quarta-feira, 11 de março de 2020

A escola pública e o proselitismo 'oculto'

NÃO versa este artigo sobre as aulas de religião na Escola pública, as quais me oponho decididamente, seja qual for sua forma. E caso me fossem atribuídas tais aulas delas declinaria... Aqui dou razões aos anarquistas e comunistas (O que aliás raramente faço!) - Neste caso por que não aulas de economia ou de política? POR QUE priorizar a religião ou a fé se temos imenso déficit de conhecimento político básico, em termos de formas e estrutura, como sistemas, regimes, Constituição, etc???

Aulas de teoria Política e de Psicologia seriam bem mais úteis aos adolescentes, aos pequeninos elementos se Sociologia e Filosofia seriam infinitamente mais proveitosos. Com Fustel de Coulanges compreendo o poder e a força social das Religiões, mas como economia e política factual é coisa que já se aprende nas aulas de HISTÓRIA ou GEOGRAFIA HUMANA.

Não examinei teor da decisão do STF (Não repeito DOGMAS 'seculares' pois dogmas só  vão bem com a religiosidade ou a fé!) a qual como disse oponho-me com base nas alegações acima. Creio todavia que não deve autorizar ensino confessional nas escolas públicas, assim o proselitismo. Penso que a educação pública ainda não tenha sido assaltada pelos pastores protestantes...  Ao menos com o apoio do poder público ou do STF. Em que pese os esforços malignos deste governo norte americanizantes e vendido aos charlatães bíblicos.

O proselitismo oculto a que me refiro, enquanto elemento sutil porém perigoso, outra coisa é.

Por isto narrarei genericamente um fato do qual tomei parte, já há algum tempo, na Escola estadual Paulista de que faço parte, como professor concursado ou efetivo já há quase quinze anos.

A narração será genérica já por respeito as atuais diretora e coordenadora, as quais em parte deram-me razão e compreenderam meu ponto de vista, além de terem feito um legítimo contraponto e me convidado, elas mesmas, para que eu examinasse o dito projeto sendo posto em prática.

Por isso não posso denunciar qualquer coisa ou trazer tais fatos a público, o que de outro modo já teria feito. Porém, por questão de justiça, tenho de examinar os fatos mais de perto e assim as alegações da outra parte.

Servirá no entanto, quanto aos traços gerais, para suscitar uma reflexão e orientar todos os professores numa grave questão de cidadania, da qual depende a sobrevivência ou não da própria democracia.

Há tempos algumas alunas 'Caxias' - Cujas identidades preservarei até o fim e jamais divulgarei - vieram até mim e disseram estar incomodadas porque sendo de cultos africanos tinham, ao fim de certo projeto, ouvir umas preces em nome de Jesus (Devo dizer que sou Cristão e adoro Jesus.) e parece alguns versos bíblicos. Estavam elas, como é natural constrangidas e isto me alarmou.

Imaginei se eu ou filho meu lá estivessemos, numa classe pública lotada e alguém lá fosse falar sobre Maomé e depois convidar-nos a recitar a fatiha...

Passou algum tempo. Eis senão quando vou entrar em minha aula é imediatamente antes de mim entra este grupo de projeto que fora acusado... Pelo sim pelo não, tendo em vista certos precedentes relacionados com outra equipe gestora, solicitei a inspetora que os fizesse sair para que pudesse entrar e ministrar minha aula - Direito meu. Adicionando que em caso de necessidade faria um BO.

Até aqui tudo bem. Sucede que perto da inspetora se achava um aluno do tipo 'crente fanático' o qual dirigiu-me a palavra apenas pata declarar que os religiosos tinham pleno direito de orar e pregar nas escolas públicas caso os alunos quizessem. QUAIS ALUNOS? TODOS??? Mencionei as leis, a CONSTITUIÇÃO, etc com o objetivo de esclarecer o dito jovem sobre a coisa pública, o laicismo, etc Ele no entanto mostrou-se irredutível e inclusive ergueu a voz, como típico é dos sectários... Respondendo eu no mesmo tom. ATÉ QUE os voluntários religiosos deixaram minha sala e lá pude entrar..


E nem havia iniciado minha aula quando me vem a Sra coordenadora querendo falar comigo. De fato pouco receptivo fui e até aspero tendo em vista o histórico da Unidade e os fatos imediatamente ocorridos, alias supondo que ela, a coordenadora, tentaria enfiar o tal grupo em minha sala. Iniciou-se uma discussão que lá foi parar na sala da Direção.

A diretora, aliás educada e paciente, tentou entender e esclarecer a situação. Relatei a denúncia feita pelas alunas sobre orações confessionais, aliás protestantes e possível citações de sei lá que versos bíblicos e declarei irredutível que tal era violação de consciência e crime contra nossa lei maior, a Constituição.

A coordenadora, aliás espírita, disse que a dinâmica em si nada tinha de religiosa ou credal mas que no entanto após o término havia uma espécie não de 'oração', com esse nome, mas uma reflexão em que cada aluno se dirigiria ao Sagrado nos termos da sua própria religiosidade... A qual insistia ela tinha outro nome...

Repliquei declarando que o nome era indiferente se a prática era a mesma e havia uma oração confessional, mencionando bíblia, Jesus e com mínimo conteúdo protestante ou exemplo de formas tipicamente protestantes fornecido pelos organizadores.

Como de praxe declararam que na sala ninguém era obrigado a aderir a reflexão e que sendo ela livre não violava a consciência de quem quer que fosse.

Respondi que está atitude era discriminatória e que certamente constrangida os possíveis irreligiosos, ateus, etc Politeísta - pois certamente ali não se falava em deuses... muçulmanos, etc mesmo aqueles que se sentem incomodados pelos gritos e berros dos pentecostais...

Claro que chegando aqui - FUI irredutível por questão de justiça - foi me assegurada a liberdade de cátedra dada por lei e nem me preocupo com Conselho, Equipe gestora, etc caso destoem da Lei maior da Constituição, garantia da liberdade de Consciência e da igualdade entre todos os cidadãos.

Por fim indagaram a respeito de meu manifesto nervosismo. Foi quando me referi ao jovem fanático, a respeito do qual elas certamente já sabiam porque - Pasmem! - ele, muito provavelmente, já se antecipara a mim, indo a diretoria denunciar-me por defender o laicismo e a Constituição e os direitos da Consciência livre. AGORA PAREM E ANALISEM ESTA POSSIBILIDADE MONSTRUOSA... Aquele jovem certamente cria que aquele espaço público, mantido com nossos impostos, fosse propriedade, líquida e certa, da seita ou grupo a que pertence!!! ONDE CHEGAMOS...

Terminei minha entrevista com a equipe gestora declarando em alto e bom som que quando ingressei naquela unidade há doze anos, pouco mais pouco menos, a equipe gestora (DIRETOR E VICE) não apenas cediam o espaço escolar para diversas organizações religiosas protestantes - A ponto de converte-se numa seita de células aos sábados e Domingos - como promoviam shows gospeis, palestras confessionais e mesmo cultos em pleno periodo letivo e com ampla atividade proselitista, com grave dano a CONSTITUIÇÃO, digo a lei. ISTO ocorreu numa Escola pública do Estado de São Paulo a partir de 2007 e há sobejos testemunhos ja de alunos que se sentiram incomodados, ja de professores que la trabalharam, nessa Escola dirigida por um fanático truculento...

Ora, alguns colegas até gostavam de ceder suas aulas a esses doutrinadores religiosos. Nem todos e menos ainda eu. Porém por fragilidade, estando no probatório e temendo retaliações, não pude denunciar - Ademais temia pelos demais, fossem alunos ou funcionários e havia ali um espirito SECTÁRIO e inquisitorial, bastante conhecido por mim...

Dai minha prevenção contra este novo projeto, do qual se haviam queixado duas meninas.

Até aqui os fatos. SEGUEM AS REFLEXÕES -

Sendo a prece ato pessoal dos que creem não há como os indiferentes ou incrédulos não se sentirem constrangidos. Assim como cristão devo fazer justiça aos ateus e incrédulos e reconhecer-lhes o direito de não querer participar de preces ou sequer presencia-las em espaço público. Posto que tal viola o santuário divino da Consciência.

Um ateu ou incrédulo tem pleno direito de sentir-se incomodado por uma prática cujo sentido desconhece ou ignora.

Mas há ainda os religiosos que não desejam fazer preces inter confessionais - Testemunhas de Jeová, 'Católicos' tradicionais, Adventistas, Mórmons, muçulmanos, hindus, etc decididamente tais grupos não desejam rezar na companhia de pentecostais fanáticos ou a moda deles porquanto as concepções de prece são diferentes.

Consideremos ainda que em tais classes ou salas os pentecostais costumam a sentir-se mais a vontade para rezar em público, como se estivessem em suas seitas e podem se por a berrar e gritar em alta voz como já presenciei. Para outros a prece é mais sóbria, interior, recatada... E as vozes e pensamentos deles ficam abafados pela gritaria pentecostal... QUE FAZEM DAS PRECES UM MEIO DE PROSELITISMO, por berra-las.

Ademais eles bem podem ser instrumentalizados pelos pastores neste sentido (Ex protestante fui criado nesse meio inescrupuloso.), a ponto de nessas preces ingênuas ou comuns produzirem um clone tipicamente pentecostal ou sectário.
Manipulam assim uma 'reflexão' a princípio voltada apenas para o Sagrado e inter confessional. Colocam isso no papel mas na prática podem distorcer, e exercer um proselitismo oculto ou sutil.

Daí surge fatalmente a revolta, por parte dos não crentes, conflitos, problemas, discriminações e preconceitos como já testemunhei. O que é deseducativo e choca-se com a harmonia que deve reinar no ambiente escolar. Para além disto disseminam ideias anti científicas e anti filosóficas como criacionismo, terraplanismo, etc Além de conteúdos moralistas e puritanos ou mesmo teocráticos e anti democráticos; o que dificulta imenso o trabalho escolar.

Por isso sou decididamente contra as preces em ambiente escolar, mormente quando promovidas por algum grupo religiosos, e, particularmente contra preces feitas e classe ou salas de aula.

Seria menos agressivo ou invasivo caso algum membro da equipe gestora apenas convidasse, a hora da entrada, quem quisesse - Sem convocação ou fila - para parar e recitar o Pai Nosso ou fazer uma prece silenciosa no pátio, enquanto os demais iam diretamente para suas salas... Aqui se poderia apelar a cultura ou ao costume e não haveria constrangimento. Mas poderia abrir precedente para justificar outras coisas, como a oração em sala...

Nós no entanto preferimos que a letra da Constituição ou da Lei seja observada, e que evento religioso ou prece alguma seja realizada em espaços institucionais, especialmente quando existem elementos proselitistas. Assim dentro da convivência vai bem o respeito.

Concluo dizendo que vivemos um momento arriscado ou delicado em que os pastores e suas ovelhas apoiaram este governo com o objetivo de obter vantagens e benefícios, como poder político ou a possibilidade de invadir e tomar nossas escolas públicas, consolidado seu poderio. Eles parecem querer usar a educação pública com o objetivo de converter nossos jovens e crianças e estabelecer uma teocracia moralista.

Há cento e trinta anos tiramos a educação das garras da Igreja Romana para torná-la laica e democrática ou para coloca-la nas unhas desses pastores enviados pelos EUA??? Caso nossos ancestrais tenham lutado para que a educação fosse, ao fim do processo, entregue a uma agremiação ainda mais insidiosa e mesquinha do que a Igreja Romana foram perfeitos idiotas, pois ao menos a Igreja Romana, com seus Pai Nossos e Ave Marias, fazia parte de nossa cultura... Que se deixasse tudo como estava. O que nossos ancestrais conquistaram em 1891 - A Escola laica, fundamento do Estado democrática - religosamente mantenhamos.




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