quarta-feira, 24 de janeiro de 2018

A raiz da Crise civilizacional 'contemporânea''

Os tópicos e linhas que serão editadas abaixo são produtos de uma reflexão bastante prolongada e alimentada no decurso de anos por diversas leituras. Já havíamos idealizado, o esquema ou o artigo mas protelávamos sua confecção até que num dos posts do Face, um bom amigo suscitou a pergunta e a partir dela desenvolvemos a argumentação. O projeto agora é amplia-la e converte-la num livro ou livreto -

Portanto não reparem o descuido:

A avaliação, a partir dos primeiros sintomas, remonta a cerca dois séculos, pouco mais. Talvez Ed Gibbon, ao publicar a "História do declínio e queda do império romano" em 1776 tenha percebido qualquer similitude. Todavia como câncer só se manifesta por meio de sintomas quando o corpo já está tomado e as probabilidades de recuperação são diminutas, podemos supor que as causas remontem há alguns séculos antes no mínimo.

Podemos então localiza-las?

Partindo das culturas de morte> Nazismo, Fascismo e Comunismo ou marxismo ortodoxo, que são sistemas absolutamente materialistas, naturalistas e próximos do ateísmo, além é claro de autocrático, julgo que seja possível chegar as causas mais remotas da degeneração e quiçá, após o diagnóstico, sugerir algum tipo de tratamento.

Em primeiro lugar notamos que o nazismo é uma forma peculiar de fascismo caracterizada pelo racismo ou um desenvolvimento (os fascistas sinceros dirão degeneração) seu. Já o fascismo contou em sua gênese com elementos de origem comunista e, como o próprio comunismo/leninismo bebeu fartamente de Georges Sorel. Chegamos assim ao anarquismo e ao marxismo/comunismo. Examinemos pois as origens de ambos.

Como o próprio Papa Leão XIII sugeriu na Rerum Novarum (1891) - aludindo a ganância e ambição insaciável dos patrões (1893 p 233) - e o articualista de 'La croix' M Vicent, postulou com bastante clareza - na 'Questão social' Vozes, 1938, p 81 e 82 - foi o liberalismo econômico ou capitalismo que criou as condições necessárias para a afirmação do comunismo ao 'Criar uma situação social em que o mais forte esmaga o mais fraco' . Marx, crio ter lido esta tese pela primeira vez no Pe Charboneau, e depois conjecturas parecidas em Guerry, Welty, Maritain, Bass, Henri Chambre e outros, não inventou o materialismo, - como costuma ser acusado pelos apologistas desonestos - e tampouco Feuerbach. Detectaram-no, descreveram-no e reproduziram-no; pois lá já estava bem presente e arraigado na tradição economicista criada pelo liberalismo econômico ou capitalismo. Vide Karl Polanyi, 'A grande transformação'

Por estas três vias - Comunismo, Fascismo e Nazismo chegamos ao Capitalismo pelos idos de 1800. Cada uma destas vias reflete uma decepção face ao homem. São ambas negativas mesmo quando prescindem de uma antropologia. Chegam a conclusão de que o homem ou parte de sua atividade deva ser controlada autoritativamente, chegam aos confins do Leviatã de Hobbes.

Vejamos agora a gênese do anarquismo.
O anarquismo deriva de uma série de fontes heteróclitas, no entanto suas fontes principais são:

1) O alemão Max Stirner
2) O Yankee R W Emerson
3) O franco suíço J J Rousseau.

Vamos ver se podemos ir mais longe nesta arqueologia das ideias:

- O teórico do egoísmo Max Stirner era de origem luterana ou protestante.

- R W Emerson era unitarista, protestante, seita cuja antropologia positiva, foi tomada aos anabatistas do século XVI. Os anabatistas do século XVI são os primeiros teóricos do PELAGIANISMO ou o naturalismo crasso em antropologia com seu otimismo invencível segundo o qual o homem é um anjo de bondade. Jamais houve pelagianismo ou naturalismo antes disto. Os agostinianos, especialmente após o advento da reforma é que conceberam essa possibilidade (para eles monstruosa) e atribuiram-na anacronicamente a Pelágio, monge Bretão (semi pelagiano e portanto perfeitamente Ortodoxo), adversário de Agostinho e de sua doutrina maniqueista, mágica e fetichista a respeito da graça.

- J J Rousseau, suíço de origem protestante, retoma e desenvolve essa antropologia otimista ou pelagiana, em oposição ao calvinismo, o qual como sabemos é outra manifestação do agostinianismo, tal e qual o luteranismo.


Há certamente quem encare o fato dos três personagens acima serem protestantes como mera coincidência, nós no entanto preferimos adotar o conceito weberiano de 'afinidades eletivas' ou de afinidades intrinsecas.



Tornemos agora ao Capitalismo -


Enquanto Rosa Luxemburgo e F Engels da parte do Comunismo apresentarão o protestantismo como a 'religião burguesa por excelência' - E portanto identificada culturalmente com a produção capitalista - Max Weber, Husley, Tawney, O brien, Fanfani, Maritain (noutra perspectiva) apontarão o protestantismo como ideologia responsável pela afirmação estrutural do Capitalismo - até então contido pela Ética da igreja velha - no contexto moderno. Claro que os 'católicos' contaminados pelo solifideismo e de coração protestante contestam a afirmação acima, mas gratuitamente...  Afinal se o protestantismo produziu essa 'coisa maravilhosa de deus' chamada Capitalismo enquanto que a Igreja ou melhor a ordem medieval, conteve-a ou reprimiu-a, que é que esses palhaços estão fazendo que ainda não se tornaram luteranos, calvinistas ou anabatistas??? Coerência manda abraços!

Importa saber que no domínio concreto dos fatos por ambos os lados chegamos a rebelião protestante.

Quanto a afirmação do Capitalismo porque segundo Maritain (apud Pe Mellawace ) o Cristianismo protestante, luterano ou anabatista, sendo derrotista (como o Agostinianismo) e negando-se as obras, abandonou a arena do mundo natural ou material, reconhecendo-se como inepto para transforma-lo e entregou-o a suas forças naturais, abrindo caminho para o naturalismo crasso. A própria igreja romana teve de abandonar seu projeto integral de sociedade Cristã, inspirada na ética do Evangelho, para dar combate ao protestantismo, concentrado-se mais sobre a fé e a doutrina do que sobre as obras, como havia sido até então. Direta ou indiretamente o protestantismo drenou as energias da Cristandade e lançou-as para além deste mundo, concentrando-se no além túmulo ou no céu e desviando o próprio papismo de sua rota milenar.

Foi uma tragédia de amplitude cósmica a ponto de alguns sugerirem atividade demoníaca ou diabólica. Afinal um projeto social com mais de mil anos de existência, pautado na Lei de Jesus Cristo ou no Evangelho, no Sermão do monte ou nas bem aventuranças, foi subitamente abortado, abrindo espaço para um naturalismo economicista que se ampliava na mesma medida em que a Sociedade protestante dividida pelo sectarismo e confusão doutrinal ia desertando o da fé e concentrado suas forças no Mercado, a nova mística ou divindade. Na linha de Weber a mesma crítica de Arendt e Eliade fizeram ao Comunismo, ao Fascismo e ao Nazismo - e que John Gray estende ao ateísmo proselitista de hoje - cabe perfeitamente ao capitalismo emergente nos séculos XVIII e XIX enquanto poderoso sucedâneo da religião.

Importa que as raízes do Capitalismo tocam a reforma protestante, e as do anarquismo também.


O mal epistemológico ou metafísico -

Abandonando agora a esfera da economia e da organização sócio política, abordo outro aspecto significativo da crise contemporânea e que esta situado no âmbito da Filosofia, mais precisamente nos campos da Metafísica e da Epistemologia, os quais também pressupõem uma antropologia não naturalista (diferente da greco romana e da Renascentista) como alardeia G George Santayana em "O Eu na filosofia germânica"

Refiro-me ao positivismo, ao agnosticismo, ao subjetivismo, ao relativismo, ao irracionalismo, ao voluntarismo, ao idealismo, ao criticismo; enfim a Kant primeiro e a Hume depois, pois este era cético.

Kant como alertaram os jesuítas de Salamanca em diversas de suas publicações, ao invés de ser impermeável a influência da fé Luterana tomou explicitamente o propósito de vindica-la, abatendo a capacidade racional do ser humano. Foi ele o Filósofo portátil de Martinho Lutero como Heiddeger fora o Filósofo portátil de Adolph Hitler. Poluiu a Filosofia transplantando para seu terreno uma antropologia negativa ou pessimista que serviu de fundamento a sua metafísica anti metafísica. No livro 'Kant e a teologia' damos com a notícia de que Kant jamais deixou de ser um bom Luterano e que nem sempre soube manter-se fiel ao nobre propósito de manter a fé e a reflexão filosófica separadas uma da outra.

I Kant como Lutero e Agostinho acreditava que o homem havia sido essencialmente transtornado pelo pecado ancestral e portanto que a sensação nos enganasse, que a razão fosse demasiado fraca e que a vontade caprichosa e a imaginação tudo comandassem. Claro que em nada disto há Filosofia. A Filosofia é naturalista a exemplo do pensamento clássico greco romano, a exceção de Pirro de Elis, o qual também fez petição anti filosófica a um sistema de crenças religiosas, a saber ao budismo e seu nirvana. O ceticismo não menos que o criticismo reporta sempre a uma antropologia negativa ou pessimista tomada a fé religiosa, e Hume tomou-a ele próprio ao Calvinismo, irmão do luteranismo e filho do agostinianismo.

Embora um grande número de expositores esforcem-se heroicamente com o objetivo de limpar a barra de seus gurus, apresentando suas teorias em conexão com teorias ou tendência anteriores, buscando apresenta-las como um desenvolvimento interno da própria filosofia há elementos suficientes para classificar a obra de Hobbes, Hume e sobretudo a de Kant, como uma intromissão religiosa no campo da Filosofia. Não nos parece que tais homens foram superiores aos escolásticos, com os escolásticos temos uma Filosofia Católica muito próxima das correntes inauguradas por Platão e Aristóteles. Com os modernistas temos uma Filosofia protestante que confina com Pirro de Elis e também, ao menos externa e imperfeitamente com a sofística de Górgias de Leontinum e Protágoras, o abderita.

Toda Filosofia contemporânea, sem exceção tem seus fundamentos mais remotos neste mancebia carunchosa, derivando sempre da cultura protestante.



A terceira fonte do mal estar -

Chegamos por fim a terceira fonte do mal estar e a ponta do Iceberg, aos sectarismos atuais.

Destinados a princípio a combater os preconceitos e a afirmar os justos direitos de determinadas minorias, tais 'clubes' tem desgraçadamente, numa proporção cada vez maior, perdido de vista sua inspiração ético humanista e por incrível que pareça reproduzido ou invertido os mesmos vícios a que pretendiam dar combate, o que nos faz vislumbrar uma situação dramática num futuro bastante próximo.

Gostaria de acrescentar uma breve análise do problema. A princípio todos estes programas de oposição ao preconceito tinham certa vinculação com o Cristianismo ou melhor com os Catolicismos, anglicano e romano, e mesmo com o metodismo e o quackerismo, sendo arejado por uma saudável consciência humanista. No decorrer do processo histórico, na medida em que o Cristianismo foi se tornando cada vez mais conservador e distanciando-se dos problemas sociais até assumir a feição anti humana, inumana e insensível que apresenta em nossos tristes dias, os batalhadores cristãos, sentido-se cada vez mais desamparados foram abdicando da fé ou da causa, sendo esta assumida a princípio por indiferentes, agnósticos, materialistas e enfim, cada vez mais por ateístas... E já dissemos em alto e bom tom que o ateísmo é inepto para produzir e manter uma Ética humanista empenhada em favor da dignidade da pessoa humana. Assim as melhores causas estão a degenerar-se nas mãos deles...


Repassemos agora alguns deses movimentos:
O das feminazis, radifens ou feministas radicais - as amazonas da modernidade rsrsrsrs - para as quais todo homem é um estuprador em potencial ou no mínimo um opressor, de modo que o sexo masculino acaba servindo para rotular e coisificar pessoas. Devemos distinguir essas moças amarguradas das verdadeiras feministas que lutam pela justiça na perspectiva da igualdade.

A certas parcelas de militantes negros ou indígenas para os quais todo europeu, branco ou caucasiano, é um inimigo, um opressor, um canalha, um monstro... e o fenótipo aqui sempre permite um julgamento coletivo, monolítico e injusto que mais uma vez ignora por completo a dimensão pessoal do ser humano.

Os assim chamados e auto proclamados devassos e imoralistas que enxergam, como o marques de Sade, no exercício da sexualidade o único ou supremo sentido da vida.

A certos naturalistas e veganos para os quais todo e qualquer ser humano é uma espécie de parasita sádico e cruel.

Os sectários ateístas ou irreligiosos que reproduzem o fanatismo dos religiosos como reconhece Michel Onfray.

 
Agora qual o ponto de partida desta revolução ou destas seitas?

Todas elas foram edificadas em diálogo com o maniqueísmo, o puritanismo ou o moralismo judaico cristão, mais judaico do que Cristão e até digo muito pouco Cristão. 


Esse moralismo, que é sempre um sinal de declínio religioso, foi cada vez mais assimilado ao protestantismo - sua matriz, - pelo Catolicismo a partir do século XVII, chegando a seu ápice no século XIX ou no período vitoriano; sociedade de aparências, convenções e neurose. Haja visto que o Catolicismo da 'malfadada' Idade Média fora muito mais liberal, moralmente falando, a ponto de ser classificado pelos reformadores protestantes - a exceção de Lutero promotores desta consciência moralista ou puritana legada pelo farisaísmo judaico - como pagão e devasso.

O fato é que apesar disto o papismo foi assimilando paulatinamente o caráter rancoroso, mesquinho e bisonho da reforma protestante, até tornar-se tão obscurantista quanto ela, ao cabo do seculo XIX. Período em, que a Cristandade ocidental tornou-se marcadamente: Machista, adultista, odinista, racista, homofóbica... segundo podemos observar nas seitas bíblicas e judaizantes ainda hoje.

Foi este excesso a um lado que provocou a reação e os excessos do outro lado. O sectarismo em formação no tempo presente é tributário dos preconceitos de outrora em sua maior parte tomados a Bíblia, a Paulo, ao antigo testamento... e postos em circulação pelos reformadores, a começar por Calvino. Ainda aqui pela derradeira vez damos com a mão do protestantismo! Pois ele produziu o clima que suscitou a reação desmedida do tempo presente.

Não há portanto aspecto da crise porque passamos - a exceção do perigo externo do Islã - que não chegue a reforma protestante e portanto a 1521 ou ao século XVI, ocasião em que desintegrou-se o éthos ou ideal unitário e totalizante de vida e civilização Cristãs inspirado no Evangelho e na tradição da Igreja antiga.

Claro que poderíamos estender e levar nossa crítica até Agostinho de Hipona e o Agostinianismo, como já fizemos noutro ensaio. Chegaríamos a raiz do mal, e mil anos antes. Poderíamos inclusive recuar a fonte inspiradora de Agostinho i é até o Maniqueísmo e o século III na Pérsia de Varano. Importa saber que o Agostinianismo, durante toda a Idade Média, esteve em conflito com a crença tradicional semi pelagiana, afirmada ainda em 1539 pelo teólogo holandês Alberto Pighius contra Calvino


A igreja romana mostrou-se leviana e irresponsável por não combater e condenar o Agostinianismo em suas fontes, mas... eram tempos de barbárie.

Seja como for ela ou parte dela resistiram-lhe bravamente e engalfinharam-se com ele até as vésperas da reforma, quando enfim foi canonizado por Martinho Lutero, um ex monge agostiniano. É por meio da reforma que o Agostinianismo ao cabo de um milênio impoẽm-se dogmaticamente. Por meio da reforma protestante é que ele triunfa, ainda em parte, no seio da igreja romana com o Concílio de Trento e com o jansenismo enfim. Todas as variantes e vertentes de nossa crise civilizacional remetem de algum modo a antropologia pessimista de Agostinho, concretamente assumida pela reforma protestante e ao solifideismo que é a contribuição especifica de Lutero.

Eis onde chegamos pondo o dedo no fundo de cada uma de nossas chagas e feridas.
 

Conclusão - A Perda do sentido...


Sim, nós sofremos desde que nos desligamos 'ex abrupto' da Idade Média. Porque ela possuia um plano mal acabado e jamais retomado de Civilização cristã ou Católica inspirada naquele mesmo Evangelho que inspirou a um Francisco de Assis ou a um Francisco Vitória, e as fontes deste plano eram transcendentes.

O problema não foi a ruptura, a Idade Média tinha graves vícios e defeitos que tinham de ser corrigidos, e a Renascença despontou apontando o caminho. A Renascença apontou para o homem e desafiou o agostinianismo. A reforma surgiu como reação ou resposta ao Renascentismo e a afirmação Cristã do homem e da sua liberdade e da sua racionalidade...

A ruptura com a idade média por meio da reforma foi brusca, dramática e descontinua; foi turbulenta, foi iconoclástica. Todos os valores antigos foram deitados ao lixo... Deveríamos ter optado por uma ruptura crítica ou orgânica. Por uma superação que não descarta alguma continuidade. A reforma foi como um tufão, uma avalanche ou um dilúvio que passou pelo velho mundo enchendo-o de ruínas, as quais Nietzsche pode contemplar.

Mas é do tufão perder rapidamente sua força, de modo que em cem anos a reforma, que pretendia substituir a igreja antiga, estava já em parte desmoralizada e principiando a desabar fragosamente.

Ela só logrou impor-se e florescer no terreno virgem de cultura da América do Norte, onde não havia vestígio algum de paganismo ou de catolicismo - e portanto a falta de uma cultura superior e oponente - e apenas para dar origem as seitas bíblicas do belt bible (que são outro pesadelo assombroso), a uma pleiade imensa de preconceitos, ao destino manifesto, ao ambiente do capitalismo, ao imperialismo ao paraíso da arte degenerada; enfim a tudo quanto Aron e Dandieu chamaram ĉancer americano ou americanismo - a apoteose suprema da vulgaridade.

No velho mundo em comparação com as culturas anteriores Católica e clássica, a reforma falhou e logo teve de ceder lugar ao naturalismo economicista ou seja ao capitalismo, o qual deu origem a toda uma nova ordem, não apenas secular (o que é bom) mas absolutamente formalista e naturalista, o que é trágico. Não deu conta de sua missão auto atribuida, não satisfez a demanda, amarelou... abrindo acesso ao islã. Aos extremos problemáticos do islã e do ateísmo militante... Cila e Caribdes.

Ao menos até o Concilio do Vaticano II, em certo sentido o papado, juntamente com a coroa britânica - chega a ser paradoxal -  segurou as pontas da cultura.  Quanto ao povo e as massas no entanto, jamais recuperaram o vigor da fé e menos ainda um ideal de civilização católica enquanto programa de vida em sua puridade. Ficaram em maior ou menos grau contaminados e feridos pela chaga do solifideismo e pela doutrina da salvação fácil e sem compromisso até ignorarem por completo que a igreja possui uma doutrina social imensamente rica - eu como Ortodoxo grego o reconheço! - e conformarem-se por completo com as instituições do mundo capitalistas.

Os Católicos instruídos no entanto puderam contemplar os estragos do luteranismo no nosso campo e a sentir que desde o século XVI e especialmente após a ascensão do Capitalismo, faltava algo ou que algo estava incompleto. Eles perceberam a fragmentação de um sentido que já não mais alcançava, inspirava e arejava certos domínios da existência... Sentiram que as pessoas estavam vivendo um meio Catolicismo, que tocava apenas a fé e a salvação no além, como no caso do protestantismo. Acontece que até o advento da Reforma o Cristianismo jamais havia sido encarado como mera fé! Coisa que ele não é e jamais será. A fé não esgota o Catolicismo, é seu ponto de partida. O Catolicismo é uma vida, e quando esta vida não é ou não pode ser vivida apodrece como um cadáver. Apesar da doutrina social da Igreja os maiores vultos da Cristandade foram capazes de perceber que o nosso ideal havia sido barbaramente mutilado, na medida em que alguns transloucados negociaram e negociam com o liberalismo naturalista! Eles aspiram por uma fé somente, sua profissão é Católica, mas suas almas são luteranas e nelas não há heroísmo!

Ficou uma imensa frustração a dominar os legítimos Católicos, uma consciência pesada e um sentimento de culpa. T S Elliot jamais conseguiu supera-lo... Benson conjecturou sobre o fim do mundo, a besta, o anti Cristo e outras fábulas em 'O senhor do mundo'... Berdiaeff e outros clamavam aos céus pedindo que estes tempos fossem abreviados... Landsberg teve de analisar com cuidado o tema do suicídio... O agostinianismo, veneno que dera origem a todo o processo, recrudesceu com Ettiene Borne, Tasso da Silveira, Maritain em menor medida... O encanto havia se quebrado para sempre. Spengler deu toque de finados a nossa civilização, diversas monografias - como a de Ferrero - sobre a decadência e queda do Império romano foram editadas e Toynbee ficou a aguardar em vão por nova síntese religiosa a ser feita no ocidente
. Tal nosso estado de espírito no tempo presente!

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