Nada mais veraz do que a passagem do Evangelho: "Os filhos das trevas são mais argutos que os filhos da luz."
Não poucas vezes são os filho da luz completamente estúpidos.
Como pirilampos envolvidos pela mais densa treva.
Tal a sorte dos Cristãos apostólicos, sejam Ortodoxos ou romanos sob o ponto de vista da cultura. Tamanha a inabilidade dos mesmos para compreender as relações econômicas, morais, científicas, etc
Por questão de convivência o único elemento que a igreja logrou compreender em sua rude simplicidade foi o trono. O que, em que pese do mesmo modo a advertência do Mestre: "Daí a Deus o que de Deus é e a César o que de César é!" - não evitou que levasse ela um chute na bunda por parte do Estado...
Quiçá por ódio ou rancor, após as primeiras ameaças de ruptura e os atritos iniciais, foi o Estado político que, no imaginário de nossas comunhões históricas, converteu-se em vilão. Sentindo-se a Igreja ameaçada pelo poder secular emergente ou pela teoria da soberania politica editada por Bodin, passou a desconfiar neuroticamente da autoridade profana. Sem cogitar que por trás dela, oculta, havia um poder bem mais forte, maior e mais tenebroso... O qual passou batido aos olhos da igreja ao longo dos últimos séculos.
E no entanto estava tal poder a espreita com o intuito de assumir o comando da Sociedade.
E, afirmado sobre as próprias pernas - Mas sem ter atingido o auge de seu poder. - pode já descartar o adjutório político do absolutismo, compondo com uma ordem democrática propensa a secularização. De fato quando o Mercado sentiu-se forte e senhor de si desamparou as monarquias, atingindo indiretamente o poder da Igreja. Uma vez que a Igreja exercia ainda certo controle sobre o Estado monárquico (Era uma via de mão dupla em que havia um controle mútuo.) e que o Estado monárquico buscava controlar todas as esferas (Conforme a já citada doutrina da Soberania de Bodin.) matou o liberalismo político dois coelhos com uma só pancada. Bom aluno de mestre Maquiavel afirmou o princípio bodiniano da soberania política - Em sua expressão mais chã - ou mesmo do direito divino enquanto serviu a seus propósitos face as revindicações do poder eclesiástico. Aluídas as revindicações eclesiásticas pela crise da fé descartou o apoio do Estado absoluto ou da monarquia. Pois nada havia de essencial para esse poder utilitário... Girando o pensamento liberal economicista em torno de uma instrumentalidade oportuna.
Bom é o quanto serve para promover os interesses da economia ou a aquisição de lucros: Se for a monarquia muito que bem... ou partamos para a democracia. Se for o papismo Ok... Porém se não o for faça-mo-nos protestantes. Como disse, nada de sério além do lucro. Nada de essencial.
Ali estava esse poder maquiavélico, relativista e utilitário; sem que a Igreja se desse conta do perigo. Pelo que brincou a Cristandade com o fogo e se queimou. Isto a ponto de existirmos numa sociedade Capitalista e não mais numa sociedade Cristã i é inspirada por princípios éticos autenticamente Cristãos. O que é absolutamente normal para a consciência protestante. De modo algum para a consciência Católica ou para a consciência apostólica. Pois não pode a espiritualidade séria e consciente viver de par com o materialismo mais desbragado. Seremos de algum modo Cristãos e norteados pela ética do Evangelho ou seremos capitalistas, as duas coisas não podemos ser, afinal: "Não é possível servir a Deus e ao dinheiro." - Tais as palavras do divino Mestre tantas vezes ignoradas pelo povo Cristão.
Verdade é que não estava desamparada a Igreja por falta de avisos. Pois se não tocou a Revelação divina a estrutura do Capitalismo tampouco deixou de alertar os homens quanto a seu espírito ou alma i é quanto ao pecado a avareza. A igreja no entanto, fugindo ao Evangelho, optou por carregar suas mãos sobre o que classificou como luxúria. Prestou atenção no mosquito e deixou entrar ou passar o elefante. E desde então solapou o elefante a ordem de Cristã.
Devido a uma tal falta de cuidado a avareza engendrou uma ordem ou cultura economicista, em comunhão com o protestantismo, por via do individualismo. Fácil entender que um elemento puxa e favorece o outro. E que o capitalismo chegou a instrumentalizar ou a adestrar o protestantismo, a ponto deste servi-lo muito docilmente. Tal a situação indigna da nova Cristandade protestante, a qual serve e é comandada ao invés de inspirar e ao menos indiretamente, comandar. Manifestou-se o Cristianismo para comandar o mundo, exercendo a soberania ética. O protestantismo no entanto serve a poderes econômicos, curva-se, colabora e aceita a situação como é dada. Nada mais oposto ao sentido do Cristianismo antigo professado pelos mártires.
Com o protestantismo o cristianismo ocidental perde o controle espiritual da humanidade. Cessando a civilização de ser Cristã. Foi o protestantismo, face ao controle direto e feroz da igreja papa, totalmente inepto no sentido de conceber um controle indireto da vida e da cultura por meio da Ética. Aceitou ser comandado por reis e príncipes numa medida jamais vista até então e através deles principiou a servir aos poderes econômicos. Desde então a moralzinha protestante, cessando de ser comunitária ou social passou a ser meramente familiar ou mesmo individual e portanto inofensiva para os poderes político e econômico.
Como um tal tipo de concepção servil infiltrou-se na igreja antiga já o dissemos.
Resta adicionar que fixação sexual da igreja velha bem como o ódio ou as suspeitas com que passou a encarar o poder político não foram indiferentes ao processo. Nada mais desastroso que visar controlar a sexualidade e descuidar da regulação econômica. Não que tenha a igreja renunciado a controlar a esfera da economia. Certo é todavia que investiu mais forças no setor da sexualidade humana, e foi um investimento desastroso.
Por insistir ainda hoje no sexual ou mesmo no político e prestar muito pouco atenção no econômico revela pouco ou nada compreender quanto a ordem da cultura.
O econômico, alterando o político e o social com o objetivo de satisfazer suas exigências acabou por alterar sacrilegamente a própria religião através do Vaticano II. Pois se a um lado havia a influência protestante e a vontade de agradar os sectários a outro era necessário criar condições tendo em vista a afirmação dos princípios e valores protestantes na IAR - Ora quem criou tais condições foi o capitalismo na medida em que suas instituições superaram as campesinas e em que o ritmo urbano se impôs a maior parte dos ocidentais.
Somente pessoas de fato muito superficiais ou tolas são capazes de ignorar que as instituições tradicionais, lentas e rígidas são próprias de um ambiente agrário ou rural. Consideremos portanto que o berço do Cristianismo foi uma sociedade agrária ou rural e não urbana. E que a cultura antiga não havia atingido ainda um ponto de ruptura pelo simples fato de seus núcleos urbanos não serem capitalistas.
O capitalismo no entanto impõem as cidades já existentes ou ao mundo que cria um novo ritmo, representado pelo relógio e notável pela celeridade, até chegarmos as relações líquidas de Bauman.
Ora esse mundo não é o do espírito, conforme o modelo legado pela Filosofia grega. Modelo pré capitalista em que vemos um Sócrates, pontífice do espírito, clamar a todo tempo contra as relações e poderes econômicos, os quais pareciam atentar muito seriamente contra seu modelo de cultura ou de constelação social.
E menos ainda era tal mundo emergente o mundo a Teologia, da Ética, da Estética artística, do culto Litúrgico, do padrão tradicional ou da Igreja antiga. Esta porém cometeu o grande erro de permitir que as coisas tomassem tal caminho e se transformassem nisso - Num mundo hostil a ela e a suas instituições. O mundo das relações econômicas aceleradas demanda uma religiosidade tanto mais pobre, simples, vazia e psicologista - Admitido este mundo será o mundo do protestantismo e o protestantismo será - Sob as formas mais vulgares - a religião de um possível mundo capitalista.
Afinal num mundo materialista e economicista não há espaço para valores como o bom, o verdadeiro ou o belo e sua 'paideia' não será a 'paideia' socrática da Kalokagathia, não corresponderá sequer ao padrão político preconizado por um Aristóteles como deduziu Arendt. Pois a economia livre e auto reguladora tudo absorve (K Polanyi) engendrando o que chamamos economicismo.
Materialismo, economicismo, capitalismo, etc são como antíteses face a vida do espírito que é a vida da Igreja. Da mesma forma no plano da ética a antítese entre individualismo e solidarismo não é menos clamorosa ou intensa.
Eis porque a apostasia verdadeira ou a descristianização do mundo não poderia ter começado pelo comunismo, pelo anarquismo, pelo fascismo ou pelo nazismo; os quais seriam triturados um a um pelo Cristianismo autêntico ou eticamente comprometido. Foi necessário portanto de a manobra principiasse pela destruição ou corrupção do Cristianismo, assim pelo protestantismo. A partir do qual manifestaram-se, uma após outra, as diversas culturas de morte.
O espírito deveria ser falsificado primeiro.
A partir daí constrói-se um outro mundo infenso ao compromisso. E cuja atmosfera religiosa é superficial.
Como esse mundo, convertido em espaço do trabalho, poderia ser ao mesmo tempo espaço do estudo, da prece, do ritual???
O universo da igreja antiga demandava tempo.
A modernidade no entanto falta qualidade democrática por recusar-se a dar mais tempo e espaço a política...
Como crer que daria algum tempo a fé ou a espiritualidade?
É uma sociedade que por negar tempo a formação fabrica massas. Massas que ameaçam não somente a qualidade do político mas também a qualidade da fé religiosa, traduzindo-se no sectarismo protestante.
Há autoritarismo e sectarismo irmanados do outro lado porque o tempo necessário ao cultivo do espírito nos foi retirado pelo poder econômico ou pelo modo capitalista de produção.
Errou feio Marx ao supor que a alienação se dá quanto ao significado do quanto produzimos. A situação e bem mais grave pois o capitalismo alineou-nos de nós mesmos.
Foi o culto alterado pela igreja romana e tornado mais simples para corresponder não apenas ao modelo do protestantismo mas também as exigências concretas do tempo ou da organização do trabalho. O operário ou trabalhador de hoje chegou a perder a noção do mundo simbólico e isso é por si só grave. não está mais a altura do culto simbólico ou tradicional porque foi despersonalizado ou melhor porque sua personalidade ao invés de ser integralmente educada e formada foi empobrecida.
Surgiu o modernismo exatamente nesse contesto de miséria ou indigência espiritual para ocultar-nos um fato abominavelmente monstruoso: A arte, a autêntica arte, que comporta técnica e regras, está morta ou agonizando. Assassinou-a o liberalismo econômico ou a massificação produzida por ele e desde então vivemos num mundo cada vez mais feio. Mesmo a esquerda massificada não foi capaz de percebe-lo e mergulhou de cabeça no pós modernismo...
O Vaticano II com suas simplificações torpes é tentativa da Igreja romana salvar-se neste novo mundo urbano e alucinante. Por isso teve de ir adiante e de tornar-se carismática, afetando os modos da assembléia de deus... Desde então irá essa comunhão de abismo a abismo, tombando outras tantas vezes no abismo do moralismo insípido... Cloaca em que terminará seus dias.
O que a Igreja deveria ter feito e não fez é ter combatido não apenas o neto, ou seja o comunismo, mas pai e o avô i é o capitalismo e o protestantismo com a mesma intransigência. Ter descuidado dos dois últimos no plano da cultura foi a grande desgraça da Igreja latina. Agora o mesmo movimento de apostasia - Instigado pelo puritanismo. - entra de cheio no bojo da Igreja Ortodoxo, levando a apostasia adiante. A única solução viável aqui é o repúdio em bloco da cultura americanista ou do modelo de 'sifilização' que nos é oferecido pelo protestantismo, começando é claro pelo liberalismo econômico. Nosso combate não se restringe portanto ao plano da fé mas segue pelo plano da cultura, e se não compreendermos a dinâmica da cultura, na medida em que o capitalismo e o protestantismo se expandem por nossas sociedade também teremos um Vaticano II - Preparemo-nos portanto para a resistência!
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