Resta-nos constatar se o Comunismo e os Socialismos são humanismos.
Gostaria de tecer algumas considerações a respeito:
Antes de tudo gostaria de salientar que o Socialismo é antes de tudo um estado de indignação e inconformidade provocado pelo capitalismo ou melhor por seus resultados e já digo que não pode experimenta-la quem não possuí algum senso de justiça.
Todo socialista é em certo sentido não só herdeiro de Jesus Cristo mas antes de tudo - cronologicamente falando - legatário de Platão.
Se você não se identifica com o outro e se situações de injustiça são incapazes de revolta-lo jamais compreendera o Socialismo. Encarando-o muito provavelmente como uma patologia, síndrome, loucura ou delírio.
Uma questão de princípios, de valores, de sentido.
Não preciso de Marx aqui. Não entra Engels aqui. Não dependo de Lênin. Apenas uma consciência de justiça face a situações de injustiça.
Os socialismos todos trazem este sentido idealista do vir a ser ou do que deve ser em oposição ao que é e uma firme aspiração por alterar esta realidade indesejável.
A consciência burguesa além de conformar-se dizendo: É assim mesmo! ainda mistifica alegando que sempre fora assim. Quando sabemos que o capitalismo foi precedido por outras formas de produção econômica e organização social. Nem sempre fora assim, portanto nem sempre precisará se-lo.
Não gostaríamos de ser explorados ou de estar no lugar de um proletário. E por isso proclamamos a necessidade de redimi-lo. É o que chamamos de solidariedade ou alteridade.
Todos apreciamos ser verdadeiramente livres em posse de nosso espaço, de nossas roupas, de alimentos, etc e por isso desejamos que todos experimentem essa mesma liberdade!
"O que vocês desejam que os outros vos façam, fazei vós assim a eles."
Tal o objetivo dos socialistas.
Apreciemos agora os meios:
O socialismo ao contrário do comunismo recusa-se a encarar o golpe a sedição ou a revolução sangrenta como uma receita de infalível para todos os problemas sociais. Não adere pois a mística vulgar e grosseira da violência... nem acredita que condições sociais possam ser fabricadas ou criadas a partir da força bruta.
Não excluí a possibilidade de um conflito em determinadas circunstâncias. Não ignora as doutrinas da guerra justa, da legítima defesa, da auto determinação de um grupo social, etc Não é legitimista ingênuo. Mas também não desespera quanto a via do político ou institucional, acreditando na ampliação e aprofundamento da democracia que temos até chegarmos ao poder popular e a democracia direta; após termos percorrido um lento caminho, sempre dialogando com a cultura e investindo em educação.
Agora o que socialismo algum admite é a doutrina da ditadura ou o viés totalitário do Comunismo.
A diferença aqui, em que pesem as mentiras, calúnias e generalizações da canalha liberal, é crucial: Os socialismos todos encaram o liberalismo político legado pela burguesia como um bem ou como algo essencialmente positivo. O liberalismo a ser demolido não é o político mas o econômico. A democracia burguesa ou formal não deve ser revogada mas ampliada ou aprofundada até tornar-se popular.
Em geral os socialismos, por diversas vias - como plebiscitos, referendos, meios de comunicação virtuais, etc - buscam superar a democracia burguesa de Locke jamais revoga-la implementando uma ordem autocrática ou absolutista. A liberdade para os socialistas é um valor real que buscam conciliar com a igualdade desprezada pelos capitalistas.
Daí o tema dos socialistas em geral ser: Igualdade e Liberdade e/ou vice versa.
Donde se concluí que por via alguma o socialismo pode se apresentado como um anti humanismo. Tendo em vista seu compromisso com as liberdades e com os direitos fundamentais da pessoa humana. Podem classifica-lo como loucura ou ingenuidade mas não como um anti humanismo.
Pois mesmo a igualdade que busca não é absoluta - como a que buscam os comunistas - mas relativa. Pois trata-se como esclarece Bakhunin duma igualdade de oportunidades ou chances, a partir das quais - dentro de certos límites - as desigualdades decorrentes do esforço humano tornam-se legítimas. Não o são no contesto capitalista porque jamais se parte de condições iguais... tendo os filhos dos milionários todas as chances e os filhos dos trabalhadores chances bem reduzidas.
A todos os títulos é o socialismo uma doutrina equilibrada, que nega-se a reproduzir em larga escala os pecados do capitalismo.
Passemos agora ao comunismo.
Será ele um humanismo?
Para chegarmos a uma conclusão satisfatória comecemos separando os fins dos meios.
O fim aqui é o mesmo: o controle das atividades econômicas pelo grupo social e a consequente extinção das injustiças.
Sentido precipuamente socrático, cristão, ético que o capitalismo não possuí nem compreende.
Neste sentido há uma certa identidade de fins entre o ideal Católico e o ideal comunista, alias socialista.
Faz-se mister confessar que a seu modo é o comunismo ou brado de alarma. Uma consciência de que algo não vai bem. O sintoma de uma enfermidade quiçá bastante grave. Ora o capitalismo é esta enfermidade grave, é uma consciência acomodada, um sistema impenitente! A ponto daqueles que pretendem corrigi-lo ou enjaula-lo - como Keynes - passarem por heréticos!
O comunismo tem algo de heroico e nobre por ter se sensibilizado face as situações experimentadas pelo proletariado. Fez dele uma espécie de Messias... mas porque antes o capitalismo o havia crucificado!!! Não, este proletariado não é uma classe predestinada, um messias, um redentor ou uma categoria perfeita... É no entanto mártir da cobiça e como tal digno de lástima e de regeneração.
O Comunismo teve o mérito de percebe-lo e de converte-lo numa verdade distorcida! A qual nem por isso deixa de ser verdade. O Comunismo por um tempo importou-se com aquele ser encadeado as máquinas e sujeito a uma disciplina sub humana, aspirando redimi-lo. Há aqui solidariedade! Há aqui alteridade! Então há aqui um conteúdo de humanismo.
Soube o marxismo ortodoxo perceber a situação ou identificar o problema. O que não soube foi soluciona-lo, adotando uma metodologia incorreta, alias amplamente empregada pelo capitalismo.
Antes que o comunismo santifica-se os golpes de estado, desesperando do processo histórico e da educação, o capitalismo implementara a democracia burguesa ou representativa por meio de golpes de estado. E se a Revolução Russa foi uma sedição, que foi a tão festejada Revolução francesa de 89???
Golpes fomentados por elites sem qualquer participação popular que derrubaram os monarcas absolutistas. Não o povo! Pois não houve nem plebiscito, nem referendo, nem qualquer tipo de consulta uma vez que o bom povo era monarquista em sua maioria (!!!). Foi a imposição duma ordem democrática. E já sabemos porque nossas democracias sequer estão consolidadas. Porque ainda não se aprofundaram ou ampliaram tornando-se mais consistentes e reais... Porque ainda não assumiram a forma grega... Uma vez que houve a sobreposição de formas democráticas sobre uma cultura monárquica, ocorrendo a educação para a democracia 'a posteriori'.
Nem é para admirar que os EUA em pleno século XIX ainda perpetrem golpes democráticos sempre mal sucedidos!
Jamais nos libertamos do golpismo. Não é apanágio exclusivo dos comunistas mas vício de que se serviram os liberais do passado cuidando apressar a História e burlar o processo de produção cultural.
Nem mesmo quanto a panaceia ditatorial pode o liberalismo eximir-se.
Afinal Robespierre não teve de fazer-se ditador após a grande Revolução, cuidando apressar a História? A qual tornou a recuar assim que ele fechou seus olhos... não tivemos a ditadura florianista aqui no Brasil, logo após o 15 de Novembro???
Democracia que precise apoiar em ditadura, que tido de democracia é esta?
Trágico foi o erro de Lênin ao sancionar a ditadura do proletariado ora atribuída aos sociais democratas Marx e Engels. De marxista tem a ditadura marxista muito pouco... Marx jamais considerou seriamente a politica e jamais aprofundou suas pesquisas neste campo. Não foi ele quem concebeu o partido como uma espécie de igreja sem deus ou vaticano secularizado, mas Lênin.
Pode-se justifica-lo no entanto se se leva em consideração o espirito do povo russo, impermeável a cultura democrática européia. Como implantar uma democracia burguesa numa cultura 'tzarista'? Absurdo dos absurdos! Tinha mesmo o marxismo russo ou bolchevismo de assumir as formas autocráticas oferecidas pela cultura e apresentar-se em certo sentido como uma continuação do tzarismo. Não deve portanto a Revolução dos russos constituir objeto de nossos melindres.
Problema aqui é desejar transpor a realidade russa - em termos de leninismo - para países em que havia já uma cultura mais ou menos democrática em formação, revertendo este quadro e fomentando ditaduras. Tal o equivoco sinistro do comunismo ou bolchevismo. Desejar reproduzir a experiência russa noutros contextos e culturas.
Tal o erro dos Estados Unidos, das potências ocidentais e desses comunóides e anarcóides que chegaram a vislumbrar primaveras democráticas num contexto islâmico. Quando sabemos que os fundamentalismos e massas fanatizadas só podem ser contidas - e devem se-lo - por regimes despóticos e autoritários. Do contrário a tentativa de implantar-se uma democracia de dentro para fora degenera sempre em teocracia, por falta duma consciência laicista e dum sentido da liberdade.
Pecam comunistas, anarquistas e mesmo socialistas, ao examinarem as terras do Oriente por falta de afinidade com a cultura. Os EUA erram e pecam porque interferem e seus adversários pecam e erram porque esperam do islamismo o que ele não pode dar ou fornecer: suporte para a policracia e para o socialismo. Assim os tontos que em 17 esperavam poder implantar uma ordem democrática onde antes florescerá o tzarismo! Assim os que em 89 juntamente com Robespierre cuidavam lançar os fundamentos de um mundo mais justo e fraterno numa cultura ainda demasiado monárquica, religiosa e um pouco burguesa...
Quando os homens aprenderão que devem caminhar em comunhão com o processo histórico agindo dentro de determinados limites e sem cogitar poder apressar a História?
Resta-nos não só concluir que em que pese seu fim humanista, os métodos adotados pelo comunismo não só não foram humanistas como chegaram a ser inumanos. Foram todavia tais métodos tomados ao liberalismo, 'pai de todas as Revoluções' como diziam De Maistre, Veuillot, A Nicholas e outros reacionários do século XIX. A mesma sensação experimentada pelos liberais de hoje face a propaganda comunista e as diversas tentativas de golpe foram já experimentadas pelos monarquistas do século XIX. Agora se os liberais perpetraram golpes contra os feudais e substituiram-nos por que lamentam-se tanto face a possibilidade de golpes comunistas???
Por todos estes títulos é necessário descrer nos golpes enquanto solução para os problemas sociais e confiar na educação e nas instituições democráticas. Caso desejem abalar o estado burguês, sirvam-se da desobediência civil de Thoureau! Tal o sentido do socialismo!
Reconheçamos enfim que o liberalismo econômico não é o anjo que pretende ser nem o Comunismo o demônio que pintam uma vez que este limitou-se a reproduzir os erros e falsidades daquele, tendo inclusive o mérito de acrescentar-lhe uns temperos ou cheiros de humanismo; coisa que o liberalismo econômico jamais possuiu.
Algo há de humanismo no Comunismo ainda que ele não seja humanista em decorrência de seus métodos materialistas e grosseiros, resultados de uma visão determinista de mundo. Agora no capitalismo, que não passa de um culto arqui sacrílego tributado a Mamon não resta humanismo algum. Pois a afirmação dos economicismos foi a morte do ideal, da razão e da ética.
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