terça-feira, 8 de novembro de 2016
A mania de rotular as pessoas
Se é verdade que o 'Bom filho a casa torna' eu voltei...
Após ter reservado um tempo a leitura e ao estudo, eu voltei...
Precisava reabastecer-me. Movimentar o fluxo das ideias, oxigenar a mente, exercitar os neurônios... Afinal água que não corre, apodrece e máquina que não se movimenta enferruja.
Assim o pensamento que não se abastece com leituras, estudos, informações.
Realmente não sei se fiz alguma falta, mas, pro via das dúvidas...
Voltei e começarei chutando o 'pau' ou melhor o suporte da barraca. Pois quero ver a casa, digo, algumas casas virem abaixo, e estrondosamente.
Durante as Idades Média e Moderna o barato era classificar o outro como Herege ou Herético. O que jamais foi privilégio dos papistas, também os protestantes, luteranos, calvinistas, zwinglianos e mesmo anabatistas costumavam empregar o termo sem um pingo de moderação. Mais ou menos como dizemos hoje 'Filho da puta' ou, lamentavelmente, capitalista, comunista, fascista, anarquista, macumbeiro, etc
De fato nos últimos dois séculos termo herege ou herético foi substituído, com relativo sucesso, por maia dúzia de rótulos cujo fim ou objetivo é pura e simplesmente satanizar certa categoria de seres humanos e de torna-los odiosos e odiados, exatamente como nas Idades pretéritas.
De modo que as pessoas jamais deixaram de ser rotuladas, apenas foram criados alguns outros rótulos. No entanto por parte daquele que recorre ao rótulo o objetivo é sempre e eternamente o mesmo: Tornar seu oponente ou desafeto ideológico odioso.
Não, não sou, nem de longe relativista.
Pelo simples fato de que o relativismo, levado as últimas consequências, tudo desculpa, tudo absolve, tudo sanciona; inclusive o nazismo, o estupro, a tortura, a teocracia.
Sou pela ética da Essência e portanto por uma epistemologia realista e objetiva, que conceba existência a verdade e sirva de respaldo para condenar o erro enquanto erro e condena-lo irremissivelmente. Certas ideologias ou culturas de morte, certos venenos ideológicos, certas teorias anti humanas e humanistas precisam ser irremissivelmente condenadas em nome do fenômeno humano e sua dignidade impar.
Lamento proferir verdades amargas, mas, se de fato o ateísmo e o materialismo crasso tudo fragmentam, tudo isolam e tudo tornam individual, subjetivo e relativo, temos de discutir sobre as ilações ou decorrências Éticas de semelhante ponto de vista e retomar o tema socrático da universalidade e atemporalidade do Bem e do Mal.
De fato tenho minhas ideias, opiniões, teorias; as quais julgo serem verdadeiras na medida em que estejam embasadas no mundo da concretude por via da experiência. Tenho meus pontos de vista muito bem definidos. Minha religiosidade, um modelo de organização social, uma plataforma política, uma doutrina econômica, uma concepção de mente ou personalidade, certo sentido em termos de História, etc
Tenho portanto ideologias, certas ideologias, fruto de acurada investigação, resultado de anos e mais anos de estudos, produto de diversas leituras, etc E como disse a pouco não posso crer que todas as ideologias sejam absolutamente iguais ou que a policracia e o fascismo sejam equivalentes...
De minha parte não temo definir-me honestamente como Cristão Católico (Ortodoxo não romano), aristotélico ou realista, socrático ou humanista, policrata (partidário da democracia direta - a longo prazo e a ser construída a partir da democracia que temos.), solidarista, keynesiano ou trabalhista, construtivista, eclético ou semi freudiano, etc Não tenho qualquer dificuldade em apresentar-me e em apresentar as verdades que acredito serem válidas e valiosas.
Mais, procuro viver o que acredito numa linha de coerência.
Implica admitir que não posso deixar de encarar as ideologias opostas: o protestantismo, o relativismo kantiano, os anti humanismos (assim o nazismo), os totalitarismos (comunismo e fascismo), o individualismo, o capitalismo, o idealismo, o materialismo crasso, o behaviorismo, o ateísmo, etc como equivocadas, perigosas e indesejáveis. E tampouco deixar de opor-me a elas e as instituições que as representam e defendem.
Assim, a 'igreja' calvinista, a 'assembléia de deus', o movimento neo nazista, o partido fascista, o partido comunista, o PSDB, o PMDB, o DEM, o instituto Von Mises, o regime de mercado, a FIESP, a Polícia militar, o Exército, a ATEA, etc, etc, etc
Segundo meu ponto de vista associar-me a qualquer ou das instituições acima - dentre muitas outras - ou colaborar com elas equivaleria a trair sordidamente os ideais a que professo aderir.
A consciência obriga-me antes de tudo a examinar e a - sempre que for possível - abraçar as soluções ou iniciativas propostas pelos padrões católicos, pela plataforma centro socialista, pelos libertários ou policratas, pelos humanistas e solidaristas e assim ecologistas, defensores dos direitos da infância, feministas, paladinos da liberdade sexual, etc, pelos educadores progressistas, pelos realistas, objetivistas, semi pacifistas, etc Embora realize sempre um exame crítico sinto-me obrigado a iniciar meu exame partindo das propostas das organizações que representam tais valores, e posso declarar que quase sempre satisfazem-me.
Por isso - como ex protestante - sempre folguei em opor-me ao movimento ecumênico (Que implica assimilar certa doze do espírito protestante), por isso jamais tenho votado em candidatos filiados a partidos de direita, por isso jamais colaborei com coletivos ou organizações de matriz totalitário, por isso tenho denunciado todas as associações culturais de caráter puritano ou preconceituoso, por isso tenho evitado o simples ato de falar a plateias ou clubes de viez liberal, patriótico, militar, etc Tenho buscado selecionar as organizações, instituições e grupos a que falo partindo duma linha de coerência e já cheguei a ser escrupuloso inclusive!
Hoje no entanto, sendo mais flexível, permitindo-me algumas exceções.
Assim, em que pese minha repulsa pelo espírito protestante e tudo quanto representa, não hesitaria em ir a uma apresentações de música sacro erudita num templo luterano ou metodista. Como não deixaria de ir a uma exposição cultural sobre os EUA na sede do DEM ou sobre a Rússia ou a Ex URSS na sede do P C. Tampouco deixaria de assistir a uma palestra sobre qualquer tema interessante no Palácio da Polícia ou a uma exposição filatélica no B C. E se me permitem escolher um tema e falar livremente, aceito falar a qualquer platéia.
Como bom Socrático ou (até mesmo) seguidor do velho Platão (ao menos quanto a este aspecto) continuo acreditando que o mal merece ser odiado e o Bem apenas ou o que é Bom, amado, assim da verdade. Pois não creio que o Bem subsista separadamente da verdade e da beleza (Kalokagatia).
Estou firmemente persuadido de que certos ensinamentos e doutrinas errôneas devam ser detestados pelo homem virtuoso e submetidos a sua crítica. Não acredito que cada qual tenha sua verdadezinha individual, que todas as opiniões sejam igualmente aceitáveis, que esteja obrigado a concordar com todas as teorias (inclusive as opostas) e que nada haja de universalmente válido e seguro.
Portanto devo dizer que odeio o erro, bem como as opiniões erradas e as teorias, e as ideologias falaciosas. Se dissesse que não odeio de todo meu coração e que aborreço ao racismo, ao nazismo, a tortura, a pena capital, ao fanatismo religioso, ao fetichismo, o machismo, o adultismo, a injustiça, a repressão sexual, a homofobia, etc e que amo tudo quanto esteja em oposição a tais ideologias não me sentiria humano ou sequer racional.
Para tapar a boca do abismo que esta a nossos pés é necessário ultrapassar ou transcender o imaginário individualista e retomar o discurso da essencialidade. Condenar esta ou aquela cultura de morte em termos meramente individuais e subjetivos numa perspectiva relativa é pura e simplesmente admitir que nossa condenação esta firmada na força ou no poder... Portanto caso o fascismo, o comunismo ou o nazismo obtenham o poder condenar-nos-ão segundo o mesmo princípio e pelo poder ou a força farão sancionar suas opiniões... Se nada há no mundo além de opiniões.
Não pode o nazismo ou o comunismo sem falso sem que a policracia seja verdadeira em termos de essência e não de consenso opinativo ou poder.
Agora por odiar o protestantismo, o judaísmo antigo ou farisaico, o islamismo, o fetichismo, o ateísmo, o materialismo crasso, o relativismo, o subjetivismo, os totalitarismos, os individualismos, etc direi que todos os partidários dessas ideologias não passam de vilões?
Podemos dizer que todas as pessoas favoráveis ao nazismo, ao fascismo, ao comunismo, ao capitalismo, ao anarco individualismo, ao protestantismo, ao sectarismo, ao islamismo, ao ateísmo, ao materialismo, ao relativismo, ao subjetivismo, sejam más?
Será lícito confundir as pessoas com as ideologias que professam ou com as instituições de que fazem parte?
Permitam-me a mim acreditar que de modo geral a maior parte das pessoas esta acima da ideologia que declaram professar, que pessoas honestas professam opiniões falsas e que boas pessoas possam pertencer a instituições odiosas!
Permitam-me crer que pessoas possam estar de boa vontade e sinceramente equivocadas!
Permitam-me julgar que até mesmo nas piores seitas protestantes como nos partidos nazista, fascista e comunista possa haver certo número de pessoas que acreditam ter dado com o bem, o belo e a verdade, e que se deixaram enganar ou iludir pelas aparências???
Acaso me dirão que todos os alemães filiados ao Partido Nazi (e eram dezenas de milhões), que todos os russos filiados ao P C nos anos 50, que todos os habitantes do Belt Bible, que todos os muçulmanos ou empresários (burgueses) espalhados pela face da terra tenham plena consciência a respeito do que creem ou fazem???
Haverá quem o diga. Quem diga sim e conclua que a imensa maioria dos seres humanos pratique o mal ou sustente o erro conscientemente pelo simples prazer de mentir ou de fazer o outro sofrer. Que há um sadismo ou uma crueldade difusa na espécie humana. Lutero, Freud e até certo ponto Lênin, certamente pensavam assim. Eu no entanto prefiro partilhar o otimismo de um Sócrates ou de um Jesus e a crer que se alguns deleitam-se em praticas conscientemente o mal, a maioria age quase sempre inconscientemente i é crendo professar a verdade e fazer o bem.
Isto quando não são enganadas pelos líderes religioso, políticos ou sociais; exploradas em sua boa fé e manipuladas em sua angústia abissal.
Por mais que odeie o protestantismo, o capitalismo, o comunismo, o nazismo, etc não me peçam para concordar com o uso dos termos: protestante, capitalismo, empresário, burguês, fascista, comunista, nazista, etc como o equivalente a mostro ou a ser humano privado de dignidade e direitos.
Não me peçam para sancionar o uso desses 'nomes' com o intuito de coisificar as pessoas ou de converte-las em espantalhos!
Num primeiro momento sou levado a crer que aquele sectário religioso, muçulmano, empresário, comunista, fascista, relativista, subjetivista, etc não passa de um alienado, de um ignorante, de um mal informado e manipulado pelo sistema a que pertence. O que deve levar-me não a uma atitude agressiva, violenta, feroz e sim a uma atitude cordial, carinhosa, amena, voltada para o diálogo e buscando esclarece-lo.
O sentimento que devemos nutrir face aos que pensam ou creem diferente não é sentimento de ódio pelo homem.
Doutrinas e crenças não só podem como devem ser odiadas, mas pessoas, sempre que possível (esgotadas todas as possibilidades) devem ser compreendidas e amadas. E este sentido de amor, carinho e compreensão para com uma pessoa que perdeu o caminho deve conduzir-nos a troca de ideias ou ao diálogo nos termos do grande Sócrates ou do divino Jesus e não ao ataque e a agressão...
Ei-a! Pessoas não são opiniões, não são ideologias, não são erros, não são organizações, não são igrejas e tampouco clubes ou partidos; são pessoas.
Podemos e até devemos discordar delas, mas isto não nos obriga a crer que são desonestas, safadas, canalhas, maldosas ou mentirosas. Uma coisa é discordar teoricamente e outras conhecer os motivos mais íntimos e profundos que conduziram aquela pessoa a determinada posição teórica ou intelectual! Aqui temos de proceder com a máxima prudência e se não conhecemos a pessoa, e se lidamos com uma multidão de seres humanos EVITAR QUALQUER TIPO DE GENERALIZAÇÃO APRESSADA.
Se não temos contato pessoa com a pessoa, abstenha-mo-nos de julga-la ou de ataca-la. Permaneçamos no campo da doutrina apenas!
"Odeia o erro e ama o que errou." é norma e regra formulada milênio e meio pelo Bispo de Hipona e julgo que hoje seja mais atual do que nunca.
Pois com o objetivo de fomentar a cólera, a raiva, a paixão, o ódio, o instinto de agressividade, a ferocidade atávica... nossa sociedade manipula nomes, joga com palavras e rotula seres racionais e livres fazendo-nos crer que são monstros e que devam ser exterminados.
Foi assim que usaram o termo herege, o termo judeu, o termo burguês, o termo comunista e o termo fascista; dentre outros. Claro que essas condições todas existem. Claro que algumas são odiosas e outras (judeu) não. Saibamos no entanto distinguir os homens nossos irmãos, membros da mesma família e representantes do mesmo gênero das ideias erradas que possam vir a endossar.
E tenhamos sempre em nossos corações o fato de que pessoas não são ideias e ideias não são pessoas. Que uma coisa podes e deves detestar (os 'ismos') e a outra deves buscar compreender.
Assim o papista não é um inquisidor, o herege não é necessariamente um pecador, o judeu não envenena poços, o burguês não é necessariamente insensível, o comunista não come criancinhas... Abandonemos os estereótipos antes que seja tarde.
Marcadores:
alienação,
capitalismo,
Clube,
Coisas,
Coisificação,
comunismo,
Crenças,
fascismo,
fetiche,
Grupo,
humanismo,
ideologia,
nazismo,
partido,
Pessoas,
relativismo,
Rótulo,
Sectarismo
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário