terça-feira, 3 de novembro de 2015

Carlyle, Taine, Marx e a questão do homem e do processo histórico

Caso abramos qualquer livro de História editado neste pais até meados dos anos 70 damos invariavelmente com o culto da personalidade em torno de uns supostos heróis, quase sempre políticos ou homens de estado. Tratam-se de personagens amiúde retiradas de seu contesto social e por isso quase que abstratas. É todo um desconsiderar das circunstâncias externas ao personagem ou dos fatores propriamente históricos.

Grosso modo o romantismo conhece apenas o poder mágico de vontade humana... aqui a realidade é norteada ou decretada por algumas vontades excepcionais e nada se sabe em termos de condicionantes; e nada se diz a respeito do meio, do ambiente, do tempo, do espaço, da cultura, da economia. Trata-se duma História mirabolante, superficial, tosca, voluntarista, individualista e portanto viciada. Segundo Marx no XVIII Brumário, tal era a perspectiva de V Hugo ao analisar o 02 de Dezembro...

Aqui temos romance, folhetim, drama, fantasia... o que quisermos; mas não História real, que os caminhos da História real são outros e bem mais complexos.

No entanto como o homem vai de extremo a extremo ou de abismo a abismo a reação não tardou a afirmar-se assumindo o caráter de um determinismo imaterialista ou cultural ou de um determinismo materialista e economicista, ambos absolutos. Aqui a própria vontade da pessoa era compreendida como epifenômeno da coerção social ou do regime concernente aos bens econômicos. Os homens eram produtos ou resultados da assimilação cultural - e portanto cópias uns dos outros - ou das relações econômicas de produção, assim sendo, de modo algum livres, mas determinados pelos fatores externos e aprisionados pelas circunstâncias. Atuavam os homens necessariamente, como peões de xadrez no tabuleiro da História, movidos por forças externas muito superiores...

A História romântica havia eliminado o fator condicionante ou seja as circunstâncias. A História positivista e posteriormente a Comunista eliminou o fator eficiente, a iniciativa humana.

Marx no entanto parece ter tido ideias bem mais equilibradas e saudáveis do que seus seguidores, a exemplo de Eugene Dietzgen. Este materialista economicista e mecanicista irredutível. Da analise de Marx sobre o XVIII Brumário (cap I) salta a vista que em Fevereiro de 1848, as conjunturas para a Revolução socialista, haviam sido dadas. Apenas não foram aproveitadas pelos comunistas ou socialistas, faltando aqui a ação do elemento humano. A qual consequentemente Marx não excluí. Outra segundo Marx (opus cit) não era a opinião de Proudhon, o qual certamente era capaz de perceber a necessidade dos dois elementos...

E continua expondo que do mesmo modo as condições para o 02 de Dezembro de 51 haviam sido igualmente dadas, e aproveitadas por Luiz Napoleão, embora fosse este, segundo o juízo de Marx, um estúpido ou imbecil. Agora nós somos da opinião oposta, julgando que é necessária certa acuidade ou superioridade, tendo em vista a percepção das circunstâncias dadas e seu aproveitamento pelo homem. Aqui cabe o gênio de Carlyle, não no alterar magicamente a história, mas em conhecer as oportunidades dadas pelo momento histórico e atuar em comunhão com ele, o que certamente não pode ser apanágio do homem vulgar.

A H Taine, o positivista heterodoxo, devemos uma das soluções ou sínteses mais interessantes. A qual engloba tanto o homem quanto as circunstâncias dadas pelo processo. Claro que em se tratando duma solução de compromisso ou meio termo, continua sendo incompreendida pelos extremistas e radicais... assim os voluntaristas imbecis classificam o sociólogo francês como determinista por ter aceito os elementos condicionantes e limitado as possibilidades da ação individual ou mesmo humana, enquanto que os materialistas economicistas classificam-no como voluntarista e idealista por ter concedido certo poder ou capacidade a ação humana, mormente quanto conjuntamente exercida.

Engloba esta síntese brilhante três elementos: um eficiente> o homem ou a vontade humana; e dois condicionantes ou se quiserem limitadores: o tempo (época) e o espaço (lugar) ou meio (ambiente). O homem ou as organizações humanas levam a História adiante na medida em que analisam o meio (tempo e espaço) compreendem a cultura e aproveitam as possibilidades oferecidas, conscientes de seus limites.

Nem deus onipotente, nem uma marionete ou robô programado mas um elemento consciente que para atuar com sucesso deve compreender as circunstâncias dadas e atuar em comunhão com elas dentro de determinados limites, para além dos quais sabe ser impossível avançar; isto é o homo sapiens na perspectiva do que posteriormente viria a ser crismado como possibilismo por Vidal de la Blache e sustentado com habilidade por Toynbee.





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