Julien Offray de la Mettrie é um exemplo clássico de como o postulado de Dostoiévsky é verdadeiro: "Se Deus não existe tudo é permitido". Por coerência os ateus deveriam deduzir a sequência lógica da negação da existência de deus. Onde não há deus, há liberdade; Onde há deus, há lei; Onde não há deus eu sou a lei. Aqui no blog já falamos (Domingos e eu) das implicações morais do ateísmo e citamos a moral
La Metrie partia do princípio que o bom ou mau funcionamento do corpo condicionava de modo absoluto a felicidade ou infelicidade dos homens, de acordo com ele:
"Os maus podem ser felizes...
Parricida, incestuoso, ladrão, celerado, infame e justo objeto da execração dos homens de bem, serás feliz apesar de tudo. Bebe, come, dorme, ronca, sonha; e se, pensas, às vezes, que seja entre dois vinhos... Refocila como os porcos e serás feliz à maneira deles". [¹]
Segundo Sérgio Paulo Rouanet "diante de trechos assim é compreensível o desejo dos filósofos de se distanciarem de La Metrie. Foi o caso de Diderot, também ateu e que por isso mesmo fez questão de se dissociar das consequências morais (ou imorais) que La Metrie tirava de seu materialismo. Para Diderot, La Metrie era um autor sem julgamento, de quem se reconhecia a frivolidade de espírito no que ele dizia e a corrupção do coração no que não ousava dizer, cujos princípios derrubariam as leis, dispenariam os pais de educar seus filhos, internariam no hospício o homem que luta contra suas inclinações desregradas, em suma, era um homem dissoluto, impudente, bufão, adulador, feito para a vida das cortes e para o favor dos grandes". [²]
Notas: Do homem-máquina ao homem-genoma de Sérgio Paulo Rouanet - jornal Folha de São Paulo, caderno Mais! 06 de maio de 2001, página 14.
Um comentário:
Melindram-se os ateus 'bem comportados'- que desejam passar por paladinos do humanismo e assumir um discurso pautado em princípios e valores saudáveis - que seus colegas, mais honestos, viris ou corajosos, reflitam até as últimas e derradeiras consequências da negação do Ser, elaborando uma 'escolástica' ateística suja conclusão inexorável é a total relativização dos valores, da ética, do homem e da vida.
Querem os ateuzinhos incoerentes viver como pessoas teístas ou religiosas para as quais existem padrões absolutos e fixos de bem e mal e não construções relativas ao arbítrio do sujeito que as elabora em benefício próprio a exemplo do patriarca ateu Teodoro de Kirene e do Dr La Mettrie.
O nexo em termos de lógica já foi devidamente apontado e esgotado por Kant na 'Crítica da razão prática', injustamente menosprezada pelos modernos, porque problematizadora e posteriormente por Camus e Sartre.
Deve o ateísmo, por linha de coerência lógica - seguida por Stirner e Nietszche - descambar no mais completo nihilismo até o desespero e o suicídio.
Mesmo Camus teve - como Sartre - de apelar a 'seus' valores com o intuito de 'condenar' o suicídio, mas os valores de Camus eram de Camus...
Destruido o vinculo essencial que une todos os seres fragmentários, distintos e dispersos; o próximo, outro ou semelhante vai-se pelo cano... pois cada um julgará sempre em seu próprio beneficio e proveito sem considerações a respeito da justiça...
Sem uma lei externa e absoluta desaparece o homem e a vida, todo e qualquer mecanismo de proteção social torna-se inutil numa tal sociedade em que homens convertem-se em lôbos uns dos outros, conhecendo apenas o argumento da força.
Quando houverem filhos, netos e bisnetos de ateus, criados desde o berço neste sistema e capazes de refletir sobre ele até o fim, as coisas tomarão outro rumo.
Pena que os paladinos do ateísmo não foram - em sua maior parte - educados e formados nas fileiras ateísticas desde o berço.
Excelente artigo.
Ateus e fundamentalistas religiosos e fanáticos merecem-se.
Viva Erasmo de Roterdan!
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