Decidi não mais discutir com as pessoas que não tem o mesmo grau de cultura que eu, decidi não mais debater com aqueles que argumentam aos berros e que pensam mais com o coração do que com o cérebro.
No meio professoral tenho ouvido certos discursos calados mas ao mesmo tempo enojado e respondo de forma acrítica e com um sorriso amarelo de decepção.
Ontem mesmo ouvi um desses discursos, no qual uma professora dizia que as serventes, inspetoras, atendentes e professores não devem reclamar de seus serviços porque quando prestaram concurso sabiam bem quais eram suas atribuições. Prestaram concurso sabendo do que se trata, então não devem reclamar do trabalho x e nem do salário, que mudem de emprego ou que prestem concurso para outra área.
O que a professora em questão ignora (e não só ela, mas ela representa aqui todas as pessoas que pensam da mesma forma que ela) é que uma pessoa quando busca um emprego concursado, busca estabilidade, por medo do desemprego, por medo da instabilidade, por medo de não ter crédito na praça entre outros. Claro que os concursados leram o edital e sabem quais são suas atribuições, isso não quer dizer que concordem com ela. Tá - pode alguém perguntar - então por que cargas d'água fizeram o concurso? Não tinham outra escolha? Não, não tinham outra escolha, porque no sistema capitalista a burguesia diz que você pode escolher seu emprego e seu patrão, mas isso não é a verdade, de sã consciência jamais alguém escolheria um patrão ou um emprego. Ora, a burguesia detêm os meios de produção, o trabalhador só vende sua força de trabalho, ele apenas submete-se àquelas atribuições porque precisa do emprego para sobreviver, ele não tem escolhas, ele não negocia com o patrão as atribuições de seu encargo nem o salário, é pegar ou largar. Não se pode dizer que existe liberdade em escolher ficar num emprego estável ou num emprego instável; Não se pode dizer que existe escolha entre ficar empregado ou suportar o desemprego e seus fantasmas. Não se pode falar de escolhas entre um proprietário e um desapropriado. A conversa entre patrão e empregado é: Ou faz isso ou rua - e ainda continua ironicamente - a opção é sua. No caso dos professores concursados, principalmente daqueles que estão em estágio probatório a situação não é diferente, eles não escolheram suas atribuições, elas não foram negociadas no gabinete dalgum secretário da educação, foi algo imposto, vindo de cima, não discutido, não debatido, os professores apenas aceitaram tal e qual um dogma, aliás até os dogmas da religião cristã são debatidos antes de serem formulados.
Eu não aceito minhas condições de trabalho porque eu não as escolhi, mas premido pelas necessidades neste mundo no qual vigora a lei do mais forte tive que me submeter para sobreviver ou era devorado pelo desemprego ou por um subemprego, mas isso acontece porque o povo é individualista e fatalista. Crê que existe uma ordem estabelecida e que desde que o mundo é mundo as coisas são como devem ser. Muitos funcionários públicos que assim pensam sequer refletem que amanhã eles mesmos podem ser vítimas dos desmandos de certos governos e prefeitos. Mas as ideologias dominantes são sempre as das classes dominantes como ensinou Marx. E é tão difícil vencer essas ideologias, pois derrubá-las equivale a destruir toda uma cosmovisão, requer que as pessoas pensem e a maioria delas não está disposta a pensar sobre capitalismo, ideologias e ideias afins. Enquanto levam suas vidinhas medíocres com seus carros parcelados em 60 vezes, com suas casas financiadas em ou 40 anos, enquanto podem viajar nas férias e comer alguma coisa diferente das classes mais empobrecidas, está tudo bem. O modo de vida que a burguesia reproduziu neles, os leva a pensar assim. Fazer o quê? Estudar filosofia, levar a filosofia a ágora. Mas eu não tinha dito no início do texto que não discuto mais com pessoas que não tem o mesmo nível cultural que eu? Sim, eu disse, mas tenho que vencer isso e imitar a Sócrates que a ninguém desprezava e fez até que um escravo pudesse participar da filosofia. Bom, é isso.
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