quinta-feira, 26 de janeiro de 2012
Um cenário de terror
Imagine o leitor uma montanha de lixo, agora imagine pessoas paupérrimas: crianças, adolescentes e adultos envelhecidos antes do tempo. Não é o cenário perfeito para um filme de terror? Não é uma paisagem perfeita para os contos fantásticos de Edgar Allan Poe?
Há mais ou menos uma década vi o que era viver abaixo da linha da pobreza. Não foi trabalho de campo de geografia nem de sociologia. Fui com meu irmão (irmão de consideração mas nem por isso menos irmão, irmão que a natureza não quis me dar) para o lixão à cata de livros em meio aos catadores de papéis. Fomos para comprar livros, sim livros bons também param no lixo. E o que vimos lá? Coisas que olhos não viram - parafraseando São Paulo apóstolo -que os ouvidos não ouviram, que os narizes não cheiraram e que a mente não imaginou.
Fomos para comprar livros e compramos, perguntamos aos catadores quanto lhes pagavam por quilo e não acreditamos ou melhor não quisemos acreditar no que ouvimos: 2 centavos, o quilo. Sim, leitor os catadores de lixo reciclável, ganhavam 00,2 R$. Para ganhar R$ 2,00 por dia precisavam catar 100 quilos de lixo! Eles estavam muito além da exploração e nem sei que nome Marx daria a esse tipo de hiperexploração econômica, seria talvez mais-valia hiperinflacionária? O mais espantoso de tudo é que se você oferecesse para alguns deles que lhe trouxessem livros de 200 ou 300 gramas ou mais 0,20 centavos ainda ficavam agradecidos com a generosidade! E se desse R$ 1,00 você se torna um deus! Mas isso não seria bom negócio para os donos do lixão, pois pessoas dispostas a pagar mais se tornariam concorrentes e logo incômodas para aquele imundo sistema.
No lixão de São Vicente, no Sambaiatuba, hoje desativado, vi crianças trabalhando, pessoas com ferros que mais pareciam lanças para catar papéis, sem quaisquer proteção para os pés, cabeça ou braços. Poderiam se cortar com vidros, pregos enferrujados, se contaminar com líquidos puterfatos ou quaisquer outros materiais. Não eram escravos pois não tinham uma senzala onde descansar nem tinham comida mesmo da pior qualidade lhes esperando, estavam numa condição pior do que as dos escravos do século XIX. Eram pessoas sem esperança, sem identidade, sem futuro, viviam por viver. Com a desativação do lixão não sei o que foi feito delas. O lixão foi destivado para preservar o meio ambiente de São Vicente, mas de que adianta preservar o meio ambiente se se trata o outro como um objeto?
Ver coisas como essas creio eu, superam e muito os romances saídos da imaginação, o que eu vi gostaria que fosse um pesadelo, ou pura imaginação mas era real, tão real quanto você que me lê. É por isso que sonho com um mundo melhor porque o mundo real é um pesadelo sem fim.
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