Num dias destes, proseando com um amigo, atalhou-me ele para postular a existência de diversas Éticas ou de Éticas diferentes, contrárias, etc tal e qual sucede a moralidade ou aos costumes, de fato relativos ao tempo e ao espaço.
Bem sei que eu que a par de diversas revelações ou grupos religiosos, existe certo número de predicações valorativas que revindicam ser Éticas. Revindicar porém não é ser, e devemos investigar os fundamentos.
Como Socrático e humanista que sou, julgo ela existência de uma única Ética autêntica ou bem fundamentada. As demais teorias e sistemas que revindicam este título seriam tão equivocadas quanto as moedas falsificadas.
Nem poderiam ser opostas e verdadeiras ao mesmo tempo. Declarar aceitáveis diversas éticas contraditórias equivaleria renunciar a verdade, e a contentar-se com aparências ou palavras.
Remeto meus críticos ou objetores ao princípio da contradição.
E diante dele dirijo-me aqueles que compreendendo a importância vital do tema estão dispostos a investigar e a descobrir qual seja a Ética verdadeira.
Você pode demonstrar por qualquer meio (Que não o religioso é claro!) que a Ética deva contemplar a espécie ou a sociedade ao invés do indivíduo??? Nada na natureza obriga o indivíduo a ceder lugar ao grupo. Nada, em absoluto. A empiria esta a favor dos individualistas. Aqui concordamos com eles, e chegamos, pelo que é ou a observação dos fatos, ao individualismo... Com todos os problemas subsequentes.
Kropotkin demonstrou que os animais costumam a auxiliar uns aos outros. Certo, é fato. Mas o que temos de indagar aqui é em que circunstâncias ajudam-se ou se ajudam-se mesmo com prejuízo de si mesmos e de seus interesses, i é, se os animais de imolam pelo outro e se isto é habitual entre eles. Quanto a este tipo de consciência gregária, quanto a imolar-se pela espécie, não tenho qualquer notícia entre os animais. Observo-o nos homens, mormente quando instigados por alguns credos religiosos. Ademais em situações ou circunstâncias anormais ou desfavoráveis tendem os animais a 'pensar' somente em si mesmo ou em termos individuais, exceto talvez da prole (inda que com reservas!) que é a continuação deles mesmos.
As Éticas empíricas não tem podido ultrapassar o abismo do individualismo.
Podem escapar ao abismo do utilitarismo chão???
Pode você leitor demonstrar-me, partindo do que é ou da experiência, que devamos construir princípios e valores que transcendam a utilidade ou aquilo que seja útil ao individuo, cogitando sofrer prejuízo em nome da justiça, como tantas vezes foi cogitado por Sócrates?
A simples vivência irrefletida e irredutível a razão jamais ultrapassa o ponto de vista de Trasímaco, inda que este, qual Morfeu, mude de feições com o passar das gerações. Excluído o elemento comum da reflexão metafísica ou do arrazoado racional, sustentará o homem a busca pelo seu prazer sem cuidar de outra coisa. Moral ou Ética sera sempre fruição de vantagens, benefícios, prazer, etc e não se sai disto. Assim a política será apenas uma questão de poder ou força, a serviço não do bem comum, mas da fruição individual... E atrelado a fruição do prazer e do poder teremos a posse de bens materiais até o abuso, garantindo acesso ao poder a ampliando o acesso ao prazer. E tudo fica nisto: Prazer, poder e fortuna em termos individuais.
Este tipo de 'Ética' sequer nega mas simplesmente despreza ou ignora a existência de seres sofredores, enfermos, escravizados, dominados ou injustiçados; pois os outros só existem para ele enquanto meios para se obter ou consolidar o próprio bem estar. O outro aqui é sempre um objeto ou uma coisa a serviço dos interesses individuais e não uma outra pessoa ou um igual, com o qual nos devemos solidarizar. A empiria não cobra essa equalitarização porque não observa a igualdade na ordem do mundo mas a desigualdade, a qual encara como natural e irreformável. Não se questiona a realidade porque inexiste o padrão ideal posto pela razão ou pelo exercício da metafísica.
Por isso considero apenas uma Ética como autêntica ou legítima em seus fundamentos: A Ética racional, que parte de uma problematização e reflexão profundas, construindo seus princípios e valores em termos de algo tão abstrato como a humanidade, face a qual todos são iguais em termos de relação. Este elemento comum ou 'elo de ligação' universal só se apresenta a razão, não a experiência, e é com base nele que disciplinamos o convívio, dando-lhe uma conotação marcadamente social a um tempo e abstrata ou ideal a outro.
Apenas esta reflexão, que ultrapassa a mera observação dos fenômenos materiais e cogita naquilo que é abstrato e social, poderia ter criado na noção de Bem Comum. Ora a noção embrionária de bem comum, afirma-se teoricamente com o Estagirita, embora esteja já presente em Platão, Sócrates ou na mentalidade da polis grega enquanto busca. E quando dizemos busca, dizemos busca racional.
O conceito em questão não foi apenas formulado pelos grandes sistemáticos do pensamento clássico, mas também provido de fundamentos estáveis ou essenciais.
Por este motivo quanto escrevo Ética, escrevo em singular e quero dizer sempre esta Ética que remonta a Sócrates, passa por Platão e é por assim dizer 'acabada' por Aristóteles, ao menos quanto a seus elementos mais relevantes.
As demais são aparências de Ética, muito mal construídas.
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