da Escandinávia. Assim o ideal socialista alimentando pela consciência Católica o qual, mesmo após sua secularização, obstina-se em afirmar-se no contesto europeu. Assim as tradições campesinas sempre infensas ao novo ritmo de vida. Um certo sentido do homem e do humano afirmado desde os tempos de Sócrates. Um certo sentido da arte e do intemporal e contraposição ao imediatismo e consumismo vulgares....

Os Norte americanos mais do que ninguém assumiram os ideais do capitalismo e por assim dizer deram-lhe um corpo ou uma existência social. Chegando a criar um sistema de pirataria internacional com o objetivo de pilhar riquezas. De que resultaram infinitas guerras.

É um tipo de imperialismo diverso de qualquer outro. Todos os imperialismos antigos - do romano ao inglês - conheceram uma contrapartida cultural até certo ponto positiva. Os romanos e seus sucessores folgavam em estabelecer colégios, acadêmias, museus e instituições culturais nas regiões economicamente dependentes ou periféricas. Os EUA jamais se preocuparam em fundar escolas, museus, termas ou pinacotecas as unidades políticas que pilhavam...

A cultura que os EUA implantam nas regiões dependentes é inteiramente superficial ou destinada ao consumo. Redes de fast food, bonés, tênis, camisetas... Não existe qualquer elemento unificador como na filosofia grega ou no cientificismo anglo francês. Os romanos diga o que se disser, amalgamaram-se aos demais povos porque eram capazes de ve-los como seres humanos. Os EUA jamais conseguiram enxergar além do próprio umbigo. Por isso criaram e criam apenas laços econômicos de dependência.

Como sói suceder no entanto, tais relações carregam ou transportam sempre algum conteúdo cultural. Lentamente as regiões economicamente dependentes convertem-se em províncias culturais do centro dominante. Assim o modo de vida Yankee transbordou, por assim dizer, e ocupou a maior parte do planeta. Inclusive a Europa.

E por ser esta cultura mais antiga e mais sólida, este assumir novos modos de vida, não pode deixar de produzir um impacto bastante significativo após o pós guerra. Os mais velhos sobretudo mostravam-se escandalizados face a conduta dos mais novos, cada vez mais 'norte americanizados'. No que diz respeito ao vestir, ao comer e sobretudo aos gostos musicais pode-se dizer que os EUA produziram um sistema global e que a moda passou a ser ditada por eles. Nem Roma, nem Paris, nem Londres mas Nova Yorque!

E como já houvesse uma disputa ideológica na Europa entre os elementos anteriores ao advento do capital e os elementos favoráveis a nova ordem, os elementos culturais provenientes dos EUA, associados ao éthos consumista, converteram-se em fiel da balança, fazendo o caráter daquela sociedade inclinar-se decididamente para a nova ordem. Isto desde os anos 50 mas especialmente após os anos 80 e o colapso das Repúblicas comunistas do Leste. Os anos 90 foram decisivos para o triunfo da ordem capitalista na Europa enquanto produtora de cultura!

Bem antes disto, no entanto, os esquerdistas radicais, haviam desconsiderado a questão da variedade cultural na Europa, e apresentando tudo como uma coisa só.

Eles jamais foram capazes de discernir onde encontravam-se as fontes de seu próprio modelo ou padrão de pensamento.

Alienaram-se completamente quanto a dinâmica cultural e o conhecimento da cultura.

Por mais importante que seja a crítica científica de Marx ao capitalismo (compreenda-se que me refiro unicamente ao 'Capital' e não a suma metafísica comunista posta para o futuro ou o 'como deve ser') é sempre bom lembrar que sua crítica atinge apenas a estrutura material do capitalismo.

Sempre poderemos aprofundar sua crítica atingindo o espírito éthos do Capitalismo. Para tanto convém resgatar um Morelli, um Mably, um Morus, um Campanell, um Aquino, os padres da Igreja, Paulo, e Jesus, e Aristóteles, e Sócrates... mergulhando nas raízes ancestrais da nossa cultura.

Portanto se hoje, em 2015, a cultura européia de modo geral, inclinou-se decididamente na direção do modelo Norte Americano a ponto de ameaçar a existência do Estado de bem estar, devemos reconhecer que se trata dum fenômeno bastante recente. E que em menor medida, os elementos dissonantes ainda estão lá merecendo ser examinados e reaproveitados.

Mesmo tendo criado raízes no organismo europeu o câncer americano ou americanista não conseguiu eliminar por completo a resistência em termos de sobrevivência cultural.

Em que pese a malignidade infundida pela cultura de morte e a sombra do capitalismo não nos podemos esquecer de Sócrates, perder de vista um Ambrósio, minimizar a existência de um Morus ou de um Bloy! É uma escuridão em que brilham diversos focos de luz.







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