quinta-feira, 18 de outubro de 2018

Robert Nisbet 'Filósofos sociais' caput I A comunidade militar X comunidade familiar


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Não precisamos ler 'Os filósofos sociais' de R Nisbet para ficar sabendo que a comunidade militar e a comunidade familiar são antípodas.

Afinal é da comunidade familial ou familiar produzir a vida, além é claro de educa-la e da comunidade guerreira, belicosa ou odinista consumi-la.

Não se trata aqui de uma crítica utópica ou idealista ao exército enquanto entidade defensiva. No dia seguinte a supressão das forças armadas seríamos invadidos por algum império. Claro que já somos invadidos e quase controlados culturalmente... No entanto seria pura ingenuidade de nossa parte supor que a dominação cultural dispensaria uma dominação efetiva em termos políticos.

Instituições como política e exército são males, nosso idealismo ético obriga-nos a confessa-lo. No entanto nosso princípio de realidade leva-nos a encara-las como males absolutamente necessários, a falta dos quais ficaríamos sujeitos a males ainda piores.

O que criticamos aqui são os abusos. Assim o caráter militar de nossa polícia - que deveria ser comunitária ou comunal - e o militarismo ou qualquer coisa como expansionismo militar, imperialismo, odinismo...

A comunidade militar, quando estimulada por situações de guerra, consome a sociedade familiar. Daí o ditado: "As mães abominam a guerra."

Eis o que faz saltar a vista a associação monstruosa feita por certas mentes entre a defesa da família e o militarismo. Já aludimos a outra associação não menos monstruosa entre a defesa da família, e, pasmem; o liberalismo econômico ou capitalismo, apontado pelas pesquisas sociais, desde Le Play como uma das principais causas da dissolução da ordem familial ou como um elemento desagregador.

Mas é como se para eles, o Católico, Le Play jamais tivesse existido ou publicado seus cadernos sociais. E é como se Nisbet jamais tivesse existido...

Era de se esperar mais criticidade e honestidade por parte dos que defendem a organização familiar. No entanto como cordeirinhos vão eles estender suas patinhas aos lobos - I é ao Mercado 'auto regulável' e o militarismo... quando o primeiro consome o tempo e gasta a força dos elementos da família - Alienando-os uns dos outros e enfraquecendo os laços de afeto - e o segundo consome-lhe o sangue dos filhos, demandando sempre mais...

Ocorre-me ter lido em diversos almanaques civilistas narrativas sobre mães heroicas que perderam cinco ou mesmo sete de seus filhos em determinada guerra. Uma vez que o pastor ou mesmo o padre sem consciência, declare que seus filhos estão no céu por terem morrido tentando matar outros inocentes (raramente o padre ou o pastor ousarão examinar um conflito tendo em vista o critério da justiça!) a pobre mãe aceitará passivamente uma triste realidade a que não poderia ter resistido ou feito qualquer objeção... Mesmo guardando na memória o quanto fez para manter e educar os cinco ou sete filhos, sem a ajuda do magnífico exército.

Numa Sociedade em que prevalece a solidariedade social ou o Bem comum e na qual esta brava mulher e seu esposo fossem apoiados na brava emprese de manter e educar os filhos, até poderíamos compreender estes apelos ao sacrifício. Numa Sociedade em que todos os cidadãos tivessem oportunidades iguais compreende-se que se defendessem mutuamente e morressem uns pelos outros. Como compreende-lo todavia numa sociedade cujas diferenças são clamorosas e na qual prevalece o individualismo? Como compreende-lo numa Sociedade em que uns exploram os outros? Como compreende-lo numa Sociedade em que as oportunidades são desiguais? Onde alguns tem tudo e muitos nada tem... Como exigir que o miserável morra pelo milionário, que o pobre se sacrifique pelo rico, que o humilde imole-se pelo afortunado?

Caso a pátria não seja mãe verdadeiramente gentil para todos os seus filhos que direito tem ela de clamar pelo sangue deles?

E no entanto, mesmo quando justa e empreendida por uma Sociedade em que impera a justiça social, a guerra duradoura pode causar um impacto terrível sobre a comunidade familial. Pelo fato de consumir a juventude... Assim durante a segunda grande guerra, na Rússia durante a Revolução Bolchevique, durante a primeira grande guerra, durante as guerras napoleônicas na França, durante a guerra dos Trinta anos, após as guerras sociais em Roma. A Guerra consome a juventude e promovendo a seu modo o governo dos idosos, favorece o modelo conservador. Isso em sociedades dominadas pelo machismo... Pois em uma Sociedade mais aberta chegou a favorecer, ao menos indiretamente, a emancipação feminina.

Geralmente se diz que também o liberalismo econômico também colaborou para a emancipação da mulher. Esta afirmação é tendenciosa porquanto o liberalismo econômico ao oferecer emprego a mulher jamais cuidou em oferecer-lhe um pagamento digno, mas pelo contrário de oprimi-la ao máximo, apelando aos preconceitos machistas do tempo. O emprego oferecido as mulheres pela fábrica durante a idade de ouro do capitalismo nada mais foi que servidão. O acesso ao trabalho só veio a beneficiar a mulher quando suas condições foram transformadas sob os auspícios não da boa vontade do patrão ou das benesses do mercado mas das Leis trabalhistas e da propaganda socialista.




Mas, tornando ao militarismo e a família temos de ressaltar um aspecto muito pouco trabalhado nos livros de História. Não foi por acaso que os Espartanos e os Romanos - ao tempo de Augusto - proscreveram o celibato, equiparando-o a um crime. Sociedades militaristas dependem de mãos, pés e cabeças, dependem de jovens ou de certo número de vidas, de modo a poder sacrifica-las segundo as necessidades. Daí o apelo de tais sociedades a procriação ou ao aumento da natalidade.

Nada mais comum ou trivial do que a vida para este tipo de sociedade. Afinal nada mais fácil do que sacrificar os filhos dos outros colocando-os nas frentes de batalha, face ao inimigo. Também os filhos dos militares se arriscarão durante algum tempo para afetar bravura, sendo até possível que um ou outro morra. Apenas até que algum amigo do papai indique-o para um posto de oficial, indo ele para a retaguarda das fileiras, enquanto os filhos dos cívis - a falta de quem promova - ficam sendo tripa de canhão... São realidades sutis que não se divulgam ou comentam... mas que são absolutamente reais.

Todas as vezes que a comunidade militar ou o Estado envolver-se em alguma guerra a comunidade familiar será desfalcada. Nisbet nos oferece com propriedade três notórios exemplos: A Atenas anterior a Clístenes (509), a Roma anterior a Augusto e a Idade Média anterior as Cruzadas. E todos os três casos uma situação de conflito interno resultou na fragosa derrota da comunidade antiga ou familiar dando origem a uma ordem ou aparato militar unificado capaz de lançar-se para fora e de conter ou abater um poderoso inimigo externo, assim o Império Persa, os povos Germânicos e a Jihad Islâmica.

Atenas, o Império romano e a Europa Católica tiveram sucessivamente de militarizar-se por imposição de um inimigo externo poderoso e ameaçador. Essa situação promovida pelo inimigo externo exacerbou em máximo grau a oposição já existente entre dois modelos de sociedade: O modelo arcaico e concêntrico tendo por base as relações familiares e tribais e o modelo militar, na dependência da responsabilidade pessoal e num tipo de co fraternidade e autoridade não biológica. Claro que em tais situações o Pater e o General ou comandante não podiam exercer a autoridade simultaneamente. Já o sabiam os antigos romanos, os quais, durante as mesmas situações de guerra em que investiam um ditador (portador do Imperium), sustavam o poder tradicional do Pater.

Nada de demasiado grave enquanto os germânicos achavam-se distantes... No entanto na medida em que iam concentrando-se cada vez mais nas fronteiras, a defesa do Império exigiu uma mobilização cada vez maior e por assim dizer contínua de recrutas, o que acabou comprometendo o poder o Pater. Na verdade isto já havia ocorrido durante as guerras sociais e apenas agravou-se com o decorrer do tempo. O fato de que o primeiro tipo de cidadão romano posto fora da esfera de controle do Pater - tendo a posse de sua propriedade e de seus ganhos garantida pela lei - tenha sido o veterano de guerra que servira no estrangeiro é prenhe de significados. E só podemos imaginar quantos jovens filhos ambiciosos e oprimidos optaram desde então pela caserna. Durante algum tempo foi o exército a única via porque o varão romano podia escapar ao poder despótico de seu pai, o qual como sabemos cessava apenas com a morte.

Assim nas regiões europeias que eram vulneráveis ao muçulmano ou ao normando os comandantes e gendarmes não tardaram a substituir a figura do homem mais velho do clã. O reduto deste homem é claro foi o solar ou castelo. Mesmo o reino dos francos, após a morte de Carlos Magno e o pretexto criado pelo tratado de Verdum (843) principiou a dissolver-se e assim os grandes patrimônios da nobreza, em pouco mais de cem anos ou de três gerações as propriedades ou feudos foram atomizando-se, do que resultou a adoção do princípio da primogenitura com a exclusão dos irmãos mais novos da linha sucessória. Já atomizados os feudos estabilizaram-se, mas não o crescimento populacional e assim o aumento do número de deserdados sem patrimônio. Segundo Huberman foi o século XI marcado por conflitos não apenas entre os feudos ou os senhores feudais, mas por duelos ou disputas entre cavaleiros errantes ou bandos; temos assim um período de caos... Do qual a Europa saíra apenas quando esta massa guerreira, sob a égide de ordens militares e portanto melhor organizada, despejar-se sobre a terra santa e abater os infiéis.

A partir de então este aparato marcial não cessará jamais de desenvolver-se, alimentando-se sempre da organização familiar.

Tais reflexões suscitam outras tantas: Em que medida uma ameaça externa ou imperialismo qualquer - como o persa ou o islâmico - estimula a militarização de uma dada Sociedade ou melhor dizendo determina-a? Em que medida um imperialismo não estimula, gera ou produz outro? Que outra solução as sociedades ameaçadas poderiam ter adotado que não a militarização? Que seria da cultura grega caso Atenas não se tivesse militarizado sob Clístenes ou se submetido a Alexandre? Poderia a comunidade familial resistir ad infinitum a pressão exercida pelo Império rival? Que seria da Cristandade Europeia sem o recurso do braço germânico, da militarização ou das ordens militares? Em que medida a militarização poluíram os ideais democrático e cristão? Poderia a democracia ateniense opor-se resolutamente ao Império Persa, assim a fé Cristã? Poderiam os ideais democrático e Cristão resistir sob a dominação estrangeira fosse persa ou islâmica? Em que medida é o imperialismo islâmico continuação do imperialismo persa ou da jihad judaica?

Eis as diversas perguntas suscitadas por obras como a de Nisbet e cuja solução e resolução entregamos a você caro leitor.











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