quinta-feira, 29 de dezembro de 2016
É Jesus um coquetel de deuses antigos? Uma resposta ao panfleto 'RELIGIÕES: TUDO QUE VOCÊ PRECISA SABER ANTES DE MORRER' - Oiced Mocam
A serenidade nos faz ler muitas bobagens e silenciar ou calar.
Em determinadas circunstâncias tentar refutar uma tolice pode acabar sendo demonstração de tolice ainda maior.
E também, como dizia o velho Orígenes, há quase mil oitocentos e cinquenta anos, a vontade humana continua irrefutável.
Se a pessoa quer ou deseja acreditar em algo nada do que escrevamos ou digamos mudará isso...
As vezes é sinal de sabedoria poupar argumentação, tinta e saliva!
Por outro lado, quando algum amigo querido ou aprendiz solicita uma refutação, então temos algo sobre o que pensar.
E neste caso só resta fazer algo muito bem feito.
Por isso pensei, pensei e pensei...
No entanto o que me fez tomar decisão, foi um desses inúmeros textos imbecis que desfrutam da boa graça dos esclarecidos internautas e faceboqueanos mas que seriam varridos incontinenti e como lixo dos meios acadêmicos.
Plagiando Julio César até posso dizer que: LI, RELI E NÃO CRI!
Pois até mesmo a estupidez há de ter seus limites. Ou não?
E como o fragmento da porqueira estivesse truncado e sem indicações lá fui eu pesquisar qual fosse a fonte, e céus eternos, para minha maior surpresa pude encontra-la!
Trata-se da obra intitulada - 'Religiões tudo que você precisa saber antes de morrer.' Busquei o nome do autor e ao invés de dar com ele, tudo quanto pude encontrar foi um anagrama (nome falso ou codinome FAKE) Oiced Mocam (Decio alguma coisa, Macom??? Não sei, mas até gostaria de sabe-lo para desafia-lo a um debate publico!). Trata-se portanto de obra tão chula que o autor até tem receios de vincular seu nome, preferindo recorrer as estrategias das Tjs, assim ao anonimato...
Ademais o titulo é absolutamente falacioso e enganador.
Pois não se trata de expor imparcialmente os credos religiosos, ou de descreve-los como faz a verdadeira ciência acadêmica representada por um G Vermes ou por um J D Crossan, mas de um ataque as religiões em geral, especialmente é claro ao Cristianismo, religião a que o autor vota profundo ódio. E busca apresentar tão rasteiro sentimento como cientifico!!!
No entanto já antes de darmos com o prato principal, começa o pregador ateístico a clamar contra o culto da Cruz, alias Católico, posto que os protestantes a exemplo dos ateus, também odeiam a cruz. E a partir de sua Bíblia passaram a apresenta-la como pagã e diabólica, bem antes dos ateus, os quais limitaram-se a copiar ou reproduzir a parlenga dos reformadores, seus mestres...
E de chofre já declara que o símbolo da Cruz passou a ser empregado pelos Cristãos muito após a morte de Jesus... Claro que ele se contenta com um 'muito apos' genérico, pois precisa-lo em termos de tempo não dá né... e sempre se pode dar uma 'saída para a esquerda...'
Seja como for numa de suas Epístolas - Tida como autêntica pela própria crítica racionalista e indiferente (cf E Renan 'Historia do Cristianismo') - o apóstolo Paulo já se refere a cruz como símbolo do poder e da glória de Deus e vinte anos após a morte de Jesus. Para além disto altares com cruzes foram escavados numa capela Cristã existente na cidade de Pompeia, soterrada pelo Vesúvio no ano 80 desta era (meio século apos a morte de Cristo) e fragmentos de vidros com cruzes gravadas foram encontrados nas ruínas de uma das primeiras igrejas cristãs de Damasco capital da Síria, construção que data do seculo I.
De modo que em meados do século II o polemista Ortodoxo Tertuliano de Cartago, aconselhava os Cristãos a traçarem o sinal da cruz a proposito de qualquer coisa... Antes de comer, beber, dormir, ler, etc.
Portanto a alegação do panfletário cristianofóbico carece de todo e qualquer embasamento.
Alegar que a Cruz ou qualquer outro símbolo assumido e empregado pelos cristãos é anterior ao Cristianismo nada significa caso consideremos a doutrina dos arquétipos ou símbolos universais presentes já na mente, já na cultura. O fato de existirem antes do Cristianismo comunica lhes veneranda antiguidade enquanto o fato de terem sido assumidos pela igreja indica que o Cristianismo converteu este universo mental de veneranda antiguidade em realidade concreta, inserindo-o nos domínios da História. O que precisa ser explicado não é a existência do símbolo 'a priori', mas sua presença 'a posteriori' na História do Cristo, assim a Cruz, assim a crucificação dele... Ela é que pede a explicação e a explicação é que os símbolos e arquétipos onipresentes no imaginário humano encontraram correspondência na vida deste ser humano singular.
Pois os cristãos só assumiram os símbolos antigos na medida em que tinham relação com a Historia de sua fé. Tomando o Cristo como referência fizeram uma seleção e tudo quanto não trazia este sentido foi descartado...
Genial a resposta dada a essa gente pelo nosso Joaquim Nabuco: Toda vez que vocês demonstram que algo no Catolicismo é mais antigo do que ele, mais venerando, mais remoto e tomado a religião ancestral do paganismo, tanto mais me apego a esta religião que corresponde aos anseios mais remotos da humanidade.
Em seguida o catequista ateu lança esta maravilhosa pérola de grande quilate: Sem o antigo testamento de que o Cristianismo se apoderou o Cristianismo jamais teria existido.
Diante desta pérola gigantesca não temos como nos controlar e só nos resta exclamar: E há redundância brava aqui! Pois se nosso gênio já havia mencionado o Cristianismo na primeira parte do período a norma culta da nossa lingua determina o emprego de pronome pessoal 'Ele' quando se refere ao Cristianismo pela segunda vez. No entanto a alma bárbara que compôs esse enorme acervo de afirmações gratuitas e estapafúrdicas porfia em martirizar a 'flor do lácio inculta e bela' enquanto vai destilando seu veneno puramente ideológico.
Pois ao contrário do que propala o apóstolo San Harris ateísmo não sendo material, imediatamente acessível aos sentidos, perceptível e empírico é meramente ideológico e por isso mesmo lançado pelos verdadeiros céticos ou agnósticos no mesmo balaio que o teísmo e tido em conta de fé ou especulação. Não, não são os cristãos que dizem isto e nem mesmo os religiosos mas pensadores do quilate dum Huxley. E se como alega o sr Pirula 'Darwin chegou perto do ateísmo' é justamente porque não chegou ao ateísmo, como por estar perto da Catedral da Sé não estou nela, pois se estivesse nela não estaria perto...
Quanto ao Antigo Testamento a afirmação é veraz quanto as profecias alusivas a vinda ou manifestação futura de Jesus Cristo, tais como: Uma Virgem dará luz a um filho... ou Um menino nos nasceu, filho nos foi dado... ou ainda Cresceu diante de nos como pobre rebento... varão das dores, moído pelos sofrimentos, etc Evidentemente que os ateístas odeiam tais oráculos pelo simples fato de que apesar de terem gasto toneladas de tinta e papel, jamais conseguiram refuta-los sob qualquer perspectiva. Pelo que continuam convencendo muitos homens de valor.
Agora para além das ditas profecias a relação existente entre Evangelho ou Cristianismo e Antigo Testamento ou Tanak, ao contrario do que declaram Calvino e os reformadores protestantes, foi marcada pela criticidade e pela rejeição. Moisés vos ensinou... disse o Mestre amado, eu porem vos ensino... O que atraiu a cólera dos rabinos opressores e reacionários com sua gama de preconceitos, e determinou o assassinato do subversivo ou revolucionário galileu (cf 'Cristo, o maior dos anarquistas', por Anibal Vaz de Mello).
Pouco mais adiante, pois a obra prima sequer é paginada e o autor parece ignorar que sejam números, damos com a afirmação arbitraria de que Jesus não passara de um tipo ideal, noutras palavras de um mito sem direito a existência histórica concreta. Assim entre o nazareno e o Mikey Mouse ou o Peter Pan não haveria qualquer diferença significativa. Incrível como os ateístas se mostram tão acríticos e apegados a suas tradições podres quanto qualquer judeu ou protestante. Haja visto sua petição ao arcaico e ultrapassado E Bossi cuja filípica remonta a século e meio tendo sido refutada brilhantemente pelo Pe Senna Freitas dentre outros tantos... Mas nosso crente, confiando docilmente nos dogmas estabelecidos pelo sr Bossi, sequer folheou a obra de Senna Freitas ou mesmo - o que é infinitamente mais grave - as dos já citados pesquisadores e cientistas Vermes e Crosan duas 'bestas' que jamais se atreveram a postular seriamente a inexistência de Jesus.
A justiça no entanto obriga-nos a reconhecer que apesar da sujidade acumulada sobre esse monturo, há ali uma flor e flor odorífera.
Pois ao menos o autor, descrevendo Jesus como mero 'avatar da Filosofia grega' reconhece a decantada relação existente entre o Evangelho e a Filosofia helênica ou entre Cristianismo e Socratismo, reconhecida pelo insuspeito Nietzsche e enfatizada pelo eruditissimo Wener Jaeger na "Paideia Cristã e Paideia grega".
Eis porque - segundo já citado Nietzsche - Jesus e Sócrates devem ser abatidos juntos, ademais o pensador de Silz Marie jamais acalentou duvidas sobre Cristianismo e Humanismo sobreviverem ou morrerem juntos. Paradoxalmente é este 'humanismo' florescente apenas naquele cristianismo 'paganizado' a que chamamos catolicismos, não no cristianismo judaizado e sectário i é no protestantismo, sempre infenso a nossa herança greco romana incorporada pelo primeiro.
Justamente por ter percebido esta correspondência entre a Filosofia grega, no que tinha de mais excelente - o socratismo e o aristotelismo - e o Catolicismo é que aderi a este e o tenho professado até hoje após ter descrido dos mitos do antigo testamento e rompido com o protestantismo.
A percepção de que a organização Cristã primitiva logrou realizar, ainda que precariamente - e nos referimos ao aparelho de serviço social criado pelo Império Bizantino no século IV ( com a Magnaura, jardins da infância, hospícios, escolas, hospitais, asilos, orfanatos, recolhimentos, leprosários, dispensários, etc ) o ideal de sociedade fraterna esboçado por Sócrates e Platão foi terminante para mim. Nenhuma ideologia - em termos puramente humanos - mais vigorosa do que a socrático/platônica/aristotélica, quiçá mais vigorosa entre os antigos no final da Era pré Cristã, do que o positivismo na segunda metade do século décimo nono, o marxismo na primeira metade do século vinte ou o pós modernismo em nossos dias.
E no entanto essa ideologia colossal não conseguiu preservar o mundo antigo da destruição.
Sossobraram os ideais pagãos de Sociedade humanista com a Sociedade que os gestou apesar de sua imensa popularidade.
Roma - então repositório de tudo quando havia sido acumulado pelo Ocidente desde os egípcios e sumérios - caiu fragosamente e com ela todo um projeto de Sociedade e ideário de vida elaborados pelas mentes mais brilhantes que o mundo conhecera.
A queda o Império romano, a crise e colapso da civilização antiga implicam reconhecer que Sócrates, Platão e Aristóteles não haviam sido capazes de reforma-la ou de sanea-la eticamente. Implica reconhecer que seus heroicos esforços falharam.
Agora se estamos bem informados e levamos em conta quais foram as culturas que substituíram aquele império e que fizeram com ele temos de nos perguntar por que raios ainda sabemos tanta coisa a respeito daquele mundo destruído, seu ideário de vida e projeto de sociedade???
Quem não souber que eram os bárbaros germânicos e que faziam as cidades romanas com suas pontes, aquedutos, templos, estátuas, bibliotecas, teatros, escolas, pinacotecas, estádios, etc o conteste; assim como quem ignorar ou não souber o que a primitiva jihad islâmica fez com os principais centros helenísticos do Oriente próximo... Dar-me-ei satisfeito com rememorar a destruição da Biblioteca de Skandaria, por Amru al ass valido do quarto califa Omma ibn Katib.
Ruínas fumegantes, destroços e cadáveres era tudo quando restava daqueles então florescentes espaços de cultura.
No entanto os nomes de milhares ( O Florilégio de Ihoannes Stobaeus apenas contem centenas deles) de personagens relacionados com a cultura clássica nos são conhecidos e digo mais, até detalhes de seus vidas e opiniões. Agora a quem se deve isto se os germânicos e muçulmanos nutriam total ojeriza para com aquele padrão cultural???
Teriam os guerreiros islâmicos e/ou teutônicos compilado e transmitido a posteridade a Eneida de Vírgilio, As vidas e doutrinas dos filosofos ilustres de Laertius, a Antigona de Sófocles, as Memoráveis de Xenofonte ou dos Diálogos de Platão???
É verdade que chegaram aos muçulmanos 'liberais' ou mutazilas que floresceram do século IX a XI desta Era, como no entanto haviam chegado a eles?
Será que Ésquilo, Aristóteles ou Sexto caíram dos céus nas mãos dos esclarecidos mutazilas???
Até onde esclarece-nos a crítica mais sólida tais escritos haviam sido tomados ao siríaco ou arameu. E vertidos a esta lingua - a partir da lingua original, o grego - por teólogos, clérigos e Bispos Ortodoxos, tanto malkaya ou bizantinos quanto assírios e siríacos. Já no Ocidente as memórias dos latinos como Cícero, Sêneca, Tácito, Lívio, Suetônio, Catulo, Estácio, Propércio, etc haviam sido compiladas primeiramente pelos monges escribas congregados por Cassiodoro em Vivarium, posteriormente, sob Columbano em Bobbio e por fim em Lidsfarne e outras abadias da distante Irlanda ao tempo de Scottus Eurigen. cf "Como a Irlanda salvou a cultura" Th Cahill
Como se vê quem salvou e preservou os fragmentos, vestígios ou elementos de Filosofia grega ou de civilização clássica que chegaram até nós foram os odiados monges Católicos. Foram eles que compilaram e transmitiram tais tesouros a posteridade. Agora se havia marcada oposição entre o conteúdo de tais obras e a fé Cristã por que raios o teriam feito???
O simples fato dos monges terem compilado e preservado tantos e tantos monumentos da Filosofia grega remete-nos mais uma vez a questão da afinidade.
Era Jesus de fato um 'avatar da Filosofia grega' mas vivo e real perdido nos confins obscuros e arenosos da judeia ou da Galileia. Podem os ateus explicar naturalmente este 'fato'? Não. Então já sabemos o que os leva a negar a existência de Jesus. Porque se trata dum homem póstumo ou extraordinário, subversivo ou revolucionário, emblemático e misterioso... Este eco de Sócrates e/ou Platão a expandir-se pelos ínvios desertos da Palestina é um desafio a crítica anti Cristã porque esta figura terá de ser no mínimo grandiosa ou não vulgar.
De fato um Jesus vulgar em termos de rabino acrítico, crédulo, topo e bem comportado é o que jamais existiu.
CONTINUA -
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