Em apoio do quanto registramos no artigo precedente reproduzimos abaixo as profundas considerações do ilustre literato português sobre o velho estado religioso ou confessional, sem duvida deteriorado pelo estatismo e absolutismo, em comparação com o um Estado Político de trânsito ou passagem para a treva economicista e portanto contendo os germes que o haviam de fazer enfermar, agonizar e morrer no tempo presente.
Atentem que a visão acurada de Garret, falecido em 1854, era bem mais acurada que a do Sardinha (Nascido em 1887 - Portanto mais de trinta anos depois.) o qual, preso de estranha paranoia, pouco ou nada presumia do capitalismo ou do mercado e do protestantismo - Exatamente como os neo romanos ou tortodoxos de fancaria, títeres da cultura de morte protestantes ou da sifilização norte americana.
Substituam a expressão 'barões' por 'burgueses' por 'capitalistas' e a atualidade do texto saltara as vistas:
"Frades... Frades... Não, não gosto deles. Como os temos visto neste século, como os conhecemos hoje, não gosto deles e não os quero para nada, moral ou socialmente falando.
No ponto de vista estético porém, o frade faz muita falta...
Nos campos o efeito era ainda maior: Eles caracterizavam aquela paisagem, poetizavam a situação mais prosaica do monte ou vale; e sem tais necessárias e obrigadas figuras aquele painel não é já o mesmo.
Além disso, o convento no povoado e o mosteiro no ermo, amenizavam e davam grandeza a tudo: ELES PROTEGIAM AS ÁRVORES, SANTIFICAVAM AS FONTES e enchiam a terra de poesia e solenidade.
O que não sabem, podem ou querem fazer OS BARÕES AGIOTAS que os substituíram.
É muito mais poético o frade que o barão.
O frade era, até certo ponto, o Dom Quixote da Sociedade antiga.
O barão é, sob quase todos os aspectos, o Sancho Pança da sociedade nova...
O barão é pois USURARIAMENTE revolucionário e revolucionariamente usurário...
Por isso brigamos muito tempo, afinal vencemos nós, e assentimos em que os barões corressem com os frades da terra. No que fizemos uma SANDICE como nunca se fez outra. O BARÃO MORDEU NO FRADE, DEVOROU-O E ESCOUCEOU-NOS A NÓS DEPOIS...
Sim, o frade não nos pode compreender a nós e por isso morreu, e nem nós pudemos compreender o frade, e por isso constituimos esses barões que nos conduzem a morte e fazem morrer.
São a moléstia deste século; são eles e não os jesuítas, a cólera morbus da sociedade atual são os barões. Nosso amigo Eugênio Sue errou feio em seu 'Judeu errante', o qual precisa ser refeito.
Decerto foi o frade que errou primeiro em não querer compreender a nós, a nosso século, a nossas inspirações e inspirações; com que falseou sua posição, isolou-se da vida social e fez de sua morte uma necessidade por assim dizer infalível e sem remédio.
Assustou-se com a liberdade, que era amiga sua, e que o havia de reformar, e associou-se ao despotismo, que de modo algum o amava, senão relaxado e vicioso, para dele servir-se e servido ser.
Nós também erramos em não entender o tolerável erro do frade e em lhe não dar outra direção social, e EVITAR ASSIM OS BARÕES, QUE É O MAIS DANINHO BICHO ROEDOR...
E eu que sou da liberdade e do progresso antes prefiro a oposição dos frades de ontem a dos barões de hoje...
O progresso e a liberdade perdeu, não ganhou.
Quando me lembra tudo isso, quando vejo os conventos em ruínas, os egressos a esmolar pelas ruas e os barões de berlinda, sinto saudade dos frades, não dos frades que foram mas dos que podiam ter vindo a ser."
Não era democracia ou liberdade em si mesma como fim mas, democracia de ocasião, de passagem ou trânsito para o mercado, para o acúmulo irrestrito de bens, para um novo ethos, para uma nova cultura, para uma cultura exógena, para o economicismo. E foi a ruína e transtorno do nosso universo seja ele grego, latino ou medievo - Nem o Rei e menos ainda o Povo ou os cidadãos mas o barão i é o burguês, o patrão ou o empresário > E Sim, este novo mundo saiu muito pior do que os antigos!
Já não há decerto o monstro infame das inquisições, colossalmente inchado ou engordado pelos 'liberais' ingênuos ou safados... Que nem todos os frades eram queimadores de gente (E a maioria não era!) como foram cruéis e insensíveis e assassinos os barões ou patrões do século XIX já na Inglaterra, já na Alemanha e quiçá na própria França...
A figura desse empreendedor santificado pela imprensa moderna. A figura desse empresário sem consciência. A figura do bancário avarento foi historicamente muito mais danosa que a do inquisidor, a do rei ou a dos Revolucionários, ao menos quanto a extensão do poder. Apenas a figura do empreendedor conta com advogados contratados que lhe emprestam as mais róseas tintas, e fica como um macaco maquiado...
Porém foi ele que poluiu e polui a terra, que exterminou e extermina animais, que aniquilou e aniquila florestas não sem ter feito trabalhar a mulher grávida, o idoso e a criança de seus quatro anos em troca de um mísero naco de pão...
Essa História já foi muito bem escrita e registrada não por Marx, Engels ou Lênin ou ainda por seus embiocados seguidores mas pelo Cristão Charles Dickens - A tinta negra ou vermelha brota do cálamo de Dickens o qual nos revela o feito desses barões que prostituíam nossa democracia e nosso liberalismo puro tal e qual haviam prostituído a fé nos tempos da infeliz reforma protestante...
Sardinha, cego pela ideologia ou pelos amores que dedicava a anglos ou germânicos, não pode percebe-lo, mas percebeu-o o velho Garrett, que lhe dá uma aula.
O frade romano ou ortodoxo lá estava, no quadro ou contexto, do campo e da Vila em comunhão com a mãe natureza, convivendo ou comungando com animais, e árvores, e fontes - A exemplo do seráfico pai S Francisco ou de S Serafim de Sarov... E os defendiam, guardavam e protegiam... Mantendo e conservando aquele ambiente pintado pelo pincel de Millet - Em que ao por do Sol os lavradores dobravam os joelhos sobre a negra terra que os nutria e recitavam a Ave Maria a mãe de seu pobre Deus enquanto dobravam os sinos...
Havia trabalho duro e fatigante, sim havia. Mas também havia sentido para quem era senhor de seu pequenino torrão, para aquele que em sua choupana era aguardado pela esposa devotada e pelos filhinhos saudosos... Congregados em torno de uma mesa onde havia pão cheiroso tirado do forno, azeite, queijo e vinho. E flores plantadas e torno a pequena casa. E o cão e o gato abanando suas caudas.
Parte deles não era constituída por proprietários ou donos de terra. Havia que se lhes ter dado terra e não movido a cidade. Pois já não há terra para dar... E sequer trabalho nas grandes cidades - Menos ainda trabalho digno. E menos ainda liberdade. E lhe tiraram a esposa - Que hora também trabalha como uma burra! - e os filhinhos (Postos na creche), e as flores, os animais... Tudo enfim. Até que esse homem e essa mulher, pelas mãos do barão ou do burguês, conheceram a angústia e o desespero, uma escravidão oculta ou disfarçada.
Sim, o tempo do Frade era menos ingrato.
Não nos enganemos - Não considero esse modelo ideal ou perfeito, antes muito mesquinho... Porém em comparação com o mundo urbano do assalariado é e era paraíso.
E não adianta dizer ou clamar que o capitalismo que pinto não é mais o mesmo, que transformou-se também e tornou-se mais humano e suportável, e desejável em tempos em que um governo inspirado. Tal devemos agradecer aos anarquistas, fabianistas, trabalhistas, católicos, etc que moveram céus e terras para criar uma legislação protetiva que jamais cessou de ser ameaçada pelos economicistas ou capitalistas.
Nem a concederam de bom grado, nem jamais se conformaram com ela.
Daí a atividade frenética do governo anterior, liberal economicista ou capitalista - Não fascista como quer a esquerda pós modernista desmiolada. - no sentido de destruir essa legislação e fazer o Brasil recuar ao século XIX, inglês, por sinal... Quadro social a respeito de que, diziam alguns analistas, era ainda mais cruel do que a escravidão negra em nosso país. Pois o cenário urbano na Inglaterra e na Alemanha do século XIX foi monstruoso... E o ideal economicista jamais se desprendeu dele, clamando a todo instante pela ilimitação ou pela restrição do Estado, ainda quando democrático ou popular.
Para as populações rurais de toda Europa foi o liberalismo econômico autêntica porta sobre o qual bem se poderiam fixar as memoráveis palavras: "Vós que aqui entrais perdei toda esperança de sair."
Não, o frade jamais fora tão cruel e mesquinho quanto o patrão e os mosteiros até ofereciam escolas, enfermarias, dispensários, asilos, etc O que jamais se viu ser oferecido em larga escala pelos maravilhosos empreendedores do século XIX.
Parece-me, como a Garrett, necessária, a passagem do regime confessional ou credal ao político e laicista, de modo algum a passagem ou trânsito do Estado político ao estado Econômico, empresarial ou economicista - Como já é abertamente defendido por certos panfletários ANCAP oriundos dos EUA. No entanto se tal passagem, do puramente político ao econômico corresponde a um fenômeno inelutável, então laboramos em erro grave e devemos reconhecer que os conservadores totais ou ''católicos" atidos ao modelo medieval estariam certos.
Pois nossa democracia, a democracia que queremos não é a dos EUA ou da Inglaterra por não ser mínima quanto a qualquer coisa mas ampla (Dentro do espaço do Bem Comum) o suficiente para proteger o trabalhador, a ecologia, a natureza, as plantas, os animais, o mar, o solo, etc Nosso projeto é tão amplo quanto ao do frade de outrora uma vez que nosso olhar político e cidadão se inspira nos mesmos valores.
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