Foi classificado o homem pelos individualistas como ente isolado e solitário.
Enquanto foi classificado pelo 'estagirita' como um ente social, político ou gregário.
Para descobrirmos quem esta com a razão ou quem acertou devemos antes de tudo colocar-nos em nosso devido lugar.
Digo, compreender com exatidão, qual seja nossa condição no mundo natural.
Biologicamente falando pertencemos ao grupo metazoa 1 ou animalia (animal) e a menos que alguém revindique para si o posto de mineral ou vegetal considerarei esta afirmação como 'ponto pacífico'.
Somos animais, ou como declarou o mesmo 'perípato' "animais racionais" ou seja capazes de pensar abstratamente, de raciocinar, de refletir, de planejar...
Por mais que os fanáticos e obscurantistas aleguem que somos frutos duma criação específica ou distinta, a estrutura mesma do nosso corpo - vide o esqueleto humano comparado com o do chipamzé por exemplo e os primeiros estádios da progressão embriogênica - depõe contra esta explicação mitológica.
Assim, enquanto 'homo sapiens' ou 'homem que sabe' - e que portanto é capaz de conhecer perfeitamente sua condição e origem - é a biologia, etologia, e primatologia que devemos consultar para saber o cárater de nossos ancestrais.
Quanto aos primatas, que são nossos parentes mais próximos, todas as pesquisas, invariavelmente tem demonstrado que eles nada sabem, em absoluto, sobre o 'primado do indivíduo' e que todas as espécies conhecidas são precipuamente gregárias. Queremos dizer com isto que as relações pessoais existentes entre todos os membros desta ordem, estão envolvidas por uma tecitura de relações sociais bastante complexas, tendo em vista a prevalência da solidariedade...
Em que pese a tão decantada 'concorrência' ou a rivalidade existente entre as ordens e espécies distintas; ESTE ESTADO CONFLITUOSO - ao menos no que tange a nossos parentes e ancestrais mais próximos - NÃO ALTERA EM NADA AS RELAÇÕES INTRA GRUPAIS, AS QUAIS CONTINUAM SENDO REGULADAS PELAS NECESSIDADES GERAIS DE ESPÉCIE E JAMAIS POR QUESITOS DE NATUREZA INDIVIDUAL.
Só nos resta inferir que ao menos entre os membros de nossa espécie deveria prevalecer a colaboração.
De fato Chimpamzés exercem adoção, conhecem o luto, são solidários para com os seres humanos, fruem uma dimensão ética da existência.
De fato Thomas Hobbes errou feio ao postular um conflito generalizado entre indivíduos. E seus continuadores, arquitetos do 'homo solitarius' erraram ainda mais feio na medida em que atribuíram a todos os membros de nossa espécie e da espécie em geral, uma natureza individualista.
Como inexistem primatas individualistas, a menos que a natureza tivesse dado um gigantesco 'salto', nossa espécie teria passado a cultivar o individualismo...
De fato o conflito ventilado por Hobbes teria fundamento concreto caso fosse atribuído a grupos ou sociedades humanas e não a indivíduos isolados uns dos outros.
Alguns sociólogos e historiadores diante da significativa lentidão com que o progresso técnico foi cultivado pelo homem primitivo e, em que pese a inexistência de meios de transporte eficientes e de códigos escritos; supõe a existência de um estado de conflito mais ou menos generalizado, entre os primeiros grupos humanos.
A existência deste tipo de conflito todavia, em nada favorece o credo individualista. Pois estamos diante de conflitos sucedidos entre 'sociedades' e não de conflitos sucedidos entre indivíduos. Efetivamente este estado natural de conflito entre os diversos grupos, clãs ou tribos subsistiu por muito tempo neste continente e subsiste ainda - ao menos como forma de antipatia - entre as culturas mais primitivas da África e da Ásia.
No entanto este mesmo homem primitivo que dá combate sem tréguas ao membro da tribo ou do clã rival; identifica-se até diluir-se por completo em seu próprio grupo ou clã; sendo inclusive capaz de imolar-se ou de sacrificar a vida por qualquer membro de sua tribo...
Destarte, no interior de cada grupo social, impera soberanamente a fraternidade ou a solidariedade mecânica.
Conhece pois o 'selvagem' e põe em prática o éthos da cooperação, da solidariedade e mesmo do altruísmo; inda que numa esfera tanto mais limitada e restrita, e por que?
Apenas porque ignoram o conceito biológico de espécie e a identidade genética existente entre todos os grupos que formam nossa espécie.
Devido a dispersão dos diversos grupos humanos pelas diversas porções do planeta, a falta de contato provocada pela inexistência de meios de transporte e comunicação eficientes, o isolamento cultural, etc tornou-se impossível o cultivo da solidariedade em termos universais...
Bastante cedo os grupos adotaram divindades distintas de cárater belicoso e consideraram a si mesmas como produtos de criações divinas especiais, ou seja, sem quaisquer vínculos reais com os demais grupos, produzidos noutras circunstâncias por seus próprios deuses... Dentro desta contextura não pode haver lugar para a colaboração, a alteridade e o socialismo; porque não há qualquer princípio de identidade. E como os deuses primitivos são tão guerreiros quanto os povos que conceberam-nos, o princípio já existente do conflito é ainda mais reforçado pela religiosidade primitiva... cada povo ou nação luta por seu 'deus' e esta luta é apenas reflexo duma luta cósmica entre os deuses...
Apesar disto cada pessoa identificava-se com seu grupo e ninguém sequer imaginava a própria existência a não ser dentro do corpo social em que viera a luz...
Os moralistas apenas ampliaram a aplicação da solidariedade orgânica, sempre existente, a espécie ou seja a grande família humana; isto na medida em que os meios de transporte e comunicação tornavam-se mais eficientes, a ordem política tornava os grupos menos violentos, o cárater dos deuses tornava-se mais benevolente, os preconceitos religiosos iam sendo postos de lado, a reflexão filosófica cumpria seu papel... e esta ampliação, produziu a ideia duma sociedade universal (correspondente ao conceito biológico de espécie) e o discurso socialista.
Diante disto só nos resta concluir que o socialismo apenas corresponde a evolução de um comportamento social primitivo - a solidariedade mecânica - que parte de nossa condição mesma de primatas.
O tipo ideal do individualismo o 'homem solitarius' isolado do grupo social corresponde a uma quimera que jamais existiu, e, segundo Marx Nordau, a um tipo problemático cuja aparição diz respeito aos momentos de crise enfrentados pela civilização.
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