quinta-feira, 23 de novembro de 2017

Uma breve leitura sobre os 'Demônios descem do Norte' de Délcio Monteiro de Lima

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Penso ser absolutamente normal que parte das pessoas direcione
seus bens tendo em vista algo em que acreditam.

E portanto que invistam parte de seus proventos em suas respectivas religiões e seitas.

Natural que as pessoas que acreditam na INSTITUIÇÃO JUDAICA do dízimo, paguem dízimos, o contrário por sinal seria incoerência...


Até aqui nada a objetar.

Embora eu mesmo não veja nada de Cristão ou de evangélico em tal instituição. Pelo simples fato de que Jesus jamais impôs quaisquer taxas aos que abraçaram o Santo Evangelho. Dízimo, insisto eu, é dogma judaizante, pentecostal, protestante, biblicista E DE MODO ALGUM CRISTÃO.

O Cristianismo estabeleceu o sistema de colaboração livre, descrito nas Epístolas do Apóstolo Paulo.

Tal minha visão das coisas.


Seguindo esta linha de raciocínio nada mais degradante do que imaginar a Santa divindade concedendo supostas graças ou favores em troca de contribuições... Acaso não teríamos aqui um deus vendedor ou traficante de indulgências???

Diante disto fica até fácil entender porque temos uma Sociedade que se vende cada vez mais, pessoas que negociam seus próprios valores e uma política essencialmente corrupta ou venal.

Caso a Santa divindade seja pintada como corrupta ou venal que nos restará???

Isto quanto aos dizimistas e o tráfico de coisas sagradas que a tradição ancestral batizou como simonia.

Agora quanto ao simples investimento, por parte dos crentes ou fiéis, em determinada instituição religiosa, já o disse encara-lo como absolutamente natural, pelo simples fato de que as pessoas tendem a valorizar, em todos os sentidos, o quanto seja significativo para elas.

Ficando claro que para algumas destas pessoas gastar com a fé equivale a uma devoção.

O que não posso encarar como normal ou natural é que EMPRESAS MULTI NACIONAIS E MULTI MILIONÁRIAS, INDÚSTRIAS E INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS, QUE LUCRAM EXPLORANDO AO MÁXIMO SEUS FUNCIONÁRIOS, financiem corporações religiosas...

Não o catolicismo, não o espiritismo, não o budismo, não o hinduísmo ou qualquer outra religião mas certamente as missões protestantes - born again ou pentecostais/fundamentalistas - nos países mais pobres...

Francamente falando, acho esse negócio muito estranho...

Instituições que vivem burlando a Ética do Evangelho, semeando a miséria e servindo a Mamon, financiando determinadas facções religiosas...

TEMOS DE REFLETIR E DE NOS PERGUNTAR SOBRE O PÔRQUE DESTE FENÔMENO...

Quais interesses ou objetivos tem levado O CAPITALISMO a patrocinar um tipo ou padrão de religiosidade predominante nos EUA, o centro mundial do capitalismo???

Por que essa aposta decidida do Mercado nas seitas protestantes???

Seria ingênua ou aleatória?

Não o creio...

Então temos de nos perguntar sobre o que tais empresas e instituições esperam deste tipo de religiosidade?

Segundo Délcio Monteiro de Lima em "Os demônios descem do Norte" a única resposta plausível implica admitir a aposta num modelo religioso que até certo ponto justifique o materialismo, o predomínio do Ser sobre o Ter ou a busca do acúmulo irrestrito de bens ou do lucro máximo num contesto 'cristão'; enfim num padrão de espiritualidade que preconize o sucesso financeiro ou o enriquecimento, as custas das exigências ou postulados éticos baixados pelo Cristo em seu Santo Evangelho, o que implica aceitar e abster-se de criticar a ordem capitalista com todas as suas mazelas suficientemente conhecidas por todos nós.

Implica pois uma adaptação ou conformação em termos de Cristianismo ou uma negociação em termos de princípios e valores. Pelo qual o Cristianismo ao invés de inoportuno torna-se conivente ou colaboracionista. 



E esta resposta sugere um segundo questionamento -

Até que ponto as seitas financiadas pelo poder econômico SÃO CONIVENTES OU MESMO FAVORÁVEIS A EXPLORAÇÃO DOS EMPREGADOS PELOS PATRÕES ou até que ponto santificam esta relação iniqua???

Até que ponto silenciam a respeito da injustiça e deixam de denunciar o poder do capital em nome do Evangelho???

Em que medida são elas mesmas compradas ou agenciadas pelo capital com o propósito de porém a favor dele e, contra o povo trabalhador?

A bem da verdade a maior parte das seitas protestantes não obedece a um programa consciente no sentido de favorecer ou beneficiar a ordem econômica vigente. Contentam-se em ser anti comunistas, embora via de regra, identifiquem toda e qualquer forma de socialismo com comunismo, bem a gosto dos EUA, cuja cultura e modelo de organização social folgam reproduzir.

Acontece que lá nos EUA a questão crucial para os Cristãos, que tais seitas costumam baralhar e disfarçar com apelos forçados ao antigo testamento, diz respeito, antes de tudo, ao imperialismo e a guerra de agressão e conquista; bem como a pena capital. A tônica lá gira em torno disto uma vez que a miśeria ainda não assomou aos índices vigentes no terceiro mundo ou nos países subdesenvolvidos, pelo simples fato de que estes não possem colônias como os EUA...

A realidade dos países latino americanos e demais repúblicas do hemisfério Sul tem sido marcada pela miśeria, agravada cada vez mais pela ingerência da política externa N Americana, cujo principal objetivo consiste em dar apoio a iniciativa privada ou a ação predatória das grandes multi nacionais.

Diante de semelhante quadro de miséria em que a malfadada luta de classes é potencializada ainda mais pelo modelo capitalista importado dos EUA e em que as lideranças nacionais inclinam-se por vontade própria ao modelo do estado mínimo enquanto as massas oprimidas clamam por intervenção, tem prevalecido um estado de tensão... Em que as democracias recentemente implantadas e manipuladas pelo poder econômico, tendem a omitir-se e o povo, em certas ocasiões a rebelar-se, e caudilhos a tomar o poder...

Prevaleceu esta situação confusa até o instante em que os panfletários anarquistas e comunistas instaram-se nos grande centros urbanos e principiaram a fazer suas propagandas arregimentando certo número e um número cada vez mais de cidadãos descontentes empenhados em criar algo como a "Comuna de Paris" ou a "URSS". De fato, a partir da segunda metade do século XIX, a maior parte das sedições operacionalizadas em países sub desenvolvidos assumiu uma orientação comunista ou socialista. O que implica um afastamento progressivo dos países da A latina quanto a órbita dos EUA e seu modelo social.

Desde então o lema "América para os (Norte) americanos" tornou-se controvertido do México para baixo...

Consideremos agora que até então, i é até meados de 1960, achava-se a igreja Romana, cindida socialmente em diversas vertentes e que a partir de 1960, todas estas vertentes, sob influxo da Teologia da Libertação, tendem a reforçar o direcionamento social pré existente e em convergir para soluções socialistas, quando não comunistas, mas, de um modo ou de outro, sempre anti imperialistas ou anti americanizantes.

Desde 1960 e a cabo de três décadas a igreja romana, cujo poderio na América Latina era considerável, juntou forças com os elementos descontentes ou dissonantes no sentido de denunciar as mazelas sociais legadas pelo sistema colonial que estavam a ser ampliadas e aprofundadas sob os auspícios o imperialismo Yankee e do capitalismo. Predispondo o cenário político a transformações dramáticas, de que temos exemplo no sandinismo da Nicarágua ou na guerrilha Colombiana.

Claro que os EUA não tardaram para perceber o perigo. Localizado num território que encaravam e ainda encaram como quintal seu. Relatórios foram elaborados por diversos setores da administração yankee e nenhum deles foi lisonjeiro para com a velha igreja romana, ora posta, quase que em sua totalidade, em favor da justiça social e da emancipação dos povos. A igreja romana, comprometida com uma teologia libertadora, foi classificada como não confiável no sentido de que equivalia a uma espécie de brecha feita na muralha da alienação. A cultura da opressão fora desertada culturalmente e corria um grande perigo...

Em tais conjunturas que fazer?

O governo Yankee, que desde 1940 renunciara a financiar ele mesmo as seitas bíblicas a partir o erário, em tese nada fez.

Além de é claro orientar as instituições financeiras... Convencendo-as de que a praxis cultural é via de regra, sancionada pela fé religiosa. Fazia-se mister sabotar a força da igreja romana no contexto da América latina ou de enfraquece-la substituindo-a por um modelo bem menos crítico. A sugestão das seitas protestantes, baluarte da cultura Norte americana, ficou implícita...

Basta dizer que o protestantismo fundamentalista comporta por assim dizer uma fermentação de seitas bíblicas, cada qual imaginando ter dado com a verdade eterna ignorada por todas as outras e portanto ser necessária a salvação de todos os seres humanos, ideal que em tais seitas tornasse obsessivo até a mania... Adotando moldes e assumindo necessidades empresariais - inclusive no plano financeiro - a grande prioridade de cada seita é aumentar seus quadros. Isto pelo simples fato dos protestantes acreditarem que o aumento ou sucesso numérico de determinada seita implica necessariamente no favor divino...

Adicione-se ao contexto acima descrito o elemento do individualismo, peculiar ao protestantismo. Desde Lutero, tem os protestantes negado o aspecto social, gregário ou comunitário da Redenção Cristã e apresentado uma salvação mágica e individualista ou seja sem mediação de obras éticas, que tenham por objeto o outro. Para os protestantes a salvação não passa pelo próximo ou pelo outro (o que conferiria a ela uma dimensão ética), dando-se em termos de comunhão entre o indivíduo e deus... e em termos invisíveis e espirituais de uma comunidade fantasmagórica (a igreja invisível).

Neste sentido podemos até falar numa luta pela salvação e numa vitória do mais 'bíblico', em famílias, clas, cidades, países, etc eternamente divididos por deus em réprobos e salvos... O fato é que o protestantismo jamais toma consciência social, estabelecendo vínculos espirituais e salvíficos entre todos os seres humanos. Tais laços de solidariedade é algo que não existe no contexto luterânico. Aqui seitas lutam com seitas, homens com homens e homens com anjos num combate generalizado...

Portanto o que importa aqui, ao indivíduo é escapar ele mesmo aos fogos ardentes do inferno sem cogitar em parentes, amigos ou companheiros. Importa furtar-se as chamas e torturas infernais inda que nossos filhos, pais ou amigos nelas caiam... Importa estar a salvo ou ser feliz, em que pese a eterna desgraça daqueles que amamos. Tal a exótica noção de paraíso protestante.

Neste sentido a vida só faz sentido quanto perseguimos uma única meta, a da salvação. Jamais compreendida no sentido Cristão, enquanto salvação da pessoa ou do homem todo ou ainda como verdadeira salvação do mal e do pecado. Aqui a salvação além de ser individual é maniqueísta, enquanto salvação da alma ou do espírito invisível e imortal no além túmulo. O corpo aqui jamais conta. Tampouco implica esta salvação em salvação real e efetiva do mal ou do pecado mas em salvação vicária, posto que o salvo continua sendo sempre um pecador derrotado, magicamente salvo das chamas do inferno, mesmo que venha a pecar sucessivamente... Aqui o arrependimento não significa ruptura ou transformação mas mero ato intelectual. Como se vê é um padrão de salvação precário em todos os sentidos  já por ser individual, meramente espiritual e aparente...

Seja como for, as seitas são extremamente hábeis e eficientes no sentido de comunicar este objetivo aos neófitos, i é de concentrar todos os seus esforços na salvação da alma i é no além túmulo, no outro mundo, no além no paraíso, etc em detrimento deste mundo, com o qual é sempre inútil preocupar-se, dizem eles, acrescentando que o Reino de Deus não é deste mundo, sem jamais se darem ao trabalho de perguntar se o Reino foi trazido a este mundo pelo Verbo que se fez carne ou Emanuel... O Reino, e portanto o objetivo do crente, esta sempre no paraíso o no mundo invisível, tendo por adversário o Diabo ou Demônio, um suposto anjo caído, cujo principal passatempo consiste em aliciar os seres humanos...

O fim de tudo isto é abdicar por completo da realidade do mundo material. A qual é supinamente ignorada pelas seitas salvacionistas e maniqueistas, parte das quais chegaram a reeditar o dogma farisaico do catastrofismo, ora batizado como apocalipticismo, o qual via de regra é precedido pelo dogma não menos espúrio e pessimista da apostasia. Aqui também damos com um conflito fictício entre supostos anjos caídos e a divindade e por uma vitória mágico fetichista tão a gosto dos fanáticos. Nada de concreto, nada de real... Nenhuma luta heroica contra a injustiça, o egoísmo, a maldade, a mentira, etc Apenas ideais quiméricos ou ilusórios.

Destarte o sectarismo protestante abandona o mundo real e abdica de sua transformação para alienar-se e refugiar-se nas nuvens. Inútil dar combate as situações de injustiça se deus punirá os injustos e recompensará oprimidos no além túmulo é tudo quanto sabem dizer. Quanto ao mais conformam-se com todas as situações de miséria, angústia, opressão, escravidão e sofrimento esperando por uma libertação espiritual após a morte, nos céus. Aqui na terra produzem escravos e servos conformados com seus grilhões e os quais recusam-se a lutar e a combater pela própria libertação.

Toda esperança é transportada para o além túmulo ou retirada deste mundo, no qual consolidam-se as situações de opressão, segundo a mentalidade do tal capeta, o qual para não poucos sectários é o senhor e deus que controla este mundo. Libertação verdadeira, repetem eles, só a de deus após a morte. 

Devemos portanto esperar que tais pessoas ou seus líderes contestem as situações de miséria ou de opressão aqui existentes?

Tolo seria quem esperasse por isto.

Face a realidade iniqua do mundo é o sectarismo protestante conformista ou situacionista por definição. Não menos do que o positivismo, com seu ideal meramente descritivo face a realidade, o protestantismo jamais se rebela contra aquilo que é, bem podendo conviver em paz com o racismo, com o odinismo, com o capitalismo e com o imperialismo; quando não se presta para alimentar tais ideologias.

Por isso o capitalismo empenha seus cobres nas missões protestantes, porque sabe ser o protestantismo uma fé omissa e covarde, alienada ou conformada que não costuma afrontar uma realidade social iniqua pugnando pela justiça e por um ideário de libertação integral para o homem. O capitalismo investe no protestantismo porque não o teme e porque sabe nada recear da parte dele.








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