Há dois milênios e meio, a sombra dos propileus do Hecatompedon, Sócrates, Platão e Aristóteles, especialmente este último, afirmaram um novo ideal de Homem, o Homem Racional, capaz de pensar, de refletir, de tomar decisões judiciosas e de planejar seu próprio destino.
A sombra de suas Stoas, há cerca de vinte e cinco séculos, alguns gregos conceberam um ideal harmonioso e bem ordenado em oposição ao caos.
E antes dos albores da Era Cristã esboçaram um ideal grandioso de civilização, de que faziam parte o Canon de Polikleitos, o princípio de contradição, o Teorema de Pitágoras, Pinacotecas, Museus, Universidades - Enfim todo um universo de dourados sonhos, há muito anuviados pela bruma do passado...
Poucos como Hume, Freud, Marx, Darwin... ousaram desconfiar da proposta grega, supondo-a falaciosa.
De fato não somos apenas razão, tal nossa cruz e caldeirinha.
E operam em nós outras forças, poderes e princípios que nos estão conduzindo, como espécie, ao fim.
De fato a vida racional, consciente e ética jamais passou de um projeto, do qual dependerá não somente nossa sobrevivência, caso haja tempo. Projeto grandioso, nobre, belo e excelente, porém projeto e projeto ameaçado.
Já o sabia Aristóteles como Confúcio. Como o sabiam Buda, Sócrates, Jesus, Paulo, Basílio, e mais tarde: Mably, Morelly, Bouchez, Bloy, Berdiaeff, Maritain, etc - Os quais de um modo ou outro teceram críticas mais ou menos duras a nosso costume de acumular coisas, acumuladores que somos de riquezas inúteis, as quais não poderemos carregar para onde iremos ou levar a tumba.
Ao menos se fossemos egípcios ao modo dos que viveram antes de Cristo, poderíamos acumular para levar a tumba, onde após termos ressuscitado, viveríamos eternamente comendo, bebendo, jogando, etc
Nós no entanto ousamos dizer que cremos no primado do espírito! Belo primado...
Não me surpreende a incoerência dos ateus e materialistas que denunciam o acúmulo exagerado de bens. Antes surpreende-me muito mais as dissertações com que uma hoste de 'cristãos' defendem este pernicioso vício que faz sangrar a natureza... Quando o Mestre de todos disse em alto em bom som: Não acumuleis tesouros neste mundo! Parte de seus seguidores no entanto não pensa outra coisa senão acumular fortuna ou enriquecer... E quando os denunciamos com o Evangelho nas mãos, principiam a gritar: Comunista! Comunista!
É o que está acontecendo exatamente agora neste país enfermo que a propósito de tudo imita a cultura podre dos Estados Unidos da América do Norte, envenenada pelo individualismo protestante.
E no entanto, apesar de reconhecermos a importância de Marx e a justeza de suas críticas a um sistema que está, efetivamente, conduzindo nossa espécie a um suicídio certo, não precisamos dele ou reconhecemos sua necessidade. Aristóteles foi mais profundo, Freud mais agudo, Scott Nearing mais coerente e nosso Jesus, ah nosso Jesus, foi bem mais insidioso ao dizer que tal como a corda não passa pelo fundo da agulha rico algum entrará em seu reino.
Reino Comunista?
Respondendo com Paul Valery e com Julien Benda, direi: Não, reino do Espírito, reino da excelência, da beleza, da profundidade do Ser.
Tornemos a Confúcio: O que só se preocupa em comprar e vender, ou seja, em lucrar, é um ser vulgar que não entende coisa alguma.
O materialismo está muito mais no sentido rasteiro da avareza do que nas teorias sofisticadas do judeu alemão, o qual, como disseram alguns 'padres', limitou-se toma-lo ao liberalismo econômico ou ao positivismo. Marx apenas assumiu o materialismo reinante que ainda ai está e que nada tem de socrático ou de aristotélico e menos ainda de Cristão.
Torno a Aristóteles, o qual muito antes de Freud já havia enunciado a tolice que é acumular ilimitadamente num sistema que já se sabia finito, e que, fora da ficção científica ainda o é.
Uma hora chegaríamos a exaurir a mãe natureza...
Esse belo sistema, que partindo de uma falaciosa dicotomia, é apresentado como nosso melhor face ao tenebroso comunismo.
Muita treva há no Comunismo, no Nazismo, no Fascismo, no Anarquismo... Não há menos treva porém oculta por trás de um sistema que estimula ao máximo um princípio que todos os Mestres da Ética, unanimemente, apresentaram como um veneno, a avareza... Assim a beldade a que chamamos capitalismo.
Se o capitalismo é o que temos de melhor, melhor perder toda esperança de redenção, aceitar a destruição inevitável e cruel da espécie e adiantar-se a ela.
Deixe-me dizer em alto e bom som: É feio, é feio, e feio porque mais do que o comunismo, o anarquismo, o fascismo e mesmo o nazismo conduziu-nos todos as portas da destruição.
Enquanto escrevo estas despretensiosas linhas prepara-se a ONU para editar (Em 2022) um relatório em que descreve com vivas tintas as condições a que o lindo capitalismo conduziu nosso Planeta.
Será algo semelhante a Filme de terror, em que as vítimas serão as diversas espécies de animais e vegetais que a evolução tem demorado centenas de milhões de anos para produzir, o que cognominamos 'Extinção em massa'.
Torno a Aristóteles: Não é possível explotar ilimitadamente um sistema finito, exaure-se.
A flora e fauna exaurem-se...
A constatação é da ONU...
Não do PC soviético!
Face a tal estado de coisas escora-se a cultura Norte Americana no fundamentalismo protestante, instilando a baba pútrida do conspiracionismo por toda parte... Tendo ela se convertido em dilúvio no Brasil...
Para os empresários e seus fiéis escudeiros, os pastores, transformou-se a ONU em valhacouto do Comunismo...
E comunistas são José Bonifácio, Vargas, o Papa romano, etc tudo quanto não se solidariza com o liberalismo econômico ou apoia-o ativamente.
Critica-lo então equivale a formar fileiras com Marx e Engels, como se as palavras de Jesus tivessem sido proferidas por eles, o Evangelho escrito por eles ou o sentido oposto ao que costumamos ler.
É vezo do livre exame.
Os protestantes leem o Evangelho e atribuem o sentido que querem ou o que mais lhes agrada.
E fica Jesus sendo mega empresário, banqueiro, milionário... como poderia ficar sendo até um pizza.
Pouca seriedade, respeito e sacralidade...
Enfim vozes que destoem desta mediocridade são imediatamente condenadas.
Bem, ainda que não tivesse o Capitalismo, conduzido-nos a borda do precipício, nos teria indubitavelmente - Dirá um conservador desanimado do mundo como T S Elliot, um poeta como Valery, um prosador como Hermann Hesse, etc - ao reino da vulgaridade ou aos confins dessa coisa sinistra chamada arte moderna, assim a rasteira cultura das massas.
Antes de converter-se em algoz da espécie humana foi o liberalismo econômico, como não podia deixar de ser - Por ser materialista e utilitário - algoz da excelência ou da cultura refinada.
Resta dizer que nada há de racional em acumular riquezas ou bens materiais.
E que não passa de um impulso irracional advindo das zonas obscuras que Freud analisou.
Não sei exatamente porque Scott Nearing pôs fim a sua vida.
Alguns dizem que suicidou-se por ter 'descoberto' em que esse impulso nefando transformou aquele ser racional idealizado pelos antigos gregos há dois mil anos e meio, e em que esta metamorfose transformou nosso planeta...
Sei no entanto que numa de suas obras relacionou a febre ou delírio consumista de que padecemos com o medo da morte. Da vida nada levamos em termos materiais, privando-nos a morte de tudo... Para negar a morte apega-mo-nos aos objetos ou as coisas, e passamos a junta-los, como se garantissem nossa permanência definitiva por aqui...
Pelo temor da morte o ter chegou a triunfar do ser.
Combateu-se a metafísica do ser, e criou-se uma nova metafísica, uma falsa escolástica, uma outra mística - A do lucro, a do capital, a do dinheiro, a da riqueza, a da fortuna a do acúmulo.
Curioso - Caso você acumule gravatas é acumulador e neurótico ou doido, caso acumule dinheiro, como o tio Patinhas em sua Caixa forte, é são e não apenas são mas modelo de empreendedor.
Desde que deu com tal fator na gênese psicológica do acúmulo Nearing passou a cultivar na mais alta intensidade o desapego, por meio de uma vida sóbria. E como se tal não bastasse decidiu ele mesmo desfazer-se da vida, quando lhe parecesse conveniente. E a natureza colaborou, fazendo com que atingisse cem anos.
Nearing pode enfim desprender-se ou suicidar-se. Pois teve uma vida longa e digna. Havia combatido o bom combate ou semeado o bem. Havia pugnado pela Ética e se colocado ao lado da justiça. Um homem assim bem pode sair da existência quando quiser, pois pagou seu tributo a civilização ideal ou república de Santos e Filósofos.
Cada qual tem sua consciência e conhece seus límites.
Quero morrer como o comandante daquele navio holandês que enfrentou e venceu a fúria do Kakratoa, com suas ondas de cem metros! Morrer amarrado ao Timão do Barco e resistir até a derradeira gota de sangue pelo combate da civilização ideal, da civilização Ética... Em comunhão com a fauna e com a flora... em sintonia com a mãe natureza.
Enquanto houver capitalismo tal será impossível.
Pois devorador algum pode ser sustentável.
Por outro lado se deve ser limitado ou contido, lamento, não é mais liberalismo econômico ou capitalismo. O capitalismo pleiteia total ausência de controle ou liberdade absoluta para as atividades econômicas. É xipofago do cientificismo positivista e irredutível a um controle Ético/ideal, o qual coloque sobre si e acima de si direitos inalienáveis a pessoa humana.
Daí economicismo, cientificismo, etc e não humanismo.
Resta-nos descrever que espectro Nearing teria antevisto, ao menos segundo alguns críticos.
Ao que parece anteviu ele justamente aquilo que o citado relatório da ONU reserva a nossos olhos e que com tão vivas tintas pintou...
Em que nos transformou esse pecado (Pois o Evangelho e toda Tradição Cristã - Abandonada pelo Protestantismo - apresentam-no assim), o pecado da avareza? - Que é a alma do capitalismo...
A comparação é chocante...
Porém não é obra da fantasia cavoucar o homem a terra em busca de minérios abrindo-lhe uns túneis ou fístulas e furando o ventre que nos trouxe a luz...
E tampouco deixa de ser verdade que, ao menos nos grandes centros urbanos (Em que impera o capitalismo) nos movemos num ritmo que chega ser alucinante - Ocorreu-me agora o delicioso Playtime de Jacques Tati. da casa ao trabalho e do trabalho a casa ou as lojas...
E também nos nutrimos da fauna e criamos para abater, e introduzimos mudanças mais do que discutíveis nas teias alimentares ou no mundo natural.
Bem, por tudo isto e mais um pouco (Pois há muito mais e há quem queira torturar animais em laboratórios ou caçar baleias!) Nearing tería dito a sua esposa que este mundo não passa de uma Carniça infecta ou nauseabunda e que nós, os seres racionais do estagirita e caniços pensantes de pascal, não passamos de uns vermes ou larvas a pulular sobre a carniça...
Após testemunhar pessoalmente a especulação imobiliária exercida no local em que vivo - De que resultou a quase total destruição do mundo natural! (Isto para não falar na sacrílega destruição de nossa memória representada pelo Patrimônio Histórico.) A destruição do Pantanal. O tráfico de madeiras nobres na Amazônia. O envenenamento de onças... etc, etc, etc seria temerário duvidar de Nearing...
Parece que o impulso do acúmulo - Deflagrado pelo medo da morte ou pela pobreza interior do ser. - a que chamamos avareza transformou muitos de nós ou mesmo a maioria de nós em vermes ou gusanos... Aos quais não restou pingo de alma ou espírito. A ponto de usarem o Natal e a Páscoa, com o pretexto de comprar coisas, de consumir, etc exaurindo mais e mais a mãe natureza e acelerando a destruição de tantas e tantas espécies que vieram a luz ao cabo dos séculos... A isto chamam aquecer o Mercado, uma população que se tendo tornado irracional ou mesmo louca, não cessa de se multiplicar...
Quanto aos remédios amargos de que ainda dispomos o primeiro deles corresponderia, já o dissemos, num rigoroso controle populacional em termos de limitação de natalidade. Projeto sempre sabotado pelas grandes religiões com sua sede de poder... quem conta com dezenas de milhões de adeptos ou contribuintes ou dizimista mais quer que suas ovelhas façam sexo irresponsável e se multipliquem...
Do outro remédio Nearing mesmo tomou: Trata-se de um decidido retorno a vida simples e natural, em que os objetos sejam degradáveis ou recicláveis. Não dá mais para tanta gente continuar fazendo uso de alumínio ou plástico... Há que se voltar a madeira, ao barro e outros elementos do tipo.
Outra atitude a que a mãe natureza daria boas vindas seria o vegetarianismo ou melhor dizendo o semi vegetarianismo, em que há espaço para o consumo de mel, ovos, leite e moluscos, isto é, de quaisquer seres vivos desprovidos de sensibilidade neuronal e consciência.
O que todavia ficaria sempre na dependência da redução da natalidade. Do contrário jamais haveria espaço para tanta plantação de cereais e árvores bem como para a conservação das florestas. Por mais que reflitamos topamos sempre com a necessidade de planejar a família e reduzir a natalidade, e isto sim deveria ser estimulado pela ONU, com a recusa de quaisquer programas de ajuda ou benefícios sociais aos países que fugissem a esta regra ditada pela necessidade.
Para que retomemos um ritmo saudável de vida, no qual cada família possa ter seu pomar, sua horta, seu quintal, seus bichos, bem como um pedaço de mata por perto é imperativo reduzir a população humana. Para que a população seja humana e viva humanamente terá de ser menor ou reduzir-se.
O que chamamos de progresso não passa de escatologia Cristã secularizada. Não nos levará ao paraíso na terra mas a destruição da terra, ao único e verdadeiro inferno que nos espera e aos mais acerbos sofrimentos numa planeta seco, sujo e sem água limpa.
Caso seja isto que você deseja para seus filhos, netos e descendentes meus parabéns!
Sinta-se um arquiteto ou construtor do inferno.
Pois o sistema que você defende com unhas e dentes continua a estimular, através das religiões sem consciência, a propagação irresponsável da espécie, apenas para manter um exército de reserva e controlar o preço do trabalho.
Aqui a ambição e o fanatismo associam-se para lançar mais uma pá de cal no cadáver fedorento da mãe terra...
Não. Eu nem me desespero, nem me sinto ou me assumo como um destes vermes. Pois tenho tomado por regra de vida as autênticas e fiéis lições do Evangelho, de Sócrates, de Buda, de Confúcio, de Francisco de Assis e sobretudo deste novo Francisco de Assis que foi Scott Nearing. Pois decididamente não acredito na explotação infinita de um sistema finito, na mística furada de um progresso técnico incessante, em regras imanentes ao Mercado, em milagres ou na necessidade de uma catástrofe que facilite a segunda vinda de Jesus... O qual a meu ver impos-nos o dever de criar um mundo melhor e de lutar por isso com unhas e dentes.
Sem compactuar com os erros do Comunismo e demais culturas de morte tampouco direi que está tudo bem ou que estamos em posse do melhor sistema social em termos de possibilidade. Não, não me conformo. Sou dos oponentes ou dos críticos os quais acreditam num tipo ideal, mais humano, mais racional e mais excelente. Sou dos que apostam em algo Ético, assim superior a ciência, a técnica e ao mercado... Em meio a tantos vermes rastejantes tento caminhar com Cristo e manter-me humano.
Nenhum comentário:
Postar um comentário