Dado sobre o qual não deve pairar mínima dúvida em nossas mentes é sobre ser a cultura americanista epifenômeno, produção ou construto da fé protestante ou do protestantismo.
Do que resulta um conflito ou choque irredutível face a Cosmovisão Cristã tradicional: Ortodoxa, Católica, Apostólica ou apostólica romana.
Pois seja derivada de um ambiente agrário\campesino, ou, como temos e cremos nós, derivada do mundo espiritual e invisível (Por meio daquele que nasceu numa manjedoura, não num palácio e recomendou que juntassemos tesouros no Reino dos céus.) é ela gregária, solidária, comunitária, fraterna... e totalmente avessa ao individualismo.
Basta dizer que P G F Le Play localizou a gênese do éthos individualista nas organizações sociais da Escandinavia medieval e não da judéia do século I d C ou em algo remotamente próximo do nosso Novo Testamento.
No entanto, o protestantismo assume, já em seus primórdios, esse éthos e se concentra em torno do que ele mesmo convencionou chamar 'salvação pessoal' - Uma noção individualista de redenção em que se perde de vista a dimensão fraternal ou comunitária do mistério, sempre afirmada pela Igreja antiga e fundamentada no amor, no exercício da bondade, no serviço, no convívio... Como por sinal lemos no livro de Atos: Caminhavam juntos como se um só coração tivessem e tudo tinham em comum.
Tal o preço pago pelo protestantismo ao minimizar as obras mesmo enquanto evidência externa de salvação e afirmar a possibilidade de uma salvação sem quaisquer obras, bem como uma salvação no pecado, uma meia redenção que a sobrevivência do homem velho, enfim a presença de uma graça fraca que não destrói por completo o mal ou pecado. Dessa noção anti ética de salvação sem fruto ou alteração de comportamento, derivou a ideia de que a Redenção é algo que se dá exclusivamente entre o individuo e Cristo, e que de modo algum envolve o próximo, a comunidade, a humanidade, a espécie... Excluindo-os.
Segundo a concepção anti nomiasta o próximo ou nosso convívio com ele jamais se aproxima ou toca o evento de nossa libertação. É algo que não passa pelo semelhante e que de modo algum depende do outro, mesmo a posteriori - Sequer somos salvos ou remidos por Cristo PARA o próximo.
Perdemos assim toda e qualquer conexão com o outro e dele nos alienamos para isolar-nos em nós mesmos, como numa ilha de conforto e sem qualquer compromisso - Pois se trata de uma redenção descompromissada e fácil, que perde por completo o próximo de vista. E nossas preocupações incidem apenas sobre nós mesmos...
De modo que o amor pelo outro cessa de ser concreto, dinâmico e ativo para se converter em algo abstrato ou teórico, numa ficção ou num discurso sem maiores responsabilidades. Aqui a solidariedade ou o convívio se converte em questão irreligiosa, em torno da etiqueta ou das boas maneiras e cessa de fazer parte de nossa vida espiritual ou da religião como um preceito divino derivado do Evangelho. Não é algo que devemos atribuir a Lutero ou creditar a Calvino mas que se fez cada vez mais presente no universo protestante e na consciência de seus adeptos a partir do anabatismo.
Ao fim deste processo podemos conceber o remido como alguém que encontrou-se com Deus em seu quarto fechado e que ali permaneceu fechado sem qualquer contato com seus irmãos batizados membros da grande família de Cristo. Pode-se já ser filho único ou sem irmandade...
A pedra ou a avalanche vai rolando nessa direção.
E na vida prática vai-se afastando do outro cada vez mais.
E mesmo sem que Calvino tenha responsabilidade o calvinismo muito contribui para agravar a situação. Pois se conforme a doutrina da fé não podemos distinguir os réprobos dos remidos nesta vida, na prática os remidos são os nossos e os réprobos os membros das diversas outras seitas cujos membros, rejeitados por Deus, não estamos obrigados a amar ou a servir...
Eis o protestante concentrado apenas em sua salvação e desconectado do mundo ou da comunidade. E estamos já num individualismo crasso - O qual, grosso modo, não passa de puro e simples egoísmo.- associado a espiritualidade ou a fé religiosa...
Seja por abuso, quanto a doutrina enunciada por Lutero (De que obras não salvam, embora sejam ABSOLUTAMENTE NECESSÁRIAS, ENQUANTO FRUTO DA FÉ OU DA SALVAÇÃO.) ou por desenvolvimento, chegou o protestantismo a tais termos: Do salvo isolado em sua torre de Cristo ou do indivíduo a sós com seu Deus... Coisa que jamais se virá na História do Cristianismo. E tal foi o sabor - Individualista ou egoísta, desse Cristianismo que passou a Inglaterra e passou aos EUA.
E já na Inglaterra, expandiu-se ou ampliou-se este vício abominável do egoísmo. Passando aos demais setores ou esferas da vida humana, e tudo contaminando.
De fato passou o individualismo da fé protestante a economia; com o capitalismo ou liberalismo econômico e a Filosofia; com o anarco individualismo de Stirner (Isto na Alemanha). Pois se pode o ser humano salvar-se isoladamente, pode do mesmo modo fazer riqueza desconectado de seus semelhantes, como poderia prescindir de um corpo político ou mesmo da sociedade e viver só, como uma ilha.
Perceba o leitor como foi o individualismo, através da fé protestante ampliando seu raio de ação - Dando origem a outras tantas ideologias noutros setores, embora afirmando-se como fundamento de cada uma dessas expressões - Meras manifestações suas em diferentes campos.
E de fato podemos apontar o individualismo como a 'afinidade eletiva' ou lastro comum responsável por conectar protestantismo, capitalismo e anarco individualismo - Até chegarmos ao ANCAP.
Eis porque a 'sifilização' norte americana gira em torno dessas três expressões de matriz individualista: Protestantismo, Capitalismo e uma democracia meramente formal que parece tender ao ANCAP... Aqui a busca pela salvação individual, ali a busca pelo enriquecimento individual, ao fim a demolição do ente político voltado para o bem comum e a atomização do corpo social ou sua destruição. Tal o éthos, o espírito, a consciência coletiva, o imaginário 'social' ou a cultura prevalecente naquele país.
Que tem isso de Cristo ou de Cristianismo tradicional, de catolicismo, de Ortodoxia ou de apostolicidade... Absolutamente nada. Tudo aqui partiu do protestantismo, com sua ideia de salvação isolada ou alheia ao corpo místico de Cristo, que é a Igreja.
Foi o protestantismo que, intencionalmente, desarraigou o homem da fraternidade eclesiástica visível para fazer dele mero membro da igreja celestial, unido ao Cristo somente, mas não a túnica mística e indivisível da Cristandade. Foi a reforma que criou esta 'esta' célula isolada sem tecido ou corpo...
Tal a força da fé e das coisas religiosas que essa concepção não tardou a migrar para os demais nichos da humana existência, até produzir uma série de expressões congêneres e subjugar a totalidade da vida. O que veio a ocorrer nos Estados Unidos, no momento em que o protestantismo associou-se ao liberalismo econômico e a democracia policial.
O que nos autoriza a identificar o protestantismo como matriz ou elemento plasmador dessa cultura.
Ainda que alguns papistas e ortodoxos - Os cristãos infiéis e culturalmente protestantizados. - (Americanistas) empreguem todos os recursos possíveis com o propósito de objetar, a relação é manifesta.
De fato alguns papistas e ortodoxos 'incoerentes' buscam relacionar a formação da cultura que tanto lhes agrada coma maçonaria. Sem considerar a um lado a oposição existente entre ela e os Cristianismo apostólicos e a outro o vínculo existente entre ela e o protestantismo Norte americano.
Ocorre-me ''O jardim das aflições" de Olavo de Carvalho - O qual parece insistir demais no conteúdo esotérico da organização (O qual num contexto calvinista - Em que o deus 'cristão' era pintado como mau - teve alguma relevância.) e em seu papel, enquanto suposta plasmadora da cultura.
Antes de tudo devemos esclarecer que, embora nós ibéricos, costumemos chamar a maçonaria de franco maçonaria, certo é que chegou ela a França, vinda da Inglaterra, a qual é seu primitivo lugar de origem.
Em seguida devemos ter em mente que o Histórico de relações entre protestantismo e maçonaria nos EUA não é uniforme mas, marcado por oscilações e recomposições sucessivas.
Por fim, devemos considerar que a maçonaria entrou em conflito irredutível com a Ortodoxia ou a igreja romana em seus respectivos domínios porque era já não apenas portadora dos elementos da cultura por nós assinalados, mas de fato aliada das organizações protestantes.
Desde o princípio houver certo gráu de proximidade ou amizade entre maçonaria e protestantismo, ainda quando os ideais maçônicos fossem um tanto vagos e os elementos da cultura protestante estivessem já formados. E para tanto devo observar que a primeira constituição ou livro de ordem maçônico foi escrito por um clérigo presbiteriano escocês.
Certamente que haviam ocasionais atritos, produzidos pelos protestantes mais fanáticos, devido justamente ao conteúdo místico\ocultista da maçonaria, o qual é até hoje seu disfarce. No entanto, repito, habitualmente tais relações era bastante cordiais.
A primeira ruptura sucedeu pelos idos de 1776 quando, ao desligar-se da Inglaterra a elite maçônica yankee, fixou a separação entre a esfera religiosa e o Estado. Para a apática igreja anglicana, mancomunada com Dna Inglaterra não foi algo assim tão significativo... Agora para os calvinistas e até mesmo para alguns batistas foi um duro golpe - Veja que os 'bible belt' ainda encaram tal tipo de organização política> Laicista, como atéia e maligna.
No entanto, passado o auge da crise, houve uma rápida conciliação de interesses em torno de princípios. Inaugurando-se um período de mútua e íntima colaboração ou simbiose, período em que a maçonaria assumiu com ainda mais fervor os elementos da cultura Yankee como a democracia policial, o capitalismo e 'para os países romanos e ortodoxos' o laicismo...
E de tal modo deu certo essa parceira que sequer podemos saber com perfeita nitidez quem dá as cartaz no Império. Putin assevera que as coisas partem do pentágono e 'vem' pela maçonaria ou que a maçonaria (Como a ONU e o papado pós Vaticano II) constitui um braço político dos EUA (Presente em quase todos os países do mundo.) e os EUA o centro de comando dessa sociedade secreta.
Seja como forem tais relações hierárquicas uma coisa é certa: É a maçonaria mero vetor ou veículo de uma cultura que de fato não produziu, vindo a encontrar já pronta, enquanto desenvolvimento do protestantismo. É continente e não criadora de conteúdo.
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